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2 TRABALHO: SITUAÇÕES DE SOFRIMENTO E PRAZER

2.3 PESQUISAS SOBRE SOFRIMENTO E PRAZER NO TRABALHO

Pesquisas acadêmicas do período entre o ano 2000 e 2012 que tratam sobre a colaboração no ambiente laboral, o reconhecimento e as defesas, na perspectiva da psicodinâmica, foram analisadas e destas, inseridos alguns recortes como aporte teórico e metodológico para o desenvolvimento deste estudo, pois se observa uma forte expressão de trabalhos nessa área no Brasil, como os que seguem.

Lima e Lima Filho (2009) analisam no estudo sobre as Condições de Trabalho e Saúde do/a Professor/a Universitário/a, o processo saúde-doença do trabalho docente, verificando as relações entre o processo de trabalho docente, as condições sob as quais ele se desenvolve e o possível adoecimento físico e mental dos professores da Universidade Federal de Mato Grosso do Sul através de pesquisa exploratória, junto a 189 professores.

Nesse estudo, os autores concluíram diante dos dados colhidos que há importante indicativo de que o trabalho interfere na saúde dos professores que apresentaram um quadro de crescente mal-estar, tanto em termos físicos e psíquicos, como interpessoais.

A pesquisa destes autores encontrou várias manifestações sintomáticas que evidenciam o sofrimento no trabalho, tais como: cansaço mental, estresse, ansiedade, esquecimento, frustração, nervosismo, angústia, insônia e depressão que constituem queixas relacionadas à saúde mental, como dores nas costas, pernas e braços, rinite e alergia respiratória, relativas da saúde física.

Contudo, apresentam uma conjuntura que além do sofrimento demonstra o prazer, e afirmam que ainda existe encanto, que persistem práticas construtoras de alianças e compartilhamento, bem como a produção de novos sentidos e significados à prática docente, embora levantem a possibilidade para novas pesquisas no sentido de investigar dimensões interpares e do cotidiano de trabalho docente, como as disputas internas pelo poder e tradições clientelistas e patrimonialistas presentes nas instituições brasileiras.

Ferreira; Fernandes; Prado; Baptista; Freitas e Bonini (2009), cujo estudo exploratório e descritivo com abordagem qualitativa, analisou sentimentos de prazer e sofrimento no processo de trabalho do enfermeiro docente de três universidades privadas do município de São Paulo, verificando experiências enriquecedoras de significados do saber-fazer na prática docente.

Os autores objetivaram naquela pesquisa, identificar os aspectos geradores de prazer e sofrimento no processo de trabalho do enfermeiro docente, analisados segundo

o referencial teórico de Christophe Dejours, pontuando a importância dos fatores psicossociais em relação ao objeto estudado.

Nesse contexto, enquanto resultados investigativos verificaram que as relações ambíguas presentes no trabalho desses profissionais expressavam sentimentos de prazer e sofrimento decorrentes dessa prática, evidenciando as condições e a organização do trabalho como elementos potencializadores de tais sentimentos no cotidiano laboral do enfermeiro naquelas instituições.

Destaca-se que Mendes; Chaves; Santos e Mello Neto (2007) produziram o artigo intitulado: “Da arte ao ofício: vivências de sofrimento e significado do trabalho de professor universitário”, cujo objetivo foi o de descrever os significados do trabalho e sofrimento na profissão de docente.

A metodologia utilizada para a investigação foi a psicodinâmica do trabalho de Dejours, embora tenha sido feita uma análise comparativa da psicanálise, fundamentando-se nos ensinamentos de Freud, com entrevistas a professores dos departamentos de Física, de Estatística e de Matemática da Universidade Estadual de Maringá, UEM.

O referencial teórico da referida pesquisa discorreu sobre o sofrimento e o significado do trabalho, e tanto na psicanálise, quanto na psicopatologia do trabalho, buscaram explicações mais abrangentes para entender como as relações de prazer/desprazer seriam vivenciadas pelos indivíduos no âmbito da sociedade.

Quanto ao método, os autores utilizaram a pesquisa de caráter qualitativo por entenderem que quando se trata de sentimentos a pesquisa quantitativa torna-se insuficiente devido às vivências de sentimentos serem experimentadas por cada indivíduo, do ponto de vista da sua singularidade.

Sob a questão dos resultados, a pesquisa mostrou que apesar de a profissão docente ser gratificante, por utilizar-se das faculdades mentais, como num processo de criação artística, o sofrimento no trabalho dos professores entrevistados é muito evidente, e na sua maioria são relacionados com a instituição e seus problemas, concluindo os autores que mesmo em profissões criativas como a de docente, existem fortes sentimentos de desprazer.

Glina; Rocha; Batista e Mendonça (2001), no artigo: Saúde mental e trabalho: uma reflexão sobre o nexo com o trabalho e o diagnóstico, com base na prática, apresentaram sete casos de saúde mental, dentre os 150 atendidos nos Centros de

Referência em Saúde do Trabalhador de Santo Amaro e André Gabois, no período de 1994 a 1997.

