• Nenhum resultado encontrado

POSSÍVEIS FUNDAMENTOS DA IMPRESCRITIBILIDADE DA PRETENSÃO DE REPARAÇÃO DO DANO AMBIENTAL

COMENTÁRIOS AO ACÓRDÃO DO SUPREMO

5. POSSÍVEIS FUNDAMENTOS DA IMPRESCRITIBILIDADE DA PRETENSÃO DE REPARAÇÃO DO DANO AMBIENTAL

Ainda que se concorde com a tese fixada, consideram-se dois outros fundamentos que parecem mais adequados ao seu acolhimento.

Mencionam-se aqui, por sua consistência argumentativa, os posicionamentos dos professores Ricardo de Barros Leonel - de um lado - e Sérgio Cruz Arenhart e Gustavo Osna - de outro - para justificar a tese fixada pela Suprema Corte.

Pelo que se pode compreender de ambos, os dois posicionamentos partem do pressuposto da ausência de previsão normativa, mas buscam no próprio conjunto das normas da Constituição Federal e do Código Civil as razões que justificam o enquadramento do dano ambiental entre as hipóteses de imprescritibilidade.

Nesse contexto, o professor Ricardo de Barros Leonel defende, para os casos de dano ambiental, a aplicação analógica do art. 37, parágrafo 5º, da Constituição Federal (ubi eadem ratio, ibi eadem dispositivo) para reconhecer a imprescritibilidade de sua pretensão reparatória.

Para ele, se a Constituição Federal afasta a prescrição nos casos em que o dano atinge o patrimônio público, não há razão jurídica para que essa disposição não se estenda aos demais interesses difusos, sob pena de desconsideração da máxima maligna restringenda.

Vale dizer: não haveria razão para justificar tratamento diferenciado de interesses e direitos difusos que são igualmente relevantes.

O entendimento do professor Ricardo de Barros Leonel aproxima-se do posicionamento do Ministro Edson Fachin, mas com ele não se confunde.

Com efeito, enquanto o primeiro (Ricardo de Barros Leonel) sustenta a necessidade de aplicação analógica do dispositivo exatamente por conta da ausência de tratamento normativo expresso, não se justificando a diferença entre direitos fundamentais de mesma estatura constitucional, o segundo (Edson Fachin) propõe uma leitura ampliativa da expressão dano ao erário, constante na norma constitucional, como também compreensiva do dano ambiental.

O segundo posicionamento aqui mencionado é adotado pelos professores Sérgio Cruz Arenhart e Gustavo Osna, para quem a pretensão de reparação de danos a direitos e interesses difusos, que não são passíveis de apropriação individual, como é o caso do direito ao meio ambiente, não podem ter contra si prazo de prescrição porque não seria possível a tutela do direito por parte de seus destinatários finais.

O direito existe, mas como seu titular não pode exercer pessoalmente a pretensão de reparação (lembremo-nos que a tutela de direitos difusos ocorre por representação/

legitimação extraordinária), ou seja, não pode exigi-lo, não se pode admitir que contra ele corra prazo de prescrição, instituto cuja fonte eficiente é a inércia do titular.

A hipótese, por conseguinte, submeter-se-ia à regra de exceção do art. 198, I, do Código Civil.

A esse respeito, é preciso ressaltar que, embora o Código Civil vigente haja definido como termo inicial da contagem do prazo prescricional o momento da violação do direito, a doutrina continuou dividida, remanescendo uma segunda corrente a defender como termo inicial para contagem do prazo prescricional o momento a partir do qual a pretensão pode ser exercida, o que parece ser a solução mais ajustada à disciplina do regime jurídico da prescrição, uma vez que não se pode admitir o transcurso de prazo contra quem não pode exercitar seu direito.

Essa, inclusive, a interpretação que melhor se ajusta à compreensão conjunta dos arts. 189 e 198 do Código Civil.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A imprescritibilidade no âmbito da responsabilidade civil ambiental, a despeito da tese fixada e da sua eficácia vinculante ao Poder Judiciário, parece ainda longe de pacificar-se do ponto de vista da perspectiva dogmática.

Entre as teses sustentadas pela doutrina, as duas posições antes mencionadas -dos professores Ricardo de Barros Leonel e Sergio Cruz Arenhart e Gustavo Osna, respectivamente - parecem bastante adequadas a justificar a imprescritibilidade da pretensão de reparação de dano ambiental, a despeito da inexistência de disciplina legal específica.

