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Paul Ricoeur e a «Metapsicologia» de Sigmund Freud como «Meta Hermenêutica» da Cultura

Moderno — A «Metapsicologia» de Sigmund Freud e os Prolegómenos da Crítica «Meta-Hermenêutica»

4.6. Paul Ricoeur e a «Metapsicologia» de Sigmund Freud como «Meta Hermenêutica» da Cultura

Com Eros e Civilização, Herbert Marcuse propõe uma reconstrução de alguns dos conceitos fundamentais da «metapsicologia» de Sigmund Freud, para a partir deles poder elaborar uma crítica da cultura que procura compreender e denunciar o funcionamento das estruturas de «poder» que se encontram instituídas no contexto social da modernidade técnica. De acordo com Marcuse, às diversas revoltas sociais que se manifestaram ao longo da história, tem-se sempre seguido uma subsequente desilusão social generalizada, por sua vez responsável pelo surgimento de um novo «sentimento de culpa» no seio do contexto social da época, o qual irá assim lançar a humanidade em busca de uma nova reformulação do «princípio de realidade». Contudo, poder-se-ia objetar a legitimidade de uma tal reconstrução da proposta freudiana. Objeção que procuraria desde logo evidenciar como na proposta original que é avançada por Freud não é feita uma referência clara à possibilidade de um indivíduo — ou até mesmo de um coletivo social em particular — se mostrar capaz de determinar, intencionalmente, o «princípio de realidade» de acordo com a sua vontade subjetiva. Na medida em que tal determinação se mostra oposta à lógica do «princípio de realidade» tal como ele é definido por Freud, torna-se bastante difícil aceitar a interpretação de Marcuse, sem para tal ter de recorrer a argumentos que podem incorrer numa interpretação da estrutura da sociedade que a representa erigida sobre uma fundamentação conceptualmente utópica (Cf., HABERMAS, 1968, pp 50-51).147

Refletindo sobre uma tal possível objeção, e partindo também da fundamentação conceptual original sobre a qual se edificam os textos freudianos que compõem a

146 A proposta defendida por Herbert Marcuse na segunda parte de Eros e Civilização procura sustentar

que a única via pela qual se poderá romper com este ciclo terá que assentar as suas raizes sobre uma reformulação “estética” do «princípio de realidade». Em suma, Marcuse propõe uma reformulação que rejeita a fundamentação estrita do «princípio de realidade» sob a «racionalidade técnica», que determina o seu caráter enquanto opressão «pulsional», propondo antes uma fundamentação «estética» do «princípio de realidade» que preza por uma harmonização do contexto da vida em sociedade. Marcuse vem assentar os fundamentos conceptuais da sua tese numa reabilitação das raízes da cultura ocidental a partir dos mitos de Orfeu e Narciso, que se mostram para o autor numa clara oposição ao mito de Prometeu, sob o qual compreende que se encontram filogenéticamente enraizados os fundamentos opressivos da «racionalidade técnica» que impera sobre a vida social no contexto da cultura ocidental moderna. Cf., MARCUSE, 1955, pp. 123-182. Esta questão será ainda abordada no decorrer do sexto capítulo da presente investigação.

«metapsicologia», pode tornar-se bastante difícil compreender em que sentido a interpretação que, por via da «metapsicologia», se faz da cultura poderá vir a ser concebida como um dos fundamentos da crítica «meta-hermenêutica» da modernidade técnica.

No entanto, será precisamente por se demonstrar como uma teoria que constrói uma delimitação hermenêutica da cultura — i.e., uma conceção da cultura que possui um caráter essencialmente interpretativo — que a «metapsicologia» freudiana se poderá apresentar como um dos principais fundamentos da crítica «meta-hermenêutica» à qual se tem vindo a fazer referência, e sobre a qual a Filosofia da Técnica das Humanidades acabou também por se desenvolver. A receção que Paul Ricoeur faz da psicanálise freudiana nos seus textos — sobretudo no que diz respeito ao Conflito das