Estes pesquisadores, com base na análise das anamneses e prontuários, buscaram caracterizar as situações de trabalho e discutir o estabelecimento do diagnóstico e do nexo causal com o trabalho.

Verificaram, portanto, que as situações de trabalho caracterizavam-se por: condições de trabalho nocivas, problemas relacionados à organização do trabalho, gestão inadequada de pessoal e violência. Os quadros clínicos mostravam a existência de medo, ansiedade, depressão, nervosismo, tensão, fadiga, mal-estar, perda de apetite, distúrbios de sono, distúrbios psicossomáticos (gastrite, crises hipertensivas), além da contaminação involuntária do tempo de lazer, ou seja, os trabalhadores sonhavam com o trabalho e não conseguiam “desligar-se”.

Os autores dessa pesquisa constataram que em todos os casos era possível relacionar o quadro clínico com a situação de trabalho onde os trabalhadores visivelmente apresentavam o sofrimento no trabalho, gerando assim o adoecimento físico e mental.

Moraes (2005) estudou prazer e sofrimento no trabalho docente a partir de um caso concreto com professoras de ensino fundamental em processo de formação superior e verificou que o trabalho docente demanda a formação de vínculo afetivo, condição salutar para a afetividade do trabalho dos professores.

A autora objetivou em sua pesquisa identificar e analisar as principais fontes de prazer e sofrimento psíquico no trabalho dos professores de ensino fundamental, integrantes do Programa Especial de Formação Docente (PEFD), problematizando a exigência da formação superior e as demandas entre professor e aluno.

Encontrou como resultados em sua pesquisa que a principal fonte de prazer no trabalho se relaciona à tarefa de educar e à troca afetiva com os alunos. Contudo, as fontes de sofrimento psíquico estavam na ausência dos pais dos alunos, na evasão escolar agravada por falta de acompanhamento técnico, falta de tempo das professoras para organizar as aulas, violência associada às condições precárias e desvalorização salarial da profissão.

Diante dessas constatações e partindo dos postulados da abordagem da psicodinâmica, a autora concluiu que é da luta contra o sofrimento que se manifesta a inteligência astuciosa que pode levar à subversão da organização prescrita de trabalho, a partir do estabelecimento de procedimentos mais eficazes. Citando Dejours, ainda

afirmou que quando o sujeito põe sua marca, recebe o reconhecimento social que promove um registro subjetivo positivo, tendo lugar à vivência de prazer.

Barros e Mendes (2003), em estudo sobre sofrimento psíquico no trabalho e estratégias defensivas dos operários terceirizados da construção civil, investigaram as estratégias defensivas contra o sofrimento desses trabalhadores a partir de uma construtora em Brasília, utilizando como referencial teórico-metodológico a psicodinâmica do trabalho.

Nessa pesquisa, as autoras realizaram entrevistas coletivas com 20 trabalhadores da construção civil que se encontravam vulneráveis e inseguros diante do modelo de produção terceirizado que negligencia seus direitos e exige alta produtividade. Nesse estudo, elas concluíram que o sofrimento torna-se visível por meio de indicadores de mal-estar como desgaste físico e mental e falta de reconhecimento que é enfrentado mediante estratégias defensivas de negação e controle, aparecidos diante do modelo de produção, baseado nos princípios tayloristas e na acumulação flexível de capital, preponderante no setor da construção civil, confirmando, portanto, o sofrimento potencializado desse contexto laboral.

Gasparini; Barreto e Assunção (2005), em o professor, as condições de trabalho e os efeitos sobre sua saúde, estudaram as relações entre o processo de trabalho docente, as reais condições sob as quais ele se desenvolve e o possível adoecimento físico e mental, verificando também possível associação com os afastamentos do trabalho.

No referido estudo foram analisados dados do relatório preparado pela Gerência de Saúde do Servidor e Perícia Médica (GSPM) da Prefeitura Municipal de Belo Horizonte, relativos aos afastamentos do trabalho de funcionários da Secretaria Municipal de Educação, no período entre abril de 2001 e maio de 2003, cujos atestados médicos eram fornecidos pela própria instituição.

Constataram, portanto, que os motivos pelos quais ocorriam os afastamentos concentrados em professores eram decorrentes aos transtornos psíquicos em primeiro plano, viabilizando aos autores elaborarem hipóteses de pesquisa visando identificar associações do adoecimento com as características das escolas e as condições de trabalho vividas em suas dependências.

Concluíram, então, que os dados e as conclusões dos estudos interessados em descrever o perfil de adoecimento daqueles professores eram convergentes, independentemente da população e da região estudada, e observaram também que os docentes têm mais risco de sofrimento psíquico de diferenciadas matizes. Assim

também, a prevalência de transtornos psíquicos menores é maior entre eles, quando comparados a outros grupos, ficando evidente o sofrimento psíquico nesse contexto de trabalho.

