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4. TERRITORIALIZAÇÃO DAS COMPANHIAS AGROINDUSTRIAIS DE PRODUÇÃO DE ÓLEO DE PALMA E TERRITÓRIOS DA REFORMA

4.4 PERFIL DA AGRICULTURA FAMILIAR NOS MUNICÍPIOS PESQUISADOS

Uma outra dimensão importante a ser analisada no contexto estudado diz respeito aos resultados preliminares do Censo Agropecuário 2006, apresentados pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), no que se refere peso da agricultura familiar no conjunto dos estabelecimentos agropecuários existentes. Os dados são retratados na tabela 4.

Nos nove municípios pesquisados existiam naquele ano 27.415 estabelecimentos agropecuários, que ocupavam uma área de 1.539.139 milhão de hectares. A agricultura familiar representava 91,0% do número total de estabelecimentos, o que revela a sua importância para o desenvolvimento local, contudo, quando se analisa a área ocupada a participação relativa deste segmento cai para 42,2%.

Os três municípios onde os agricultores familiares têm participação mais expressiva são Acará, Moju e Igarapé-Açu, respectivamente, enquanto que no município de Tailândia é onde o setor é mais fraco, conforme tabela 4. Neste último caso, verifica-se que a área média dos maiores estabelecimentos é mais acentuada (1.171,5 hectares), o que pode indicar maior concentração da estrutura fundiária. É precisamente neste município que a Agropalma detém um imóvel de mais de 97 mil hectares.

A agricultura patronal, não-familiar, respondia por apenas 9% do número de estabelecimentos agropecuários, mas concentrava 58,2% da área total. Este resultado evidencia claramente a histórica concentração da posse e propriedade da terra na região, a qual reedita a mesma tendência que caracteriza a estrutura

fundiária estadual e nacional. Os municípios que contrariavam essa dinâmica eram Acará, Concórdia do Pará, Moju e São Domingos do Capim, onde a área ocupada pela agricultura familiar superava a patronal.

Considere-se que já se passaram quase dez anos entre a realização do último Censo Agropecuário e o momento atual, e foi exatamente neste intervalo que o impulsionamento do mercado de terras para viabilizar a expansão dos monocultivos de dendê se deu com mais vigor, o que pode ter influenciado na dinâmica fundiária regional, conforme se examinará no capítulo específico que abordará estes resultados.

Tabela 4 - Estabelecimentos da agricultura familiar nos municípios da região pesquisada Nº

ordem Município Agricultura familiar (hectares) Área Agricultura patronal (hectares) Área fiscal do Módulo

município (hectares) 1 Acará 4.237 85.030,00 408 57.652,00 50,00 Aurora do Pará 857 32.530,00 130 56.802,00 55,00 Bujaru 909 11.439,00 184 30.941,00 55,00 2 Concórdia do Pará 784 29.660,00 67 19.889,00 55,00 Irituia 1.478 48.161,00 124 50.502,00 55,00 3 Moju 3.617 110.745,00 228 85.926,00 70,00 São Domingos do Capim 2.497 47.135,00 131 28.297,00 55,00 4 Tailândia 130 6.243,00 90 105.438,00 50,00 5 Tomé-Açu 10.441 278.352,00 1.103 454.397,00 50,00 5 TOTAL 24.950 649.295,00 2.465 889.844,00

Fonte: Censo Demográfico 2006; INCRA/SR-01.

A última coluna da tabela 4 apresenta o módulo fiscal7

de cada município e demonstra que, com exceção do município de Moju, nas demais localidades essa unidade de referência varia de 50 a 55 hectares. Este dado é importante para definir os parâmetros que segmentam as pequenas (até 4 MF) , médias (acima de 4 até 15 MF) e as grandes propriedades e/ou posses (acima de 15 MF), assim como para definir o alcance da agricultura familiar (até 4 MF). Logo, no município de Acará, por exemplo, as áreas de agricultura familiar podem atingir até o limite de 200 hectares,

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O módulo fiscal é uma unidade de referência utilizada para fins fundiários e tributários, cuja definição foi estabelecida no art. 50 da Lei nº 4.504/64 (Estatuto da Terra), que assim o caracterizou: “o d ulo iscal de cada unic pio e presso e e ctares, ser deter inado levando-se em conta os seguintes fatores: a) o tipo de exploração predominante no município [...]; b) a renda obtida no tipo de exploração predominante; c) outras explorações existentes no município que, embora não predominantes, sejam expressivas em função da renda ou da área utilizada; d) o conceito de "propriedade familiar", definido no item II do artigo 4º desta Lei.

enquanto no município de Bujaru vai até 220 hectares e no município de Moju é possível chegar a 280 hectares.

