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Os Processos de Transformações do Estado e suas implicações na Reconceitualização da Sociedade Civil

E, finalmente, o quinto capítulo, tratará sobre “Os efeitos do Programa Rede Vencer em Altamira e Santarém: entre os desafios da construção e os riscos da

1 ESTADO, SOCIEDADE CIVIL E SUAS INTERFACES COM O TERCEIRO SETOR: CONFIGURAÇÕES, IMPASSES E PERSPECTIVAS

1.1 Os Processos de Transformações do Estado e suas implicações na Reconceitualização da Sociedade Civil

O Terceiro Setor vem se consolidando como um potencial campo de estudo que atualmente tem suscitado diversos questionamentos por estar atrelado às transformações verificadas no contexto econômico, político e social, à medida que se situa no embate das determinações estruturais e conjunturais que alicerçaram mudanças na maneira de pensar o próprio conceito de Estado e de Sociedade Civil.

A discussão que envolve esse tema remete à vinculação orgânica entre a configuração das políticas sociais, de modo especial, às políticas educacionais, e as formas históricas de constituição do Estado10, ao mesmo tempo em que expressa a conformação e contorno de regulação prevalentes em cada contexto, no que diz respeito aos confrontos dos interesses econômicos e no enfrentamento das questões sociais. Nessa direção, para entendermos como esses processos ocorreram, é fundamental mostrar suas raízes, contextualizá-lo e apontar o contexto em que foi construído.

Interessa-nos destacar nesta passagem que, embora o Estado não tenha origem na era moderna, de acordo com Montaño e Duriguetto (2010), há preocupações e estudo sobre o tema desde a antiga Grécia, porém, é somente na segunda metade do século XV, com a ascensão do "Estado Moderno" a partir do desenvolvimento do capitalismo mercantil, que surge a reflexões sobre a formação deste Estado, elaboradoras por Nicolau Maquiavel, considerado o primeiro teórico a incorporar em suas análises “uma distinção, até então não considerada entre Estado e Sociedade” (Ibidem, p. 21).

As reflexões acerca das abordagens, concepções e correntes teóricas diversas que marcam as definições de Estado e a Sociedade Civil, passando pelas teorias contratualistas fundamentadas no “direito natural” ou jusnaturaslismo, presentes nas obras de Thomas Hobbes, John Locke e Jean Jacques Rousseau, que apresentam como elemento principal, a legitimação do poder político expresso por meio de um pacto ou contrato social (BOBBIO E                                                                                                                          

10 São diversas a teorias sociológicas que se debruçam no debate da formação do Estado, com perspectivas e conceituações distintas que ocasionam polêmica entre si. Com isso, sem nos determos no aprofundamento de explicitações que fundamentam o Estado moderno no marco do desenvolvimento da sociedade do capital, enfatizamos aqui, que nossas reflexões sobre o Estado se dará a partir da perspectiva elaborada por Gramsci de “Estado Ampliado” e, consequentemente, de Sociedade Civil, por estas estarem alinhadas ao nosso objeto de estudo. Para uma leitura aprofundada acerca das diferentes formações do Estado, ver Montaño e Duriguetto (2010), Bobbio e Bovero (1994) e Carnoy (1990).

BOVERO, 1994); pelas análises de Hegel, sendo este a cunhar, pela primeira vez, o termo sociedade civil, estabelecendo ainda sua diferença em relação ao Estado, bem como, conferindo a cada uma das duas instâncias sua própria esfera de ação.

Posteriormente, por meio da tradição marxista, as reflexões sobre o Estado e Sociedade Civil postuladas por Hegel, adquirem novos elementos desenvolvidos por Karl Marx. Carnoy (1990) aponta que as duas principais características da visão de Marx sobre o Estado, em oposição àquelas desenvolvidas por Hegel. Primeira, Marx situa o Estado em seu contexto histórico e, ao submetê-lo a uma concepção materialista da história, compreende não é Estado que molda a sociedade, mas ao contrário, é sociedade que molda o Estado e, essa, por sua vez, é moldado pelo modo dominante de produção e das relações de produção; e segunda, Marx defende que o Estado é expressão política da classe dominante e, como produto das relações de produção, não representa o bem comum da ‘coletividade social’, nem é o “curador da sociedade como um todo”, mas

[...] é um instrumento essencial de dominação de classes na sociedade capitalista. Ele não está acima dos conflitos de classes, mas profundamente envolvido neles. Sua intervenção no conflito é vital e se condiciona ao caráter essencial do Estado como meio da dominação de classe (CARNOY, 1990, p.67).

