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Relações interpessoais professor/aluno de mútuo reconhecimento, confiança e

4 RESULTADOS E DISCUSSÃO

4.1 APRESENTAÇÃO E DISCUSSÃO DOS NÚCLEOS DE SENTIDO

4.1.4 Relações socioprofissionais e núcleos de sentido

4.1.4.2 Relações interpessoais professor/aluno de mútuo reconhecimento, confiança e

Profª Mary: “[...] então, eu acho que realmente tem uma coisa que no fundo, no fundo tá para além da remuneração, do financeiro. É uma coisa de gostar mesmo, de ter

prazer. Sabe, isso compensa, de certa forma, o cansaço, o desgaste, as relações pessoais. Assim, o que eu sinto entre um Complexo e outro, é que lá no C é mais aconchegante porque é menor, é mais rústico, é mais longe e não é todo professor que quer ir pra lá, já tem aqueles mesmos, a gente já tem certa afinidade, vamos mais cedo até pra fazer nossas coisas com mais calma antes dos boateiros chegarem. Então, é mais aconchegante, dá pra atender melhor os alunos, pra interagir com os colegas. Aqui não, aqui a gente não tem relação com ninguém, tu chegas, senta no teu lugar e pronto”.

“[...] até porque eu não sou bajuladora, eu não sou assim, o meu perfil é muito, muito, muito com os alunos, eu e os alunos, assim, eu e os alunos. A aula, os seminários, os atendimentos de orientação de TCC, essa troca. E eu fico pensando, meu Deus, por quê? O quê que eu estou fazendo aqui? Porque eu estou fazendo isso? Mas é muito bom, é muito gratificante a resposta dos alunos, a conversa, a mudança deles, essa é muito interessante, eu acho que a compensação está bem aí, a história do cansaço.”

Profª. Cindy: “[...] hoje eu percebo, eu me vejo também, agora eu também to trabalhando na Imobiliária, não tô mais só aqui, não tô refém, eu me vejo assim, um retorno, digamos assim, mais nos alunos mesmo. Eu acredito muito no que eu faço, eu acredito muito nessa troca, a gente sabe o trabalho que a gente tem, essa coisa de corrigir prova, de corrigir projeto, de elaborar prova de lançar... Nesse momento, eu digo assim, é muita coisa porque professor não é só professor, ele também faz serviço administrativo. E cada vez mais isso parece que volta pra gente, eles reconhecem o nosso trabalho, acham a gente competente, te valoriza, e quando eles gostam te presenteiam no dia dos professores, fazem festa surpresa no aniversário. Às vezes você é surpreendido com um cartão, com uma fruta, isso massageia o ego. Sabe, eu esqueço tudo, isso faz você mudar com os alunos, com a turma e até com os colegas. Você naquele momento fica de bom humor, fica com a moral alta.”

Prof. Jonh: “[...] com certeza... também essa situação de você ser reconhecido de te procurarem pra ser orientador, de te abordar nos corredores pra esclarecer uma dúvida que às vezes não é da sua turma, da sua disciplina, faz você se sentir bem, parece que você sabe muito, que você é o bam, bam, bam, que você além de competente é querido, isso é muito bom, quem não gosta disso?”

Profª May: “[...] isso, isso mesmo! Nossa, graças a Deus nesse período não peguei uma turma ruim. os alunos te reconhecem, te respeitam, eu mesma já chorei em sala de aula por causa disso. No meu aniversário fui dar aula e me deparei com uma

festa surpresa com bolo, salgados, refrigerantes, flores, fotos, todos querendo uma foto. Isso já aconteceu nos três Complexos, foi muito bom. É maravilhoso se sentir querido, e também essa coisa de te abordarem no corredor pra tirar dúvidas, e quando é de outro colega então, parece que você é o que sabe mais, mesmo quando no fundo a gente pensa que eles querem mesmo é a resposta dada por um professor, parece que aí não tem erro.”

Profª Karol: “[...] mas quando eu me apresento, eu sou professora de fato, eu não tenho outra função, sou professora, ainda que eu trabalhe em outras Instituições, então assim, faço isso por amor, por satisfação, por prazer, então a gente se insiste, vai insistindo nessa relação, vai acreditando, vai cada dia acreditando, acreditando...”

Profª Katy: “[...] a gente executando a atividade de ensino, isso de qualquer forma traz uma satisfação, que é como eu já tinha falado, a gente ensina porque gosta de ter preparado uma aula, uma dinâmica de ensino mediante seu conhecimento e sua prática, realmente dá prazer no exercício do magistério”.

“(...) A nossa saúde emocional e psicológica, de quem faz o que gosta, não se abala uma vez que você faz aquilo com prazer e se programe pra executar essa atividade. Algumas são as respostas dos alunos para o que a gente faz, prepara, mas em algumas situações nos causa não frustração porque eu acho essa palavra muito forte, mas tristeza, cansaço. É desestimulante, vamos assim dizer, sobre essas ações administrativas”.

Profª Any: “[...] fora essa questão do docente com a Instituição, em termos de

forma, o ato de ensinar é muito prazeroso, você se sente muito gratificado quando o aluno reconhece que seu trabalho foi frutífero e que os teus alunos estão respondendo a tua postura, estão respondendo ao teu progresso dentro de sala de aula, então é aquela coisa de você formar opiniões, de você formar conhecimento, você ajudar porque a ideia hoje é que nós somos facilitadores, você ajudar é muito gratificante e se a gente tem todo aquele cansaço físico e psíquico essa recompensa por si só já vale.”

