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Temos portanto de libertar, enraizar e desenvolver estas noções de anel (re troactivo) e de abertura (organizacional) e associá-las no seio da organização

1 — O anel: da forma genésica à forma generatriz. Organização recorrente

e reorganização permanente

No meu fim está o meu começo.

T. S. ELIOT

A) O ANEL: DA RETROACÇÃO À RECORRÊNCIA 1. Do turbilhão ao anel

Vimos que a forma rotativa é constitutiva dos motores selvagens (turbi- lhões, remoinhos).

Esta forma nasce do encontro de dois fluxos antagônicos que, inter-rea- gindo um sobre o outro, se combinam mutuamente num anel que retroage en- quanto todo sobre cada momento e elemento do processo. Este anel constitui assim a forma genésica do remoinho ou turbilhão '.

Esta forma genésica é ao mesmo tempo a forma tipo e constante, isto é, ge-

nérica dos turbilhões e remoinhos.

Esta forma genérica é organizacional; organiza o movimento centrípeto e centrífugo do fluxo; organiza a sua entrada, a sua circulação, a sua transfor- mação e a sua saída. Incessantemente,' o movimento rotativo capta o fluxo, suga-o, desvia-o, fá-lo rodopiar, diferencia-o, torna-o heterogéneo, imprime- -Ihe a forma espiral, e depois expulsa-o. Esta forma, que gera o remoinho (ge- nésica), dá-lhe o seu género (genérica), gera a cada instante a organização que regenera o turbilhão. A forma é, portanto, não só genésica e genérica, mas também generativa. E ainda, visto tratar-se de motores selvagens, é generatriz de energias cinéticas (que o homem saberá domesticar e subjugar).

O turbilhão é anel não só porque a sua forma se fecha sobre si mesma, mas porque esta forma anclante é retroactiva, isto é, constitui a retroacção do todo enquanto todo sobre os momentos e elementos particulares dos quais surgiu. O circuito retroage sobre o circuito, renova a sua força e a sua forma, agindo so- bre os elementos/acontecimentos que, de outro modo, se tornariam imediata- mente particulares e divergentes. O todo retroage sobre o todo e sobre as par- tes, que por sua vez retroagem, reforçando o todo. Se o fluxo e as condições exteriores de formação do remoinho não variam além de certos limiares de to- lerância, o remoinho pode perdurar deste modo quase indefinidamente.

A forma genésica das galáxias e das estrelas desenha-se na transformação das turbulências em turbilhões. A forma turbilhonar, que se constitui sob o efeito das interacções gravitacionais, está animada de um movimento centrí- peto e concentra-se num núcleo cada vez mais denso e quente, até à ignição. A partir daí, o movimento centrípeto do turbilhão genésico e o movimento centrí- fugo proveniente da fusão termonuclear anuiam-se e combinam-se mutuamen-

Os remoinhos constituem-se na corrente dos rios a partir dum elemento sólido fixo que, de- sempenhando um papel de ruptura, provoca por rejeição um contrafluxo de sentido inverso, o qual se combina com o fluxo de modo a criar e manter o anel rotativo.

174 EDGAR MORIN te num anel retroactivo que se identifica com a forma esférica da estrela. Per- manece todavia algo — em todo b caso no nosso Sol — das formas turbilhona- res, nomeadamente na rotação diferencial das camadas superficiais que desli- zam umas sobre as outras em relação ao núcleo central, e a periferia do turbi- lhão original prolonga-se, transformada e ordenada, na rotação dos planetas em torno do astro central.

O anel retroactivo da estrela, tal como o do remoinho, é simultaneamente genésico, genérico e generativo, quer dizer que garante o nascimento, a especi- ficidade, a existência, a autonomia da estrela. Tal como no remoinho, mas de modo muito mais notável, pois a estrela-sol é um ser organizado duma extraor- dinária complexidade^, sede de inumeráveis interacções de toda a espécie e de múltiplas actividades produtoras e motrizes, o anel, nascido espontaneamente da união que se torna complementar de dois movimentos antagónicos, garante retroacção negativa e regulação sem nenhum dispositivo informacional. O anel não nasce duma retroacção negativa ou duma regulação. Ele é a retroacção ne- gativa e a regulação. Na origem e no fundamento do ser solar existe o anel, isto é, o todo retroactivo, produtor e organizador-de-si.

O anel pode confundir-se, sob as suas espécies selvagens ou arcaicas, com uma forma turbilhonar, circular e esférica. Mas a ideia de anel não é uma ideia mórfíca, é uma ideia de circulação, circuito, rotação, processos retroactivos

que garantem a existência e a constância da forma.

2. A chave-do-afTel: retroacção e recorrência

O anel retroactivo não é uma forma, mas permanece ligado a formas rotati- vas, isto é, comporta sempre circuitos e/ou ciclos.

É um processo-chave de organização activa, simultaneamente genésico, ge- nérico e generativo (de existência, de organização, de autonomia, de energia motriz). O andamento retroactivo, nos exemplos anteriormente citados, é um processo físico (remoinhos, turbilhões), fisico-quimico (estrelas), mas não in- formacional. Nos seres vivos o andamento fisico-quimico opera-se através da circulação da informação. Aliás, o anel retroactivo emergiu na nossa consciên- cia sob a sua forma comunicacional, com o primeiro dispositivo cibernético. Mas esta emergência, em vez de extrair da sombra a ideia de anel generativo, pelo contrário, mergulhou-a ainda mais profundamente.

Com efeito, a ideia de anel regressa assim à ideia informacional: é um dis- positivo de eliminação do desvio por correcção do erro: efectivamente, nos artefactos cibernéticos, só existe o anel informacional. Ora esta visão oculta o carácter primordial do anel e desfaz aquilo que ele comporta de actividade to- talizante e integradora. É portanto superficial e atomizante. Temos pois de aprofundar e de desatomizar a ideia de anel, o que exige, mais uma vez, uma inversão de perspectiva: o anel não procede duma entidade chamada «informa- ção»; o anel precede genealógicamente a informação. Temos de introduzir a informação no anel, e não encerrar o anel na informação.

No centro do Sol está o núcleo, onde se operam as reacções termonucleares, e em seu redor a fotosfera é constituída por turbilhões incandescentes equivalentes a milhares de bombas de hidrogê- nio, depois a cromosfera e, finalmente, a coroa.

Recapitulemos os caracteres organizacionais do anel retroactivo. Dizer que

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