A partir dessa compreensão sobre o Estado, Marx, ao analisar a sociedade civil, define esta como base econômica d sociedade burguesa, ou seja, “[...] como a esfera da produção e da reprodução da vida matéria” (MONTAÑO E DURIGUETTO, 2010, p. 35) e o Estado, como superestrutura: “Ou seja, o Estado é um produto da sociedade civil, expressa suas contradições e as perpetua, e não como pensa Hegel, uma esfera independente, com racionalidade própria” (Ibidem p. 35).

O movimento reformador não se preocupou em articular sua dinâmica racional-legal com uma dinâmica emancipatória, aberta para a democracia política, a promoção social e a cidadania. Disso deriva a razão maior de seu fracasso. O roteiro seguido deixou de enfatizar a relevância e o valor do Estado (face técnica + face ética, consenso + coerção) para a montagem de pactos sociais sustentáveis, com o que abriu passagem para o crescimento dos espaços não-estatais, paralelos à legalidade democrática e à convivência cívica (Ibidem, p. 52).

O tratamento sobre a temática do Estado a partir de uma “percepção de uma intensa

socialização da política 11” (MONTAÑO E DURIGUETTO, 2010, p. 43 – grifos no

original), como preocupação fulcral de Antônio Gramsci em suas análises sobre a Sociedade Civil e sua relação com o Estado a partir da visualização da complexidade das relações de poder e de organização de interesses presentes nas sociedades capitalistas de seu tempo. É a partir dessa percepção que Gramsci elabora seu conceito de Estado Ampliado.

Esse teórico tem como premissa o conceito marxista de Estado e as relações que propôs entre estrutura e superestrutura para explicar complexidade das sociedades modernas. Contudo, Gramsci propõe novas abordagens para esse debate ao constituir uma relação dialética entre estrutura e superestrutura e conjecturar a existência de fenômenos superestruturais necessários à estrutura. Segundo Carnoy (1994), ao fazer isso, eleva o conceito de superestrutura desenvolvido por Marx e diferencia-se deste quando considera as relações ideológicas e culturais mais importantes do que as relações de produção. Com isso, se para Marx a fundamentação do Estado localiza-se nos modos e processos de produção e sua consequente formação econômica e social, sendo este reflexo da sociedade civil; em Gramsci, em sua teoria ampliada do Estado, considera as transformações que a esfera social, política e econômicas absorveram com o desenvolvimento do sistema capitalista, incidindo numa maior complexificação do Estado. Nessa direção, tanto em Marx quanto em Gramsci, a sociedade civil é o fator central para a compreensão do desenvolvimento capitalista, porém, se em Marx temos a compreensão da sociedade como elemento para designar a infraestrutura econômica, ou seja, as relações na produção; em Gramsci, “ao contrário, ela é superestrutura, que representa o fator ativo e positivo no desenvolvimento histórico; é o complexo das relações ideológicas e culturais, a vida espiritual e intelectual, e a expressão política dessas relações torna-se o centro da análise, e não a estrutura” (Ibidem p. 93).

Destarte, para Coutinho (2006), ao desenvolver a noção de Estado Ampliado, Gramsci aponta para um movimento dialético de continuidade/ruptura ou conservação/superação com o pensamento de Marx, ao incorporar novos e necessários elementos à dimensão da sociedade civil, a partir da descoberta dos aparelhos privados de hegemonia. Nesse sentido, as alterações nas análises realizadas por Gramsci em relação a Marx, significa dizer que “[...] a sociedade civil, em Gramsci, é um momento do Estado, ou, em outras palavras, o conceito de sociedade                                                                                                                          

11 Segundo Montaño e Duriguetto (2010, p. 43), a socialização da política resulta “da presença de organizações, tanto dos trabalhadores quanto do capital, no cenário do capitalismo desenvolvido (partidos políticos, sindicatos), da conquista do sufrágio universal, do fascismo e do nazismo como movimentos de expressão da hegemonia politica burguesa [...]”.

civil é precisamente o meio privilegiado através do qual Gramsci enriquece, com novas determinações, a teoria marxista do Estado” (Ibidem, p. 31).

