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2 GOVERNOS LULA E DILMA: A POLÍTICA EXTERNA E AS DIFERENÇAS MARCANTES DA POLÍTICA GERAL DE INTERNACIONALIZAÇÃO

2.3 POLÍTICA E AÇÕES GERAIS DE INTERNACIONALIZAÇÃO UNIVERSITÁRIA NO BRASIL NOS GOVERNOS LULA E DILMA

2.3.2 Política e ações de internacionalização universitária no governo Dilma – Programa Ciência sem Fronteiras

No governo de Dilma, a partir de 2011, o programa de internacionalização universitária que mais obteve destaque entre a comunidade acadêmica e na sociedade em geral foi o Ciência sem Fronteiras. Esse programa desde o seu início foi polêmico, como se observa nas palavras de Renato Janine, ex-ministro da Educação do governo Dilma Rousseff:

[...] não se pode pensar o CsF em torno só do fato de que deu chance a pobres de estudar fora. Não, ele não era um programa de inclusão social neste nível tão elementar. Era para bons e ótimos alunos, ricos ou pobres. Neste sentido, sim, mandou pobres para fora. Mas não era um programa social. Era um programa para fortalecer a economia brasileira e a parte que a Ciência e a Tecnologia nela desempenham. Isso é muito bom, mas claro que depende de dinheiro e de qualidade (MONTESANTI, 2017).

Essa diferença também é destacada por outros entrevistados na matéria de Beatriz Montesanti sobre o fim do programa. Entre eles, a pesquisadora Luciane Stallivieri e o prof. Raul Machado Neto (2017, informação verbal), presidente da Agência da USP de Cooperação Acadêmica Nacional e Internacional (AUCANI), que confirmam que o Ciência sem

Fronteiras foi um programa inovador do governo federal, mas que seria necessário haver um melhor planejamento para sua execução. Seria desejável uma postura mais proativa e participativa das instituições de ensino brasileiras nas tomadas de decisão de operacionalização do programa.

O programa estabeleceu uma polêmica, inicialmente positiva, dada a grande quantidade de bolsas ofertadas para estudar fora do país e pela prioridade dada à graduação. No entanto, foi paulatinamente sendo questionado pelos próprios professores universitários que viam na ausência de exigências de retorno dos bolsistas uma forma de tornar o programa pouco eficiente junto a estes alunos bolsistas. Sem condições de saber se haveria retorno ao país, o programa foi se tornando assim polêmico.

Instituído pelo Decreto nº 7.642, de 13 de dezembro de 2011, ainda no primeiro mandato de Dilma, o Programa Ciência sem Fronteiras (CSF) foi estabelecido sob responsabilidade de execução pelo Ministério da Educação (MEC) e pelo Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI) e suas respectivas agências: CAPES e CNPq. O programa tinha como objetivo incentivar o intercâmbio de estudantes brasileiros em universidades de excelência no exterior e, assim, qualificar os estudantes de graduação e pós- graduação. A novidade esteve não só na oferta de bolsas de estudo e auxílio-permanência para intercâmbio de graduação com duração de um semestre a um ano fora do país como na amplitude dos países contemplados.

De acordo com o decreto que o institucionalizou, o programa tinha como objetivo geral propiciar a formação e a capacitação de pessoas com elevada qualificação em universidades, instituições de educação profissional e tecnológica e centros de pesquisa estrangeiros de excelência. De forma operacional, a meta do programa era de que, até 2015, 101.000 bolsas seriam disponibilizadas para estudantes de graduação e pós-graduação para que fizessem integralmente (modalidade plena) ou parte (modalidade sanduíche) dos seus estudos no exterior. Além disso, tinha também em seu escopo trazer pesquisadores internacionais para o país, a fim de estabelecer parcerias com pesquisadores brasileiros (BRASIL, 201-b).

As áreas prioritárias para a seleção de bolsista para o exterior foram: Engenharias e demais áreas tecnológicas; Ciências Exatas e da Terra; Biologia, Ciências Biomédicas e da Saúde; Computação e Tecnologias da Informação; Tecnologia Aeroespacial; Fármacos; Produção Agrícola Sustentável; Petróleo, Gás e Carvão Mineral; Energias Renováveis; Tecnologia Mineral; Biotecnologia; Nanotecnologia e Novos Materiais; Tecnologias de

Prevenção e Mitigação de Desastres Naturais; Biodiversidade e Bioprospecção; Ciências do Mar; Indústria Criativa (voltada a produtos e processos para desenvolvimento tecnológico e inovação); Novas Tecnologias de Engenharia Construtiva; Formação de Tecnólogos (BRASIL, 201-a).

Os países de destino foram, no seu princípio do programa, Estados Unidos e demais países reconhecidos por seu desenvolvimento científico e tecnológico, como: Alemanha, Canadá, França, Itália e Reino Unido nas chamadas de 2011, conforme pode ser observado no Anexo A. Com o passar do tempo, foram sendo acrescentados outros países, sendo eles:

a) chamadas de 2012: Austrália, Áustria, Bélgica, China, Coréia do Sul, Espanha, Holanda, Hungria, Irlanda, Japão, Noruega, Portugal e Suécia;

b) chamadas de 2013: Finlândia e Nova Zelândia.