Interpretações, mas também em Freud: Uma Interpretação da Cultura — procura

demonstrar a possibilidade desta conceção, i.e., demonstrar a possibilidade de construir uma «reflexão filosófica» a partir da proposta de Freud, demonstrando também como esta pode ser transposta para outros domínios que não aqueles que foram imediatamente definidos pelo seu autor.148 Com a construção de uma «reflexão filosófica» acerca da

proposta de Freud, Paul Ricoeur procura então fornecer uma demonstração filosófica, coerentemente fundamentada, da legitimidade da compreensão hermenêutica da cultura que percorre a vertente sócio-antropológica da «metapsicologia» proposta originalmente por Sigmund Freud (Cf., RICOEUR, 1969, pp. 121-174).149

Mesmo tendo este intuito em mente, Ricoeur não deixa contudo de considerar que a interpretação que trespassa toda a «metapsicologia» de Sigmund Freud é construída tendo por base um «modelo económico» do psiquismo. Este modelo, de acordo com a sua delimitação original, não procura mais do que representar de forma inteligível a dinâmica que se estabelece entre as energias psíquicas — i.e., entre as «pulsões sexuais» e de «morte» que estão na base da necessidade da edificação do «princípio de realidade» — que estão em jogo na determinação de uma dada cultura. No entanto, é também ao partir desta perspetiva base que é evidenciada por Ricoeur, que são fornecidas as condições necessárias para compreender em que medida, na proposta de Freud, se vem sobretudo constatar como, num contexto sociocultural determinado, o recurso à «ilusão» é utilizado como uma estratégia de apaziguamento do sofrimento que a própria cultura, enquanto materialização normativa do «princípio de realidade», impõe sobre a

148 Preste-se sobretudo atenção aos argumentos expostos em RICOEUR, 1969, pp. 159-174. 149 Veja-se também RICOEUR, 1965, pp. 133-219.

humanidade, e que, simultaneamente, não se mostra capaz de «sublimar» por quaisquer outras vias (Cf., RICOEUR, 1969, pp. 130-147).

No modelo «económico» do psiquismo que se desenha na «metapsicologia» freudiana, segundo a interpretação que é assim construída por Ricoeur, a «ilusão» apresenta-se como um dos mais importantes conceitos aos quais terá de se fazer recurso para se poder compreender o posicionamento crítico, de caráter fundamentalmente «meta-hermenêutico», que poderá ser atribuído a esta vertente da psicanálise face aos pressupostos sobre os quais se delimita a modernidade técnica. De acordo com o cerne desta interpretação em torno da proposta freudiana, o recurso que as diversas culturas têm feito da «ilusão» ao longo da história, segundo as palavras de Ricoeur, tem vindo sempre a ser feito no sentido de fornecer «representações que tornam suportável o sofrimento (Cit., RICOEUR, 1969, p. 143)». Potenciando através da sua instituição uma “consolação” para o sofrimento sentido pela humanidade, constituindo-se por isso essa mesma «ilusão» como um alvo de «investimento pulsional», capaz de proporcionar o escape que a organização estrutural pela qual se rege uma cultura, por si mesma, não se mostra capaz de fornecer. A «ilusão» — do bem-estar, da estabilidade financeira, espiritual, etc. — vem por isso servir como uma forma de justificar racionalmente a opressão das forças inerentes aos instintos primitivos, como um eficaz mecanismo de «sublimação» das «pulsões» que, por diversas vezes na história da humanidade, se veio apresentar como a única alternativa viável na iminência de um colapso do «princípio de realidade» que determina a coesão da cultura (Cf., RICOEUR, 1965, pp. 198-219).

Mesmo ao constatar esta questão, Ricoeur não deixa contudo de voltar sublinhar que, tal como foi já referido, a determinação freudiana da «metapsicologia» que evidencia esta circunstância da cultura é, na sua essência, uma determinação baseada num modelo «económico» do psiquismo. Neste sentido, e tal como também já foi sublinhado, à vertente sócio-antropológica da «metapsicologia» pouco mais lhe parece caber para além da função de desmascarar este fenómeno da «ilusão» como um «investimento» cultural, i.e., como uma estratégia da qual a cultura tem de fazer recurso no sentido de controlar as «pulsões» que contra ela se manifestam, para assim tornar a existência humana mais fácil de suportar dentro do seu próprio contexto. Em suma, a análise que a «metapsicologia» pode fornecer acerca do papel desempenhado pela «ilusão» na determinação da cultura, e de acordo com a perspetiva “objetivista” que se encontra patente nos textos freudianos, consiste sobretudo num esforço de evidenciar a dinâmica que se estabelece entre as forças «pulsionais» que nela vigoram, de modo a

poder tornar claro o seu consequente funcionamento (Cf., RICOEUR, 1969, pp. 144- 145).150

