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81 Para finalizar, reagrupando e sintetizando o que por in-

tenções esclarecedoras separamos: "é preciso explorar sempre as estruturas léxicas, onde toda a palavra se insere e as es­ truturas semânticas, onde toda a palavra adquire sentido"6 º

.

O jeito, a forma , os processos e os recursos dependerão de quem se proponha a fazê-lo ; no caso, estudaremos a estra­ tégia da abordagem léxico-semântica de Ana Maria Machado.

5 . 2 . l - Recursos MorfolÕgicos 5 . 2 . 1 . 1 - Formação de Palavras 5 . 2 . 1 . 1. 1 - Derivação

No que diz respeito aos processos de formação de pala­ vras, ocupa a derivação papel importante na constituição do vocabulário de Ana Maria Machado.

Entendemos por derivação o processo pelo qual a palavras já existentes, acrescentam-se certos elementos formativos, fazendo com que elas adquiram sentido novo, que se referem

entretanto, ao significado da palavra primitiva . Na derivação se estrutura um vocábulo na base de outro . Talvez seja no es­ tudo dos prefixos e sufixos que observamos mais claramente a evolução e vida das palavras .

Os radicais, base fundamental dos vocábulos, elementos de significação geral, vaga e indeterminada , às vezes nas línguas de flexão, recebem dos prefixos e sufixos, seu modo de ser, sua individualidade e precisão, e, se aqueles radi-

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cais podem nestes influir, modificando-os, tanto em sua forma quanto nas modalidades de seu sentido, estes, por sua vez, influem nos radicais, introduzindo-lhes elementos novos, substituindo-os, aumentando-os, diminuindo-os ou eliminan­ do-os .

Estas duas séries de ações e reações caracterizam os elementos rnórficos dos vocábulos, oferecendo o radical o es­ boço da palavra; os prefixos e sufixos os instrumentos que lhe determinam os contornos, dando-lhe feições, corpo e fei­ tio conhecidos .

5 . 2 . 1 . 1 . 1 . 1 - Derivação Sufixal

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através da derivação sufixal que se formam substanti­ vos, adjetivos, verbos e advérbios, razão pela qual o sufixo pode s er classificado em nominal, verbal e adverbial . Assim, em português, os sufixos têm como função precipua - morfoló­ gica - formar novas classes gramaticais, sem alterar a sig­ nificação do radical .

Corno elementos de formação vocabular que essencialmente sao, a sua posição no interior do sistema lingüístico é muito mais rnórfica do que semântica . Servem, principalmente, para transpor um radical de urna categoria de palavras para outra . Essa vacuidade nocional, com algumas exceções, facilita o fenômeno da saturação afetiva, e faz de muitos sufixos portu­ gueses vigorosos elementos estilísticos.

Ana Maria Machado por meio de sufixos acoplados a radi­ cais de significações diversas, vai nomear objetos, seres,

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situações. Isto se torna particularmente importante pois, de outra maneira, não conseguiria traduzir o que si gnificam, pe­ la dificuldade de expressão ao utilizar apenas termos conhe­ cidos da língua . Este processo concebe relações engenhosas e criativas, sendo importante observar que original é o produ­ to do sufixo anexado ao radical normalmente não combinado com o mesmo e não o sufixo em si. Corroborando isso, Machado Câmara Jr. na mesma linha do lingüista americano M. A. K. Halliday , nos diz que � para cada vocãbulo hã sempre a possi­ bilidade, ou a existência potencial de uma derivação"6 1

Examinemos, então, a utilização que Ana Maria Machado faz dos sufixos que podem formar :

5.2 . 1 . 1 . 1 . 1.1 - Substantivos

E a segunda coisa não podia ter mais redondice . • . Ben- to 13

.. . apesar de todas as minhas andanças e voanças por mui­ tas épocas . . . Pr 61

s . 2 . 1. 1. 1. 1 . 2 - Adjetivos

Tinha bichos mais abraçadores, feito o tamanduá , Jabu­ ti 4

- Vocês não viram um tatu-bola muito bem bolado bem aqui? Bento 13

84 5. 2 . 1 . 1. 1 . 1. 3 - Verbos

Em relação aos verbos , não encontramos exemplos com a caracteris tica mencionada , ou seja , a combinação de sufixos com radicais a que ordi nariamente não se unem . O que verifi­ camos é que Ana Maria Machado lança mão ou de bras ileirismos ou palavras de pouco uso na linguagem corrente , resgatando esses vocábulos em contextos que passivelmente não s ão muito usados .

