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FUGURA 3 – Categorias da investigação: os modos de ser e agir do pianista colaborador

5.3 PERCEPÇÕES SOBRE OS MODOS DE SER E AGIR NA PROFISSÃO 140

5.3.2 Percepções dos pianistas sobre como os outros os veem 142

 

  Além de relatarem suas percepções sobre si e sobre a profissão, os pianistas colaboradores relatam suas opiniões sobre como os outros sujeitos da escola os veem no trabalho. Esses sujeitos são os alunos, os professores de instrumento e canto, os maestros e a direção da escola.

Os pianistas colaboradores afirmam que os alunos reconhecem a sua importância e a sua contribuição na interpretação do repertório e na formação musical discente. Os alunos, segundo Janaína, sentem confiança nesse trabalho e desenvolvem um “respeito” que ela sempre procura “retribuir” (EJ, p. 12).

Para Breno, a profissão do pianista colaborador tem duas dimensões: a prática, quando ele tem de tocar e se apresentar com o aluno; a pedagógica, quando ele ensina e discute questões de interpretação musical. Essas dimensões refletem a visão que os alunos têm acerca do profissional. Breno diz que, em primeiro plano, o pianista colaborador tem uma “ação prática” que o difere de um professor de instrumento (EB, p. 50). Este tem possibilidade de desenvolver um trabalho pedagógico que, ao longo dos anos, aprofunda a relação professor- aluno e é capaz de transmitir as tradições do ensino e os segredos da interpretação do instrumento, formando uma escola onde “se toca semelhantemente” as músicas. No caso do pianista colaborador, ressalta Breno, o trabalho se realiza em prazo mais curto e está destinado às apresentações musicais daquele determinado semestre na escola; “essa própria característica já muda esse tipo de relação” entre os alunos e os demais profissionais da escola, ele conclui (EB, p. 50). Logo, os alunos percebem, segundo Breno, que o pianista colaborador não é um docente em sentido pleno.

Segundo Leela, os alunos veem que os pianistas colaboradores são profissionais que participam intensamente de sua formação musical e que transformam positiva e definitivamente suas vidas. Ela destaca ainda que os alunos percebem as diferentes maneiras de os profissionais atuarem, tocarem o piano e interpretarem as músicas, definindo, portanto, resultados distintos ao fazer música em conjunto (EL, p. 71-72).

Segundo Rafaela, quando os alunos iniciam o trabalho com o pianista colaborador, às vezes não sabem exatamente o que tocar ou como proceder. O papel do pianista colaborador, então, é informar e esclarecer os alunos. Rafaela costuma apontar seus objetivos de trabalho, sugerir alguns caminhos interpretativos para a música e familiarizar os alunos quanto às possíveis estratégias de ensaio. Para a pianista, o modo como os alunos percebem o trabalho do pianista colaborador recebe influências da visão do seu professor de instrumento ou canto. Alguns professores dão destaque para o resultado final em apresentações musicais e outros, para o processo educativo com o aluno.

Na opinião de Dinorá, os alunos de instrumento e de canto têm visões distintas sobre o pianista colaborador. Os alunos de instrumento o veem como “músico camerista” que frequentemente deve tocar partes como se fosse o solista na música (ED, p. 106). Essa alternância do solo entre o aluno e o pianista colaborador é o que a pianista define como um

jogo de “pergunta e resposta”. Os alunos de canto, por sua vez, veem o profissional como “acompanhador” porque a maior parte das músicas são árias de óperas em que o piano está tentando imitar a orquestra e, por isso, nem sempre os discentes percebem a música como um todo. Dinorá alerta que essas diferentes formas de percepção entre camerista e acompanhador não são rígidas ou depreciativas e que cada aluno tem sua própria opinião sobre o pianista colaborador e o seu trabalho, buscando “ampliar” suas visões sobre esse profissional e suas funções na escola (ED, p. 106).

Solange sugere que a idade dos alunos interfere nas percepções que eles têm acerca do pianista colaborador. Os alunos adultos têm uma experiência de vida que os envolve no trabalho com o pianista colaborador de maneira distinta à do aluno jovem. Solange destaca que, em geral, os adultos desenvolvem uma autocobrança em relação ao rendimento nos estudos e se “ressentem mais quando erram”, buscando apoio no pianista colaborador (ES, p. 134-135). Os jovens se dedicam aos estudos e reconhecem o trabalho do profissional, mas o procuram com menos frequência para tirar dúvidas.

Ao serem indagados sobre como acham que os professores de instrumento e de canto os percebem em sua profissão, os pianistas colaboradores afirmam que esse professores valorizam o trabalho de parceria que promove o enriquecimento do ensino de instrumento e do canto na escola. Os entrevistados percebem, também, que os professores sentem-se privilegiados em ter um pianista colaborador cujo trabalho pode oferecer recursos adicionais à aula de instrumento e canto.

Janaína identifica o trabalho em parceria principalmente quando ela obtém o consentimento dos professores de instrumento para ajudar os alunos com o repertório. A situação gera uma confiança mútua entre Janaína e os professores, estabelece objetivos comuns no trabalho pedagógico e valoriza a aprendizagem dos alunos. A pianista lembra que os próprios professores, “em algum momento de suas vidas, foram acompanhados por pianistas” e aponta uma familiaridade entre as situações que envolvem esse trabalho em conjunto: a da colaboração musical (EJ, p. 9).