Tal como Ricoeur o vem sublinhar em O Conflito das Interpretações:

«O interesse da concepção freudiana da ilusão é marcar como representações que tornam suportável o sofrimento, que "consolam”, se edificam não só sobre a renúncia pulsional, mas a partir dessa renúncia: são os desejos e o seu movimento de investimento e de contra- investimento que constituem toda a substância da ilusão. Foi neste sentido que pudemos dizer que a teoria da ilusão é ela própria de uma ponta à outra, económica. Mas, reconhecê- lo, é ao mesmo tempo renunciar a encontrar aí uma interpretação exaustiva do fenómeno de valor, de que só uma reflexão mais fundamental sobre a dinâmica do agir poderia dar conta. (Cit., RICOEUR, 1969, p. 143)»

Tal como se pode constatar a partir desta passagem, na conceção «económica» da «ilusão» que é proposta por Freud, não se abre um espaço concreto para uma compreensão valorativa da cultura, por sua vez necessária para o desenvolvimento de uma crítica «meta-hermenêutica» da modernidade. No entanto, há, porém, que ter em conta que o desenvolvimento da «metapsicologia» pela parte de Sigmund Freud tem na sua raiz um propósito terapêutico, que embora não possa promover uma “cura” para as patologias que se manifestam na estrutura «pulsional» que delimita a sociedade, vem, contudo, possibilitar a abertura para uma sua transformação; um outro tipo de “cura” que apenas se torna possível mediante um exercício interpretativo que deve ser levado a cabo criticamente. Por esta via, mesmo quando os seus pressupostos são aplicados à cultura, a «metapsicologia» não deixa de se manifestar como um esforço interpretativo que tem em vista a criação das possibilidades necessárias para a modificação de um padrão de comportamento, o mesmo que, ao longo da história da humanidade, veio servir de modelo para a estrutura da vida em sociedade (e que na interpretação marcuseana se vem identificar com o ciclo de destituição e reificação do «princípio de realidade»). É aqui onde Ricoeur compreende que o contributo hermenêutico da vertente sócio-antropológica da «metapsicologia» pode estender-se para além de um modelo estritamente «económico», mostrando-se a partir dele também a possibilidade de evidenciar os conceitos que são necessários para a construção de uma reflexão filosófica aprofundada acerca dos problemas que assolam a cultura ocidental moderna, e que vai assim para além determinação freudiana original.

A análise que Freud constrói acerca da religião, nomeadamente no que diz respeito àquele que designa como o «sentimento oceânico» que é proporcionado pela fé — tema que também trespassa o texto O Mal-Estar na Cultura — é disso um dos melhores exemplos. A argumentação que Freud desenvolve nesta obra em torno do tema da fé, procura sobretudo demonstrar como este «sentimento oceânico» que é atribuído à experiência religiosa se constitui como o resultado de uma «sublimação» cultural das «pulsões sexuais» e de «morte» em «amor de alvo inibido». O «sentimento oceânico» é por isso o resultado de uma «sublimação» das «pulsões» primitivas do ser humano, por sua vez proporcionada pela «ilusão» que fundamenta toda experiência religiosa criada pela, e na cultura, a partir do «sentimento de culpa» original. Na leitura que Freud desenvolve neste texto em torno do problema do «sentimento oceânico», compreende-se que, detrás da implementação da religião num determinado contexto social, esconde-se um outro intuito que vem a ser disfarçado pelas suas manifestações mais objetivas. Mais do que fornecer uma explicação para o sofrimento que se faz sentir no seio de uma determinada cultura, a religião tem sobretudo em vista criar um reforço do «sentimento de culpa» primordial que lhe deu origem, e que, entretanto, veio constituir-se também como a base da própria cultura, i.e, como um reforço do comportamento que lhe serve de fundamento, e sobre o qual se veio sustentar um estável modelo de vida em sociedade (Cf., FREUD, 1930a).151