No contexto apresentado emergem vários fatores críticos que têm inibido o dinamismo da produção familiar rural na região, dentre os quais se verifica a dificuldade de acesso a mercados, a frágil organização social da produção e a infraestrutura deficitária.

Os vínculos e estratégias de integração ao mercado se dão de maneira distinta nas comunidades rurais de formação camponesa em face daquelas onde prevalecem os agricultores familiares, conforme a proposição de Abramovay (2007). Para a uele autor “o traço sico das sociedades ca ponesas é a integração

parcial a mercados incompletos" (ABRAMOVAY, 2007, p. 125, grifo do autor). Nesse

caso, a ideia não seria de um certo gradualismo pelo qual a inserção a esse ambiente seria intensificada até se tornar completo, mas que as unidades de produção familiar são regidas por uma flexibilidade entre consumo e venda, de acordo com a condição mais vantajosa momentaneamente. A imperfeição8

do mercado nesse caso consiste na dependência do camponês a um ambiente econômico profundamente assimétrico, no qual ele tem poucas chances de influenciar no processo de integração, o que termina por comprometer a própria racionalidade camponesa defendida por Chayanov (1981).

Na região em estudo, via de regra os camponeses estão subordinados a “redes de co erciali ação astante desvanta osas” ( IÇÃ , 2 2, p. 37), onde prevalece a ação dos atravessadores, marreteiros e outras categorias, que na verdade são “prepostos de co erciantes ais poderosos ue e erce , eles si , u poder de monopólio na compra e venda de produtos. Ora, os comerciantes maiores, com sua rede de prepostos locais, fazem o vínculo entre o agricultor e o mercado nacional: nesse v nculo não estrutura co petitiva” (A A V AY, 2 7, p. 28). Ao analisar o processo histórico de reprodução da vida camponesa na Região ord este Paraense, onceição (2 2, p. 47, gri o do autor) assinala ue “a cadeia

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De acordo com Ellis (1988 apud ABRAMOVAY, 2007, p. 87) para a economia neoclássica “a concorrência perfeita enfatiza a necessidade do mecanismo de preços e seu papel como árbitro de todas as decisões econômicas. Existem muitos compradores e vendedores tanto em mercados de insumos como de produtos.Nenhum consumidor ou produtor é capaz de influenciar o nível de preços por sua ação individual. Há informação livre e precisa dos preços de mercado. Há liberdade de entrada e saída em qualquer ramo de atividade e, também, a competição assegura que os produtores ineficientes sejam eliminados da produção, enquanto apenas os mais eficientes sobrevivem. Num modelo de concorrência perfeita nenhuma coerção, dominação ou exercício de poder econômico por alguns agentes econômicos sobre outros pode existir.

de comércio, um tema pouco estudado ainda, foi estendida à medida que os ramais e trechos rodoviários foram se multiplicando, facilitando a entrada dos marreteiros, que compravam produção agrícola de porta em porta”.

No caso da agricultura familiar contemporânea, o ambiente econômico na ual se desenvolve “é e ata ente a uele ue vai as i iar o ca pon s, o rig -lo a se despojar de suas características constitutivas, minar as bases objetivas e si licas de sua reprodução social” (A A V AY, 2 7, p. 42). Assi o que se verifica é que quanto maior o grau de subordinação da agricultura familiar à racionalidade do mercado, menor é a possibilidade de manutenção da territorialidade camponesa e de seu modo de vida.

Outro fator crítico é o baixo grau de organização econômica da produção familiar rural, que, via de regra, ainda permanece como mero fornecedor de matéria- prima, sem exercer influência sobre as demais etapas das cadeias de produção. Estudo9

realizado por Silva (2011) sobre os PA's da região Nordeste Paraense, com base nos dados da Pesquisa de Avaliação da Qualidade dos Assentamentos de Reforma Agrária (PQRA) realizada pelo INCRA em âmbito nacional e regional, em parceria com a Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRS), revelou que “ ais de u terço das famílias demonstra satisfação com a forma de comercialização de seus produtos. No entanto, 28% dos entrevistados consideram ruim ou péssimo o acesso a mercados para seus produtos e 17,2% não respondera ” ( I VA, 2 , p. 42). e acordo co a uele autor, a dificuldade de acesso a ercados constitui “u pro le a estrutural para as a lias assentadas, requerendo a adoção de novas estratégias de comercialização, sobretudo com en o ue no co ércio usto e nos princ pios da econo ia solid ria” ( I VA, 2 , p. 129).

