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PROCESSO TRADICIONAL, A CRISE DA DURAÇÃO RAZOÁVEL E PROCESSO JUDICIAL ELETRÔNICO

3 UMA VISÃO GERAL DO PROCESSO DO TRABALHO

4 COMPREENSÃO DA CONTRIBUIÇÃO DA ALTERAÇÃO DOS PARADIGMAS PARA AS REVOLUÇÕES CIENTÍFICAS

4.3 PROCESSO TRADICIONAL, A CRISE DA DURAÇÃO RAZOÁVEL E PROCESSO JUDICIAL ELETRÔNICO

O processo judicial é considerado muito mais do que um instrumento e uma simples sucessão de atos processuais (procedimentos). Deve ser vislumbrado pelo fim que engendrou a sua proposição, pela relação entre os atos processuais e entre os sujeitos da relação processual (juiz, partes). O processo judicial pode ser visto como o instrumento que concretiza a atividade jurisdicional (exercida com o objetivo de apaziguar os conflitos de interesses respeitando e aplicando as leis vigentes) com respeito aos direitos fundamentais constitucionais do Estado Democrático de Direito.

Para Calmon de Passos (2012), o processo é, em verdade, o instrumento do poder como manifestação da vontade do Estado e da soberania do povo. Por essa razão, para o autor, a análise do processo deve se relacionar com a estrutura social, ideológica, econômica circundante e não apenas se ater a aspectos jurídicos. Isso significa que, no processo, além da necessidade do cumprimento dos direitos

fundamentais e das garantias processuais, mister que haja a interação com aspectos extrajurídicos relacionados ao contexto social, ideológico e econômico para que, ao fim do trâmite, a justiça seja efetivada. Enfim, o processo deve acompanhar a sociedade que está inserido, sempre permitindo atualizações que se façam necessárias.

O contexto acima sinteticamente ilustrado denota o cenário ideal que deve cumprir o processo judicial. No entanto, há alguns anos, por razões de diversas ordens (por exemplo: regras processuais postas no nosso ordenamento, estrutura do Poder Judiciário em várias de suas esferas, comportamento dos sujeitos da relação processual, questões de ordem política, cultural e econômica), o processo geralmente não tem cumprido a contento os fins para os quais foi idealizado e muitas das garantias processuais são violadas durante a tramitação.

Importante ressaltar que, na doutrina sobre jurisdição, foram vislumbrados quatro escopos desta, a saber: jurídico (conferir aplicação concreta da vontade do direito para a solução da lide); social (resolver conflito de interesses, promovendo às partes envolvidas a pacificação social, sanando a insatisfação das partes, através de uma decisão justa proferida em um processo célere, pouco custoso e com amplo acesso de participação); educacional (ensinar aos jurisdicionados, e não apenas às partes envolvidas, os direitos e deveres); e político (fortalecer o poder estatal quando a jurisdição é desempenhada de forma eficaz; deve ser o último recurso para a proteção das liberdades públicas e dos direitos fundamentais; estimular a participação democrática por meio do processo a exemplo da proposição da ação popular) (CINTRA; GRINOVER; DINAMARCO, 2003, p. 133). Relevante salientar que se um desses escopos não é atingido, há um problema na prestação jurisdicional.

Não é de hoje que o processo judicial tem sido utilizado de forma a tornar ineficaz a prestação jurisdicional, prejudicando os escopos da função principal do Poder Judiciário. Alternativas ao processo passaram a ser valorizadas em determinados casos que podem ser solucionados sem a chancela do Poder Judiciário. A arbitragem, por exemplo, ganhou muita importância e destaque como meio de solução alternativo dos conflitos que versem sobre direitos patrimoniais disponíveis de pessoas capazes. No entanto, o problema não parece residir no instituto do processo em si, mas na maneira como ele é praticado, seja pelas regras

processuais em vigor, seja pelos sujeitos que o utilizam ou pela estrutura dos órgãos do Poder Judiciário ou pelo contexto político, econômico existente.

O problema mais latente do processo, que tem gerado muitos debates e possui destaque por sua nítida gravidade, é o atinente à celeridade e à duração razoável dos trâmites processuais.

De acordo com Wilson Alves de Souza (2009), o decurso do tempo é um aspecto inerente ao trâmite processual, em razão do rito a ser seguido respeitando as garantias dos litigantes (contraditório, produção de provas, prazos). No entanto, é frequente, se tornando quase regra, que a tramitação dos processos tem durado mais tempo do que o razoável, do que o necessário e fora do contexto da normalidade. Essa demora na solução das demandas judiciais deságua no problema da efetividade e, consequentemente, na negação do acesso à justiça.