Tal como se pode perceber com o final do excerto de O Conflito das

Interpretações que atrás foi citado, Ricoeur destaca que toda esta análise que a

«metapsicologia» faz da cultura ocidental, possui um caráter hermenêutico fundamental, constituindo-se por isso como uma metodologia que se desenvolve, na sua essência, como um exercício de interpretação simbólica. Ideia que, de acordo com Ricoeur, ganha a sua sustentabilidade sobretudo quando se percebe que Sigmund Freud constrói nos seus textos da «metapsicologia» uma análise da cultura que parte da interpretação daquelas que são as suas manifestações simbólicas, para a partir delas ir ao encontro do seu significado mais profundo. O desmascarar da religião como uma «ilusão», que por sua vez se tem vindo a impor como modo de vida no contexto da cultura ocidental, é feito por esta via, i.e., a partir da interpretação das conotações que se encontram implícitas nas suas representações simbólicas, e pelas quais se vem determinar todo o contexto sócio-cultural moderno. A leitura que Freud desenvolve em torno da cultura ocidental a partir dos pressupostos fundamentais da sua «metapsicologia», demonstra-se assim como uma tentativa de compreender, por via hermenêutica, o seu verdadeiro

significado, de denunciar aquilo que através da representação simbólica é, numa primeira instância, velado ao intelecto. Esta denúncia é apenas tornada possível por via da interpretação, a única via para alcançar essa verdade, uma vez que a mesma se encontra encoberta por aquela que se poderá aqui designar como uma “manifestação objetiva” da cultura; nas promessas de salvação e de bem-estar da humanidade que, na sua essência, servem de fundamento para a institucionalização social da «ilusão» que tem em vista o apaziguamento do sofrimento humano, originalmente provocado pelas restrições que são impostas pela própria cultura de modo a perpetuar historicamente as suas normas.

Há ainda que ter em conta que daqui não se pode inferir que toda a cultura se encontre fundamentada numa «ilusão», pelo menos não no que diz respeito ao seu sentido pejorativo, enquanto mentira e deceção, que por esta via poderiam ser facilmente associados ao termo. De facto, tanto Ricoeur como Marcuse têm em consideração o facto de que o controlo das forças «pulsionais» que se manifestam num contexto de vida em sociedade é um mecanismo de incontornável importância para garantir a subsistência da espécie humana a longo prazo. Porém, tal não vem, contudo, demonstrar que todos os mecanismos de opressão «pulsional» que são utilizados no sentido de garantir a integridade do «princípio de realidade» instituído possam ser compreendidos como garantias inquestionáveis de progresso. De acordo com a perspetiva que Ricoeur dá por esta via à compreensão do seu leitor, é por possuirem uma fundamentação simbólica, i.e., linguística, que vem desde logo demonstrar-se a possibilidade de estes mecanismos possuirem caráter polissémico, uma significação essencialmente indeterminada pelo seu caráter conotativo e, por isso, também dependente do sujeito que a interpreta. Na leitura que Ricoeur elabora da «metapsicologia», torna-se possível compreender nela uma determinação ontológica da cultura que, ao mesmo tempo que dá espaço para a construção de uma compreensão hermenêutica do seu verdadeiro significado, possibilita também a hipótese da sua instituição como uma farsa, como um engodo social que procura perpetuar o poder instituído. Pois que o significado imediato dos conceitos que lhe servem de fundamento — i.e., aquele que é apresentado pela sua representação objetiva, empírica, e que por essa via pode ser objeto de uma análise empírica — pode não se corresponder com os seus reais intuitos.

Na «reflexão filosófica» que Ricoeur faz acerca dos textos freudianos que compõem a vertente sócio-antropológica da «metapsicologia» — e sobretudo no que diz respeito à sua interpretação de O Mal-Estar na Cultura e Moisés e o Monoteísmo — é

