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2 CAPACIDADE CONTRIBUTIVA APLICADA AOS IMPOSTOS EXTRAFISCAIS

2.2 Capacidade contributiva na Constituição Federal de 1988

2.2.1 Previsão constitucional de aplicabilidade aos impostos

Majoritariamente, sustenta-se, pautando-se na redação constitucional, que a capacidade contributiva é princípio norteador apenas dos impostos, afastando-se sua aplicação das demais espécies de tributos, regidas, no caso das taxas, pela retributividade, e; no que atine às contribuições, pela remuneração ou pelo benefício auferido, traçando-se como nota distintiva a característica da referibilidade não pertencente à primeira espécie e inerente às duas últimas. O critério distintivo possui uma razão lógica para sua eleição. Ao passo que no caso dos impostos as condutas eleitas pelo Estado caracterizam atitudes reveladoras de riqueza dos sujeitos passivos, sem nenhuma interferência dele para sua configuração, evidencia-se com mais nitidez algum parâmetro relevante e mais geral a ser considerado pelo Poder Público.

Referida discussão, todavia, não mantém pertinência direta com o objeto deste trabalho, de maneira que apenas se faz a ela menção29, averiguando-se a aplicabilidade da capacidade contributiva relativamente aos impostos (extrafiscais ambientais que exprimam finalidade ambiental). Superada essa ressalva, retoma-se o raciocínio desenvolvido anteriormente para se extrair algumas consequências que também norteiam a sistemática constitucional aplicável aos impostos. Observando-se a disposição contida no §1º, do art. 145, da CF/88, infere-se que a pessoalidade, por exemplo, também advém da aplicação desse princípio, ligando-se aos aspectos do sujeito passivo que compõe a relação tributária, afetando elementos que compõem o tributo em uma espécie de interferência recíproca entre as condições do sujeito e os elementos do tributo.

Advirta-se que, muito embora se admita sem maiores controvérsias a aplicabilidade do princípio da capacidade contributiva aos impostos, não se especificou sua       

29 Para maiores informações sobre aplicabilidade da capacidade contributiva a espécies tributárias distintas dos

impostos, realça-se a explicação de Douglas Yamashita e Klaus Tipke, in verbis: “[...] apenas os impostos estão obrigados à observância do ‘sempre que possível forte’, ou seja, em seus dois aspectos: o positivo e o negativo. Os demais tributos estão sujeitos ao aspecto negativo do princípio da capacidade contributiva, ou seja, não podem ter efeito confiscatório. Contudo, o aspecto positivo da eficácia do princípio da capacidade contributiva pode variar conforme cada tipo de tributo realmente observe ou não outros princípios fundamentais, tais como o princípio da solidariedade e o da equivalência.”. (YAMASHITA, Douglas. TIPKE, Klaus. Justiça fiscal e

princípio da capacidade contributiva, p. 67.) Também ver: COSTA, Regina Helena. Princípio da Capacidade Contributiva, p.51-58.

empregabilidade a todos eles. A discussão reside em precisar se a eficácia desse princípio se irradia apenas aos impostos pessoais, e não aos reais, bem como, ainda, com maior discordância de opiniões, se interfere na sistemática da extrafiscalidade desses tributos.

Parte da doutrina inadmite a aplicação da capacidade contributiva aos impostos reais, argumentando que, como não se leva em consideração aspectos pessoais do sujeito passivo nesse tipo de imposto, inexiste a possibilidade de se extrair a incidência da capacidade contributiva nessa relação; já outra parte, admite-a, por entender que existem técnicas para que se atinja a justiça fiscal pela capacidade contributiva com o uso de métodos como o da progressividade30.

Sobre o tema, o Supremo Tribunal Federal, no julgamento do RE 562045/RS, rel. orig. Min. Ricardo Lewandowski, red. p/ o acórdão Min. Cármen Lúcia, 6.2.2013. (RE- 562045)31, compreendeu que a progressividade das alíquotas do ITCD não afronta o disposto no §1º, do art. 145, da Constituição Federal, apesar das ressalvas do relator e do Min. Marco Aurélio Mello, que se posicionavam, o primeiro, pela necessidade de expressa previsão constitucional para a progressividade, ainda mais quando o referido comando constitucional caracteriza garantia do contribuinte, e, o segundo, pela incongruência na possibilidade de exigência de iguais valores do tributo a herdeiros em situações econômicas diferentes.

