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Perspetivas de análise das famílias que lidam com doença crónica

Família

ESTÁDIOS DELIMITAÇÃO DOS ESTÁDIOS DE DESENVOLVIMENTO TAREFAS FATORES NEGATIVOS 1 Casal sem filhos Do casamento (formal ou

6. Perspetivas de análise das famílias que lidam com doença crónica

Estão descritas quatro perspetivas para análise das famílias que lidam com DC: recurso, défice, influência e impacte.67

A família enquanto recurso é vista como o núcleo duro da rede de suporte social dos elementos que a compõem e que careçam de cuidados. Doherty e Baird68 consideram que a pessoa doente, a família e o profissional de saúde são corresponsáveis pelos processos

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assistenciais e substituem a díade médico/paciente pela tríade médico (equipa de saúde)/doente/família. Os elementos desta tríade relacionam-se ao longo de todo o desenvolvimento da doença mediante, com escreveram os autores,68 uma “relação crónica”. Espera-se que a família proporcione apoio emocional, incentive hábitos de vida salutogénicos e assegure tarefas instrumentais, como, entre outros, o transporte do doente para tratamentos, a gestão da medicação ou a mobilização da pessoa acamada, pelo que os profissionais de saúde devem promover o seu empoderamento.

A perspetiva de défice centra-se, sobretudo, nas dificuldades e disfunções da família. Independentemente da origem da doença, se já existir disfunção prévia, dada a natureza circular da interação, a resposta familiar constituirá um importante fator na sua manutenção ou agravamento.69

A perspetiva da influência remete para a forma como a família pode determinar a evolução da doença, pelo descuido ou pelos cuidados que proporciona à pessoa doente.69 Por último, a perspetiva do impacte salienta a crise que ocorre na família com o adoecer de um dos seus elementos,69 na medida que constitui um ponto de viragem em que a pessoa doente e a sua família têm de optar por este ou aquele rumo, mobilizando recursos de recuperação e favorecendo uma nova diferenciação. Os caminhos que a DC obriga a descobrir, conduzindo a áreas desconhecidas ou ainda não totalmente vividas, podem ser muitos, complicados e árduos. Pelo modo como a doença pode afetar fortemente a família, Peter Steinglass apud Relvas e Cunha70 compara-a a “... Um terrorista que surge à porta, irrompe pela casa fora, exigindo tudo o que a família tem.” Também Alarcão23 observa que, independentemente do grau de adequação da transformação funcional realizada pela família, a mudança é sempre ameaçadora, pois empurra a família para algo que ela desconhece. Assim, o modelo do impacte representa uma mudança conceptual na forma como a família é percecionada, passando-se “Das famílias que causam problemas para as famílias às quais acontecem problemas”.69

Nesta dissertação adotar-se-á a perspetiva do impacte no estudo das famílias.

7. Importância da intervenção nas crises familiares

As etapas do ciclo de vida familiar, demarcadas por eventos transformadores do funcionamento da família, podem ser previsíveis ou não previsíveis.23,71 Os eventos demarcadores das etapas previsíveis são as descritas por Duvall no ciclo de vida familiar que concebeu: casamento, nascimentos, escolarização e adolescência dos filhos, saída dos filhos de casa, reforma e viuvez.23,29,55 São exemplos de etapas não previsíveis as originadas na DC, no divórcio ou no desemprego.

Os períodos de transição entre etapas, pela sua instabilidade, correspondem a crises. Estas denominam-se normativas, se são previsíveis na vida familiar, ou acidentais, se o não são.23,67

Uma crise traz, simultaneamente, risco de disfunção e oportunidade de evolução para melhor.61 A justaposição de crises, normativas e acidentais, complicam e desafiam a capacidade de adaptação da família, incrementando riscos de disfunção.

Uma família em crise apresenta-se desorganizada, sem direção e sem objetivos coerentes. Na procura de como passar a funcionar, a família abre-se a intervenções exteriores, pelo que estas são particularmente eficazes, comparativamente às realizadas já com disfunção familiar instalada e cristalizada.23

Uma intervenção atempada poderá evitar que a disfunção, em princípio temporária, perdure e se torne “um modo de vida”.72 Para potenciar a capacidade autocurativa da família, frequentemente bastará reduzir a tensão existente no sistema com a mobilização de recursos pertinentes da comunidade, facilitar a ventilação de pensamentos e

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sentimentos entre os seus elementos e ajudá-los a discernir o suficiente para adotarem soluções adequadas.

8. Intervenção familiar

A inscrição familiar, privilegiada na constituição da lista de utentes, bem como a prestação de cuidados globais e longitudinais, levam a que os MF tenham um elevado conhecimento do comportamento de cada elemento da família e das suas circunstâncias de vida, incluindo desacordos na forma com que cada elemento pontua as sequências dos acontecimentos. A observação direta da família em interação, quando o médico faz uma consulta a um utente no domicílio ou este recorre à consulta acompanhado por outros familiares, permite-lhe confirmar ou não hipóteses sistémicas colocadas a partir de relatos individuais, funcionando como meio de diagnóstico de áreas disfuncionais.

A valorização da família não conduz, necessariamente, à intervenção com toda a família. Pode apenas significar a possibilidade de agir junto de algum ou alguns elementos da família para mudar ou transformar a experiência de doença, a adaptação às limitações e a adesão aos tratamentos.73

Ainda assim, poderá ser útil a convocação de entrevista(s) com todos os elementos da família, nomeadamente nos casos em que cada um refere uma versão diferente do problema e naqueles em que a exploração do contexto familiar leva à identificação de uma problemática que envolva dificuldades de adaptação à situação de doença e novos riscos para o próprio doente e para outros familiares. Estas entrevistas permitirão aprofundar a exploração do contexto familiar, bem como mobilizar recursos existentes no indivíduo, na família e noutros sistemas envolventes, promovendo o seu empoderamento face à situação de crise. Não obstante, no âmbito da MGF, é mais comum esse trabalho junto à família ser desenvolvido “à vez” junto de cada elemento, no caso de todos serem frequentadores da unidade de saúde, podendo-se convocar familiares que mais raramente utilizam os serviços, se considerado determinante na construção de soluções satisfatórias para os problemas.

Os diferentes níveis de envolvimento familiar no trabalho dos profissionais de saúde64 estão descritos no Quadro IV.

Quadro IV – Níveis de intervenção familiar

Nível Intervenção Descrição da Intervenção

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