Os professores, segundo Leela, identificam dois perfis de pianista colaborador na escola: o profissional que concentra a atuação na execução das músicas no piano e aquele que, além de tocar, dá sugestões de interpretação durante as aulas (EL, p. 67-68). Sobre o segundo perfil, Leela alerta que o pianista colaborador deve cuidar para que as sugestões estejam em harmonia com a proposta pedagógica do professor. Caso contrário, a situação discordante pode prejudicar a aprendizagem do aluno – que ficará confuso sobre qual “metodologia” adotar – e causar algum desentendimento entre o pianista colaborador e o professor (EL, p.

68). Por isso, é importante que os profissionais estabeleçam um acordo sobre as possibilidades de atuação e as responsabilidades de cada um em aula e na presença do aluno.

Os professores de canto, segundo Rafaela, desejam desenvolver um trabalho mais próximo ao do pianista colaborador que os professores de instrumento. Na sua percepção, o repertório de canto é escrito, na maioria das vezes, com o acompanhamento do piano e raramente se encontra uma música a cappella50. Além disso, os professores de canto veem os pianistas colaboradores como profissionais que participam globalmente do trabalho pedagógico escolar. Rafaela destaca diferenças entre ser “parceiro” e ser “auxiliar” e o hábito de os professores incluírem os pianistas colaboradores nas bancas avaliadoras da instituição:

Sempre tem o piano [nas partes da música]! Isso faz com que esses professores sejam [nossos] parceiros [no trabalho]! E não auxiliares. É diferente, né, quando você está simplesmente auxiliando o canto ali e quando você está construindo e ajudando o aprendizado! Porque faz parte [do trabalho]! Até onde eu sei, esses professores de canto costumam ouvir as opiniões dos pianistas [correpetidores] nas provas, nas avaliações. Os professores não negam essa oportunidade de ouvir. “Ah, Fulano, o que você achou da prova dele?” Porque você [pianista] pode falar, né! [...] [Eles perguntam aos pianistas:] Como é que foi a [prova]? A gente sabe [sobre a parte pedagógica do aluno]. A partir daí você percebe uma diferença muito grande da concepção dos nossos colegas [professores] em relação a nós [pianistas] (ER, p. 94).

Essa visão é compartilhada por Solange quando afirma que há uma interdependência entre as partes musicais do piano e do canto que reflete a necessidade da presença do pianista colaborador em sala de aula, a não ser que o professor de canto “também seja um pianista” para tocar o repertório (ES, p. 135). Além disso, ela lembra que a relação entre os profissionais é pautada por muitas afinidades.

Segundo Dinorá, os professores têm valorizado o trabalho dos pianistas colaboradores. A ideia é reforçada quando esses professores comparecem aos ensaios dos alunos com os pianistas colaboradores. Dinorá avalia positivamente a situação e a classifica como um “diálogo” que permite fortalecer o seu trabalho musical (ED, p. 108).

Antonieta destaca que os professores de canto têm diferentes percepções sobre o pianista colaborador na escola. Essas percepções refletem as formações musicais que os                                                                                                                

50 O termo a cappella, segundo Sadie (2001, v. 5, p. 490), foi amplamente empregado desde o século VII e

adquiriu amplos significados em vários contextos e lugares. Por exemplo, por volta do século XVIII, o termo se referiu: aos relicários construídos em forma de pequenas igrejas; aos agentes e padres que ensinavam os cantores e aos locais de adoração – altares no palácio, castelo, catedral, igreja ou residência particular. No século XIX, o termo designava um pequeno conjunto musical de bailes ou conjunto de metais. O repertório a cappella, originalmente, incluía a música sacra para o ordinário da missa, serviços vocacionais e missas para os mortos (SADIE, 2001). Nesta dissertação, o termo é empregado para se referir à música essencialmente vocal sem o acompanhamento de instrumento.

professores tiveram ao longo da vida e como um corpo docente é heterogêneo, “não dá pra falar como o professor percebe [o pianista]” (EA, p. 190). Apesar dessa diversidade, segundo a pianista, os professores compartilham da opinião acerca da importância em ter o profissional nas aulas de canto. De modo semelhante, e em virtude da estrutura administrativa do CEP- EMB, Antonieta entende que os professores de instrumento também têm a “visão do que aquele pianista tem que fazer” (EA, p. 190), ou seja, eles têm expectativa com relação à atuação do pianista colaborador.

Os diretores da instituição, segundo Janaína, valorizam os pianistas colaboradores e depositam muita “confiança” no trabalho que, “diariamente”, mostra resultados à comunidade escolar (EJ, p. 13). Em sua opinião, o trabalho dos diretores destina-se à gestão e à administração escolar, envolvendo recursos humanos e materiais e dificulta o acesso desses aos profissionais do NPAC.

A mesma ideia de valorização do pianista colaborador e da contribuição de seu trabalho na formação musical dos alunos vem à tona quando Dinorá descreve como os regentes percebem o profissional. Nessa situação, o regente, como líder de um grupo, conta com a ajuda do pianista colaborador na preparação do coro. Sem essa ajuda, o regente se sente sobrecarregado (ED, p. 109).

Ao comentar sobre as percepções que os pares têm da profissão, Mirela acredita que os colegas gostam do que fazem porque, de modo semelhante, se sentem realizados profissionalmente. Segundo Mirela, o trabalho do pianista colaborador é muito rico porque permite aos colegas a oportunidade de diversificar a sua atuação e atuarem como professores em outros núcleos da escola (EM, p. 173).