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CAPÍTULO –

CONTAS DE ANGOLA 1.2.1 Considerações Gerais

1.4. OS PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS FINANCEIROS A OBSERVAR PELO TRIBUNAL DE CONTAS NO MOMENTO DA ACTIVIDADE DA

1.4.1. Aspectos gerais

1.4.2.1. Princípio da Legalidade

Historicamente, o Princípio da Legalidade surge como reacção ao arbítrio do sistema judicial e da administração pública, acabando com os inadmissíveis abusos que puseram em perigo a segurança das pessoas e dos seus haveres, ou seja, bens económicos, pois que, apenas, servia conveniências individuais e interesses da classe no poder – A nobreza e o clero, e o Direito e Lei eram interpretados, simplesmente, nas instituições predefinidas, nomeadamente: o “Clero180, a Igreja181

e a Universidade”.

Escreve que (…) Fonte de Direito é uma expressão figurativa que tem mais que do que uma significação (…), pois é; esta designação cabe (…) todos os métodos de criação jurídica em geral. - Diz ainda que: “uma norma geral é fonte da decisão judicial que a aplica e que é representada por uma norma individual. Mas a decisão judicial também pode ser considerada como fonte dos deveres ou direito das partes litigantes por ela estatuídos, ou da atribuição de competência ao órgão que tem de executar a decisão.

- Mas a expressão é também empregada num sentido não jurídico quando com ela designamos todas as representações que, de facto, influenciam a função criadora e a função aplicadora do Direito, tais como, especialmente, os princípios morais e políticos, as teorias jurídicas, pareceres de especialistas e outros.

- Conclui este autor que (…) aplicação do Direito é simultaneamente produção do Direito (…), e , (…) por aplicação da Constituição, opera-se a criação das normas jurídicas gerais através da legislação e do costume e, em aplicação destas normas gerais , realiza-se a criação das normas individuais através das decisões judiciais e das resoluções administrativas.

180 Os homens do clero eram, de entre a população crista, os únicos que tinham cultura literária.

Eram também os que estavam mais bem organizados: dispunham de Direito próprio, hierarquia própria e exercia um poder cuja raiz era diferente da do poder civil. Mais desenvolvimento ver SARAIVA, JOSÉ HERMANO – História de Portugal, Publicações Europa América, 8ª edição, 2011, Pág. 70.

181 Ibidem – A Igreja representava Deus no Mundo e Deus estava muito acima de todos reis. O poder

Francisco Mário – O Controlo Jurisdicional dos Dinheiros Públicos em Angola

85 Entretanto, ela surge basicamente ligada a duas matérias nas quais revela, melhor do que qualquer outra, a condição dos súbditos e cidadãos livres, dos membros de uma comunidade182. Ora, foi precisamente na definição dos delitos e

das penas (Princípio da Legalidade Penal) – Nullum Crime Sine Legem –, e o estabelecimento de tributos (Princípio da Legalidade Tributária) – Nullum Tributo Sine Legem –, que se deu a primeira manifestação do Princípio da Legalidade.

Mas HANS KELSEN já havia estabelecido o Estado de Direito como sendo um Estado de Legalidade, uma vez que actua por via do Direito positivamente identificado com a Legalidade e não porque defende ou sustenta uma particular ideia de Direito183.

Por seu turno, GOMES CANOTILHO, da Escola de Coimbra, assevera uma abordagem na perspectiva da Legalidade Administrativa-Constitucional, exprimindo que o Princípio da Legalidade postula dois subprincípios:

a) Subprincípio da Supremacia ou Prevalência da Lei;

Isto porque, num Estado Democrático de Direito, ou Democrático- Constitucional, a Lei Parlamentar é, ainda, a expressão privilegiada do Princípio Democrático. Daí a sua supremacia na Ordem Jurídica Financeira Angolana, nos termos do Art.º 6º, da CRA, Art.º 4º da Lei n.º3/10, de 25 de Março, sendo tida como fonte de Direito184.

b) Subprincípio da Reserva da Lei.