Ocorre que a discussão não finda pela sua aplicabilidade aos impostos reais, acentuando-se no que tange aos impostos indiretos, notadamente quando se indaga sobre seu impacto na repercussão tributária em que, legalmente, procede-se a um desdobramento do sujeito passivo em contribuinte de fato e em contribuinte de direito, ou seja, aqueles que, respectivamente, suportam a carga tributária efetivamente e aqueles que a repassam a outros que figuram em alguma das etapas da cadeia tributária32. Apesar das críticas referentes a essa       

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Regina Helena Costa defende que a capacidade contributiva se faz aplicável aos impostos reais: “Em conclusão, parece-nos que a personalização do imposto há de ser observada sempre que a estrutura do aspecto material da hipótese de incidência o comporte, mesmo que se esteja diante dos chamados impostos reais” (COSTA, Regina Helena. Princípio da Capacidade Contributiva, p. 53.).

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Cf. BRASIL. Poder Judiciário Federal. Supremo Tribunal Federal. RE 562045/RS, rel. orig. Min. Ricardo Lewandowski, red. p/ o acórdão Min. Cármen Lúcia, 6.2.2013. Julg. em 06/02/2013, D.J.E 13/02/2013.

32 Hugo de Brito Machado Segundo realiza críticas à classificação dos tributos em diretos e em indiretos, mas, ao

explicar o que são os tributos indiretos, além de analisar a incongruência com que a matéria é tratada pelos Tribunais Superiores, os quais utilizam em, suas razões, elementos de convicção paradoxais, a exemplo de autores que possuem opiniões divergentes, assinala que “a explicação mais comumente encontrada nos manuais de Direito Tributário é a de que o tributo indireto se caracteriza por ser legalmente devido por um sujeito, mas economicamente ser suportado por outros. Daí chamar-se o primeiro de contribuinte de direito e, o segundo, contribuinte de fato.”. Para os fins deste trabalho, importa anotar a alerta que faz para uma nota distintiva dos impostos indiretos consistente em que eles “têm por fato gerador situação que revela capacidade contributiva por parte do consumidor, e não por parte do contribuinte vendedor.”. (Cf. MACHADO SEGUNDO, Hugo de Brito.

Repetição do tributo indireto: incoerências e contradições. São Paulo: Malheiros, 2011, p. 13 e 64.). Ver

ainda: MACHADO, Hugo de Brito. Tributação indireta no direito brasileiro.In: MACHADO, Hugo de Brito. (Coord.). Tributação indireta no direito brasileiro. São Paulo: Malheiros, 2013, p. 182-185.

classificação, em especial aquela que afirma que os elementos econômicos33 é que são utilizados como critério distintivo entre as espécies, ela é utilizada em julgamentos dos Tribunais Superiores, o que denota, ao menos, alguma relevância.

Face ao exposto, infere-se que a censura na aplicação da capacidade contributiva aos impostos indiretos recai na dificuldade de se aferir os elementos pessoais do sujeito passivo daquele tributo indireto. Todavia, à similitude do explicado para os impostos reais, existem técnicas para que se atinja a justiça fiscal pela capacidade contributiva, tais quais as da seletividade e da não cumulatividade34.

Uma vez traçadas essas notas e bem explicitado que aos impostos o princípio da capacidade contributiva se faz aplicável, é viável que se defenda que a capacidade contributiva oferta um meio de se controlar o uso de uma de suas expressões: os impostos extrafiscais que exprimam finalidade ambiental.

2.3 (Im)Possibilidade de aplicação da capacidade contributiva aos impostos extrafiscais que exprimem finalidade ambiental

Os questionamentos atinentes à (im)possibilidade da aplicação da capacidade contributiva aos impostos extrafiscais que exprimem finalidade ambiental caracterizam ponto de interesse relevante nesta dissertação, vez que constituem uma premissa específica para algumas das formas de controle do manuseio desses tributos, notadamente aquela que considera elementos tradutores de riqueza que se atrelam indissociavelmente ao critério extrafiscal ambiental (v.g., risco de uma atividade associada à sua despesa e qual sua relação       

