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Transformando a questão política em jurídica: a atuação do STF no MS-MC 31816

6. O STF COMO PLAYER DO JOGO POLÍTICO: UM ESTUDO DE CASO SOBRE O

6.2. Transformando a questão política em jurídica: a atuação do STF no MS-MC 31816

A partir do dia 12 de dezembro de 2012 começaram a ser impetrados MSs questionando o ato do Legislativo federal em adotar medida de urgência, na votação do VP 38/2012, por supostas violações à CF/88 e ao RICN. Ao total, esta pesquisa contou com sete documentos questionando a medida adotada e que foram protocoladas até o dia 19 de dezembro de 2012, sendo esses acoplados em quatro casos: MS 31816, MS 31814, MS 31828 e MS 31832107.

Os proponentes são parlamentares federais pertencentes ao grupo de Entes Produtores e Afetados. O MS 31814 foi proposto pelo senador Lindberg Farias (PT/RJ) e outros parlamentares; o MS 31828 pela senadora Ana Rita Esgario (PT/ES) e outros parlamentares; o MS 31816 pelo deputado federal Alessandro Molon (PT/RJ); e o MS 31821 pelo senador Magno Malta (PR/ES).

A questão política apresentada no tópico anterior foi levada, em termos jurídicos, ao STF, com a seguinte formulação: ao acatar o requerimento de urgência e passar o VP 38/2012 à frente de outros vetos, o presidente do Senado violou o direito líquido e certo à observância do devido processo legislativo, incorrendo nas seguintes violações às normas de regência (MS-MC 31816, p. 5-6)108:

(a) Ofensa ao art. 66, §§ 4º e 6º, da Carta de 1988, configurada por duas circunstâncias: (i) pela criação de “um inusitado regime de urgência

107 São sete documentos, porque há dois MSs decisão quanto ao pedido cautelar, o que gera a nomenclatura “MC” aos MSs e gera outro documento de análise, distinto do primeiro; e, além disso, há o agravo regimental no MS 31816, que também gera outro documento distinto. O que, somando-os, totalizam-se em sete documentos. 108 A mídia especializada chamava a atenção para o Bullyng Federativo sofrido pelas minorias parlamentares, nesse caso. Isso porque, representando a minoria parlamentar na situação, os Entes Produtores e Afetados viam um esforço do resto do Congresso em superar o vetos da maneira mais rápida possível, mesmo que para isso tivesse de violar regras procedimentais. Dessa forma, liderados por Molon, esse grupo fez o que a mídia chamou de rolo compressor de defesa das minorias parlamentares (CONSULTOR JURÍDICO, 2012).

sem qualquer amparo na Constituição”, o qual, a rigor, sequer faria sentido

em matéria de apreciação dos vetos, porquanto sujeitos a prazo peremptório de 30 dias para sua análise; e (ii) pela apreciação “aleatória ou voluntarista” dos vetos presidenciais a projetos de lei, que já se acumulam em número superior a 3.000 (três mil), alguns deles pendentes há mais de uma década. Alega que a análise dos vetos deveria seguir critérios objetivos e razoáveis, não podendo flutuar puramente ao sabor das conveniências políticas;

(b) Desrespeito ao direito constitucional das minorias parlamentares, traduzida na criação de um procedimento legislativo ad hoc, aplicável tão somente a um veto específico, em franco prejuízo do debate justo, racional e transparente do tema, como evidenciam algumas manifestações realizadas naquela sessão legislativa por parlamentares contrários ao requerimento, as quais teriam sido completamente ignoradas pelo bloco político majoritário; (c) Afronta a diversos dispositivos regimentais do Congresso Nacional, notadamente daqueles que (i) impedem a apreciação de matérias que não estejam na ordem do dia; (ii) exigem a constituição de Comissão Mista para elaborar relatório acerca dos vetos presidenciais; e (iii) estipulam que eventuais lacunas normativas devam ser colmatadas prioritariamente com recurso ao Regimento do Senado Federal (e não ao da Câmara dos Deputados).

Os pedidos feitos nesses casos eram para que o STF concedesse a segurança e impedisse a votação do VP 38/2012 e, que no mérito a concessão da segurança de maneira definitiva, determinando a votação dos vetos antigos anteriores ao VP 38/2012. O fundamento para concessão da liminar foi que a manutenção do veto garantiria a aplicação das regras antigas, não havendo riscos, diferente do que ocorreria se os vetos fossem rejeitados.

