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PJE COMO NOVO PARADIGMA DO PODER JUDICIÁRIO TRABALHISTA BRASILEIRO

6 PROCESSO JUDICIAL ELETRÔNICO TRABALHISTA: NOVO PARADIGMA DE ACESSO À JUSTIÇA

6.1 PJE COMO NOVO PARADIGMA DO PODER JUDICIÁRIO TRABALHISTA BRASILEIRO

Para se chegar à conclusão sobre se o PJe trabalhista pode ser considerado um novo paradigma de acesso à justiça é necessário antes examinar algumas questões.

Primeiramente, podemos constatar que o paradigma anterior do direito processual laboral como instrumento na solução de conflitos de interesses pelo Poder Judiciário Trabalhista era o processo que tramita em autos de papel e que se baseia no princípio da escritura. Esse processo, como visto, é tutelado por uma série de garantias constitucionais, processuais e próprias.

Em seguida, é notório que há alguns anos, por razões de diversas ordens, a atividade jurisdicional do Poder Judiciário brasileiro através do processo judicial tradicional, via de regra, é acometida da anomalia relacionada à demora na solução dos litígios. Isso repercute e impede a efetivação da garantia do acesso à justiça. Uma prestação jurisdicional tardia peca no aspecto da efetividade, prejudica os litigantes e macula o Poder Judiciário.

Ademais, é evidente o fato de a informática e a internet estarem entremeadas em diversas searas da sociedade, de facilitarem as rotinas em diversos aspectos e contribuírem para o progresso social.

Diante desse contexto de crise na prestação jurisdicional pela demora na tramitação do processo e da utilização dos recursos da informática e internet para a melhora no desempenho de atividades em diversos setores da sociedade, tornou-se evidente que a interface entre ambos poderia acarretar alterações que colaborassem para a melhoria da celeridade processual. Neste sentido, surgiram diversos sistemas de processo eletrônico nos vários órgãos do Poder Judiciário brasileiro. Ocorre que a coexistência de plataformas digitais diferentes para a tramitação de processos judiciais com regras, interfaces e recursos distintos gera percalços para o Poder Judiciário e para seus usuários. Os advogados, por exemplo, são sujeitos a diversos processos eletrônicos com peculiaridades diversas, que atrapalha o exercício da

profissão. Por isso, acordos de colaboração celebrados entre o Conselho Nacional de Justiça e os Tribunais Superiores optaram pela uniformização dos processos eletrônicos existentes no Poder Judiciário com unificação da inteligência extraída desses diversos sistemas. Eis que surge o PJe (Processo Judicial Eletrônico), que deverá ser implantado e adotado pelos tribunais do Poder Judiciário (federais, estaduais, trabalhistas, eleitorais). A Justiça do Trabalho já implantou o PJe em toda a sua estrutura.

Inicialmente, vale salientar que, para a compreensão de que o PJe é um novo paradigma, é necessário ter em mente que a proposta do PJe é ser um processo virtual, diferentes de muitos sistemas informatizados adotados por órgãos do Poder Judiciário brasileiro. Esse aspecto relevante necessita ser bem entendido pela sociedade, principalmente pelos operadores do Direito.

O processo virtual difere substancialmente do processo digital, que é um meio termo entre o primeiro e o processo de papel. Isso significa que o PJe é um processo produzido no meio virtual e não meramente copiado ou escaneado ou reproduzido do papel para um sistema de informática. Existe uma diferença considerável entre esses aspectos. Um processo virtual, cujos atos são produzidos em meio digital, é detentor de uma racionalização importantíssima que acarreta a celeridade, segurança e economia processuais tão desejadas.

Para melhor compreender este aspecto da racionalização do sistema de processo virtual, a sociedade precisa deixar de analisar e praticar o PJe com a consciência e a comparação do processo que tramita no papel. Isso é difícil principalmente porque estamos numa fase de transição e ruptura com um paradigma que imperou por décadas. Mas o entendimento de que o processo é virtual, por ser produzido no ambiente digital, colabora para perceber que ele detém o atributo racionalização do sistema. Esta se opera de forma que o sistema possui uma inteligência que enseja a prática automática de atos burocráticos (que não necessitam de alto nível de cognição do ser humano). Por exemplo, num processo virtual como o PJe, rotinas como autuação, numeração de folhas, juntada, carga e remessa dos autos, decurso de prazo, etc., não precisam ser realizadas, porque o próprio sistema se encarrega de fazê-las automaticamente. A consequência principal disso é a otimização do trabalho: o indivíduo que utiliza o PJe passa a se preocupar mais detidamente com os atos que dependam essencialmente da capacidade

cognitiva. Esse fato acarreta alterações significativas na garantia do acesso à justiça trabalhista. Lembrando que, na conjuntura do Estado Democrático de Direito, o acesso à justiça possui uma conotação mais ampla do que apenas a garantia do direito de postular no Poder Judiciário, mas obter a solução de um conflito de interesses resguardados todos os princípios englobados no devido processo legal.

