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Percepção de risco associada à gestão de resíduos

Grupo III Produção total

LISBOA E VALE

4. RISCO E PERCEPÇÃO DE RISCO ASSOCIADOS AOS RESÍDUOS HOSPITALARES

4.2. PERCEPÇÃO DE RISCO

4.2.1. Percepção de risco associada à gestão de resíduos

Na revisão bibliográfica efectuada não foram encontrados estudos sobre a percepção do risco relacionada com as várias etapas de gestão dos RH. Apenas foram encontrados alguns trabalhos sobre resíduos nucleares, resíduos perigosos e RU, focando essencialmente a percepção de risco inerente à localização das infra-estruturas de tratamento.

Em termos históricos, os primeiros resíduos a serem englobados nestes estudos foram os resíduos nucleares. Em Hohenemser et al. (1983), os resíduos nucleares aparecem referenciados entre 93 possíveis riscos tecnológicos. Vários estudos foram também realizados focando a percepção de risco inerente à selecção do primeiro depósito para

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resíduos nucleares dos EUA, que ocorreu em 1987 no Nevada (na Yucca Mountain). São exemplos, os estudos efectuados por Kunreuther et al. (1990), por Slovic et al. (1991) e por North (1999).

Kunreuther et al. (1990) estudaram a oposição pública dos residentes do Nevada ao projecto, comparando dois modelos de escolha individual: um modelo de custo-benefício e um modelo de percepção de risco. Concluíram que a aceitação da infra-estrutura dependia de vários factores de risco subjectivos. Os indivíduos necessitavam, primeiramente, de confiar nas entidades responsáveis, sendo fundamental a garantia da segurança das instalações, antes de qualquer negociação em termos de compensações (e.g. financeiras). North (1999), em relação à mesma situação, argumenta que a resolução dos problemas de contestação da localização de depósitos de resíduos nucleares não se resolve através dos avanços no conhecimento dos engenheiros e dos físicos, ou através do desenvolvimento de modelos de avaliação de risco. Como os resíduos nucleares provocam medo e grandes preocupações no público, é necessário compreender a natureza desses receios, de forma a conseguir transmitir que a gestão dos resíduos nucleares pode ser efectuada de uma forma segura.

A percepção de risco relacionada com a radiação foi estudada por Slovic (1996). Na Tabela 4.10 apresentam-se algumas conclusões deste estudo, relativamente ao risco percebido pelos técnicos e pelos leigos inerente a várias fontes de radiação. Os resultados confirmam, uma vez mais, as divergências entre os especialistas e o público e a importância das duas perspectivas.

Tabela 4.10. Resumo da percepção de risco e da aceitação do risco de diversas fontes de exposição a radiações (Slovic, 1996).

Risco percebido

Especialistas Público Energia nuclear / resíduos

nucleares Risco moderado Aceitável Risco extremo Inaceitável Raio X Risco baixo/moderado

Aceitável Risco muito baixo Aceitável

Radão Risco moderado

Necessita atenção Risco muito baixo Apatia Armas nucleares Risco moderado a extremo

Tolerável Risco extremo Tolerável Irradiação na comida Risco baixo

Aceitável Risco moderado a elevado Aceitação questionável Campos eléctricos e

magnéticos Risco baixo Aceitável Desenvolvimento de preocupações significativas Aceitação questionável

Algumas explicações possíveis, para os resultados apresentados na Tabela 4.10, são dadas pelo autor. Um exemplo está relacionado com os raios X, os leigos classificam como tendo um risco baixo por valorizarem os seus benefícios directos e pela confiança que demonstram na forma como os profissionais de saúde manejam a tecnologia, em oposição aos técnicos que classificam como tendo um risco baixo/moderado.

Da mesma forma, o radão também é considerado pelos leigos como tendo um baixo risco, por ser algo entendido como natural, estando a apatia relacionada com a familiaridade

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associada e por ser algo que ninguém é responsável. O mesmo já não se verifica com a energia nuclear e os resíduos nucleares, em que os benefícios não são grandemente percebidos, sendo ambos vistos como algo não confiável. Em relação às armas nucleares, estas são consideradas necessárias e, por isso mesmo, toleráveis (Slovic,1996).

Também Sjoberg (1998), efectuou um estudo sobre o risco relacionado com os resíduos nucleares para a população Sueca. Foram avaliadas as correlações entre a percepção do risco e a variável preocupação, tanto para o risco pessoal como geral, foram igualmente englobadas 21 dimensões psicométricas de risco dos resíduos nucleares, seguindo a tradição psicométrica. Os resultados mostraram que a percepção do risco e a variável preocupação estão, na maior parte das situações, fracamente correlacionadas.