Portanto, a alegação política foi traduzia em dois argumentos complementares: (i) inconstitucionalidade da prática de votação de veto adotada pelo Congresso,

por desrespeito à regra do artigo 66 da CF/88. Segundo essa regra, se o veto não fosse analisado pelo Congresso Nacional em até 30 dias, a pauta de votação seria bloqueada e o veto entraria na pauta de discussão da sessão subsequente. A partir dessa lógica, não se pode alegar urgência de um veto frente aos outros, pois a pauta de votação estaria suspensa até a votação do veto mais antigo;

(ii) Irregularidade procedimental, pois o RICN não prevê adoção de regime de urgência em veto presidencial; e por não seguir os trâmites dos artigos 104 e 105 que determinam a convocação da comissão mista, antes da votação quanto a qualquer veto.

O caso julgado pelo STF, e analisado neste momento, foi o MS-MC 31816, protocolado no dia 13 de dezembro de 2012, e no dia 17 de dezembro do mesmo ano o STF pronunciou-se sobre o caso, por meio de decisão liminar, do ministro relator Luiz Fux.

A decisão do ministro foi de conhecer a ação e deferir a liminar.

Como apresentado no tópico 5.6, pela primeira vez o STF estava superando a sua jurisprudência de que em casos de controle de pauta de votação quanto ao veto, apesar de poderem ser controladas, não podem ter liminar deferida por conta de a decisão liminar antecipar a decisão de mérito.

Os argumentos utilizados pelo ministro, para a concessão da medida, foram variados, mas todos encampados de justificativas e racionalidade jurídica. O que significa que, apesar de ser uma decisão com consequências na política, a sua justificativa foi com bases e formulação jurídica; o que se espera de decisões do STF, mesmo que se trate de questões com impactos políticos, como defendido no capítulo 3.

O primeiro argumento do ministro foi no sentido de especificar a diminuição do campo de diferenciação entre questões políticas (interna corporis) e questões jurídicas, por meio do raciocínio do direito constitucional moderno de que a constituição prevê os limites à democracia, para se garantir a democracia. Apesar de parecer redundante, o raciocínio do ministro é bem formulado e interessante, segundo a teoria constitucional, a constituição atribui limites à soberania da vontade popular. E, para o ministro, cabe à jurisdição constitucional a cautela de análise e definição desses limites. A seguir, destaco trecho da decisão:

A controvérsia travada nestes autos atinge o cerne da teoria constitucional em um Estado Democrático de Direito na medida em que conclama que o Supremo Tribunal Federal se pronuncie sobre a validade jurídica do processo de elaboração das leis, núcleo fundamental da atuação política exercida pelos representantes do povo. Indispensável, por tal motivo, uma incursão, ainda que breve, sobre os limites da atuação do Poder Judiciário em um regime democrático. Os ideais da democracia e do constitucionalismo – não obstante caminhem lado a lado – vez por outra revelam uma tensão latente entre si. É que, de um lado, a democracia, apostando na autonomia coletiva dos cidadãos, preconiza a soberania popular, que tem na regra majoritária sua forma mais autêntica de expressão. De outro lado, o constitucionalismo propugna pela limitação do poder através de sua sujeição ao direito, o que impõe obstáculos às deliberações do povo. (...) Essa aparente contradição entre os valores albergados pelo Estado Democrático de Direito impõe um dever de cautela redobrado no exercício da jurisdição constitucional. Com efeito, é certo que os tribunais não podem asfixiar a autonomia pública dos cidadãos, substituindo as escolhas políticas de seus representantes por preferências pessoais de magistrados não eleitos pelo povo. (...) Nesse sentido, a Constituição não pode ser vista como repositório de todas as decisões coletivas, senão apenas dos lineamentos básicos e objetivos fundamentais da República. Deve-se, portanto, rechaçar qualquer leitura maximalista das cláusulas constitucionais que acabe por amesquinhar o papel da política ordinária na vida social. Sem embargo, não se pode perder de mira que a Constituição

representa autêntica norma jurídica, dotada de força cogente, vocacionada a conformar condutas e apta a ensejar consequências pelo seu descumprimento. De há muito as Constituições deixaram de ser

vistas como mera “folha de papel”, como sugeria Ferdinand Lassale (A

essência da Constituição. Rio de Janeiro: Liber Juris, 1988), para assumir a posição de centralidade no sistema jurídico, enquanto definidora dos cânones estruturantes do Estado de Direito.

