• Nenhum resultado encontrado

1. PRESSUPOSTOS METODOLÓGICOS: CONTEXTUALIZANDO A PESQUISA

1.7. Pesquisa-ação

A pesquisa-ação caracteriza-se como uma pesquisa social com base empírica cujo foco constitui-se na intervenção em função da resolução de problemas concretos (THIOLLENT, 2011), ou seja, na interferência com o objetivo de transformar determinada prática que é reconhecida pelo pesquisador como passível de aprimoramento ou transformação. Desse modo, a pesquisa-ação não se limita à descrição ou avaliação de um problema (THIOLLENT, 2011), já que “no contexto da construção ou da reconstrução do sistema de ensino, não basta descrever e avaliar” (THIOLLENT, 2011, p. 85), é preciso “produzir ideias que antecipem o real ou que delineiem um ideal” (THIOLLENT, 2011, p. 85).

Além disso, esta metodologia também envolve a participação ativa do pesquisador e dos participantes de modo cooperativo ou participativo (THIOLLENT, 2011) em relação à ação proposta, em que os sujeitos de pesquisa de fato tenham algo a dizer ou a fazer e também são indivíduos escolhidos de acordo com sua representatividade social em função da situação a ser transformada (THIOLLENT, 2011). Assim, “unir a pesquisa à ação ou prática, isto é, desenvolver o conhecimento e a compreensão como parte da prática” (ENGEL, 2000, p. 182) é uma das principais finalidades da pesquisa-ação. Considerando que o objetivo desta dissertação é propor transformações nas atividades escolares de produção de texto que envolvam as práticas de revisão e de reescrita do gênero fanfiction – e levando em conta o fato de que os próprios alunos são sujeitos ativos fundamentais e socialmente representativos de tal transformação – é possível inferir que a metodologia de pesquisa-ação é adequada a tal propósito.

De acordo com Engel (2000), a pesquisa-ação é frequentemente utilizada no contexto escolar. O autor alega que essa metodologia se desenvolveu, na área do ensino, como um reflexo da necessidade de integrar as teorias educacionais às práticas docentes. Portanto, este tipo de pesquisa tornou-se interessante “pelo fato de poder levar a um resultado específico imediato no contexto do ensino aprendizagem” (ENGEL, 2000, p. 183), além de auxiliar no desenvolvimento profissional dos professores por caracterizar-se como uma ferramenta eficiente no aprimoramento de suas práticas. Neste sentido, Engel (2000) alega que a pesquisa-

ação pode fornecer subsídios para o professor construir novos conhecimentos em relação a sua didática.

Ademais, na pesquisa-ação, a teorização ocorre a partir da descrição e observação de situações concretas (THIOLLENT, 2011) que de algum modo impulsionam o pesquisador a querer transformá-las. De acordo com Somekh (2005),

a pesquisa-ação geralmente não se origina através de uma pergunta de pesquisa. A força motriz se constitui como um ímpeto por uma mudança/inovação por meio de uma observação da compreensão dos sujeitos participantes em relação ao processo social [que será pesquisado] e um [posterior] desenvolvimento de estratégias cujo objetivo é trazer melhorias7 (SOMEKH, 2005, p. 91, tradução nossa). A pesquisa-ação, desse modo, não parte de uma pergunta de pesquisa, mas de uma observação palpável da prática. Em relação ao contexto específico de geração de dados desta dissertação, é possível notar, conforme já relatado anteriormente, que a maioria das atividades de produção de texto no ambiente escolar raramente engloba atividades de revisão e reescrita. Nas poucas vezes em que isto ocorre, o usual é que o professor seja o único leitor e revisor do texto do aluno e este último, ao receber sua produção revisada, geralmente não a reescreve.

Além disso, na pesquisa-ação, a teorização ocorre de modo integrado em relação à ação de transformação da prática, assim sendo,

ao invés da pesquisa ser considerada como um processo linear de produção de conhecimento que mais tarde é aplicado ao contexto da prática, a pesquisa-ação integra o desenvolvimento da prática à construção do conhecimento da pesquisa em um processo cíclico8 (SOMEKH, 2005, p. 89, tradução nossa).

Tal processo cíclico de integração entre teoria e prática, em que uma influencia a outra, não precisa necessariamente chegar a uma conclusão natural (SOMEKH, 2005), embora considerações finais, mesmo que sejam abertas, devem ser realizadas para a publicação de qualquer pesquisa. É relevante ressaltar que a pesquisa-ação também surge com o objetivo de

7 Action research frequently does not start with a research question. The driving force will be an impetus for

change/innovation through deepening the participants’ understanding of social processes and developing strategies to bring about improvement.