Tal ampliação do Estado na perspectiva gramsciana é se dá na distinção entre duas esferas no interior do Estado, que ele denomina de “sociedade política” (Estado stricto sensu ou Estado-coerção) e de “sociedade civil” (esfera da disputa da hegemonia e do consenso). Em suas palavras, “Estado é todo o complexo de atividades práticas e teóricas com as quais a classe dirigente não só justifica e mantem seu domínio, mas consegue obter consenso ativo dos governados” (GRAMSCI, 2000, p. 331). Isso significa dizer, que o Estado em Gramsci, refere-se ao espaço onde a classe dominante exerce, sustenta e conquista seu poder por meio do consentimento, e não somente pela força. Assim, temos a definição mais total de Gramsci para o conceito de Estado no sentido ampliado:

Estamos sempre no terreno da identificação de Estado e Governo, identificação que é, precisamente, uma representação da forma corporativo- econômico, isto é, da confusão entre sociedade civil e sociedade política, uma vez que se deve notar que na noção geral de Estado entram elementos que devem ser remetidos à noção de sociedade civil (no sentido, seria possível dizer, de que Estado = sociedade política + sociedade civil, isto é, hegemonia couraçada de coerção). Numa doutrina do Estado que concebe este tendencialmente capaz de esgotamento e de dissolução na sociedade regulada, o tema é fundamental (GRAMSCI, 2000, pp. 244-245).

Segundo Montaño e Duriguetto (2010, pp. 44-45), Gramsci designa a esfera estatal de “sociedade política” como aquela que tem por intenção a dominação de uma classe, por meio do “conjunto de Aparelhos de Coerção e Repressão pelos quais a classe dominante impõe coercitivamente a sua dominação (aparato policial e militar, sistema judiciário e administrativo)”. Em Gramsci (2000, p.255): “[...] por Estado deve-se entender, além do aparelho de governo, também o aparelho ‘privado’ de hegemonia ou sociedade civil”. Assim, no Estado não representa somente uma esfera repressiva, “mas uma luta por hegemonia da burguesia na superestrutura” (Ibidem, p.45). Essa hegemonia não se traduz em mera dominação, “mas à direção social impressa pela burguesia que se legitima sob o consenso dos grupos subalternos”, sendo que essa função estatal de consenso, de hegemonia, de direção social é produzida pela esfera da sociedade civil, por esta ser “a esfera das mediações do

exercício da dominação de classe pelo exercício do convencimento” (Ibidem, p. 45 – itálico

Com base nessa compreensão, a sociedade civil, segundo Gramsci (2000) é elemento constitutivo do conceito de Estado, onde se deve apreender, além do aparelho estatal, também o aparelho ‘privado’ de hegemonia ou sociedade civil, sendo esta por “conjunto dos organismos chamados ‘privados’ e que corresponde à função de hegemonia que o grupo dominante exerce sobre toda a sociedade”. Entendida por ele como “conteúdo ético do Estado”, a sociedade civil permite a articulação e socialização dos interesses, a politização das ações e consciências, a organização de consensos e hegemonias, à medida que se põem como a “hegemonia política e cultural de um grupo social sobre toda a sociedade, como conteúdo ético do Estado” (GRAMSCI, 2000, p. 225). Esta é constituída pelo conjunto de organizações responsáveis pela elaboração e/ou difusão das ideologias, como os sindicatos, partidos, Igrejas, o sistema e escolar, a organização material da cultura (imprensa, meios de comunicação de massa) e as organizações profissionais.

Pontuamos essas questões sobre concepções do Estado e Sociedade civil para entendemos como esses conceitos serviram para fundamentar e instrumentalizar os discursos no enfrentamento da chamada crise estrutural do Estado, em que a sociedade civil, segundo sinaliza Nogueira (2003), passou de um espaço conhecido como arena de lutas políticas para uma imagem que conduz a sociedade civil para o “auxílio gerencial de um arranjo societal” que pode determinar e dar condições para que sejam viabilizadas o consenso e a hegemonia que se sustentam as discussões sobre um processo reformista do aparelho estatal de ordem mundial.

A temática da Reforma do Estado tem sido predominante na agenda política internacional desde os primeiros anos da década de 1980. De certo modo, a reformulação do aparelho estatal configurou-se como uma questão praticamente universal, enquanto resposta à crise econômica que colapsou política e economicamente dos Estados-nação nas últimas décadas do século XX. Essas reformas justificar-se-iam à medida que esgotamento do modelo

fordista-keynesiano montado no pós-guerra, se mostrava inábil em dar respostas aos

problemas intrínsecos ao próprio regime de acumulação capitalista, evidenciando um nítido processo de falência após 30 anos, embora tenham sido tomadas diversas medidas (em particular o tripé reestruturação produtiva, neoliberalismo e financeirização), o capital não conseguiu recuperar os padrões de acumulação anteriores (MONTAÑO E DURIGUETTO, 2010).

