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PROBLEMÁTICA: A (IN)COMPATIBILIDADE DA NORMA INTERNACIONAL FACE A LEGISLAÇÃO INTERNA

INCLUSÃO DAS PESSOAS COM DEFICIÊNCIA NO ACESSO AOS CARGOS E EMPREGOS PÚBLICOS: POSSÍVEL COMPATIBILI-

3. PROBLEMÁTICA: A (IN)COMPATIBILIDADE DA NORMA INTERNACIONAL FACE A LEGISLAÇÃO INTERNA

A definição de pessoa com deficiência é de fundamental importância, mor- mente quanto à reserva de vagas em concursos públicos, uma vez que a Admi- nistração Pública necessita de critérios objetivos para aferir o preenchimento dos requisitos para o candidato beneficiar da reserva de vagas. Some-se, ainda, que o concurso público atende aos princípios da igualdade e impessoalidade. Sendo assim, caso não se tenha critérios claros, é possível que fiquem excluídos da proteção legal quem dela efetivamente necessita, ao mesmo tempo em que se corre o risco de estendê-la a quem não faz jus.

A definição de pessoa com deficiência prevista na convenção em seu artigo 1.º:

Pessoas com deficiência são aquelas que têm impedimentos de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, os quais, em interação

com diversas barreiras, podem obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdades de condições com as demais pessoas11.

A definição de pessoa com deficiência previsto na Convenção é aberto e abrangente, uma vez que, ao lado da deficiência em si, agrega o ambiente econômico e social no qual se insere o destinatário da proteção, ao se referir às interações com diversas barreiras. Ante essa peculiaridade, a própria Con- venção reconhece ser a deficiência um conceito em construção, que resulta da interação de pessoas com restrições e barreiras que impedem a plena e efetiva participação na sociedade em igualdade com os demais. A deficiência deve ser vista como o resultado da interação entre indivíduos e seu meio ambiente e não como algo que reside intrinsecamente no indivíduo.

No atual Estatuto da Pessoa com Deficiência no Brasil (Lei n.º 13.146/2015) repete-se, ipsis litteris, a definição prevista na Convenção (artigo 2.º). Todavia, o Estatuto vai além e prevê a possibilidade de avaliação da deficiência por critério biopsicossocial, a ser realizada por equipe multiprofissional e interdis- ciplinar, conforme preceitua o §1.º do artigo 2.º da Lei, o qual se transcreve:

Art. 2.º – Considera-se pessoa com deficiência aquela que tem impedimento de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, o qual, em intera- ção com uma ou mais barreiras, pode obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas.

§ 1.º A avaliação da deficiência, quando necessária, será biopsicossocial, reali- zada por equipe multiprofissional e interdisciplinar e considerará:

I – os impedimentos nas funções e nas estruturas do corpo; II – os fatores socioambientais, psicológicos e pessoais; III – a limitação no desempenho de atividades; e IV – a restrição de participação.

§ 2.º O Poder Executivo criará instrumentos para avaliação da deficiência12.

11 GOMES, Joaquim B. Barbosa. Instrumentos e métodos de mitigação da desigualdade em direi-

to constitucional e internacional. Rio de Janeiro, Disponível em <www.mre.gov.br>. Acessado

em 10 de outubro de 2017.

12 Disponível em < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/2001/d3956.htm>. Acessa-

Não obstante a previsão de avaliação da deficiência pelo critério biopsicos- social, a referida regra está com sua vigência suspensa em até dois anos, con- forme o artigo 124 do Estatuto “Art. 124. O § 1.º do art. 2.º desta Lei deverá entrar em vigor em até 2 (dois) anos, contados da entrada em vigor desta Lei.” Assim, enquanto referida regra não entra em vigor, ainda prevalece, no âmbito interno, a definição de pessoa com deficiência prevista na legisla- ção anterior ao Estatuto, considerando ainda que a Lei n.º 7.853/1989 e o Decreto n.º 3.298/1999 não foram revogados.

Portanto, ainda prevalece a definição de pessoa com deficiência previsto no Decreto n.º 3.298/1999, com as alterações promovidas pelo Decreto n.º 5.296/2004, principalmente para fins de reserva de vagas em concurso público, conforme consta em seu artigo 4.º, o qual se transcreve:

Art. 4.º É considerada pessoa portadora de deficiência a que se enquadra nas seguintes categorias:

I – deficiência física – alteração completa ou parcial de um ou mais segmentos do corpo humano, acarretando o comprometimento da função física, apresentando- -se sob a forma de paraplegia, paraparesia, monoplegia, monoparesia, tetraplegia, tetraparesia, triplegia, triparesia, hemiplegia, hemiparesia, ostomia, amputação ou ausência de membro, paralisia cerebral, nanismo, membros com deformidade congênita ou adquirida, exceto as deformidades estéticas e as que não produzam dificuldades para o desempenho de funções;

II – deficiência auditiva – perda bilateral, parcial ou total, de quarenta e um decibéis (dB) ou mais, aferida por audiograma nas freqüências de 500HZ, 1.000HZ, 2.000Hz e 3.000Hz;

III – deficiência visual – cegueira, na qual a acuidade visual é igual ou menor que 0,05 no melhor olho, com a melhor correção óptica; a baixa visão, que signi- fica acuidade visual entre 0,3 e 0,05 no melhor olho, com a melhor correção óptica; os casos nos quais a somatória da medida do campo visual em ambos os olhos for igual ou menor que 60.º; ou a ocorrência simultânea de quaisquer das condições anteriores;

IV – deficiência mental – funcionamento intelectual significativamente infe- rior à média, com manifestação antes dos dezoito anos e limitações associadas a duas ou mais áreas de habilidades adaptativas, tais como:

a) comunicação; b) cuidado pessoal; c) habilidades sociais;

e) saúde e segurança; f) habilidades acadêmicas; g) lazer; e

h) trabalho;

V – deficiência múltipla – associação de duas ou mais deficiências.

Infere-se da leitura do Decreto n.º 3.298/1999, que a definição de pes- soa com deficiência nele prevista, embora importante para subsidiar a Admi- nistração Pública na aferição da qualificação do candidato como pessoa com deficiência, não está em sintonia com a Convenção Internacional sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência, uma vez que desconsidera o ambiente no qual inserido a pessoa com deficiência.

Ademais, verifica-se, também, que estabelece critérios rígidos, o que, a depender das circunstâncias, pode excluir da proteção pessoas que dela efeti- vamente precisam.

4. ENTENDENDO O CONFLITO NORMATIVO ENTRE TRA-

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