• Nenhum resultado encontrado

5. O VETO PRESIDENCIAL NO STF: UMA VERTENTE DA RELAÇÃO ENTRE OS

5.1. Procedimentos do Veto

Reuni neste grupo casos que arguiam qual seria o procedimento correto para a oposição do veto, pelo Executivo. Nesses casos, questiona-se a validade do veto por supostos vícios procedimentais. A tabela a seguir traz as principais informações desses casos.

Tabela VII – Grupo 1 - Casos de Procedimentos do veto

Tabela 7 - Grupo 1 - Casos de Procedimento do veto. BISPO, Nikolay Henrique. Fonte: planilha de casos - Apêndice IV.

Ao total, este grupo contém oitos casos. São casos com decisão colegiada e a maioria está atrelada ao período da CF/46 (cinco casos). Em termos de arguidores, cidadão figura em quatro casos, Executivo (municipal e estadual) em dois, Legislativo figura com interesse na causa em um caso (RE 45631) e Partido Político em um caso. Com exceção da

Grupo 1 - Casos de Procedimentos do veto

Instrumento e nº Relator Decisão Colegiada ou Monocrática? Proponente Autoridade Coatora Data da Propositura Data do Julgamento Duração dos autos (propositura a julgamento) A favor de quem? RC 994 Rocha

Lagoa Colegiada Cidadão

Justiça

Pública 1953 13/11/1953 +/- 1 ano Executivo RE 25601 Ribeiro da Costa Colegiada Cidadão – Serventuário do TJ Estado de SP 1950 27/12/1954 +/- 4 anos Executivo RMS 2920 Mário Guimarães Colegiada Cidadão - Serventuário do TJ ALESC e Governador do SC 1954 19/01/1955 +/- 1 ano Executivo

Rp 432 Ari Franco Colegiada Não identificado

Governador de PE Não contém informação 22/01/1960 +/- 1 ano Procurador Geral da República Rp 493 Antônio

Villas Boas Colegiada Governador de MT ALEMT

Não contém informação 19/08/1963 +/- 2 anos Legislativo (ALEMT) RE 45631 Barros

Monteiro Colegiada Cidadão/legislativo

Governador do PR Não contém informação 25/03/1968 +/- 21 dias Legislativo (ALEPR) MS 15226 Hermes Lima Colegiada Prefeito de Pouso Alegre Câmara de Pouso Alegre Não contém informação 03/03/1996 Indisponível Legislativo (CM de Pouso Alegre) ADI-MC 1491 Carlos Velloso Colegiada PT; PDT Congresso Nacional e Presidente da República 14/08/1996 08/05/2014 17 anos e 9 meses. Executivo e Congresso Nacional (maioria)

ADI-MC 1491, todos os casos do grupo questionam autoridades estaduais (seis casos) ou municipais (um caso).

Nos oito casos o STF entendeu presentes os pressupostos de conhecimento da ação e se declarou competente para analisar o caso; portanto, o STF controlou o caso. Apesar desse número de casos controlados, apenas em um (Rp 432) o STF declarou o ato inconstitucional; o que significa dizer que o STF alterou o status quo da questão, visto que, antes da decisão ela estava posta de uma forma e após a decisão da Corte essa é alterada.

O caso da Rp 432 ocorre em Pernambuco, no fim da década de 1950 e início da década de 1960 (a decisão foi em janeiro de 1960). O governador de Pernambuco teria apresentado veto a um projeto de lei e dois dias depois teria decidido não mais vetá-lo. Como forma de mostrar o arrependimento pelo seu ato, o governador sanciona, promulga e publica a lei de forma integral. O Legislativo estadual, Assembleia Legislativa do Estado de Pernambuco (ALEPE), manifestou-se no processo de maneira favorável à decisão do governador. Inconformado com essa prática, o procurador-geral da república patrocinou a causa, mas não fica claro qual seria a autoridade interessada no caso, conforme já mencionado.

