PARTE II – PRÁTICA PEDAGÓGICA EM JARDIM DE INFÂNCIA I
2.1 REFLEXÃO SOBRE A PRÁTICA PEDAGÓGICA EM JARDIM DE INFÂNCIA I
2.1.3 PAPEL DO EDUCADOR
O educador desempenha sempre um papel fundamental no desenvolvimento e aprendizagem das
crianças, sendo aqueles que “escutam as crianças, são confiáveis, orientam o comportamento
delas de maneiras positivas, têm expetativas elevadas e participam de suas brincadeiras e de sua
aprendizagem” (Howes & Ritchie, 2002; Shonkoff & Phillips, 2000; Stipek, 2006, citados por
Jablon, Dombro & Dichtelmiller, 2009, p. 23). Ao interagirem com as crianças, têm sempre
presente que elas “encontram-se num processo de construção da sua identidade individual, de
conquista da sua autonomia operativizada em termos de movimentos, de actividade física, de
relação com as coisas e com os outros” (Zabalza, 2001, p. 125).
Por ser tão importante a interação do educador com a criança, este tem de respeitar o ritmo e o
nível de desenvolvimento de cada uma, vista como um indivíduo com direitos e competente
(Zabalza, 1998a). É fundamental que o educador dê igual atenção a todas as crianças do grupo
de modo a que se tornem por momentos, o centro das atenções, sentindo-se, assim, especiais.
Ilustro de seguida, com um extrato que mostra uma reflexão sobre este assunto:
Durante as atividades livres, onde as crianças têm possibilidade de realizar jogos e brincadeiras diversificadas, como futura educadora tento não permanecer apenas numa determinada área de modo a dar atenção individualizada a diversas crianças, uma vez que “atenção individualizada está na base da cultura da diversidade. É justamente com um estilo de trabalho que atenda individualmente às crianças que poderão ser realizadas experiências de integração” (Zabalza, 1998, p. 53) (Anexo II: Reflexões em contexto de Jardim de Infância I - Reflexão da 4.ª semana).
O educador tem de estar atento ao desenvolvimento de todas as crianças pois ao fazê-lo
demonstra “conhecimentos sobre o comportamento e desenvolvimento das crianças, capazes de
reconhecer e compreender as suas diversas necessidades e promover a exploração, respeitando a
sua curiosidade natural” (Ferreira, 2013, p. 11). Ou seja, é a partir das observações, que o
educador proporciona um ambiente seguro e estimulante que promove aprendizagens
significativas (Ministério da Educação, 1997; Zabalza, 2001).
No decorrer de uma observação em brincadeiras livres, reparei que uma criança se encontrava a
observar as sombras que havia no chão causadas pelos raios de luz a entrarem pelas janelas
(Fotografia 5). Ao presenciar este momento e ao interagir com ela vi que apontava para chão e
dizia “luz”. Mais tarde, entre par pedagógico e educadora decidimos proporcionar uma
exploração de sombras, através da utilização de um lençol branco pendurado na sala e um
retroprojetor de luz (Fotografia 6). Este acontecimento observado levou-nos a proporcionar uma
atividade a todo o grupo tendo em conta o interesse demonstrado por uma criança.
2.1.4 A OBSERVAÇÃO
A observação constitui uma técnica de recolha de dados que ajuda o educador a “construir
relacionamentos, revelando a singularidade de cada criança” (Jablon et al., 2009, p. 23) como
“via de acesso à representação de uma realidade” (Dias, 2009, p. 28). Isto é, a partir da
observação o educador tem oportunidade de conhecer melhor a criança, como as suas
características e necessidades (Ministério da Educação, 1997).