8 Rather than research being a linear process of producing knowledge which is later applied to practice settings,

action research integrates the development of practice with the construction of research knowledge in a cyclical process.

superar a lacuna entre teoria e prática (ENGEL, 2000). Assim, tal metodologia “procura intervir na prática de modo inovador já no decorrer do próprio processo de pesquisa e não apenas como possível consequência de uma recomendação na etapa final do projeto” (ENGEL, 2000, p. 182). A transformação se constitui como parte essencial do processo de geração de dados, bem como as próprias intervenções e ações em relação à situação proposta a ser transformada.

Considerando que não há verdades científicas universais e absolutas, especialmente em uma pesquisa qualitativa, já que “todo conhecimento científico é provisório e dependente do contexto histórico no qual os fenômenos são observados e interpretados” (ENGEL, 2000, p. 183), não é possível universalizar os resultados obtidos em uma pesquisa-ação. Para Engel (2000), esta metodologia é situacional, já que busca transformar, por meio de uma ação prática, uma situação específica. Logo, não procura obter explicações científicas generalizáveis. Thiollent (2011) ainda afirma que o objetivo principal da pesquisa-ação não é a sua generalização justamente porque esta metodologia busca a resolução de problemas específicos. O pesquisador também precisa colaborar com os participantes em uma pesquisa- ação. O primeiro, segundo Thiollent (2011), desempenha um papel ativo no acompanhamento e na avaliação da ação proposta. Assim, posso ilustrar, como exemplo, a realização de uma atividade coletiva de revisão de uma fanfiction publicada em um website de compartilhamento

online durante a oficina para que os sujeitos discutissem sobre o que julgavam pertinente revisar

em um texto. O intuito desta minha intervenção coletiva era o de promover reflexões em grupo acerca do papel do revisor, buscando compreender a perspectiva dos alunos.

Thiollent (2011) também afirma que é necessário que a participação do pesquisador não substitua a ação proposta para os sujeitos da pesquisa. Esse é o motivo pelo qual eu optei por não interferir diretamente no texto dos participantes, isto é, nas práticas de revisão das

fanfictions dos próprios alunos, mas realizar uma revisão coletiva de uma história de uma

pessoa desconhecida por eles e que não fazia parte do grupo que frequentava a oficina, justificando, assim, a minha procura por uma narrativa em um website de compartilhamento

online de fanfictions. Tais intervenções coletivas improvisadas por mim revelam a flexibilidade

em relação ao planejamento inicial do pesquisador em uma pesquisa-ação:

O planejamento de uma pesquisa-ação é sempre muito flexível. Contrariamente a outros tipos de pesquisa, não se segue uma série de fases rigidamente ordenadas. Há sempre um vaivém entre várias preocupações a serem adaptadas em função das circunstâncias e da dinâmica interna do grupo de pesquisadores no seu relacionamento com a situação investigada (THIOLLENT, 2011, p. 55).

Estas atividades coletivas também evidenciam, além da flexibilidade no planejamento, outra característica da pesquisa-ação: a auto-avaliação. De acordo com Engel (2000),

as modificações introduzidas na prática são constantemente avaliadas no decorrer do processo de intervenção e o feedback obtido do monitoramento da prática é traduzido em modificações, mudanças de direção e redefinições, conforme necessário, trazendo benefícios para o próprio processo, isto é, para a prática, sem ter em vista, em primeira linha, o benefício de situações futuras (ENGEL, 2000, p. 184-185). Desse modo, a pesquisa-ação é auto-avaliativa na medida em que o pesquisador avalia frequentemente o processo da ação, de modo reflexivo (SOMEKH, 2005), promovendo modificações quando necessário, alterando, deste modo, o planejamento inicial. Assim, é preciso que ele, durante todo o processo, acompanhe as atividades, tomadas de decisões, bem como as ações dos sujeitos participantes (THIOLLENT, 2011).

Após a exposição dos pressupostos metodológicos acerca desta pesquisa, apresento, a seguir, o capítulo de número 2, em que realizo uma breve revisão bibliográfica relacionada ao contexto de produção de fanfictions nos websites de compartilhamento online. Assim, discorro sobre os Novos Letramentos, cultura participativa, bem como sobre o gênero discursivo fanfiction.

CAPÍTULO 2