Aguiar e Almeida (2006), através de estudo sobre professores sob pressão, sofrimento e mal-estar na educação, investigaram uma amostra de 16 professores de ensino fundamental da rede pública do Distrito Federal, alunos do Uniceub, participantes do projeto Professor Nota Dez e graduandos em Pedagogia-Séries Iniciais, no intuito de observar o sofrimento do professor e sua forma de manifestação no âmbito subjetivo e social.

A partir da busca pela identificação das disposições subjetivas e condições objetivas que se relacionam ao sofrimento psíquico do professor, obtiveram os resultados que indicam a existência de conflitos psíquicos vivenciados pelos professores por se perceberem incapazes e impotentes de responder às demandas contraditórias presentes no cotidiano escolar, por não corresponderem a uma imagem idealizada da profissão docente e não sustentarem, subjetivamente, a posição de Mestre, de autoridade e de lei, face ao declínio da função paterna no sistema social e seus efeitos no sistema escolar.

Como resultados da pesquisa, observaram que o mal-estar na docência é um sintoma do mal-estar na educação apresentado de forma singular. A angústia advinda desse mal-estar indica o sentimento de desamparo do professor no exercício da prática educativa e pedagógica e a sua demanda de reconhecimento dirigida ao outro.

Apontaram ainda os resultados, a necessidade de formação, inicial e continuada, que alie a discussão sobre a ética no campo educativo, e a práxis pedagógica à aquisição de competências profissionais e de dispositivos de uma formação pessoal do professor para o exercício da sua função.

Mendes e Tamayo (2001) conduziram um estudo sobre valores organizacionais e prazer-sofrimento no trabalho, cuja discussão é em torno das vivências de prazer e sofrimento no trabalho e as relações entre os valores organizacionais, onde o prazer- sofrimento é estudado como constructo dialético, sendo definido como vivências de sentimento de valorização, reconhecimento e desgaste no trabalho.

Essa pesquisa foi realizada em uma empresa pública de abastecimento e saneamento com 554 empregados, onde foram aplicadas escalas para medir os valores organizacionais e o prazer-sofrimento, tendo sido analisados os dados por meio de estatística descritiva e correlações bivariadas.

Como resultados, os autores observaram uma preponderância das vivências de prazer, sendo o sofrimento vivenciado de forma moderada. O prazer, correlacionado com quatro polos dos valores organizacionais: autonomia, estrutura igualitária, harmonia e domínio, enquanto que o sofrimento apresentava correlação negativa com o polo da autonomia, estrutura igualitária e domínio.

Assim, concluíram que o prazer está correlacionado com polos das três dimensões dos valores organizacionais, enquanto que o sofrimento correlaciona-se negativamente com esses polos, o que pode indicar que a cultura assume um papel de gratificação e realização do desejo, por isso, espaço para o prazer, emergindo o sofrimento quando este prazer não tem mais lugar, não sendo assim, geradora de sofrimento, mas reguladora à medida que o sofrer mais ou menos depende do quanto de prazer foi restringido pelas imposições externas.

Portanto, os autores afirmam que o prazer e a diminuição ou evitação do sofrimento encontram-se relacionados a um contexto organizacional onde predominam a percepção dos valores do polo da autonomia, estrutura igualitária e harmonia, que constituem a base para um contexto organizacional mais flexível, resgatando e dando condições para a satisfação das necessidades e para o trabalho assumir seu papel de ser fonte de prazer.

Diante das pesquisas apresentadas é possível entender que as vivências de sofrimento e prazer no trabalho, embora sejam vivências subjetivas dos próprios trabalhadores, compartilhadas coletivamente ou não, dependem da cultura organizacional instituída na empresa para expressarem o que lhes são mais forte, prazer ou sofrimento.

Então, fica claro que todo trabalho veicula implicitamente um custo humano expresso sob a forma de carga de trabalho, cujas vivências de sofrimento e prazer, resultam do confronto do sujeito com essa carga que, consequentemente, traz impactos para seu bem-estar psíquico.

Sofrer ou ter prazer no trabalho pode ter elementos intrínsecos do ambiente laboral, mas padecer desse sofrimento dependerá das estratégias adotadas pelo trabalhador para que a sua manutenção no emprego não o enlouqueça, pelo contrário, o faça crescer profissionalmente, emocionalmente e socialmente.

Conclui-se, então, que a importância deste estudo centraliza-se na forma de relacionar-se com o outro, de compreensão dos valores e atitudes que fazem parte do sujeito, onde o método da psicodinâmica desperta no sujeito a capacidade de ver a

situação real de trabalho e que seja transformador de si mesmo e do seu entorno, propiciando um ambiente sadio de trabalho, ainda que complexo e conturbador.