A efetividade da Constituição depende, em grande medida, da atuação das cortes, as quais, embora não monopolizem a sua interpretação, têm como função precípua fiscalizar a observância e zelar pelo respeito das limitações constitucionais, cuja própria existência, como apontava Alexander Hamilton, “somente pode ser preservada por

meio do Judiciário, cuja função deve ser a de declarar nulos todos os atos contrários ao conteúdo manifesto da Constituição. Sem isso todos os direitos e prerrogativas não significariam nada” (MS-MC 31816, pp. 6-8)

(grifos meus).

Superado o primeiro ponto, e entendendo existir competência ao STF para julgar a questão, o ministro passou para o segundo argumento, desenvolvendo a importância do veto e o procedimento constitucional estipulado quanto a isso. Conclui o ministro que o veto é instrumento de suma importância para o sistema de check and balances e, que, a CF/88 determina a apreciação desse instrumento pelo Congresso Nacional. E a não apreciação do veto traz consequências jurídicas, conforme o artigo 66, § 6º da CF/88. Por isso, enquanto norma jurídica estruturante do processo legislativo, essas são controláveis pelo STF, não indicando interferência indevida do Judiciário, nesses casos. A seguir destaco trecho da decisão:

(...) A Constituição de 1988, porém, avançou ainda mais no fortalecimento das discussões parlamentares ao prever o trancamento de pauta como consequência imediata para a ausência de deliberação legislativa. Ao sobrestar as demais proposições até a apreciação do veto, o constituinte

– ele próprio – reconhece a importância da discussão parlamentar

acerca do tema e, assim, direciona a pauta política do Congresso Nacional no sentido da sua imediata realização. Subjacente a esse modelo está uma tentativa de resgate da vitalidade legislativa brasileira, cujo vigor restou sensivelmente esvaziado pelo regime autoritário e centralizador característico da ordem constitucional pretérita. (...) Pouco importaria a linguagem imperativa em que vazado o dispositivo se lhe faltassem desdobramentos objetivos em razão do seu descumprimento. O trancamento de pauta foi a medida encontrada pelo constituinte de 1988 para, a um só tempo, dissuadir a inação congressual (dentro dos trinta dias assinalados pela Lei Magna) e impor a deliberação legislativa (após o vencimento do lapso temporal fixado). Enquanto espécies de normas jurídicas estruturantes do processo legislativo brasileiro, as regras constitucionais que disciplinam a superação legislativa do veto presidencial são plenamente sindicáveis em juízo, não se revelando, pela sua invocação e aplicação a casos concretos, interferência indevida do Poder Judiciário sobre questões políticas da alçada própria do Poder Legislativo (MS-MC 31816, p. 13) (grifos meus).

(...) De qualquer sorte, a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, consoante apontado supra, reconhece que as regras que disciplinam o processo legislativo constitucional revestem-se de plena exigibilidade quando descumpridas pelos seus destinatários, o que enseja a intervenção do Poder Judiciário para restabelecer a higidez da ordem jurídica violada (ADI nº 3.146, rel. Min. Joaquim Barbosa, Tribunal Pleno, j. 11/05/2006, DJ 19.12.2006; MS nº 20.257, rel. Min. Moreira Alves, Tribunal Pleno, j. 08/10/1980, DJ de 27.02.1981; MS nº 21.642, rel. Min. Celso de Mello, RDA 191/200; MS nº 21.303, Min. Octavio Galloti; MS nº 24.356, rel. Min. Carlos Velloso, Tribunal Pleno, j. 13/02/2003, DJ 12.09.2003; e MS nº 24.642, rel. Min. Carlos Velloso, Tribunal Pleno, j. 18/02/2004, DJ 18.06.2004). Especificamente sobre a superação legislativa do veto presidencial a projeto de lei, a Corte já teve a oportunidade de se manifestar no julgamento conjunto do MS nº 1.006 e do RMS nº 1.039, cuja questão de fundo versava o cumprimento pelo Poder Legislativo do quórum constitucional para derrubada do veto presidencial. (...) É, pois, evidente que forma estabelecida pela Constituição Federal para a elaboração das leis limita a atuação do legislador e não configura questão política, mas sim matéria plenamente cognoscível pelo Poder Judiciário. Destarte, a atuação judicial neste campo, desde que adstrita às balizas constitucionais, resguarda o império da lei (rule of law) e preserva as regras do jogo democrático (MS- MC 31816, pp. 15-17).

Após confirmar a competência do STF e a legitimidade para controlar a questão do caso, o ministro passa a justificar o porquê de deferir a liminar. Segundo o ministro, o impetrante comprova a existência de mais de 3060 vetos pendentes de análise, o que geraria desrespeito ao prazo do art. 66, § 4º. A deliberação do congresso é um dever constitucional e o ato do Congresso de não apreciação gera uma omissão inconstitucional por parte desse.