Profº. Paul: “[...] é bom mesmo a gente se sentir reconhecido, se sentir professor porque até então parece que você não é, que você não está num ambiente acadêmico. Então, você ir pra sala é o maior prazer que se pode ter, você chega, eles já estão lá esperando. Um ou outro chega atrasado. Dia de prova então, se a prova é à noite, eles tão lá desde a tarde, então você dá sua aula e eles perguntam e querem saber mais e interagem nos exemplos, nos casos concretos, isso te dignifica.”

“[...] ainda tem o fato de no período da formatura você ser escolhida para o nome da turma, o paraninfo, participar da aula da saudade, tem os preparativos do último período, tudo eles querem registrar, bater foto. Isso demonstra que você não é só um fantoche, um enfeite de mesa, não tá só pra decorar... E quando você os encontra lá fora nos campos de estágio ou em qualquer lugar que eles tão lá trabalhando, não são raras as vezes em que eu vou ao banco e sempre encontro um, e me chamam e tentam resolver de alguma maneira, de te tirar da fila, ou seja, eles querem retribuir de alguma forma a importância que você tem ou fez na vida dele, porque eu trato meus alunos como seres humanos, com civilidade diferente de muitos colegas aqui e a gente sabe porque ouve aqui na sala os comentários, eles apenas estão retribuindo a maldade que recebem, isso é definitivamente pequeno.”

Profª Karol: “[...] então, eu acho que tem coisas que dão prazer aqui, algumas trocas de experiências, o trabalho que você faz na sala de aula, isso aí não tem quem pague. As relações, as amizades que você faz, que a gente constrói aqui dentro, e assim, isso é muito proveitoso, é muito positivo, dá o prazer de estar aqui de continuar aqui, de querer ficar aqui, apesar das pressões”.

Esse núcleo de sentido revela que as vivências de prazer dos professores estão fortemente associadas ao reconhecimento social, à satisfação de trabalhar com os alunos que os veem como pessoas, como profissionais competentes. Trata-se de uma satisfação que permite aprendizagens constantes e recíprocas entre professores e estudantes, seja no campo das relações humanas, seja no campo profissional.

Identifica-se, assim, que há uma relação muito saudável e de duplo reconhecimento entre os professores e os alunos, que parece ser bem mais intensa, determinada por respeito, admiração e confiança, e por poucos conflitos, do que as relações estabelecidas entre pares. Embora essas sejam, de um modo geral, cordiais, são marcadas pela competitividade e pela hierarquia rígida que regem as relações sócio- profissionais.

Nesse sentido, as situações de prazer são resultantes do fato de os professores atuarem em um contexto de trabalho que viabiliza as relações intersubjetivas, marcadas pela troca e confiança com os alunos, que emitem elogios constantes reconhecendo o saber docente, e ainda pela cordialidade da relação entre os pares que, mesmo divididos ou agrupados por diferentes interesses e razões, permite, entretanto, a troca, a amizade e o respeito.

Portanto, é sobretudo a dimensão das relações sociais ou das relações socioprofissionais que favorece, ainda que precariamente, a construção pelos professores, de uma identificação com as atividades do trabalho docente, pois algumas expectativas profissionais são atendidas na perspectiva do reconhecimento social da função e das relações intersubjetivas.

Nessa perspectiva, encontramos apoio em Mendes e Abrahão, 1996; Lima e Lima Filho, 2012; Abdoucheli e Dejours, 2011; Merlo e Lapis, 2007; Ferreira e Mendes, 2001; Brant e Minayo, 2004; Glina, Rocha, Batista e Mendonça, 2001; Mendes, Chaves e Santos, 2007; Ferreira, Fernandes, Prado, Baptista, Freitas e Bonini, 2009; Barros e Mendes, 2003; Lancman e Uchida, 2003; Abrahão e Torres, 2004; Simplício e Andrade, 2011, no sentido de que as condições do trabalho podem influenciar tanto negativamente quanto positivamente na subjetividade do trabalhador.

Assim, por meio dos relatos dos professores, apesar do cansaço devido à elaboração das aulas, das provas, das correções, dos acompanhamentos aos alunos, dentre outras atribuições, essas tarefas são realizadas com prazer, capricho, zelo, satisfação. É o esforço físico e mental recompensado com os resultados dos alunos e os seus reconhecimentos.

A análise dos resultados permite inferir, portanto, que os indicadores de sofrimento no trabalho concentram-se na estrutura organizacional hierarquizada, direcionada a objetivar o lucro sem dar atenção ou priorizar o setor pedagógico da Instituição e, ao mesmo tempo, com regras inflexíveis centradas na produtividade docente, o que tem gerado desgaste físico e emocional nos professores, configurando uma situação de sofrimento no trabalho.

Por outro lado, nos depoimentos sobre as relações pessoais no trabalho, há uma grande satisfação em ser professor, em estar com os alunos, em poder trocar experiências profissionais com os pares, ainda que o relacionamento interpessoal com a coordenação e a hierarquia superior seja conflituoso, desgastante e marcado pelo mal- estar.