O STF decidiu, de maneira unânime, que o trâmite adequado para esse arrependimento seria usar da “diplomacia” frente à ALEPE, pois a partir do momento em que o veto é oficialmente oposto, não há direito de arrependimento e deve seguir o trâmite regular que determina a constituição, ou seja, a apreciação do veto pelo Legislativo. Isso fica evidente no voto do ministro relator Ari Franco:

O presidente pode usá-lo (veto) só uma vez e, uma vez usado, não pode arrepender-se. Tem de passar pelos trâmites que a Constituição lhe determina. Páginas adiante, êle timbra em mostrar que o que perfaz o veto é a devolução. Ora, desde que o Governador havia vetado a lei, a solução estaria naquilo que, por vêzes, é usado pelo Presidente da República e foi posto em relêvo pelo ilustre advogado, com muita oportunidade: é aconselhar o Congresso a rejeitar o veto (no caso, seria a assembleia Legislativa). Longe do entendimento que dá o Dr. Procurador Geral da República ao assunto, em penso que o Governador bem se houve nesta representação, porque atenta contra a independência e harmonia dos poderes e torna inconstitucional a lei.

(...)

Assim sendo, acolho a representação, remetendo o processo à Assembléia Legislativa para que se manifeste sôbre o veto que o Governador retirou (Rp 432, p. 5-6 – eletrônica) (grifos meus).

O ministro relator sugeriu, e foi seguido por mais um voto disponível no caso, que diante da apresentação do veto, por não haver mais abertura ao Executivo formalmente para a

alterar o seu ato, o caminho seria a diplomacia, no sentido de dialogar com o Legislativo e incentivar, ou convencer, esse a rejeitar o veto.

O STF realiza o controle das questões nesses casos, mas, seguindo os seus limites formais, pois a decisão reflete a CF/46, que não prevê a possibilidade de arrependimento formal do veto, pelo Executivo.

Nos outros sete casos, o STF decidiu não alterar o status quo das questões quanto ao procedimento do veto, mas, assim como no caso anterior, é possível extrair regras quanto ao procedimento do veto.

Referente aos cinco casos ocorridos no período da CF/46, o STF decidiu que o prazo dos 10 dias para oposição do veto (artigo 70, § 2º) era peremptório, devendo o Executivo cumpri-lo. No entanto, que a contagem do prazo deveria seguir o calendário do poder Executivo (contando apenas os dias úteis e excluindo os finais de semana e feriados) (RMS 2920). Também ficou decidido que o veto seria juridicamente válido a partir do momento em que ele fosse oposto e não a partir da sua publicação (RC 994). O STF decidiu, além disso, que se o Executivo não apresentasse o veto no prazo de 10 dias, o projeto de lei seria considerado aprovado (artigo 70, §2º, da CF/1946) e deveria o Legislativo sancionar tal diploma (Rp 493). Esta última decisão não ampliando ou diminuindo a prescrição constitucional, mas apenas a aplicando. Por último, decidiu o STF que o Executivo pode vetar projeto de lei que não seja de sua iniciativa. Assim sendo, projetos de lei de origem dos demais poderes devem seguir o trâmite comum traçado pela constituição, passando pela fase Executiva do processo legislativo de criação das leis (RE 25601).

O entendimento de que passados os 10 dias o projeto considera-se aprovado é repetido no RE 45631, mas já referente à CF/67. O STF, além de confirmar esse entendimento, concluiu que se o projeto for aprovado automaticamente, por inércia do Executivo, eventual vício procedimental será convalidado.

Sob égide da CF/88, o STF confirma a interpretação das decisões ocorridas no período da CF/46, e afirma que se o Executivo não exercer no prazo constitucional (15 dias) a oposição do veto, esse será considerado aprovado e deve o Legislativo sancioná-lo (artigo 66, §3º). Dessa forma, o entendimento de aplicação do texto da constituição, de forma literal, mantém-se, apenas adaptando-se quanto ao prazo em si (MS 12226). O STF também decidiu que o veto parcial a projeto de lei, previsto pela CF/88, em seu artigo 66, §§ 1º e 2º, pode abranger texto integral de artigo, parágrafo, inciso ou alínea, de maneira autônoma; dito de outra forma, ficou decidido que é juridicamente válido veto que abranja apenas caput de

artigo e deixe os respectivos incisos ou parágrafos vigentes, desde que eles tenham condições de subsistência de maneira individual (ADI-MC 1491).