Devido a isso, conclui o ministro que diante dessa omissão, não pode o Congresso selecionar qual veto irá apreciar, pois a lógica extraída desse processo é de uma votação cronológica. A partir do momento em que o primeiro veto (o mais antigo) ainda não apreciado teria trancado a pauta, toda a liberdade de agenda é perdida, com base na lógica do § 6º do artigo 66, da CF/88 (MS-MC 31816, pp. 18-20).

Dessa forma, a alocação de rito de urgência é inconstitucional, uma vez que todos os vetos são urgentes, não havendo diferenciação pela CF/88. Afirma o ministro que a pauta de urgência ocorre por determinação constitucional, sendo a análise do veto a terceira hipótese de suspensão da liberdade de agenda do Legislativo, em casos excepcionais (1ª – não votação de medida provisória; 2ª – apreciação de projeto de lei de origem da presidência; 3 – o veto). A questão de haver milhares de vetos antes do que está em apreciação é um problema que a própria Casa permitiu, não fazendo sentido não assumir o próprio ônus (MS-MC 31816, p. 20-21).

Por fim, o ministro também afirma que o STF possui competência para garantir o seguimento e aplicação dos regimentos internos da Casa, uma vez que o resquício da teoria dos atos interna corporis não deve prosseguir. Isso porque, o ministro entende que a eventual possibilidade de se admitir matérias não apreciáveis pelo Judiciário geraria um insulamento do poder que coloca em risco a higidez do processo legislativo e o adequado funcionamento das instituições. Além disso, as normas regimentais são caracterizadas de força jurídica; a CF/88 determina parâmetros basilares ao regimento interno, portanto, a esse cabendo a autolimitação desses poderes, e, se há liberdade ao Congresso para se regrar, também há deveres a seguir; o regimento interno é a garantia das regras que fornecem segurança à minoria parlamentar; e, por último, trata-se de zelar pelo cumprimento das regras do jogo democrático.

Fazendo essa análise de competência, o ministro passa a analisar e concluir que o Congresso Nacional praticou, também, as seguintes violações regimentais: (i) permitiu a apreciação de matérias que não estavam previstas na ordem do dia; (ii) ignorou a necessidade de constituição de Comissão Mista para elaborar relatório acerca dos vetos presidenciais; e (iii) aplicou o Regimento do Senado Federal (e não ao da Câmara dos Deputados, como seria o correto) para colmatar as lacunas normativas apresentadas pelo Regimento Comum do Congresso Nacional. Conclui, o ministro, que, portanto, as violações regimentais decorrem de inobservância dos artigos 104 e 105 do RICN, que prevê a necessidade de passagem pela comissão mista o veto presidencial; portanto, há verdadeira anarquia normativa, prevalecendo a vontade da maioria (MS-MC 31816, pp. 22-26).

O ministro justifica estar presente o periculum in mora (a possibilidade de votação do VP 38/2012 a qualquer momento) e o fumus bonis iuris (as previsões constitucionais e regimentais citadas). Assim, concede a liminar determinando que o VP 38/2012 só seja votado após a análise de todos os vetos anteriores, em ordem cronológica (MS-MC 31816, p. 26).

O voto do ministro relator, analisado sob uma primeira percepção, revela um conjunto de entendimentos que coloca nas “mãos” do STF um poder muito grande de controlar todos os atos dos outros poderes, sob o fundamento de ser o guardião da CF/88 e essa estar acima do jogo político da democracia, para garantir a democracia.

Contudo, se analisado esse posicionamento com o que esta pesquisa, de maneira geral, vem descrevendo e analisando, este é o entendimento que a Corte vem desenvolvendo desde 1949, paulatinamente. Mas, que se resume, na sua maioria, a se autodeterminar o controlador dos casos de veto (seja em qualquer nível federal), mas a evitar interferir de fato

na questão posta, justamente por não haver regras constitucionais específicas, além das já citadas, sobre o dia a dia desse instrumento.

Nesse sentido, o STF vem se autolimitando a atribuição constitucional de vigia da própria constituição, de maneira aparentemente suprema, mas por estar limitado a uma lógica jurídica, não possui meios justificáveis para de fato interferir em muitas dessas questões.

