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12.9 Contributos das entidades entrevistadas

12.9.5 Professor Doutor Alves de Fraga

O Exmo. Sr. Professor Doutor Luis Alves de Fraga, Coronel da Força Aérea Portuguesa foi entrevistado na qualidade de Doutor em História e docente da cadeira de Metodologia da Investigação na Universidade Autónoma de Lisboa.

1) Filiação partidária;

Não considerando a questão simples de abordar, entende, à partida, que não veria qualquer problema em o polícia, enquanto cidadão, poder ser partidário. Nas suas próprias palavras, “não veria qualquer problema as forças de segurança são exatamente isso, estão para a população na medida em que se limitam ao exercício da legislação que persegue qualquer atitude que possa ser considerada ilegal ou criminal. Donde resulta uma diferença entre a

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força de segurança e um elemento das forças armadas. Porque os elementos das forças armadas estão, não para a população em geral, mas para a nação em absoluto. São o último sustentáculo da soberania nacional. Enquanto as forças de segurança não são sustentáculo da soberania nacional. São sustentáculo da ordem nacional, da ordem interna nacional”. Portanto não vê como errado o facto de ser possível um polícia ter um empenhamento partidário. A relevância das palavras do entrevistado é tal, que nos vemos na eminência de as utilizar como foram ditas: “É uma falsa questão porque todo o cidadão, pelo menos o cidadão consciente, tem opções políticas e faz opções políticas, embora não as diga… mas fá-las e ao fazer opções políticas. Agora é preferível dizer as opções, do que ser-se e parecer-se que não se é… quer dizer vivemos numa sociedade do faz de conta. Eu faço de conta que não sou partidário de nada, mas eu sou partidário de alguma coisa. Dever-se-á é confiar no profissionalismo das pessoas. não concordo, pessoalmente não concordo com o apartidarismo. É preciso esclarecer esse ponto. Eu parto do princípio que é uma corrupção das nossas fórmulas legislativas o impedimento da atividade política por parte dos militares e das forças de segurança. Porque é como que uma obrigação contra natura. Pessoalmente eu vejo essa obrigação como uma situação contra natura democrática”.

2) Exercício de atividades político-partidárias e vínculo funcional;

O Exmo. Sr. Professor Doutor Alves de Fraga, contudo, realça que a consideração que tece, expressa no ponto anterior, fá-la no sentido abstrato, genérico. Entende como necessário alcançar a especificidade do povo que somos, e acima de tudo a ausência de tradição democrática que existe em Portugal. Não se trata só do Estado ditatorial que vivemos durante 48 anos, mas sim de uma tradição pouco democrática que vivida no contexto nacional, ainda anterior a 1820. Levando e consideração todos estes elementos, teria de delimitar a possibilidade de o cidadão polícia poder ser também um cidadão partidário. Teria de delimitar numa circunstância. É que para ele ser partidário, teria se desligar da função ativa de elemento de segurança.

Relativamente ao estatuto de impossibilidade de acumulação de funções entre o domínio privado e o domínio público no exercício de uma função pública é comum às forças de segurança e às forças armadas. Exatamente nesta perspetiva reside a grande contradição, pois não se entende como profissional o político. O político não é um profissional, enquanto que um elemento das forças de segurança ou um elemento das forças armadas é um profissional. E como profissional aí cria-se o choque, porque se presume que poderá ser mais venal os elementos das forças de polícia ou das forças militares, poderá ser mais venal que o político, quando na prática se verifica que a venalidade é efetivamente maior no exercício das funções

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políticas, não são consideradas funções públicas para esse efeito. Quer dizer, estamos perante dois conceitos distintos de função pública: enquanto que força de segurança é um exercício de função pública, politico para o efeito em questão parece não ser função pública.

3) Exercício e restrição de direitos cívicos face ao pessoal não policial;

No entendimento do nosso entrevistado, existe uma clara contradição profunda entre aquilo que se estipula no estatuto das forças de segurança e no estatuto das forças militares, relativamente ao que não se estabelece em estatuto que devia existir do político. O político pode acumular funções que na verdade deveriam ser inacumuláveis em função de um estatuto (inexistente) que deveria existir para a função política, e que não existe. É um problema ético, onde se parte do princípio de que o político é por natureza eticamente correto e parte-se do principio de que o elemento das forças de segurança é por natureza não ético.

Seguindo o raciocínio, não têm que haver diferenças entre o cidadão e o polícia, entre o polícia e o político. Mas existem na prática. Um relativamente ao outro não é superior nem é inferior, é diferente. É a diferença que os distingue, de onde não resultam quaisquer prorrogativas em maior benefício de uns e detrimento de outros, mas apenas direitos que resultam da diferença. E que têm que ser contemplados não podendo ser atropelados.

4) Histórico e tendência para o futuro do exercício de direitos cidadania.

Para o Sr. Professor Doutor Alves de Fraga quando falamos em cidadania colocamo-nos perante um conceito amplo, alargado de vivência do cidadão em relação à coisa pública. Já quando se aborda a intervenção cívica, já considera um conceito mais restrito, o qual limita o exercício da cidadania, apontando para um campo de atuação específico dessa cidadania. Assim, enquanto votar é uma obrigação de qualquer cidadão, o exercício da cidadania é o optar por exercer funções políticas, intervir diretamente na sociedade, este sim já um conceito de intervenção cívica.

Conforme elucida Alves de Fraga, na primeira República houve condições em que e momentos em que … foi vedado aos militares serem partidários, e quando digo partidários é no sentido de membros de partidos fazerem parte de partidos políticos e houve momentos em que isso deixou de ser proibido. Por conseguinte, na 1ª República os militares podiam ser membros de partidos. Tal como na Monarquia Constitucional os militares podiam ser, podiam militar nos partidos políticos. Este receio que na República democrática pós 25 de Abril de 1974 se gerou em relação aos militares e às forças militarizadas, que foram militarizadas, mas já não são, este receio que se gerou parece ter fundamento afinal num medo de os militares ou elementos da segurança pública transportarem para dentro dos respetivos quarteis as ideias

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políticas dos respetivos partidos, co arctando-lhes direitos democráticos que deviam possuir que não colidiriam com a sua ação e a sua função normal de segurança ou militar.

Parafraseando, neste sentido, “a tendência é exatamente para se manter a situação como está, isto é, para reduzir as capacidades de cidadania dos militares e dos polícias. É uma redução de cidadania. Isso é o entendimento correto da democracia”.