A PQRA realizada em 2010 indicou que 74,5% das famílias assentadas participam de associações e/ou cooperativas, o que segundo Silva (2011, p. 143) “de onstra ue a pr pria constituição do PA e a or a de sua i plantação e desenvolvimento estimula co ue tais organi ações se a criadas”, ou se a, para acessar os recursos do Programa Nacional de Reforma Agrária (PNRA) é necessário que as famílias estejam organizadas em entidades locais com

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Ver SILVA, E. P. Reforma agrária e desenvolvimento rural sustentável sob a abordagem do cooperativismo e da agroecologia: o caso dos assentamentos do Nordeste Paraense. Trabalho de

Conclusão de Curso apresentado ao Centro de Estudos Sociais Aplicados da Universidade da Amazônia (UNAMA).

personalidade jurídica própria e dotadas de legitimidade, o que não necessariamente seja um indicativo de maior grau de organização socioeconômica, uma vez que nesta região do Par “ uito rara en te se consegue encontrar cooperativas de produção ligadas à agricultura familiar e à reforma agrária [...] seja em razão dos elementos culturais próprios do extrativismo amazônida, seja por conta de e peri ncias alsucedidas ue gerara descrédito e pre u o aos ca poneses” (SILVA, 2011, p. 143).

Considerada um dos elementos centrais para impulsionar a inserção econômica dos camponeses, a infraestrutura de comunicação e transporte – compreendida nesse caso como a existência de estradas em boas condições de trafegabilidade, acompanhada de um sistema de transporte regular e acessível à população rural – revela-se deficitária e excludente, vez que onera sobremaneira o custo do escoamento da produção agrícola das comunidades rurais para os centros urbanos, dificultando a obtenção de ganhos excedentes por parte do campesinato e facilitando a atuação dos atravessadores que mantém redes de comércio em bases assimétricas. No contexto da Região Nordeste Paraense, a partir da implantação de grandes eixos rodoviários que mudaram o perfil do território, Conceição (2002, p. 149-150) acentua que

a modernização chegou, de fato, não só com os caminhões de marreteiros (atravessadores) estacionando às portas dos agricultores, mas com os telefones e os serviços bancários, porém implicando custos, que penalizam ainda mais os produtos agrícolas em situação desvantajosa, já que esses não se encontram mais valorizados, com o passar do tempo [...] para a maioria dos Núcleos, o transporte da produção tornou-se caro, irregular e sem segurança. As reduzidas cargas, em sacas de 60 kg, são transportadas em caminhões, ônibus de passageiros e até bicicletas. As feiras movimentadas das cidades de Castanhal e Bragança indicam esse empecilho à produção rural, na situação de completa dependência do escasso transporte, a cujo horário os feirantes têm que se submeter, sujeitando-se a vender os produtos que ainda lhes restam, por preço baixo, para não ter que retornar com a carga.

No caso particular dos PA's existentes na Região Nordeste Paraense, a precariedade das condições das vias de acesso aos lotes é apontada nos resultados da pesquisa realizada pelo INCRA em parceria com pesquisadores da UFRS em 2010, retratada nos estudos de Silva (2011). Naquela oportunidade identificou-se que para 38,58% dos entrevistados as condições de acesso eram péssimas; para 23,59% eram ruins; para 0,47% eram ótimas; para 8,76% as condições eram boas; para 15,72% era regular e 12,87% não responderam.

4.5 PRODUÇÃO DE ÓLEO DE PALMA x PRODUÇÃO DE ALIMENTOS A expansão dos plantios de dendê na Amazônia paraense tem despertado a velha contradição entre monocultura e produção de alimentos. Se por um lado uma corrente teórica aponta que o dendê constituiria vetor de inclusão social e produtiva da agricultura familiar, por meio da recuperação de áreas desflorestadas e da geração de renda (HOMMA, 2008; BECKER, 2010; ABRAMOVAY e MAGALHÃES, 2007), por outro, um conjunto de pesquisadores têm defendido que a intensificação da compra de terras pelas empresas nacionais e transnacionais, o aumento da proletarização no campo e a subordinação dos agricultores ao pacote tecnológico da palma de óleo, dentre outros fatores, têm ocasionado a redução das áreas destinadas à produção de alimentos, colocando em risco a própria reprodução da racionalidade camponesa (MONTEIRO, 2013; VIEIRA E MAGALHÃES, 2013; NAHUM, 2013/2014; SOUSA, 2015; SAMPAIO, 2014)

Nesta seção pretende-se abordar este assunto, com base nos dados da Produção Agrícola Municipal (PAM), do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), relativamente ao intervalo de 2004 a 2012 nos municípios com maior especialização na produção de óleo de palma na Amazônia paraense.