precisamente este caráter hermenêutico de «suspeita» que se vem evidenciar a partir da análise que neles é elaborada acerca dos elementos que compõem a cultura ocidental moderna. Para Ricoeur, o principal contributo da «metapsicologia» para a reflexão filosófica, manifesta-se na forma como Freud faz recurso de uma metodologia hermenêutica, que incide sobre as representações simbólicas da cultura de modo a poder compreendê-las em todo o seu alcance e profundidade. Só assim se poderá ir ao encontro do verdadeiro significado que nelas se esconde, daquele que não é possível ser captado através de uma análise objetiva das suas manifestações empíricas mais imediatas. Na medida em que se constitui como uma interpretação simbólica, a psicanálise freudiana, sobretudo no que diz respeito à sua formulação enquanto «metapsicologia», pode por isso compreender-se como uma praxis interpretativa, como uma “técnica” hermenêutica que poderá, por essa mesma razão, ser apropriada como uma metodologia a ser usada por outros contextos de investigação (Cf., RICOEUR, 1969, pp. 123-170; 175-182).152

Nas palavras de Ricoeur:

«Em que sentido é uma técnica? Partamos da própria palavra: num texto metodológico importante, Freud distingue, para os ligar dum modo inseparável, três termos: método de investigação, técnica de tratamento, elaboração de um corpo de teoria. Técnica é aqui tomada num sentido estrito, no sentido de terapêutica visando a cura. A palavra distingue- se, portanto, da arte de interpretar ou hermenêutica, e da explicação dos mecanismos, ou metapsicologia. Mas é importante para o nosso propósito, mostrar como a psicanálise é, de uma ponta a outra, praxis, englobando a arte de interpretar e a teoria especulativa. (Cit., RICOEUR, 1969, p. 176)»153

Na perspetiva de Ricoeur, toda a psicanálise é por isso uma hermenêutica, uma técnica interpretativa. No entanto, terá, porém, ainda de se referir que a interpretação que Paul Ricoeur constrói da «metapsicologia» de Sigmund Freud se desenvolve numa direção completamente diferente daquela que foi tomada por Herbert Marcuse. Pois embora não deixe de valorizar o contributo marcuseano,154 Ricoeur desenvolve a sua

receção da proposta freudiana no sentido de construir, a partir dos seus contributos, uma «filosofia do sujeito», uma «arqueologia do eu» que, tal como o defende Fernanda

152 A este respeito veja-se também RICOEUR, 1965, pp. 297-299.

153 O «texto metodológico importante» de Freud a que Paul Ricoeur faz aqui referência é Psychoanalyse

und Libidotheorie. Cf., FREUD, 1923b, pp. 211-233; 312-340.

154 Veja-se, a título de exemplo, a referência/reconhecimento que Ricoeur faz ao trabalho desenvolvido

por Herbert Marcuse em torno deste tema logo no início de Freud uma Interpretação da Cultura. Cf., RICOEUR, 1965, pp. 1-3.

Henriques, procura apresentar-se como uma teoria da subjetividade que dá conta da dialética que se estabelece entre as várias consciências que constituem o humano enquanto tal (Cf., HENRIQUES, 2003, pp. 233-249). Em suma, a reflexão que Paul Ricoeur desenvolve em torno do trabalho de Sigmund Freud é feita no sentido de encontrar na «metapsicologia» alguns dos elementos fundamentais dos quais necessita para construir uma metodologia hermenêutica sobre a qual se poderá desenvolver uma reflexão filosófica que, ao partir da interpretação do conflito que se estabelece entre as várias dimensões que compõem um sujeito, apresenta uma compreensão “arqueológica” do humano, que o demonstra como um ser em conflito; cujo «si mesmo» se mostra como o resultado de um confronto permanente que se estabelece entre as suas

consciências. Nas palavras de Fernanda Henriques:

«Deste modo, o trabalho que Ricoeur elabora em Essai sur Freud pode ser lido como uma resposta à problemática da crise da consciência levantada com o aparecimento no campo teórico da figura da consciência falsa, que ele considera ser o repto que um filósofo, cuja formação radica basicamente na tradição fenomenológica, tem, necessariamente, de aceitar. (Cit., HENRIQUES, 2003, p. 235-236)»

Não obstante este afastamento que se estabelece entre a interpretação que Paul Ricoeur elabora da «metapsicologia» de Sigmund Freud e a apropriação que dela é feita por Herbert Marcuse, torna-se, porém, necessário compreender que em ambos os autores é feita uma transposição dos conceitos fundamentais da «metapsicologia» para um contexto que não se corresponde com aquele que foi originalmente concebido pelo

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