Gráfico 10 – Grupo 1 - Tempo de Decisão

Gráfico 10 - Grupo 1 - Tempo de decisão. BISPO, Nikolay Henrique. Fonte: Apêndice IV.

Quanto ao tempo de duração, a média geral é de 1397 dias para resolver casos envolvendo procedimento de veto. Este prazo, a partir do critério inicial adotado no tópico anterior, é muito superior aos dois anos, praticamente sendo o dobro. Contudo, algumas considerações devem ser feitas antes de uma conclusão desse tipo.

A primeira consideração é que todos os casos foram decididos de forma colegiada, o que, hipoteticamente, é uma variável que necessita de tempo diferente das decisões monocráticas. A segunda consideração é que, como destacado no início deste tópico, a maioria dos casos são de níveis estaduais e municipais; o que, devido a não ser possível propositura direta no STF das questões, potencialmente aumenta o prazo entre o problema e a decisão da Corte.

Além disso, isolando os casos que têm prazos fora do padrão dos demais, ADI- MC 1491, RE 45631 e RE 25601, a média cai para, aproximadamente, 369 dias, o que equivale a um ano. Isso, dentro do critério geral adotado, é um prazo aceitável.

O menor tempo de resolução deste grupo foi o RE 45631, que durou 21 dias; não consigo criar qualquer hipótese para essa situação, porque não tem um padrão de repetição de casos com esse instrumento, neste grupo.

O maior tempo foi o da ADI-MC 1491. Essa ação foi protocolada em 14 de agosto de 1996, com pedido liminar, e só foi decidida em 08 de junho de 2014, são dezessete anos e nove meses, apenas para a decisão de indeferimento da liminar. O caso ainda não teve o mérito julgado. Uma hipótese para esse prazo é a complexidade do caso, que traz questionamentos de constitucionalidade quanto ao regime de exploração dos serviços de telecomunicações (Lei 9.295/1996).

Concluindo este tópico, é possível constatar que, nesses casos, o STF controla casos envolvendo o veto, mas que, excepcionalmente, altera o status quo da questão apresentada. Apesar disso, é possível extrair algumas interpretações que, potencialmente geram regras, quanto ao procedimento de oposição do veto, sendo elas:

(1) O prazo de oposição do veto é peremptório, o que significa que após o fim desse prazo o projeto de lei é considerado aprovado pelo Executivo. E se este não publicar, deve o presidente do Senado o fazer. Seguindo, assim, prescrição expressa da constituição (RMS 2920; RE 45631; MS 12226). E caso haja vício, o Executivo não pode argui-lo após esse prazo (Rp 493). (2) Não é admitido o arrependimento do veto, formalmente. Assim que

apresentado, não há meios formais para alterar a decisão (Rp 432).

(3) É juridicamente válido e vigente o veto, a partir da sua apresentação e não da sua publicação (RC 994)78.

(4) Independente da iniciativa do projeto de lei, o processo legislativo de criação das leis seguirá o trâmite constitucional geral, caso não seja previsto nenhum outro procedimento. Assim, existirá a fase Executiva e pode o chefe do poder Executivo vetar o projeto de lei, mesmo que não seja de sua iniciativa ou do Legislativo (RE 25601).

(5) O veto parcial pode abranger texto integral de artigo, parágrafo, inciso ou alínea, de maneira autônoma, desde que não fique prejudicada as condições de subsistência desses (ADI-MC 1491).

As características desses casos são de situações em que se tornam evidentes os conflitos entre o poder Executivo e o poder Legislativo, mas que não aparentam ser urgentes. Contudo, é possível verificar como as autoridades se relacionam nesses casos.

78 Tenho algumas dúvidas quanto, ainda, a validade dessa interpretação. Uma vez que, atualmente, juridicamente, só existe o veto após a sua publicação formal, pois os seus efeitos só começam quando o ato se torna público.