Fotografia 5 - Criança MA a apontar para a luz refletida no chão
Fotografia 6 - Crianças a explorarem as sombras do corpo numa proposta educativa
Através da observação o educador tem a base “do planeamento e da avaliação, servindo de
suporte à intencionalidade do processo educativo” (Ministério da Educação, 1997, p. 25). Isto
quer dizer que sem observação o processo educativo não existe, pois é através dela que o
educador conhece a criança e, assim, consegue proporcionar atividades que correspondem ao seu
desenvolvimento. Assim, a observação consiste em “selecionar informação para mais
facilmente, a posteriori, a analisar e interpretar” (Dias, 2009, p. 28). Ilustro de seguida uma
situação em que refleti sobre a observação neste contexto:
As crianças nesta faixa etária (3 anos) necessitam que o educador lhes disponha de “um espaço físico especialmente enriquecido e estimulante” (Zabalza, 1998, p. 26), uma vez que as crianças precisam de ser estimuladas, com atividades que vão ao encontro às suas necessidades e interesses. Assim, durante estas duas semanas de observação pudemos constar que as crianças dispõem de ambientes estimulantes com atividades diversificadas para puderem explorar e com elas aprender. Observámos as crianças em diversas atividades livres, que vão de encontro aos seus interesses, como por exemplo a realização de puzzles, com diversos graus de dificuldade. Também tivemos oportunidade de observar as crianças numa proposta educativa realizada pela educadora em que em pequenos grupos as crianças exploraram alguns elementos naturais: como a espiga do milho, bagos de milho e rodelas de madeira. (Anexo II: Reflexões em contexto de Jardim de Infância I – Reflexão 1.ª e 2.ª semana).
2.1.5 DESAFIANDO AS CRIANÇAS
A partir da recolha de dados e das observações, nas duas primeiras semanas no contexto em
Jardim de Infância II, pudemos planear e proporcionar diversas propostas educativas indo ao
encontro das necessidades e interesses do grupo. No entanto, tivemos sempre em conta as
considerações e sugestões da educadora do grupo, pois era ela que melhor o conhecia.
Nestas propostas educativas tivemos sempre em conta a criança competente (Oliveira-
Formosinho & Formosinho, 2013) e ainda a necessidade de existir um “ambiente que as apoie,
estimule e desafie através de experiências ricas e de actividades” (Riley, 2004, p. 42). Deste
modo, proporcionámos atividade às crianças indo ao encontro das áreas e domínios descritos nas
Orientações Curriculares para a Educação Pré-Escolar (Ministério da Educação, 1997).
As atividades proporcionadas às crianças mais significativas para mim, quer fossem na minha
semana de intervenção ou da minha colega, foram aquelas que de algum modo implicassem a
exploração de elementos naturais ou o contacto com a natureza, uma vez que o envolvimento
das crianças em atividades com esse tipo de materiais proporcionava-lhes um outro entusiasmo
que não o observava em outro tipo de atividades (Fotografia 7).
Numa atividade de exploração de plantas trazidas pelo par pedagógico e pela educadora, pude
observar que as crianças recorriam à utilização dos cinco sentidos para explorarem as plantas
(Fotografia 8), onde interagiam bastante com os seus pares, tanto crianças como adultos.
Também foi notório que existia muita imitação por parte de algumas, no entanto, esta imitação
levava a que algumas crianças explorassem os materiais de formas que antes não exploravam.
Ilustro de seguida um extrato onde mostro uma reflexão sobre esta atividade:
Na exploração de grande grupo (Fotografias 1 e 2), como estagiária observante, pude observar que havia muitas crianças que imitavam as ações dos colegas, como cheirar, agarrar numa determinada planta ou diziam o mesmo que ouviam. Também existem crianças que não exploram, ficando a observar as restantes. Nas atividades de pequeno grupo também existem imitações, no entanto as crianças acabam por ter mais espaços para as suas explorações. (Anexo II: Reflexões em contexto de Jardim de Infância I – Reflexão 7.ª semana).
Enquanto futura educadora de infância acho estas explorações interessantes e fundamentais para
o desenvolvimento das crianças, pois é através da exploração e manipulação que as crianças
conhecem o mundo que as rodeia (Bohígas et al., 1997a).
Na realização de uma exploração da massa da digitinta, as crianças tiveram oportunidade de
conhecerem, primeiramente, os materiais que iriam ser usados para a realização da massa
(farinha, água e tinta de guache). Nesta proposta os materiais foram apresentados em forma de
surpresas (Fotografia 9), o que levou as crianças a manifestarem o seu entusiasmo e excitação
através de sorrisos e gargalhadas. Esta estratégia levou a que conseguisse, através do elemento
surpresa, cativar a atenção e concentração de todo o grupo durante a exploração dos materiais.