A PA é u instru ento utili ado para o ter “in or ações ensais so re previsão e acompanhamento de safras agrícolas, com estimativas de produção, rendimento médio e áreas plantadas e colhidas, tendo como unidade de coleta os municípios” (I , 2 5). Deste modo, são organizados dados estatísticos que aferem a área plantada e área colhida com culturas temporárias, culturas permanentes e produtos agroflorestais, abrangendo o conjunto da produção agropecuária e extrativista brasileira.

A análise empreendida neste estudo visa identificar a relação entre a expansão dos monocultivos de dendê no período e a dinâmica da produção de alimentos, notadamente daqueles que predominantemente oriundos da agricultura familiar, como a mandioca, o feijão e arroz. De acordo com dados do Censo Agropecuário 2006, realizado pelo IBGE, naquele ano a agricultura familiar respondia por 93% da produção de mandioca, 84% da produção de arroz e 83% da produção de feijão no estado do Pará; representava 88% dos estabelecimentos agropecuários, 31% da área agrícola e gerava 84% das ocupações no meio rural paraense (FRANÇA, GROSSI e MARQUES, 2009, p. 51).

Figura 4 - Dendê x produção de alimentos, IBGE

Fonte: Produção Agrícola Municipal, IBGE.

Os dados da PAM revelam que no período de 8 anos a área destinada à produção de alimentos caiu drasticamente (mandioca, arroz e feijão) nos municípios onde a expansão do dendê vem ocorrendo de forma mais intensa. A área plantada de mandioca atingiu o maior nível em 2007, mas caiu acentuadamente nos anos seguintes, chegando a 41.450 hectares em 2012 (queda de 36,0%). Contraditoriamente, a área designada para a produção de óleo de palma cresceu 41,9% entre o primeiro e o último ano da série histórica.

Quando se analisam os outros dois produtos diretamente associados à agricultura familiar, verifica-se que a produção de arroz caiu 22,3% entre o primeiro e o último ano da série histórica e a de feijão declinou 53,0% no mesmo intervalo. Um conjunto de fatores podem ter contribuído para engendrar este grave quadro em que os monocultivos de dendê crescem exponencialmente enquanto a área destinada à produção familiar cai de maneira acentuada.

Se por um lado o dendê conta com políticas governamentais específicas como o Programa de Produção e Uso do Biodiesel (PNPB) e o Programa de Produção Sustentável de Óleo de Palma (PPSOP), ou seja, um arcabouço institucional e normativo favorável à expansão desse monocultivo, as culturas de subsistência como mandioca, arroz e feijão encontram-se destituídas de uma política agrícola que estimule a segurança alimentar no Pará. Informações recolhidas junto

0 10000 20000 30000 40000 50000 60000 70000 2004 2005 2006 2007 2008 2009 2010 2011 2012

ao Relatório de Gestão 2012, da extinta Secretaria de Estado de Agricultura (SAGRI) revelam que naquele exercício os recursos destinados ao Programa de Desenvolvimento da Cadeia Produtiva da Mandioca foram de apenas R$ 300.000,00 (trezentos mil reais), um valor absolutamente irrisório para uma unidade federativa com 144 (cento e quarenta e quatro municípios) e que tem na farinha de mandioca um dos principais itens da dieta alimentar regional.

Outro fator que deve ser considerado é a penosidade inerente à atividade produtiva das culturas de subsistência, motivada, sobretudo, pela baixa capacidade de adoção de novas tecnologias pelos agricultores familiares da região, que per anece produ indo rustica ente, “no ca o da en ada”, e siste a de pousio, que consiste em um ciclo que envolve escolha da área, corte (supressão), queima, coivara, plantio, capina (tratos culturais), colheita e processamento. Trata-se de um processo exaustivo tanto para o sujeito que utiliza o espaço agrário para sua so reviv ncia, assi co o para a pr pria terra ue aos poucos vai se “cansando”, como dizem os próprios camponeses.

Associada a penosidade do trabalho camponês, a infraestrutura deficitária para escoamento da produção, a reduzida capacidade de organização econômica das famílias e o alcance ainda tímido dos mercados institucionais (Programa de Aquisição de Alimentos e Programa Nacional de Alimentação Escolar) formam um quadro perverso que mantém os agricultores na dependência de atravessadores (marreteiros), que controlam esse mercado e apropriam a maior fatia da renda fundiária.