Assim, tanto a equiparação, para o fim de submissão a um mesmo regime jurídico de direitos que possuem similar estatura constitucional, como o reconhecimento da impossibilidade material de correr prazo contra as futuras gerações, na medida em que não podem exercitar seu direito ao meio ambiente sadio e ecologicamente equilibrado, superam a controvérsia fundamental sobre a matéria: a inexistência de disciplina legal específica.

É preciso dizer, contudo, que o enfrentamento da matéria não pode passar ao largo da existência de disposição normativa específica no tocante a previsão de prazo prescricional para danos ambientais nucleares (Lei 6.453/1977, art. 12), seja acolhendo-se o prazo previsto em lei especial para as demais situações, acolhendo-seja concluindo-acolhendo-se por sua inconstitucionalidade, por incompatibilidade com a natureza intergeracional do direito ao meio ambiente sadio.

Seja como for, a questão está na pauta do dia dos operadores e pesquisadores do Direito, muito está por vir a partir desse passo dado pela Suprema Corte.

REFERÊNCIAS

ARENHART, Sérgio Cruz; OSNA, Gustavo. Curso de Processo Coletivo. 2ª Ed. São Paulo: RT BRASIL. Supremo Tribunal Federal Recurso Extraordinário 654.833 AC – Acre Dano ao meio ambiente.

Reparação civil. Imprescritibilidade. Brasília, DF: STF. Disponível em: h�ps://jurisprudencia.stf.jus.br/

pages/

search?classeNumeroIncidente=%22RE%20654833%22&base=acordaos&sinonimo=true&plural=true&pag e=1&pageSize=10&sort=_score&sortBy=desc&isAdvanced=true. Acesso em: 03 maio 2022.

LEITE, José Rubens Morato; AYALA, Patryck de Araújo. Dano ambiental. Do individual ao coletivo extrapatrimonial.Teoria e prática. 4ª ed. São Paulo: RT, 2011.

LEONEL, Ricardo de Barros. Manual do processo coletivo. 4ª ed., São Paulo: Malheiros, 2017.

NETO, José Valente; CUNHA. Jânio Pereira da. A repercussão Geral no Recurso Extraordinário 654.833/AC e o risco da prescrição do dano ambiental. Disponível em: h�ps://indexlaw.org/index.php/

Socioambientalismo/article/view/6623. Acesso em: 10 Mar. 2022.

SARLET, Ingo Wolfgang. A eficácia dos direitos fundamentais: uma teoria geral dos direitos fundamentais na perspectiva constitucional. 13ª ed. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2018.

- FENSTERSEIFER, Tiago. Curso de Direito Ambiental. Rio de Janeiro: Forense, 2020.

TESHEINER, José Maria Rosa. Direito Ambiental e Prescrição. Disponível em: h�p://www.ucs.br/etc/

revistas/index.php/direitoambiental/article/view/3682. Acesso em: 26 Fev. 2022.

BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Repercussão Geral no Recurso Extraordinário com Agravo n. 796.473 - Rio Grande do Sul. Relator: Min. Gilmar Mendes. Data do julgamento: 03 abr. 2014. Disponível em:

h�ps://jurisprudencia.stf.jus.br/pages/

search?classeNumeroIncidente=%22ARE%20796473%22&base=acordaos&sinonimo=true&plural=true&pa ge=1&pageSize=10&sort=_score&sortBy=desc&isAdvanced=true. Acesso em: 10 nov. 2021.

MACHADO, Marcelo Pacheco. A Correlação no Processo Civil. Relações entre demanda e tutela jurisdicional. Salvador: Juspodivm, 2015.

MENDES, Aluísio Gonçalves de Castro. Ações Coletivas no Direito Comparado e Nacional. São Paulo:

Revista dos Tribunais, 2009.

MIRANDA, Andreia Pimentel de. Quem tem medo do processo coletivo? As disputas e escolhas políticas no CPC/2015 para o tratamento da litigiosidade repetitiva no Brasil. São Paulo: Almedina, 2020.

SARLET, Ingo Wolfgang. A eficácia dos direitos fundamentais: uma teoria geral dos direitos fundamentais na perspectiva constitucional. 13ª ed. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2018.

O PRINCÍPIO DO