33 Hugo de Brito Machado Segundo critica a utilização da repercussão econômica como elemento distintivo dos

tributos diretos e indiretos. Cf. MACHADO SEGUNDO, Hugo de Brito. Repetição do tributo indireto:

incoerências e contradições, 2011, p. 19. Regina Helena Costa afirma que: “a classificação dos impostos em

diretos e indiretos é irrelevante para o Direito, visto que sedimentada num fenômeno puramente econômico, sendo minoritário o entendimento contrário.”. (COSTA, Regina Helena. Princípio da Capacidade

Contributiva, p.53.). 34

Destaca-se a defesa da aplicação da capacidade contributiva aos impostos indiretos nas seguintes passagens: “Cremos que, mesmo na chamada imposição indireta, é viável a atuação do princípio da capacidade contributiva, que opera, em verdade, de modo diferenciado. Portanto, nesse particular, a distinção tem relevância jurídica. A dificuldade da operatividade do princípio em tal tipo de imposição reside, exatamente, na inviabilidade de se imprimir feição pessoal aos impostos indiretos, o que implica a distinta forma com que o mesmo incidirá nesse caso. A seletividade de alíquotas e a não cumulatividade do IPI e do ICMS, como veremos adiante, são expedientes que demonstram que, mesmo não sendo viável considerar as condições pessoais dos contribuintes, é possível prestigiar a noção de capacidade contributiva.”. (COSTA, Regina Helena. Princípio da Capacidade

Contributiva, 1996, p.54.). e “O princípio da capacidade contributiva vale para todos os impostos que

precipuamente serve à finalidade fiscal, independentemente da técnica da tributação. Ele vale tanto para os impostos direitos como para os indiretos. Dessa maneira, o princípio da capacidade contributiva cuida da unidade do ordenamento jurídico tributário.”. (YAMASHITA, Douglas. TIPKE, Klaus. Justiça fiscal e

princípio da capacidade contributiva, p. 32.). Ver ainda: (MACHADO SEGUNDO, Hugo de Brito. Repetição do tributo indireto: incoerências e contradições, p. 69-70.).

com o ambiente), de maneira que a suposta possibilidade de aplicação constitui uma premissa específica deste trabalho, ou, até mesmo, uma condição para seu desenvolvimento.

Faz-se mister, inicialmente, esclarecer qual a relação entre tributação e meio ambiente, um dos objetos de estudo da tributação ambiental. A harmonia da associação entre os direitos fundamentais envolvidos na relação tributária, mais especificamente os inclusos no conteúdo jurídico da capacidade contributiva, e o do meio ambiente constitui, tendo em vista ainda a noção de que os sistemas constitucionais guardam relação com a possibilidade de desenvolvimento do ser humano35, um dos interesses mais evidentes dessa temática.

Apesar do exposto, não obstante se encontre a jusfundamentalidade do direito ao ambiente ecologicamente equilibrado no art. 225, da Constituição36, reforçado pela interpretação conjunta do §1º e do §2º, do art. 5º37 dela, não se explicita de maneira pormenorizada quais as medidas que devem ser adotadas pelo Estado para a garantia da efetividade desse direito fundamental, mesmo face à previsão do inciso VI, do art. 170, da CF/88, que aponta a diretriz genérica do tratamento tributário diferenciado conforme o impacto ambiental dos produtos e dos serviços e de seus processos de elaboração e prestação38.

Nesse sentido, à medida que se destaca a importância da harmonização entre os direitos fundamentais de propriedade, de liberdade e de igualdade e o do meio ambiente39, pode-se indicar que a capacidade contributiva fornece um critério apto a verificar, em sede de impostos extrafiscais que exprimam finalidade ambiental, em que passo igualdade, liberdade e propriedade podem ser restringidas em prol da proteção ambiental. A proposta se funda na       

35 Cf. MIRANDA, Jorge. A dignidade da pessoa humana e a unidade valorativa do sistema de direitos

fundamentais. In: MIRANDA, Jorge; SILVA, Marco Antonio Marques da (Coords.). Tratado luso-brasileiro

da dignidade humana. São Paulo: Quartier Latin, 2008, p. 169. 36

Segue o texto do dispositivo constitucional: “Art. 225. Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações.”.

37 Expressamente a CF/88 assegura que: “Art. 5º [...]. §1º - as normas definidoras dos direitos e garantias

fundamentais têm aplicação imediata; § 2º - Os direitos e garantias expressos nesta Constituição não excluem outros decorrentes do regime e dos princípios por ela adotados, ou dos tratados internacionais em que a República Federativa do Brasil seja parte.”.