Tem jibóia quando es tá jiboiando . . . Bento 5

. . . debaixo da água morninha que caía, se esparramava e baru l hava gostosa , . . . Boi 16

5 . 2 . 1. 1 . 1. 1 . 4 - Sufixos Intensivos

Não incluímos os sufixos intensivos na re lação anterior por não formarem palavras novas, apenas sofrendo uma carga de

intensificação , permanecendo , porém , tai s palavras , com os seus sentidos primitivos .

Cons ideraremos sufixos i ntensivos aqueles que formarem os superlativos absolutos s intéticos e os graus aumentativo e diminutivo

5 . 2 . 1 . 1 . 1 . 1.4.1 - Superlativo Intensivo

Quanto aos superlativos intensivos , Mattoso Câmara Jr . coloca o assunto nos segui ntes termos :

Não h ã obri ga toriedade no emprego do adje t i vo com es se s ufixo de s uperlati vo, ou grau in ten s o . f a

85 rigor uma ques tão de es tilo ou p referência pes­ s oal. O u, ant es , trata-s e de um us o muito e s paça­

do e es porá dico, em regra , e de tal s orte que certa freiUência nele logo parece abus o e excen­ tricidade 2. Ao que Said A li acres centa : á a forma adj etiva apropriada p ara exp res s ar que a qualid ade ou a tributo u ltrap as s a a no�ão comum que s e tem des s a qualidade ou atri buto 3.

O superlativo tem sentido claramente observável de in­ tensificação ou conteúdo suavemente irônico ou burlesco de paródia verbal. � digno de menção o fato de encontrarmos es­ se mecanismo ampliado até ao uso num substantivo e advérbio, com o transbordamento afetivo desse tipo de adjetivação o que , aliás, inj eta no estilo da autora forte dose de natura­ lidade, da espontaneidade viva na expressão falada em que o exag�ro pitoresco é fenômeno normal e comum .

Vejamos as ocorrências:

O novissimo síndico mandou quebrar o cimento, botar ter ­

ra .. • PU 24

... tinha alguém cozinhando uma comida cheirosissima . SÓ podia estar também gos tosissima . IQ 31

Não estou inventando porcaria nenhuma. � verdadeir{ssimo.

Boi 18

• . . embarafustaram a toda velocidade pelos reais corre ­ dores compridíssimos e chegaram . .. Hist 12

.. . mestiço como Rafael e Marco, mui t íssimo mestiço como Luísa. Pr 83

Cabem ainda algumas palavras sobre o superlativo. Se considerarmos os seus dois tipos de manifestação, o sintéti ­ co e o analítico, de modo geral, o emprego do sufixo imprime

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maior força intensiva à idéia . Aproveitando o primeiro exem­ plo acima apresentado, "O novíssimo síndico " parece-nos mais novo ( recente) - inclusive pela colocação do adjetivo - do . que um "sindico muito novo " .

Mas, é claro, a intensidade tem a ver também com o em­ prego do advérbio : dizer "pelos reais corredores excessiva­ mente compridos "equivaleria a "corredores compridíssimos" .

A linguagem popular, sempre em busca de maior expressi­ vidade, desconhecendo os advérbios chamados cultos (conside­ ravelmente, prodigiosamente, excessivamente e achando desbo­ tado o advérbio muito, inventa curiosos processos superlati­ vamentes como se verá em outra parte deste trabalho .