Além dos trabalhos que focam a percepção de risco e os resíduos nucleares, outros têm abordado os problemas inerentes a infra-estruturas de resíduos (e.g. resíduos perigosos, RU) e a percepção de risco. Um exemplo é o trabalho de McClelland et al. (1990) sobre as diferentes percepções dos peritos e dos leigos relativas aos riscos para a saúde de um aterro de resíduos perigosos já encerrado, em Los Angeles (EUA).

Também Ostry et al. (1993a), estudaram numa comunidade rural as atitudes gerais e as atitudes específicas em relação aos aterros e às infra-estruturas de resíduos perigosos, de forma a identificarem factores que induziam essas mesmas atitudes. Utilizaram um modelo de percepção de risco que dividia a comunidade em subgrupos atitudinais e comportamentais. Tratava-se de uma comunidade em Vancouver (Canadá), que tinha um aterro para RU, mas que apresentava uma história de dez anos de contestação em relação à instalação de uma infra-estrutura de tratamento de resíduos perigosos.

Os mesmos autores, efectuaram um outro estudo (Ostry et al., 1993b) com objectivos semelhantes e aplicando o mesmo modelo, mas focando um incinerador de RU, construído numa comunidade urbana (Brunary - arredores de Vancouver, Canadá), em 1987, e que teve grande contestação da opinião pública.

Em 1995, estes autores publicaram um novo artigo (Ostry et al., 1995) em que comparavam três situações, as duas anteriores e uma terceira, relacionada com a proposta de substituição de um pequeno incinerador de RH existente na Universidade local, por um com maior capacidade, que incinerasse também os resíduos produzidos no hospital da universidade.

A Tabela 4.11 resume alguns dos resultados obtidos neste estudo. É na comunidade rural que se encontra um maior número de indivíduos informados sobre a infra-estrutura de resíduos (96%), em oposição à comunidade onde está a ser planeada a substituição do incinerador existente por um de maior capacidade (neste caso apenas 6% dos indivíduos estão informados). Estes resultados poderão estar relacionados com a antiguidade das instalações e com o facto de estarem ou não em funcionamento.

Além disso, Ostry et al. (1995) concluem que a comunidade mais polarizada (comunidade rural), que nunca aceitou a nova infra-estrutura de resíduos perigosos, mostra uma

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aceitação mais elevada em relação à instalação que possui (o aterro para RU), comparativamente à forma como as restantes comunidades aceitam as suas instalações de resíduos. Nesta comunidade, o grupo de pessoas que referiu não estar preocupado com este assunto (32%) encontra-se bem informado, confia na gestão desta infra-estrutura e acredita que ela traz benefícios para a comunidade. Também, o grupo de pessoas que referiu preocupação (68%), está mais optimista e confiante que os indivíduos na mesma situação (que referiram preocupação) das outras duas comunidades.

Tabela 4.11. Percentagem de indivíduos que referiram estar informados e preocupados sobre a infra- estrutura de resíduos na sua comunidade (Ostry et al., 1995).

Indivíduos informados e preocupados com a infra-estrutura de resíduos

localizada ou prevista, na sua comunidade

Informados: 96%

Comunidade rural

Aterro de RU (em funcionamento)

(N = 187) destes 68% estão preocupados

Informados: 63% Comunidade urbana

Incinerador de RU (em funcionamento)

(N = 224) destes 49% estão preocupados

Informados: 6% Comunidade urbana

Incinerador de RH (em proposta)

(N = 265) destes 67% estão preocupados

Na literatura é por várias vezes referido que um maior grau de informação induz níveis de preocupação mais elevados. No entanto, Ostry et al. (1995) sugerem que a informação é um factor importante na aceitação de infra-estruturas consideradas problemáticas (e.g. aterros sanitários, instalações de incineração), e referem a necessidade de um estudo longitudinal de forma a acompanhar o processo de disseminação da informação e os correspondentes níveis de aceitação.

Num outro estudo, realizado por Wiedemann et al. (1991) na Alemanha, sobre a oposição gerada em torno da localização de uma instalação de incineração de RU e a percepção de risco, os autores concluíram que a maior parte dos residentes estavam preocupados com a sua implementação, focando principalmente a necessidade de informação sobre o risco e os sistemas de segurança. Muitos referiram que gostavam de ter maior conhecimento sobre métodos alternativos de gestão de resíduos.