Ilustro de seguida o extrato de uma reflexão que evidencia esse momento:
No segundo dia de intervenção, as crianças exploraram a digitinta, pois é uma “técnica de expressão plástica comum na educação pré-escolar” (Ministério da Educação, 1997, p. 61), e a preparação da massa foi realizada com o grupo de crianças. Recorri à utilização de estratégias diversificadas para dar a conhecer os diferentes materiais às crianças. A farinha foi “escondida” num saco de papel (Fotografia 4), onde as crianças puderam tatear a sua textura e a água dentro de um borrifador, onde as convidei a fecharam os olhos e de seguida borrifei-as com água. As tintas foram apresentadas em recipientes onde as crianças realizaram uma votação para escolher qual a cor da tinta que queriam utilizar para a digitinta (Fotografia 5) (Anexo II: Reflexões em contexto de Jardim de Infância I – Reflexão 6.ª semana).
A utilização destas estratégias com as crianças leva-as à oportunidade de explorarem materiais
de forma a conhecerem o que a natureza lhes oferece, sendo estas oportunidades de
desenvolvimento para as crianças (Glauert, 2004; Zabalza, 2001). Assim, também surgiram
atividades que foram planeadas para serem desenvolvidas fora das “quatro paredes”.
Fotografia 7 - Criança BC a sorrir na exploração de uma planta
Fotografia 8 - Criança LB a cheirar uma planta
Fotografia 9 - Criança CR a descobrir a farinha através de um saco de papel
Fotografia 10 - Crianças a observarem as plantas num jardim
Para que as crianças tivessem a oportunidade de observar “ao vivo” de onde vêm as plantas,
optámos por proporcionar uma visita de campo ao grupo para que contactassem com a natureza,
observando e explorando o mundo que as rodeia. Neste sentido, deslocámo-nos até a um jardim
no redor da instituição de modo a proporcionar uma proposta educativa diferente às crianças
(Fotografia 10). Em propostas deste tipo são muitos os conteúdos a abordar que contribuem para
o desenvolvimento das crianças, como o cuidado a ter com as plantas e o cuidado ao caminhar
pelas ruas. Já na recolha das plantas, o grupo foi convidado a observar e a recolher algumas
plantas para mais tarde serem exploradas em sala de atividades.
De seguida ilustro um extrato de uma reflexão sobre a proposta de exploração de plantas:
Na terça-feira realizámos uma visita de campo com as crianças (Fotografia 5), onde as levámos a observarem plantas no seu meio ambiente (…). Durante esta saída, para além de lembrarmos as crianças para os cuidados que devem ter com as plantas, também mencionamos que há cuidados a ter quando se anda na rua, como os cuidados a ter por causa dos carros e que as pessoas deveriam passar sempre nas passadeiras pois a rua é “um meio que pode ser aproveitado para que as crianças se iniciem em comportamentos de respeito, cuidado e conservação do meio” (Bohígas et al., 1997, p. 427). No decorrer desta saída da instituição, as crianças ainda tiveram oportunidade de apanharem plantas num jardim no decorrer do percurso (Fotografia 6), tendo a oportunidade de explorarem o meio (Anexo II: Reflexões em contexto de Jardim de Infância I – Reflexão 7.ª semana).O educador precisa conhecer os recursos existentes tanto na instituição como fora dela de modo
a proporcionar atividades em prol da aprendizagem das crianças. Assim, “os educadores não
devem estar alheios ao uso do recreio, já que ali se geram e formam condutas, não só motoras,
como também de convivência, de tolerância e de respeito” (Guardiola, 2008, p. 111).
2.1.6 BRINCADEIRAS LIVRES
No decorrer da Prática Pedagógica, em contexto de Jardim de Infância I, pude vivenciar diversas
brincadeiras realizadas pelas crianças em momentos de atividades livres. Estes existiam em
diversos momentos do dia, estando contemplados na nossa planificação, uma vez que
compreendemos que as brincadeiras constituem momentos de aprendizagem (Frabboni, 1998).
As brincadeiras tanto se realizavam na sala de atividades, como em outros espaços comuns a
outras salas da instituição, como no espaço interior e no espaço exterior não coberto. Nestes dois
últimos espaços, tinham oportunidade de interagir com outras crianças, de faixas etárias mais
novas e mais velhas que as crianças da Sala dos Patinhos. Também tinham oportunidade de
brincar com materiais que lhes eram fornecidos, como bolas, legos e arcos no espaço interior, e
cordas, triciclos e bolas no espaço exterior. Já na sala de atividades, dividida por áreas, as
crianças tinham diversos materiais que podiam utilizar, como legos, a elementos da casinha,
carros, material de desenho, figuras de animais, puzzles, plasticina e elementos naturais.