38 Aqui a literalidade do Art. 170, caput, e VI, da CF/88: “A ordem econômica, fundada na valorização do

trabalho humano e na livre iniciativa, tem por fim assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social, observados os seguintes princípios: [...]; VI - defesa do meio ambiente, inclusive mediante tratamento diferenciado conforme o impacto ambiental dos produtos e serviços e de seus processos de elaboração e prestação;”.

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Perfilha-se o mesmo pensamento de Fábio Gonçalves e de Janssen Murayama: “Além disso, não basta haver um fundamento ambiental para justificar a continuidade de uma tributação ecológica. É necessário que se delimite em quais hipóteses tal fundamento será capaz de restringir a liberdade de iniciativa econômica e a capacidade contributiva e de que modo tal afastamento poderá ser controlado.”. (GONÇALVES, Fábio G.; MURAYAMA, Janssen Hiroshi. Releitura do princípio da capacidade contributiva sob a ótica do direito tributário ambiental. In: GONÇALVES, Fábio F, et. al. Direito tributário ambiental, p. 42.).

possibilidade de se conseguir obter, a partir do entendimento de qual relação existe entre capacidade contributiva e finalidade extra à fiscal, um critério que possui aptidão para desempenhar papel de norteador interpretativo tendente à obtenção de uma maneira de controlar o uso de impostos extrafiscais que exprimam finalidade ambiental de modo supostamente mais objetivo (pautado em critérios aferíveis mediante constatações de situações fáticas) e, por conseguinte, limitar a liberdade de conformação do legislador.

Alia-se ao argumento anterior a consideração de que o Estado fiscal brasileiro tem que traçar sua atuação a partir do texto constitucional, sempre preservando os direitos fundamentais do cidadão-contribuinte40, mesmo quando visa, a partir da tributação, promover outros direitos fundamentais. Assim, os direitos fundamentais do cidadão-contribuinte não podem ser tão relativizados a ponto de se promover alguma finalidade, qualquer que seja ela, mesmo relativa a direitos fundamentais outros como o do meio ambiente.41

O necessário choque entre igualdade, liberdade, propriedade e meio ambiente, existente nas situações em que estão envolvidos impostos extrafiscais que exprimam finalidade ambiental, demanda cautela em seu tratamento. Intenta-se, realizada essa advertência, esclarecer que tanto a capacidade contributiva como a extrafiscalidade desempenham uma função referente aos direitos fundamentais: a primeira, de resguardo, e, a segunda, de promoção42, o que parece se coadunar à perspectiva da dupla vinculação do legislador aos direitos fundamentais43.

      

40

Identifica Paulo Caliendo, como fundamento das limitações ao poder de tributar sob o ponto de vista do pensamento sistemático, a realização de um valor: promoção e proteção dos direitos fundamentais. Cf. CALIENDO, Paulo. Direito Tributário: três modos de pensar a tributação. Elementos para uma teoria sistemática do Direito Tributário. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2009, p. 203. Ver ainda: CAVALCANTE, Denise Lucena. A atividade sancionatória do Fisco e do Cidadão-contribuinte. In: Revista da

Procuradoria Geral do Estado do Ceará, v. A-14, 2007, p. 109-114. 41

A opinião de Roque Carrazza corrobora a idéia de que não se pode promover um direito fundamental, por intermédio da tributação, restringindo em demasia os demais direitos igualmente fundametnais: “De conseguinte, não pode haver restrições excessivas, inclusive tributárias, às normas e princípios que cuidam dos direitos fundamentais.” (CARRAZZA, Roque A. O princípio constitucional da dignidade da pessoa humana e a seletividade no ICMS. Questões conexas.In: MIRANDA; SILVA (Coord.), Tratado luso-brasileiro da

dignidade humana, São Paulo: Quartier Latin, 2008, p. 1103.). 42

Sobre os princípios e a função que desempenham, Humberto Ávila enfatiza que tanto vedam as restrições a direitos fundamentais injustificadas pelo Estado, quanto carreiam o dever de promoção desses mesmos direitos fundamentais: “A esse respeito convém recordar que os princípios jurídicos funcionam de duas formas: como