É claro que para entendermos a reforma do Estado, é preciso compreendê-la como componente de um processo conjuntural e global de reestruturação capitalista iniciado após a

crise do capital nos de 1970, que teve como expressão maior, a crise do Estado de Bem-Estar Social, que resultou com a emersão nos anos 1980, do projeto neoliberal. Com isso, o Estado intervencionista, denominado Estado de Bem-Estar Social, Estado-providência ou Welfare

State12, considerado por Paulo Netto (1995, p. 68), como “[...] único ordenamento sócio-

político que, na ordem do capital, visou expressamente compatibilizar a dinâmica da acumulação e da valorização capitalista com a garantia de direitos políticos e sociais mínimos”, surgiu como uma forma de reverter o processo imposto pelo liberalismo e como um prolongamento natural dos direitos civis.

Segundo aponta Laurell (1995, p. 153), por trata-se “de um conjunto de medidas e instituições que têm por objetivos o bem-estar e os serviços sociais”, o Estado do Bem Estar Social entra em crise por não ter conseguido atender a todas as demandas sociais. Com isso, foi qualificado como restrito e incompleto, uma vez que seus programas eram considerados limitados por critérios de seletividade, sendo incapazes de alcançarem o universalismo pretendido e a igualdade na distribuição de benefícios, o que o tornou excludente. Em contrapartida, Paulo Netto (1995), argumenta que o modelo originado da teoria de Keynes, o Estado do Bem-Estar Social, entra em decorrência da crise socialismo, culminando, assim, numa crise global. Porém, seus efeitos foram distintos. Se a crise do Estado do Bem Estar Social aponta para a falência do Estado, enquanto ordenador político; a crise do socialismo, para a inépcia do capital em gerar o crescimento econômico-social em ampla escala e garantir a geração de emprego. A crise do Estado de Bem Estar Social, de acordo com esse autor (Ibidem, p. 70 - grifo no original), “[...] evidencia que a dinâmica crítica desta ordem alçou-se a um nível no interior do qual a sua reprodução tende a requisitar, progressivamente, a eliminação das garantias sociais e dos controles mínimos a que o capital foi obrigado naquele arranjo”.

Assim, o Welfare State que se origina a partir da expansão do sistema capitalista e logo após a revolução industrial em alguns países da Europa, tendo como característica basilar as mudanças na relação entre Estado e economia, cuja divisão ficou bem menos visível; por transformar as estruturas sociais e culturais dos países que obteve pleno desenvolvimento, à medida que teve êxito em modificar as causas dos conflitos sociais; e por uma desmercantilização de uma área de produção de bens e serviços, de modo particular, dos serviços da educação pública, saúde e assistência social; significou, na perspectiva                                                                                                                          

12 Para uma compreensão maior das questões que envolvem o debate sobre as diferentes abordagens sobre o Estado e o avanço do capitalismo, consultar Montanõ e Duriguetto (2010). Sobre a crise do Estado do Bem Estar Social e a ofensiva neoliberal, ver Netto (1995) e Laurell (1995).

keynesiana, um Estado capaz de exercer um papel político de gestão macroeconômica, sendo, portanto, o Estado, o gestor da produção e da regulação das relações econômicas e sociais, devido incorporar novas funções no âmbito estatal, vislumbrando promover o desenvolvimento industrial/comercial, para além da função de coerção. No entanto, se as medidas propostas Keynes para salvar o capitalismo de suas deficiências à curto prazo, e para promover produção e consumo massivos pela via da regulação estatal do mercado e da intervenção do Estado na economia, posteriormente, estas tornaram-se inviável e insustentável para o capital no longo prazo redundando no retorno à própria crise, anunciada mais tarde por volta de meados dos anos 1973, pela segunda crise do petróleo, como bem observam Montaño e Duriguetto (2010, p.59-60).

Porém, se a política keynesiana serviu para tirar o capitalismo da crise (no segundo pós-guerra), aumentando a demanda e o emprego, e estimulando o crescimento do investimento produtivo, ela resulta, no longo prazo, fortemente inflacionária, e gera elevado déficit fiscal estatal (o “investimento estatal” gera endividamento público e a emissão de dinheiro para além do respaldo em ouro resulta fortemente inflacionário), derivando assim, após um período de crescimento econômico, numa nova fase de crise e recessão. O déficit fiscal e a inflação são toleráveis no curto prazo, mas insuportáveis pelo sistema no longo prazo.