Importante esclarecer que a escolha do PJe para unificar o sistema processual do Poder Judiciário brasileiro se deu em razão de vários aspectos e funcionalidades que tal sistema apresenta e que, no conjunto, demonstram o avanço dele em relação aos demais processos informatizados.

O sistema do PJe, desde o início da fase de projeto, é coordenado através de estrutura de governança composta por: Presidência do Conselho Superior da Justiça do Trabalho; Comitê Gestor Nacional; Gerências Técnica e Executiva; Grupos de Negócios; comitês técnicos; e grupos de trabalho. Tal coordenação estrutural do sistema do PJe busca agilidade no cumprimento das diretrizes necessárias e a garantia de segurança no processo decisório.

Ademais, o sistema do PJe possui um desenvolvimento compartilhado, ou seja, resulta da colaboração de vários órgãos dos diversos tribunais do Poder Judiciário brasileiro, com base no planejamento central do Conselho Nacional de Justiça. O desenvolvimento compartilhado do sistema do PJe é uma iniciativa exitosa inédita que reúne: magistrados do trabalho, federais, estaduais; servidores do Poder Judiciário (tanto da área fim como da área de tecnologia); e representantes da advocacia e do Ministério Público. Essa reunião de profissionais de diversos setores da justiça viabiliza a troca de experiências e de concepções plurais, a disseminação de boas práticas e a difusão do conhecimento. A outra vantagem do desenvolvimento compartilhado do sistema do PJe é evitar a dependência exclusiva de produtoras privadas de softwares que necessitariam ser contratadas para o aperfeiçoamento do sistema.

Outro aspecto diferencial de relevância do PJe é a adoção de código-fonte de propriedade da União. Essa particularidade do PJe denota a diretriz da gratuidade e propriedade do código-fonte do sistema, ou seja, é possível a implantação desse sem custos nos tribunais. Isso representa significativa economia de custos financeiros. A adoção do código-fonte de propriedade da União reserva ao

Judiciário brasileiro o domínio do conhecimento do sistema e a responsabilidade pela guarda de processos.

Outra especificidade do PJe é o desenvolvimento de todos os seus componentes a partir de softwares de código aberto. Isso atende ao quanto determinado no artigo 14 da Lei n° 11.419/2006. Código aberto (em inglês “open source”) consiste num parâmetro de desenvolvimento de programas de informática que propicia “um licenciamento livre para o design ou esquematização de um produto, e a redistribuição universal desse design ou esquema, dando a possibilidade para que qualquer um consulte, examine ou modifique o produto”.66 Em síntese, software de código aberto é aquele que possibilita qualquer indivíduo obter, utilizar, distribuir o sistema, sem custo.

O acesso mediante certificado digital constitui mais uma particularidade do sistema do PJe. Para utilizar as ferramentas e praticar os atos processuais, em geral, é necessário obter o certificado digital do PJe perante uma autoridade certificadora. Apesar de ser um requisito restritivo de utilização do sistema, vale ressaltar que o certificado digital prima pela regra de segurança na utilização do PJe. Ademais, a exigência do certificado digital cumpre o quanto determinado na Medida Provisória n° 2.200/2001 sobre os atributos dos arquivos digitais, quais sejam: a autenticidade da origem; a integridade de conteúdo; e a garantia de não-repúdio. O acesso com certificado digital minimiza a prática fraudulenta de atos processuais e a captura de dados dos usuários por sistemas “espiões” (os conhecidos “vírus”).

O PJe possui uma ferramenta denominada Gerenciamento de Processos de Negócios que o dota de grande flexibilidade e adaptabilidade às realidades procedimentais de cada tribunal em virtude de ter sido criado a partir da metodologia de fluxos criados. Esse diferencial do sistema do PJe possibilita que ele seja utilizado sem significativas alterações no código-fonte nos diversos órgãos do Judiciário brasileiro. Ademais, essa metodologia permite mudanças de forma rápida em caso de alterações legislativas posteriores que atinjam o procedimento judicial.

Vale salientar, ainda, que também decorre do uso da ferramenta de Gerenciamento de Processo de Negócios, a capacidade do sistema do PJe em propiciar o desenvolvimento processual a partir do mapeamento do processo do

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Informação disponível na página online WIKIPEDIA. Disponível em:

trabalho. Essa relevante particularidade do PJe permite identificar as diversas etapas componentes do procedimento judicial. A partir da avaliação das fases do processo, o sistema indica opções de atos seguintes a serem praticados e pode promover automaticamente rotinas que não necessitem da intervenção cognitiva humana. Tal propriedade do sistema do PJe pode colaborar para a redução de erros por parte dos usuários do sistema.