O critério para a escolha de parcerias não estava muito claro. O programa abrangeu países de diferentes continentes, em sua grande maioria tradicionalmente reconhecidos por serem desenvolvidos e por sua trajetória acadêmica e científica. Entretanto, não se pode afirmar que esse foi o critério de seleção dos países escolhidos como destino dos estudantes bolsistas brasileiros, porque países em desenvolvimento, como a China, e países sem trajetória acadêmica e científica, como a Hungria, estavam entre os países selecionados. Outros países de tecnologia de ponta e com destaque em pesquisas e patentes, como Israel, não fizeram parte da lista de países de destino para os bolsistas.

Segundo relatório atualizado em janeiro de 2016, o programa obteve mais de 250 mil alunos de graduação inscritos, sendo que foram contempladas 92.880 bolsas de graduação sanduíche para 30 países distintos. A distribuição de número de bolsas por país por ser observada na Figura 4.

Figura 4 – Distribuição de alunos brasileiros bolsistas do CSF por país

Pode-se afirmar que o programa tinha como foco os cursos das áreas de tecnologia e ciências e como destino os países desenvolvidos, com o intuito de promover o desenvolvimento tecnológico do Brasil. O Programa Ciência sem Fronteiras teve sua última edição com o término do governo Dilma II.

Percebe-se que no governo Dilma a política de internacionalização universitária deu sequência a alguns programas criados ainda antes d governo Lula (ex.: Programa PEC-G) e a alguns programas desenvolvidos no governo Lula (ex.: Programa MARCA), mas também assumiu uma postura de multinacionalização ou transnacionalização do ensino superior ao enviar alunos para os países desenvolvidos por meio do Programa Ciência sem Fronteiras, pois este não previu uma reciprocidade na mobilidade acadêmica discente, principalmente de alunos de graduação, grande foco do programa desenvolvido.

Por outro lado, o programa apresentou uma convergência com a estratégia de outros países emergentes, como a China, que por muitos anos fomentou a qualificação no exterior de uma massa de estudantes que estão retornando ao país para atender à demanda interna crescente por profissionais altamente capacitados. Talvez tenha sido essa a intenção da presidente, mas sem fomentar uma estratégia focada para o programa.

Neste capítulo, foi abordado o objetivo específico, conforme o Apêndice B, isto é, descrever as políticas e as principais ações de cooperação acadêmica internacional desenvolvidas ao longo dos governos Lula I e II e Dilma Rousseff II. Nesse sentindo, concluiu-se que as políticas e as principais ações de cooperação acadêmica internacional desenvolvidas ao longo do governo Lula foram os Programas IBAS, PROÁFRICA e MARCA, todos de cooperação acadêmica e científica com países em desenvolvimento, promovendo ações práticas para o discurso de política externa de cooperação sul-sul. Por sua vez, nos governos Dilma Rouseff I e II, o principal programa de internacionalização universitária foi o Ciência sem Fronteiras, que não representou uma aproximação com demais países da América do Sul, conforme apresentado em seu discurso de política externa, mas apresentou uma relação multilateral, que é uma das características do paradigma logístico da PEB.

A política de ensino superior do governo Lula foi, portanto, mais significativa no plano doméstico, com uma política de ampliação do acesso e criação de universidades. O mesmo não se pode afirmar em relação à internacionalização universitária, isto é, ampliar ou massificar o acesso à mobilidade acadêmica em nível internacional. Essa massificação da

internacionalização universitária veio somente com o governo Dilma e numa modalidade de mobilidade discente da graduação.

Quanto aos atores nacionais, tanto no governo Lula quanto no governo Dilma, foram os mesmos que assumiram os papéis de norteadores e executores da política de internacionalização universitária brasileira, sendo eles: no âmbito do Ministério das Relações Exteriores (MRE), a Agência Brasileira de Cooperação (ABC); no Ministério da Educação (MEC), a Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES); no Ministério de Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI), o Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq). Em relação aos atores internacionais, eles são distintos ao longo dos governos Lula e Dilma, por dependerem dos países com os quais o Brasil mantém as relações de cooperação acadêmica e científica, bem como das especificidades dos programas e dos projetos.

A motivação para a realização das ações de internacionalização universitária no governo Lula parece mais claramente voltada para um viés político, por meio da realização de alianças estratégicas focadas em países para atingir os objetivos de política externa. No governo Dilma, a motivação parece ser mais acadêmica, por meio do desenvolvimento de recursos humanos.

Essas características apontadas no âmbito da internacionalização universitária durante os governos de Lula e Dilma se mantiveram quando se tratou da relação com os países específicos membros dos BRICS? No próximo capítulo, serão descritas as ações de internacionalização universitária do Brasil com os demais países membros dos BRICS durante os governos Lula e Dilma.

3 POLÍTICA E AÇÕES DE INTERNACIONALIZAÇÃO UNIVERSITÁRIA

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