direitos de defesa (Abwehrrechte), na medida em que impedem, negativamente, que o Estado adote

comportamentos que se contraponham à realização do estado de coisas cuja realização é por eles determinado; e como deveres de proteção (Schutzpflichte), já que obrigam, positivamente, que o Estado adote condutas que provoquem efeitos que contribuam para a promoção do estado de coisas por eles imposta. Em palavras singelas, os princípios não apenas proíbem que o Estado os restrinja, mas obrigam que ele os promova.” (ÁVILA, Humberto. Contribuições sobre o faturamento. Vedação do direito ao crédito na aquisição de insumos recicláveis. Exame da violação aos princípios da igualdade, da liberdade de profissão, da defesa do meio ambiente, da livre concorrência e da não-cumulatividade. Revista Dialética de Direito Tributário n. 170. São Paulo: Dialética, novembro de 2009, p. 153.). Os itálicos constam do texto original.

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A situação torna-se mais grave pela importância que o fim de proteção ao meio ambiente indubitavelmente detém, pois sua relevância poderia, teoricamente, implicar na instituição de tributos extrafiscais ambientais que não se relacionassem com a capacidade contributiva sob nenhuma de suas vertentes, ocasionando potencial desvalorização dos ditames constitucionais pela legislação infraconstitucional produzida sob a justificativa unilateral de proteção ao meio ambiente. Salienta-se o temor de que se admita que um imposto extrafiscal reste satisfatoriamente justificado, do ponto de vista constitucional, pela mera aferição de que a imposição que visa à realização da finalidade extra à fiscal (v.g., promoção do direito fundamental ao meio ambiente ecologicamente equilibrado) recai, ainda que excessivamente ou indevidamente, sobre algum elemento de riqueza.

Como dito, a complexidade do problema acentua-se, então, à medida que se verifica que o fim extra ao fiscal visado pelo Estado é o de efetivação do direito fundamental ao meio ambiente ecologicamente equilibrado. Perfilha-se que, ainda assim, o fim extra ao fiscal de promoção do meio ambiente sadio não possui, mesmo que sob o pretexto da necessidade de sua realização, aptidão para autorizar que o fenômeno tributário recaia sobre qualquer situação (v.g., as que não denotam qualquer elemento econômico ou aquelas das quais não se pode extrair um critério discriminatório idôneo), sob pena de violação de outros direitos fundamentais, tais como a propriedade e a igualdade44.

Tendo em vista todo o exposto, sustenta-se, reiteradamente, que mesmo a instituição tributária para além do fim de arrecadação não importa em autorização ao legislador para transpor determinados limites que desqualifiquem a caracterização de tributo45, ainda que a medida extra que se vise obter seja permeada por questões referentes ao direito fundamental ao meio ambiente ecologicamente equilibrado. Sob essa perspectiva é que se defende que os tributos extrafiscais que exprimem finalidade de proteção ambiental

       

na seção 4 da pesquisa. Adianta-se que dela se extrai o dever do legislador não apenas de respeitar os direitos fundamentais, mas também de promovê-los na maior medida possível.

44 Insta salientar, como feito por Eduardo Périllier e por Gustavo Oliveira, que: “[...] mesmo quando a intenção

do Estado é a de praticamente criar um obstáculo quase que intransponível ao exercício de uma atividade por meio de uma elevada carga tributária, devem ser observados os princípios que regem a atividade fiscal, tais como a vedação ao confisco, a não tributação do mínimo existêncial, a capacidade contributiva, a isonomia, dentre outros.”. (PÉRILLIER, Eduardo Barros Miranda, OLIVEIRA, Gustavo Goiabeira de. A extrafiscalidade como instrumento de controle ambiental. In: Direito tributário ambiental. GONÇALVES, Fábio F. et. al.

Direito tributário ambiental, p.110.)

45 José Marcos Domingues assevera que: “[...] a tributação ambiental fornece interessante exemplo de

conciliação da extrafiscalidade com o princípio da capacidade contributiva” (DOMINGUES, José Marcos.

Direito Tributário. Capacidade Contributiva: conteúdo e eficácia do princípio. 2ª ed. Rio de Janeiro:

submetem-se à sistemática constitucional tributária, na qual, como evidenciado, se insere a observância ao princípio da capacidade contributiva46.