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O papel dos termos de ajustamento de conduta na efetivação da regulação setorial

No âmbito da regulação, tem sido crescente o movimento em torno da consen- sualidade como busca de superação das falhas do processo sancionador e sua efetividade.

A teoria da Administração Pública consensual adota o entendimento de que a transigibilidade por parte da Administração Pública pode ser mais eficiente do que a imperatividade, e mais favorável ao interesse público. Questiona-se a ideia de que o direito e a justiça vêm unilateralmente do Estado, não podendo ser resultado de uma cooperação com o ente privado.

Na visão clássica do direito administrativo, o interesse público só seria favo- recido por meio da observância ao princípio da legalidade estrita. De acordo com esse entendimento, caberia ao Estado imperativamente zelar pelo interesse público. No entanto, é possível imaginar cenários em que a observância da conduta origina- riamente prescrita na lei não seja a melhor forma de atender ao interesse público.

Diante disso, a consensualidade na Administração Pública surge favorecendo a adoção dos meios mais eficientes para a finalidade buscada pela administração. Ao escrever sobre a transigibilidade na Administração Pública, Lírio do Vale diz que “o critério frio da lei —segundo concepção firmada ainda sob a ótica da legalidade estrita— nem sempre se revelará efetivamente instrumental ao interesse público”.83 Para a autora, o interesse público pode não ser favorecido no exercício legal do direito da administração, mas sim pela modelação da aplicação do direito.84 Assim, a transação não trata de uma abdicação do interesse público, mas sim uma forma alternativa e mais eficiente de promovê-lo.

Trazendo esse debate para o instituto dos termos de ajustamento de conduta, pode-se concluir que a substituição de multa pela a adoção de outra conduta pode trazer resultados mais eficientes. Afinal, Floriano de Azevedo Marques Neto afirma que:

82  A equipe também tentou ter acesso aos votos dessas decisões por meio de contato telefô- nico com a ANEEL.

83  LÍRIO DO VALLE, Vanice Regina. Transigibilidade na Administração Pública: uma faceta da consensualidade no direito administrativo do século XXI. Fórum Administrativo. Belo Horizon- te. Ano 11. n. 123. p. 9-18. mai 2011.

[a] finalidade da atividade regulatória estatal não é a aplicação das sanções e sim a obtenção das metas, pautas e finalidades que o legislador elegeu como relevantes alcançar. Para atingi- mento destas finalidades primaciais pode lançar mão, dentre outros instrumentos, do poder de sancionar.85

Portanto, se as metas forem mais eficazmente atingidas por meio dessa tran- sação entre o ente público e o privado, a celebração de Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) estaria em consonância com os princípios da administração pública.

Dessa forma, a celebração de TAC tem se revelado tema de elevada relevância para a aderência das concessionárias às normas expedidas pela agência regulado- ra acerca da qualidade dos serviços prestados. Os TACs também têm sido consi- derados um instrumento relevante na busca da efetividade da regulação, dada a constatação de que a mera imposição de multas muitas vezes não se apresenta um instrumento adequado a dissuadir a ocorrência de infrações.

No âmbito do setor elétrico, Marques Neto entende que a celebração de TAC com os atores do setor elétrico decorre do exercício da discricionariedade da Ad- ministração Pública. A decisão das agências reguladoras de abdicar de uma san- ção pecuniária em troca de um compromisso da concessionária de investimento na melhora da prestação do serviço é uma opção do administrador. O autor sustenta, nesse sentido, que a redação das normas não faz da imposição de penalidades uma ação vinculada do administrador, mas um exercício de discricionariedade. O que importa, então, é que a atuação do órgão regulador promova o interesse público.86 Se a melhor forma de promover o interesse público for abdicar da aplicação de uma sanção em favor de um investimento, essa conduta será favorável à luz do interesse público.

A Resolução Normativa no 333/08, regula a celebração de TAC entre a ANEEL

e as concessionárias.

De acordo com essa norma, o TAC poderá ser firmado em alternativa às pe- nalidades impostas pela agência, devendo ser solicitado pelas concessionárias no curso do processo de fiscalização até o prazo para a interposição do recurso.

A Resolução mencionada não dispõe detalhadamente sobre os critérios para sua celebração, mas determina que cabe ao superintendente de fiscalização da ANEEL indicar as condições para a formalização do TAC, desde que inclua o cálculo da multa passível de ser aplicada e o plano de ações e/ou investimentos a serem

85  MARQUES NETO, Floriano Azevedo. Parecer. Revista de Direito Administrativo — RDA, v. 221/360-4. p. 357.

realizados pela interessada, quando for o caso.87 Compete à diretoria colegiada de- cidir acerca da celebração do TAC, observando o interesse público.88

O TAC pode ser celebrado em processo de fiscalização contra descumprimen- to dos indicadores de qualidade do serviço, desde que obrigue o agente a:89

1) cessar a prática da conduta ajustada;

2) corrigir as não conformidades identificadas pela ANEEL;

3) informar a todos os consumidores alcançados pelas não conformidades as medidas adotadas para correção e compensação;

4) realizar os investimentos e implementar as ações previstas no TAC.

Merece destaque que, para dissuadir a reincidência, a Resolução no 333/08 da

ANEEL veda a celebração de novo TAC, com o mesmo objetivo, enquanto o primei- ro estiver vigente. Todavia, a Resolução determina que não será considerado como dizendo respeito ao mesmo objeto o descumprimento de índice de qualidade, por uma mesma concessionária, verificado em áreas distintas.90

TACs firmados pela ANEEL com relação à qualidade do