Como instrumento mais apropriado e seguro (Art.º 28º, nº 2, da CRA) para definir os regimes em certas matérias185, sobretudo relativamente aos direitos

fundamentais e da construção da Democracia Financeira do Estado, daí a Reserva da Lei, o que significa dizer que os actos que definem o regime da actividade de controlo jurisdicional do Tribunal de Contas devem estar em conformidade com a Lei, legitimado por uma fonte normativa ou de produção normativa própria, isto é, com poderes legalmente prescritos, para não escamotear o Princípio Geral da

182 NUNES, RANGEL ELISA – Lições de Finanças Públicas e Direito Financeiro, 3ª edição, 2011, Pág.

78 e 79.

183 Apud, NOVAIS, JORGE REIS – Contributo para uma Teoria do Estado de Direito, Almedina, 2006,

Pág. 121 e 122.

184 Ver o Art.º 1º, do CC.

185 CANOTILHO, J. GOMES – Direito Constitucional e Teoria da Constituição, 7ª edição, Almedina, Pág.

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86 Segurança Jurídica e da Protecção da Tutela da Confiança dos Cidadãos votantes e da garantia dos contribuintes e dos gestores da coisa pública (Art.º 198º, da CRA).

Entretanto, o Princípio da Legalidade é aquele que prescreve as garantias e os direitos fundamentais e figuras afins, porque assegura essencialmente a relação estabelecida entre aqueles que têm o mandato de administrar e gerir a coisa pública, em nome dos contribuintes, e os que têm o mandato de controlar ou fiscalizar a sua actividade de gestão financeira, em nome do povo contribuinte, o que é uma exigência legal e de justiça de auto-normação (ou auto-imposição) no campo financeiro. Isto é, os próprios contribuintes devem, através dos seus representantes, determinar o modelo e regime de controlo financeiro que lhes aprouver, das suas finanças públicas de acordo com a Constituição, como vem exposto no Art.º 104º, da CRA.

O Estado de Direito de Controlo e da Justiça Financeira tem como fundamento e limite a Lei, como critério para a sua validade e eficácia. Dito de outro modo, as actuações dos Órgãos de Soberania (Art.º 105º, da CRA), no caso vertente, a actuação do Tribunal de Contas, têm como o limite a CONSTITUIÇÃO e o respeito pelas Leis Ordinárias, pelo Direito Internacional que integre a Ordem Jurídica Angolana, nos termos permitidos pelo Art.º 13º, da CRA, bem como pelos Princípios Gerais do Direito186.

Portanto, isto implica dizer que os operadores do Direito e da Justiça, no plano de controlo financeiro, devem actuar segundo as Fontes de Direito escrito ou Direito não escrito187, mas vigente, e em conformidade com os valores morais e da

ética financeira que presidem a sociedade Angolana.

Como bem sustenta MARIA D’OLIVEIRA MARTINS, “a penetração das ideias da economia e eficácia no Direito Financeiro, (…) alarga ainda mais este conceito

186 Neste sentido são PRINCÍPIOS FUNDAMENTAIS DO DIREITO:

1 – O Princípio Estruturante do Estado Democrático de Direito (vide, Art.º 2º, da CRA);

2 – Os Princípios Fundamentais Expressos na Declaração Universal dos Direitos Humanos (DUDH);

3 – O Princípio de Direito Internacional Geral, Direito Comum das Nações Civilizadas; 4 – O Princípio do Ordenamento Jurídico Interno.

187 Cfr. AAVV. BACHOF, OTTO – Direito Administrativo, Vol. I, Tradução de FRANCO, ANTÓNIO

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87 de legalidade financeira, distinguindo-o em relação à tradicional forma de entendimento de legalidade”188.

Aliás, como elucida o Professor PAZ FERREIRA, “tal construção não vem questionar a sujeição das despesas públicas à exigência da conformidade com Lei, mas apenas alargar o seu âmbito, tornando o Princípio da Legalidade um conceito mais amplo e exigente”189.

Portanto, este princípio opõe-se ao Princípio de Oportunidade, na medida em que decorre do processo da construção do Estado Democrático de Direito, baseado na ideia do Direito, cujas normas tributam a formação da vontade do Estado e de Justiça Financeira190, no sentido do Direito Legalista de controlo jurisdicional dos

dinheiros públicos.