Para Antunes (2005), os elementos constitutivos mais manifestos dessa crise podem ser identificados na queda da taxa de lucro, que levou ao esgotamento do padrão de acumulação taylorista/fordista de produção, resultante do acréscimo do preço da força de trabalho, gerado pelas das lutas entre capital e trabalho; no desemprego estrutural que se principiava, dando origem a uma retração do consumo que o modelo taylorista/fordista não conseguiu resolver; na hipertrofia do capital financeiro, o que representava a própria expressão da crise estrutural do capital e de seu sistema de produção, abrindo espaço para a especulação, na nova etapa do processo de internacionalização; na maior concentração de capitais graças às fusões entre as empresas monopolistas e oligopolistas; pela crise do Welfare

State ou do “Estado de bem-estar social” e seus mecanismos de funcionamento, induzindo a

crise fiscal do Estado capitalista e a necessidade de contração dos gastos públicos e sua transferência para o capital privado, o que ocasionou o aumento acentuado de privatizações.

Tratava-se antes de tudo, segundo analisa Meszáros (2002) de uma crise eminentemente estrutural do ponto de vista de seus fundamentos e possui elementos de crises cíclicas, de caráter universal e de alcance global, que atinge todas as instâncias de reprodução do capital, refletindo em toda a sociedade civil e em suas instituições políticas. Por serem

inerentes ao próprio sistema devido suas contradições, a tendência é que estas se tornem cada vez mais constantes, encurtando os intervalos de tempo entre uma e outra. Em suas palavras,

Em termos simples e gerais, uma crise estrutural afeta a totalidade de um complexo social em todas as relações com suas partes constituintes ou subcomplexos, como também a outros complexos com os quais é articulada. [...] uma crise estrutural põe em questão a própria existência do complexo global envolvido, postulando sua transcendência e sua substituição por algum complexo alternativo. (MÉSZÁROS, 2002, p. 797).

Portanto, refere-se a uma crise que afeta a totalidade do complexo social, e representa o mais alto nível de evolução do antagonismo capital-trabalho, desdobrando-se de “modo rastejante. Para o autor, “[...], a crise estrutural do capital se revela como uma verdadeira crise de dominação em geral” (Ibidem, p. 800). 13

Desse processo resultou a mundialização da economia, ao mesmo tempo em que desenvolveram-se profundas mudanças na forma, atuação e dinâmica dos Estados-nação. Dentre outras transformações, com o predomínio da economia transnacional, a função redistributiva de renda dos Estados-nação, feita por meio das “transferências sociais” para os serviços de saúde, educação e previdência, deixou de ser “territorialmente autossuficiente” e “[...] o Estado foi solapado mais ainda pela tendência de desmontar atividades até então exercidas, em princípio, por órgãos públicos, deixando-as entregues ao mercado” (HOBSBAWM, 1997, p. 413).

Para enfrentar esse contexto de crise e com a intenção de retomar níveis anteriores de acumulação de capital, o grande capital põe em movimento ajustes como estratégia para sobrepujar os desequilíbrios macroeconômicos, financeiros e produtivos, entre outros, na esfera da produção, denominada por Harvey (2002) de reestruturação produtiva ou o novo regime acumulação flexível.14 Esse novo padrão de acumulação apontado pelo autor propõe                                                                                                                          

13 Mészáros (2009) sinaliza para quatro conjuntos de contradições que vislumbram as possibilidades de enfrentamento: as contradições socioeconômicas internas do capital “avançado”; as contradições socioeconômicas e políticas das sociedades pós-capitalistas (em seu processo de desintegração); a disputa entre as próprias potências capitalistas; e a crise para administrar o sistema colonial de dominação. O autor afirma que: Como podemos ver, em todas as quatro categorias – cada uma das quais corresponde a uma multiplicidade de contradições –a tendência é para a intensificação, e não para a diminuição, dos antagonismos existentes. Além disso, a severidade da crise é acentuada pelo efetivo confinamento da intervenção à esfera dos efeitos, tornando proibitivo atacar as suas causas [...]. (MÉSZÁROS, 2009, p. 808). Com isso, observa que a crise se manifesta num contexto inexorável de intensificação, concorrendo para que as propostas de resolução, mesmo aquelas pontuais, revelam se não exitosas e, “[...] O mais provável é, ao contrário, continuarmos afundando cada vez