Para os jurisdicionados, a longa duração dos processos acarreta de forma evidente a inutilidade e a ineficácia do provimento judicial.

Essa lentidão atinge não apenas os litigantes ao comprometer a efetivação do direito pretendido, no âmbito da relação jurídica processual, mas também fragiliza a credibilidade do Judiciário para solução dos litígios, perante os jurisdicionados, em razão da sensação generalizada de restrição do acesso à jurisdição e de não realização da justiça.

Ademais, também gera custos inócuos haja vista o desperdício de verbas em prol de um processo que, pela tramitação vagarosa, não logrou atingir a solução do conflito de forma efetiva.

Dentre as causas da demora excessiva dos julgamentos nos processo judiciais, a doutrina aponta: a existência de leis processuais com seus procedimentos arraigados de formalidades prescindíveis; a política econômica dos governos (o investimento no Poder Judiciário não possui importância para os Poderes Legislativo e Executivo); a estrutura dos órgãos do Poder Judiciário (número de juízes e de servidores não acompanha o crescimento do número de processos por ano); o comportamento político e administrativo do Poder Judiciário; e atitude das partes e respectivos advogados (que, dependendo da situação que se encontre na relação processual, acaba tendo interesse em postergar o andamento do processo como estratégia de defesa) (SOUZA, 2009, p. 31).

Foi nesse cenário, em que se tornou regra a demora na tramitação processual fora do contexto da normalidade, que a Emenda Constitucional n° 45/2004 acrescentou ao rol dos direitos fundamentais do artigo 5° da Constituição Federal (no inciso LXXVIII), o princípio da celeridade processual e da duração razoável do processo. Sem dúvida essa previsão constitucional atendeu aos reclames da sociedade. No entanto, não basta apenas tornar-se previsão normativa sem buscar meios de concretizá-la.

Vale frisar que várias foram as modificações32 legislativas sugeridas pelos processualistas na tentativa de sanar a morosidade do processo judicial, antes mesmo de a EC n° 45/2004 positivar o princípio da duração razoável do processo. Essas medidas, no entanto, não obtiveram o êxito mediato esperado: colaboraram de alguma forma para a celeridade processual no Judiciário, mas o problema da morosidade ainda persiste. Isso evidencia que o problema da morosidade não possui como causa decisiva apenas a questão legislativa, mas um contexto de fontes já mencionadas acima.

Assim, em 26 maio de 2009, representantes dos três poderes da União firmaram “II Pacto Republicano de Estado por um Sistema de Justiça Mais Acessível, Ágil e Efetivo” 33, com os seguintes objetivos: acesso universal à Justiça, especialmente dos mais necessitados; aprimoramento da prestação jurisdicional, mormente pela efetividade do princípio constitucional da razoável duração do processo e pela prevenção de conflitos; e aperfeiçoamento e fortalecimento das instituições de Estado para uma maior efetividade do sistema penal no combate à violência e criminalidade, por meio de políticas de segurança pública combinadas

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Dentre as medidas legislativas processuais adotadas (na maioria dos casos são reformas processuais no Código de Processo Civil de 1973) para implementar a duração razoável do processo, estão: julgamento antecipado da lide (artigo 330 do CPC); procedimento sumário (artigo 275 do CPC) e sumaríssimo (Lei 9.099/1995); procedimento monitório (arts. 1.102-A a 1.102-C do CPC); julgamento de improcedência liminar (artigo 285-A do CPC); súmula impeditiva de recursos (artigo 518, § 1.°, do CPC); julgamentos monocráticos do relator de recurso (artigo 557 do CPC); prova emprestada; processo sincrético; comunicação dos atos processuais por via eletrônica (artigo 154, § 2°, do CPC); e repressão à chicana processual (artigo 14, parágrafo único, do CPC). Essa perpetuação do problema da celeridade gera inquietação no sentido de se questionar se se trata apenas de problema procedimental. Parece que uma conjunção de fatores de diversas ordens contribui para o problema do excesso da demora processual, como, por exemplo: aumento do número de processos nos tribunais a cada ano, em razão do problema social e da cultura do desconhecimento e desrespeito aos direitos; e estrutura deficitária do Poder Judiciário, principalmente no primeiro grau e nas justiças estaduais, que carecem de investimento em infraestrutura e reposição de servidores e magistrados.

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BRASIL. II PACTO REPUBLICANO DE ESTADO POR UM SISTEMA DE JUSTIÇA MAIS