O ministro Luiz Fux, nesse caso específico, possuía previsões constitucionais suficientes para interferir na questão, mas, não satisfeito com elas, assumiu o papel de garantir o cumprimento de normas regimentais, para avalizar maior legitimidade a sua decisão. Contudo, ao fazer isso, o ministro não respeitou o limite processual imposto pelo próprio STF a sua atribuição. O ministro concedeu uma liminar que esvaziou a consequência de uma eventual decisão quanto ao mérito, pois o objetivo era o mesmo: suspender a votação do VP 38/2012. Justamente por ser um excesso de poder, a liminar é uma exceção, pois por meio dela violam-se diversas previsões, também de um Estado democrático de Direito, como o devido processo legal e o contraditório. Esse é o entendimento do STF em todos os casos relacionados ao grupo de casos 6.

Além dessa reflexão jurídica sobre a decisão, apresento a seguir as consequências da decisão do STF naquele cenário político apresentado no tópico 6.1 e a reação dos atores políticos.

6.3. O cenário político pós-decisão liminar e as novas decisões do STF (MS- MC-AgR 31816 e ADI-MC 4917)

Após a decisão liminar no MS-MC 31816, o Congresso Nacional tentou se organizar para votar, de uma só vez, todos os mais de 3 mil vetos. Conforme consta em notícias, o Congresso agendou a votação de todos os vetos para o dia 19 de dezembro de 2012. Segundo aponta a notícia da Época, de 28 de dezembro de 2012, foi necessária uma movimentação política para evitar a votação, devido ao receio quanto aos prejuízos econômicos, financeiros, culturais, políticos e sociais que a rejeição dos vetos poderia causar, se não fossem analisados com a devida seriedade.

Na manhã da quarta-feira, iniciou-se a atabalhoada tentativa de derrubar o veto da presidente Dilma Rousseff ao projeto dos royalties do petróleo. Dois dias antes, o ministro do STF Luiz Fux concedera uma

royalties na frente de outros vetos. Isso obrigou os parlamentares a respeitar a ordem cronológica. Um caminhão-baú estava estacionado na rampa de

entrada do Congresso. No salão azul do Senado, em frente à sala da liderança do PSDB, funcionários se juntavam em duplas para carregar as urnas. A marcenaria do Senado Federal construiu rapidamente caixotes de madeira de má qualidade, com quatro alças, para que os parlamentares pudessem depositar seus votos. Cada cédula tinha 463 páginas, um livro de papel reciclado com lombada de 2 centímetros. Dentro dele, estavam listados os 3.059 vetos presidenciais acumulados nos últimos dez anos.

O tema dos royalties é daquelas matérias que geram posições radicais. De um lado, parlamentares de Rio de Janeiro e Espírito Santo tentavam, a todo custo, evitar que o Congresso votasse todos os vetos. Se o veto de Dilma no caso dos royalties caísse, os dois Estados perderiam recursos em seus orçamentos. Do outro lado estavam parlamentares dos outros Estados, interessados em derrubar o veto e angariar mais recursos para seus caixas, premidos pela diminuição de arrecadação. Na terça-feira, o Executivo

assistia em silêncio à confusão no Congresso, até que foi alertado sobre os riscos que corria. Em meio aos 3.059 vetos, estavam armadilhas capazes de quebrar o caixa do governo. O Congresso poderia derrubar o fator previdenciário. Sem ele, trabalhadores podem se aposentar mais cedo – e, nas contas do governo, abrir um rombo na Previdência. Outro

veto, se derrubado, obrigaria o governo a destinar o dobro do previsto no Orçamento para a saúde. A presidente Dilma Rousseff telefonou pelo

menos duas vezes ao presidente do Senado, José Sarney (PMDB-AP), pedindo que ele evitasse a votação dos vetos. Sarney respondeu que dependia dos líderes partidários – que não pareciam dispostos a colaborar. Ficou explícito o maior problema do governo Dilma: o mau relacionamento com o Congresso.

Numa reunião, ficou combinado que Sarney não presidiria a sessão do Congresso, marcada para o meio-dia da quarta-feira, para decidir a questão dos vetos. A tarefa caberia à primeira vice-presidente da Câmara, Rose

de Freitas (PMDB-ES). Rose também estava em situação delicada, já que seu Estado, o Espírito Santo, seria prejudicado. Ficou combinado que, para não ficar mal com seus eleitores, Rose abriria a sessão e passaria a condução da difícil matéria ao deputado Inocêncio Oliveira (PR-PE). Ex-presidente da Câmara e veterano na mesa diretora, Oliveira

saberia lidar com a situação. Rose não cumpriu o combinado. Quando