Também, num trabalho realizado por Palma-Oliveira e Santos (1999b), foram estudadas as atitudes e os comportamentos face aos locais de tratamento e deposição de RU. Foram comparados três grupos de indivíduos que viviam perto destas infra-estruturas, ou seja, próximo de uma estação de compostagem, de um aterro sanitário e de uma lixeira. Estes grupos foram ainda divididos entre os que viviam a menos de 750m da instalação e os que viviam a mais de 2,5km da instalação. Foi aplicado a estes sujeitos um questionário que, entre outros objectivos, pretendia medir a opinião em relação ao ambiente e aos resíduos, e a percepção de risco relativamente a essas infra-estruturas.

Os resultados foram bastante consistentes, demonstrando que os indivíduos que viviam perto do aterro apresentavam uma atitude mais positiva em relação a este tipo de instalação e uma percepção de risco menor. Os que habitavam próximo da lixeira tinham uma atitude

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mais negativamente polarizada em relação não apenas à lixeira mas, também, às outras infra-estruturas. Os que viviam perto da estação de compostagem encontravam-se em níveis intermédios, o que revelava uma certa incomodidade com a instalação, que apesar de ser considerada positiva não conseguia recolher atitudes muito positivas (Palma-Oliveira e Santos, 1999b).

Neste estudo foi relativamente generalizada a alta percepção de risco e um sentimento de ameaça nas respostas. Essa percepção é mais acentuada, em todos os métodos de tratamento e deposição de resíduos, quando os indivíduos entrevistados se encontram mais próximo das instalações (a menos de 750m), com excepção dos que viviam perto do aterro. Além disso, também é interessante verificar que quem vive mais longe do aterro (a mais de 2,5km), tem uma atitude mais negativa que os que habitavam próximo desta instalação (Palma-Oliveira e Santos, 1999b).

Outros estudos têm sido realizados focando as relações entre a percepção de risco e a localização de infra-estruturas de resíduos, como o efectuado por Palma-Oliveira e Correia (1997), sobre a localização de aterros e de estações de incineração. Um outro exemplo, é o estudo sobre a percepção de risco e as soluções de tratamento de resíduos industriais realizado por Palma-Oliveira e Santos (1999a). Palma-Oliveira (1998a; 1998b) efectuou também a análise comparativa do risco para a saúde e para o ambiente da gestão dos resíduos industriais perigosos em Portugal.

Como foi anteriormente referido, na revisão da literatura efectuada não foram encontrados trabalhos que relacionassem a percepção do risco e as várias etapas de gestão dos RH. Apenas o trabalho de Ostry et al. (1995), mencionado anteriormente, focou a percepção do risco e a incineração de RH, embora numa perspectiva sobretudo de oposição pública à construção de uma nova infra-estrutura.

Um assunto algo relacionado, surge num livro sobre a temática dos RH (Wagner, 1998), onde é salientada a importância para a UPCS da redução do risco de desaprovação pública (e simultaneamente da imagem pública da organização). Neste contexto, é referido que, apesar desta desvantagem não ser quantificável, a percepção pública não deve ser considerada menos importante que outros factores, salientando que a obsessão da sociedade pelos resíduos perigosos (um cruzamento entre fascinação e fobia) e a antipatia (ou aversão) do público pelos produtores de resíduos perigosos é fomentada, em parte, pelos meios de comunicação social (Duplechan, 1998).

Contudo, como o público apoia os projectos de redução de resíduos, ou seja, os esforços que protegem o ambiente, na produção de menos resíduos fomenta-se o suavizar das preocupações relacionadas com a sua "toxicidade" e incrementa-se a confiança pública. Desta forma, com a redução da produção de resíduos o risco de desaprovação pública da instituição diminui, tendo também associada uma diminuição de custos (Duplechan, 1998). De uma maneira geral, a percepção de risco relacionada com os RH tem-se alterado nos últimos tempos devido, em grande parte, ao medo induzido por doenças como a SIDA. Desde o aparecimento desta doença que se tem estabelecido mais fortemente a ligação

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entre os resíduos e a transmissão de doenças, apesar da ausência de provas nesse sentido. Um clima “irracional” induziu a que decisões políticas fossem tomadas com base no medo, em vez de terem por fundamento conhecimentos científicos (Karpiak e Pugliese, 1991).

De acordo com EA (2002), a percepção pública de risco influencia significativamente as opções de gestão dos RH independentemente dos riscos concretos, devendo, esta variável, ser considerada pelos profissionais responsáveis pela gestão dos RH.