Durante estas brincadeiras livres eram notórias as interações entre as crianças e com os objetos,
permitindo, assim, que “através destas interacções recíprocas, a criança está a aprender a
controlar ou modelar o seu comportamento e os seus sentimentos” (Brazelton & Greenspan,
2006, p. 33). Estas interações proporcionam à criança a comunicação, a cooperação e até a
resolução de conflitos permitindo-lhes a construção do “conhecimento sobre o mundo usando as
ideias de uma para o desenvolvimento das ideias da outra” (Gandini, 1999, p. 151). Ilustro um
extrato de uma reflexão onde é evidente a interação de duas crianças (Fotografia 11):
Durante a semana, pude observar a criança BC em atividades livres a interagir tanto com outras crianças como com uma tartaruga (Fotografia 13). Ela, nos momentos de brincadeira livre no salão, costumava manter- se próxima da educadora ou da ajudante de ação educativa, onde passava grande parte do tempo a brincar sozinha. E no decorrer desta semana já a observei a interagir com a criança FM (Fotografia 14) (Área Formação Pessoal e Social), ao correrem de mão dada pelo espaço (Área Expressão e Comunicação – Domínio Expressão Motora), onde a criança BC sorria muito, e também a vi a interagir com as crianças AP e DL (Anexo II: Reflexões em contexto de Jardim de Infância I – Reflexão 13.ª semana).
As crianças recorriam diversas vezes à utilização do jogo simbólico nas suas brincadeiras
(Fotografia 12), onde “a função simbólica é a habilidade de fazer uma coisa - palavra ou objeto
- representar uma outra” (Oliveira, 1995, p. 129) e ao ser usado por elas “é factor de equilíbrio
afectivo e de desenvolvimento intelectual” (Not, 1991, p. 108).
Sempre tentei participar nas brincadeiras das crianças uma vez que a brincadeira deve ser
educativa, sendo que elas aprendem através das suas brincadeiras (Fotografia 13). Durante estes
momentos, as crianças recriam comportamentos e fazem representações, resultantes de
informações do mundo exterior (Not, 1991). De seguida, ilustro um extrato duma reflexão em
que abordo este tema:
Num dos dias em brincadeiras livres, convidei a criança MA a brincar no cantinho da Natureza (Fotografias 9 e 10), uma vez que ele normalmente brinca na área da garagem. Ele aceitou e à medida que ia descobrindo os objetos da caixa ia dizendo os seus nomes, como “pedra” e “concha”. Nesta brincadeira também abordou os conceitos de cores “branca”, “preta” e ainda o tamanho de duas pedras, “grande” e “pequena” (Anexo II: Reflexões em contexto de Jardim de Infância I – Reflexão 5.ª semana).
Fotografia 11 - Criança BC e FM a interagirem no Salão
Fotografia 12 - Criança KG a construir “um castelo” com legos
Fotografia 13 - Criança MA a brincar com conchas e pedras
2.1.7 DOCUMENTAÇÃO PEDAGÓGICA
No decorrer desta Prática Pedagógica decidi realizar um exercício de documentação pedagógica,
por iniciativa própria, sem que me fosse aconselhado a fazer, quer pela educadora cooperante
quer pela professora supervisora, uma vez que “documentar permite descrever, interpretar, narrar
a experiência, significa-la e (re)significá-la (Azevedo, 2009, citado por Oliveira-Formosinho &
Formosinho, 2013, p. 69), sendo também um “processo para registar a aprendizagem – a
aprendizagem das crianças” (Oliveira-Formosinho & Formosinho, 2011, p. 35). A cada registo
da observação/aprendizagem chamei Registo Individual de Ocorrências.
Decidi executar esta documentação pedagógica de forma a realizar alguns “treinos” de registo
de observações de acontecimentos ocorridos, uma vez que
documentar significa escolher, selecionar, assumir conscientemente um ponto de vista, um ponto de observação a partir do qual relatar um pequeno espaço de vida, uma experiência particular, de uma determinada criança ou grupo de crianças, localizada num tempo definido, observada por uma ou mais pessoas através da utilização de instrumentos propositadamente identificados (Malavasi & Zoccatelli, 2013, p. 32).