5. 2. 1. 1. 1. 1 . 4. 2 - Diminutivo

Segundo Mattoso Câmara Jr . , os diminutivos sao nomes substantivos derivados que, com grau implícito, denotam com sufixo lexical específico "diminuição de dimensão" em rela­ çao aos primitivos correspondentes, e aqueles que existem po­ dem ser usados ou não, numa determinada frase, de acordo com a vontade do falante .

Rocha Lima estabelece uma diferença interessante : aos substantivos atribui a gradação dimensiva, enquanto que aos adjetivos a gradação intensiva . Por outro lado, descortina possibilidades desse "acidente '' de grau aparecer excepcional­ mente nos pronomes, verbos e advérbios, com� as vezes, ocorre na obra de Ana Maria Machado . AÍ temos mais uma prova de di­ namicidade da língua, aberta a outras possibilidades que nao

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sejam as convencionais .

A autora, apesar de usar com fre�üência vocábulos com sufixos diminutivos, não os emprega, na sua quase totalidaqe com o sentido da "diminuição de dimensão " . à denotação dimi­ nutiva acrescenta normalmente a conotação de afetividade sen­ do que muitas vezes esta inclui aquela . Sobre esta questão Said Ali nos ensina que :

A per cepção dos s er es pequeninos , como crianças , cr ias de animais , obj etos de u s o comum del icados e de pequenas proporções , as s ocia- s e facilment e o s ent i do de carinho , e daí r es ulta dizerem - s e muitas vezes , t ão s omente par a des per t ar es t e s entido s ob a forma diminu t iva os nomes de s er es que na r e ali dad : n�o s i� pequenos , e es tender -se es t e u s o aos adJ e t i vos .

Acrescentamos que alguns assumem sentido pejorativo, depr€ciativo . Ã idéia de pequenez, às vezes, se junta a de coisa ridícula ou desprezível .

Em certos momentos o uso do sufixo inho e sua variante

z inho se alternará . Os procedimentos lingüísticos do emprego

de um ou de outro (vocábulo terminado por vogal ou consoan­ te) não serão obedecidos rigorosamente pois para Ana Maria Machado o importante é o resultado expressivo do emprego, podendo até, dependendo da ocasião, usar ora um ora outro exemplo . O ritmo da frase e o nível cultural do falante pos­ sivelmente interferem também na seleção .

As manifestações de ternura caracteri zam-se por sua in­ tensidade e natural exagero . Daí ser inevitável que o sufixo também se revestisse de um caráter superlativante .

A linguagem oral é uma fonte inesgotável de aproveita­ mento de certos recursos idiomáticos . A língua coloquial

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sempre gozou de grande liberdade de derivação e composição, graças ao seu caráter essencialmente afetivo . Ana Maria Ma­ chado não só aceita estas variações normais estabelecidas pelo idioma familiar, corno também produz, ela mesma, numero­ sas outras formas novas, dentro das linhas criativas natu­ rais da língua viva . Consegue, assim, efeitos de contraste de grande eficácia, corno, por exemplo, na aplicação de sufi­ xos aumentativos e diminutivos da expressão quotidiana a pa­ lavras que normalmente não os recebem . Com este recurso acres­ centa ao seu estilo a confiança, a intimidade, a naturalida­ de e a vivacidade da conversaçao.

Criações não se constituem, propriamente, em enriqueci­ mento do vocabulário, embora possam manter-se e até fixar-se pela imitação entre estilos individuais .

Eis exemplos de diminutivos:

E se eu não chegar logo com a comidinha de lez inho , o pa­

trãozinho tem xilique . . . IQ 24

. . . , dá bem para reconhecer a cantoriazinha dele, . . . P 21 . . . tem que interromper e dar umas exp li cadinhas , . . . Pr 80

- Maj e s tadinha do meu coração, conta para mim, conta . . .

Hist 12

. . . o Preto Velho tinha dito que a ferrugem de Raul era pouquinha . R 38

.. . segurando no colo a irmã ainda bebez inha . . . O 14 . . . tinha uma amiga especial, uma bisavó - menininha lin­ da, linda, toda fofa, . . . Bisa 2 1

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