Os estímulos institucionais ao avanço da dendeicultura impulsionaram uma corrida pela apropriação das terras agricultáveis da região, situadas na classe preferencial do Zoneamento Agroecológico da Palma de Óleo (ZAE), conforme relatam Nahum e Santos (2013), ocasionando a conversão de áreas destinadas a outros usos em monocultivos de dendê. A intensificação deste fenômeno vem ocorrendo a partir de 2008, com a chegada de grandes companhias de capital nacional e transnacional, que rapidamente acumularam grandes extensões de terras e conformaram uma nova paisagem agrária no território. Este é um dos motivos que explicam a relação inversamente proporcional entre o aumento da área plantada de dendê e a diminuição da área plantada das culturas de subsistência.

O crescimento da proletarização no meio rural dos municípios mais especializados na produção de óleo de palma, mediante a contratação de mão-de-

obra assalariada, sobretudo, de filhos de agricultores, têm implicado na redução da capacidade laboral das famílias camponesas, conforme noticia Monteiro (2013, p. 16). Assim, um núcleo familiar que antes dispunha de um determinado número de integrantes para atuar nas atividades agrícolas dentro do lote passou a contar com uma força de trabalho menor, que associada a penosidade e a ausência de novas tecnologias, condiciona-o a reduzir a área plantada para se ajustar a essa nova realidade.

A inserção dos agricultores familiares e assentados de reforma agrária ao sistema produtivo do óleo de palma, mediante a chamada agricultura por contrato, conforme veremos no capítulo específico que abordará essa questão, promove a subordinação dos agricultores a uma racionalidade econômica exógena e diferente da sua, que dentre outras consequências, exige a maior parcela da dedicação laboral aos tratos culturais do plantio de dendê, o qual ocorre em módulos de 10 (dez) hectares, que equivalem a uma área de 33,3 tarefas, bem diferente das roças de 3 (tarefas) de mandioca/feijão/arroz que em média esses agricultores cultivavam antes da chegada dessa commodity. Esse fator é chave para compreender a redução da área plantada de culturas de subsistência e o avanço da dendeicultura.

Também se insere neste contexto a questão do padrão de financiamento rural e a atuação das instituições financeiras que operam os recursos públicos. A pesquisa de campo evidenciou a existência de um comportamento preferencial dos bancos públicos (Basa e Banco do Brasil) por financiar projetos de produção de dendê, por meio da modalidade do Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar (Pronaf) chamada Pronaf Eco, instituída em 2010. Em visita técnica realizada pelo Programa de Pós-Graduação em Recursos Naturais e Desenvolvimento Local na Amazônia (PPGEDAM/NUMA/UFPA) ao município de Tomé-Açu, no período de 12 a 14 de abril de 2014, o representante do Banco da Amazônia relatou que em 2013 aquela agência bancária financiou 13 (treze) milhões de reais em Tomé-Açu e municípios adjacentes. Deste volume de recursos financeiros, aproximadamente 30% foram para os plantios de dendê, por meio do Pronaf Eco. No caso dos grandes produtores que estão se integrando à atividade do dendê, em 2013 foram realizadas duas operações cada uma no valor de R$ 6,5 milhões de reais, para plantio de palma numa área equivalente a 1.200 hectares. Quando se trata de financiamento para a produção de alimentos, o grau de dificuldade aumenta, o nível de interesse da instituição diminui e as condições

oferecidas são menos atrativas para as famílias. Enquanto o Pronaf Eco financia projetos até o teto de 80 mil reais, o financiamento do Pronaf B, voltado principalmente para produtores de mandioca, feijão e arroz, não passa de 4 mil reais.

A questão da sazonalidade e o comportamento microeconômico dos preços dos produtos agrícolas ora analisados é outro fator que merece ser considerado na interpretação dos dados constantes na figura 2. Conforme postulam os princípios da microeconomia, se a inclinação da curva de oferta for negativa os preços aumentam, assim como se a curva de demanda for positiva e a de oferta for negativa ocorrerá um desequilíbrio que afetará os preços de um determinado produto. Esse postulado é bem apropriado para elucidar a controvérsia suscitada nos últimos anos, provocada pela elevação inflacionária da farinha de mandioca no estado do Pará. Logo, se a redução da área plantada impactou na menor oferta desse produto ao mercado consumidor e a demanda permaneceu constante, os preços aumentaram em função desse desequilíbrio. À medida em que se constata a relação inversamente proporcional entre a área de uso dos plantios de dendê e a dos produtos da agricultura familiar pode ser afirmado que a expansão dos monocultivos de dendê é a principal causa desse problema.

4.6 DESMATAMENTO ACUMULADO E COBERTURA FLORESTAL POR