Por ocasião do estabelecimento do PJe como sistema nacional unificado de processo eletrônico a ser implantado em todos os tribunais pátrios, foi adotado o Modelo Nacional de Interoperabilidade (MNI). Essa ferramenta permite que qualquer sistema, inclusive privado, possa ser integrado ao PJe, desde que cumpra os atributos e parâmetros técnicos estabelecidos na cláusula 2ª do Acordo de Cooperação Técnica n° 5867, de 2009, celebrado entre o Supremo Tribunal Federal, o Conselho Nacional de Justiça, o Superior Tribunal de Justiça, o Conselho da Justiça Federal, o Tribunal Superior do Trabalho, o Conselho Superior da Justiça do Trabalho e a Advocacia-Geral da União. Os atributos exigidos são: respeito às garantias processuais e materiais conferidas aos jurisdicionados; atendimento aos princípios constitucionais e legais relativos ao processo judicial; integridade, inviolabilidade e segurança dos dados e informações; tratamento adequado às informações sujeitas ao sigilo legal; e possibilidade de implementação em etapas, com diversos graus de generalidade, de forma a permitir a evolução modular e abrangente das soluções de integração. O Modelo Nacional de Interoperabilidade, aprovado pelo Conselho Nacional de Justiça, enfim, estabeleceu uma única forma de integração entre sistemas informatizados de processo judicial (na prática, contudo, se restringe ao PJe), se atendidos os requisitos ora enumerados.

Outra peculiaridade do PJe, que não encontramos nos processos que tramitam em autos de papel e é promovida em menor escala nos processos digitalizados, é a economia de papel. A substituição dos autos físicos enseja considerável economia dos gastos com papel na Justiça do Trabalho. Essa é uma alteração nítida promovida pelo PJe e que acarreta a redução de custos financeiros

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BRASIL. TERMO DE ACORDO DE COOPERAÇÃO TÉCNICA Nº 58/2009.Tem por objeto a elaboração e implementação do padrão nacional de integração de sistemas de processo eletrônico, por meio da tecnologia "WebService". Disponível em: <http://www.cjf.jus.br/cjf/sessoes-do-

cjf/acordos-e-

convenios/2009/TERMO%20DE%20ACORDO%20DE%20COOPERACaO%20TECNICA%20N.%2 058-2009.pdf/view>. Acesso em: 11 jan. 2017.

com a aquisição de papel, além de contribuir para preservação do meio ambiente em diversos aspectos (corte de árvores, consumo de energia, produção de lixo não reciclável formado pelos cartuchos e tonners de impressão).

Mudanças acarretadas pelo PJe trabalhista podem ser visíveis ainda na sistemática de gestão e rotina de serviços das unidades judiciárias. Agora é imprescindível que os servidores estejam aptos a dar vazão ao ato processual de forma integral, até que a continuidade processual não dependa mais dele. Desta forma, deverão ser evitadas atuações estanques dos servidores apenas na execução de atos processuais de determinada espécie. Isso certamente exigirá capacitação, atualização e aperfeiçoamento do quadro de servidores que atuam diretamente com o sistema do PJe, com o intuito se adaptarem às novas incumbências.

Não foi apenas para a estrutura do Poder Judiciário Trabalhista em si e para os respectivos servidores que o PJe acarretou mudanças paradigmáticas. Os advogados que militam na Justiça do Trabalho foram alvos diretos das significativas alterações promovidas com a implantação do PJe. Algumas dessas transformações são aplicadas exclusivamente aos advogados trabalhistas. Dentre estas, podemos elencar o escritório virtual do advogado no sistema do PJe e o protocolo e distribuição em lote das petições iniciais. No que tange ao escritório virtual, no sistema do PJe cada advogado possui um espaço digital próprio, com a liberdade de gerenciar os processos sob sua responsabilidade, o controle de pautas de audiência e das intimações e diversas outras atividades funcionais que colaboram para o desempenho da profissão.

Diante da análise das peculiaridades do sistema do PJe, resta claro que não estamos diante de uma simples ferramenta tecnológica de processamento de autos processuais. É mais que isso: trata-se de uma mudança de paradigma do direito processual do trabalho que exige uma mudança de mentalidade. O processo trabalhista não passou apenas por alterações na forma de visualizar e no meio de tramitar os autos, mas na maneira de produzir os atos processuais e de se comportar diante do processo.

6.2 REPERCUSSÕES DA ADOÇÃO DO PJE TRABALHISTA NO ACESSO À