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2 REVISÃO DA LITERATURA

2.5 A comunicação das instituições de ensino superior

2.5.3 A propaganda é a alma da educação?

"Nós ensinamos sucesso" Universidade de Hofstra

A frase anterior foi o centro de uma campanha da Universidade de Hofstra (Hempstead, NY), com um anúncio de 65 mil dólares de página inteira na quarta capa da revista New Yorker, em 2000 (GUTMAN; MIAOULIS, 2003). Apesar de a mensagem ser curta e clara, qual efeito na audiência, ou seja, nos pais, futuros alunos, alunos atuais, ex-alunos, doadores (o que nos Estados Unidos é importantíssimo)43?

Devido à sua importância, a propaganda é o foco desta seção. Como visto anteriormente e sintetizado por Maringe (2005), o marketing ainda é percebido como propaganda ou promoção nas universidades, numa visão estreita desde o alto escalão até os que o operacionalizam, com o foco central em trazer alunos. Kirp (2003) afirma que, em muitos casos, a propaganda é um eufemismo para recrutamento e vice-versa. A confusão entre marketing e propaganda não é privilégio da área educacional. Tem-se a sensação de que é que é cada vez maior o número de propagandas de instituições de ensino. Todavia, esta estratégia não é recente. Bok (2000) traz registros que datam de 1636. Entre 1890 e início dos anos 1900, há diversos relatos de uso da propaganda educacional: a Universidade de Cornell anunciava seus cursos em jornais, enquanto a Universidade de Chicago divulgava suas áreas de atuação em seu primeiro catálogo e a Universidade da Pensilvânia (Penn) criava seu departamento específico (Bureau of Publicity) para aumentar a visibilidade (BOK, 2000; PELLETIER, 1985 apud WU, 2003).

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Os autores não mostram a aceitação do anúncio, mas há outros aspectos interessantes acerca deste posicionamento: que partes do programa farão com que a universidade cumpra sua promessa? Sucesso pode ser ensinado? O que é sucesso – a noção é a mesma para todos que o procuram? Será que é isso que os alunos buscam?

O foco ainda é o da mídia impressa, sendo a mídia eletrônica a menos utilizada. Na promoção da educação superior, o uso da mídia televisiva é relativamente recente e tido como cara pelas instituições. Wallace (2000 apud QUATROCHE, 2004) cita o caso de cinco universidades de Fresno, Califórnia, que se juntaram para anunciar nos Jogos Olímpicos de Verão de 1984. No meio de uma queda geral no número de candidatos, essas instituições conseguiram manter seu padrão de alunos e ainda obter um pequeno aumento nas matrículas. Pesquisa qualitativa realizada nas universidades australianas (GATFIELD et al, 1999) sugeriu como principais fatores enfatizados nos materiais promocionais e guias das instituições de ensino: reconhecimento (reputação), ensino (qualidade dos professores e dos recursos), vida no campus (benefícios adicionais) e orientação (como acessar os serviços disponibilizados). O Quadro 5 traz um panorama de passagens encontradas na literatura sobre outros elementos do composto de comunicação no contexto específico das instituições de ensino.

Quadro 5 – Trechos selecionadas sobre os elementos da comunicação no contexto educacional Elemento Comentários (o que a literatura da área diz) – trechos selecionados

Relações públicas

Além da propaganda, conforme Wonders e Gyure (1991, p. 2), marketing educacional para algumas escolas também é em grande parte relações públicas. Todavia, aqui as instituições de ensino em geral igualam relações públicas à assessoria de imprensa. É relativamente comum a escola contar com uma assessoria, própria ou externa, para divulgar na mídia informações, como a posição no ranking (se favorável), fatos notáveis de seus alunos (boas classificações no Enade ou OAB) e professores (dados relevantes de pesquisa ou premiações), eventos e serviços/estratégias diferenciadoras, fusões e aquisições e abertura de capital na Bolsa. Ver Ilustração 33.

Catálogo Estima-se que o uso catálogos como ferramenta promocional das universidades date do início do século XX. Um dos marcos foi a Universidade Yale (COLLOQUIUM, 1979 apud QUATROCHE, 2004, p. 6), que os via como um apoio planejado para falar com os alunos do ensino médio sobre o próximo nível. Seu papel até 1950 era restrito – servia mais para descrever os cursos. Seria dessa época também a adoção de relações públicas nas IES e a criação de departamentos voltados para o ingresso de novos alunos. Num estudo conduzido na Universidade de Wisconsin, foram usados focus

groups a fim de entender a efetividade dos materiais impressos para o marketing educacional. A

pesquisa mostrou que a qualidade do material (e informações atualizadas e precisas) cria a impressão de eficiência e pronta resposta (BROMLEY; FISHER, 2000 apud QUATROCHE, 2004). Levantamento feito por Bohley (1998), citando pesquisas como as de Gackenbach (1983) e Johnson e Chapman (1979), mostrou que, apesar de sua ampla utilização pelas universidades, ainda apresentam falhas, como linguagem apropriada — adaptada ao público específico que a instituição de ensino superior atende, ao leitor mais jovem — e mais simples e direta, de acordo com o nível da audiência.

Patrocínio O patrocínio é pouco utilizado pelas instituições de ensino. Nos Estados Unidos, o lado esportivo desempenha fortemente esse papel. Por mais que aqui no Brasil haja escolas que invistam em esportes e cultura para levar sua imagem para futuros alunos, não há como comparar os dois países neste aspecto. Lá há dissertações que abordam apenas essa questão, assim como casos, como o de Harvard, que em 1905, contratou um técnico de 26 anos para seu time de futebol americano com o mesmo salário que o presidente – e o dobro do valor pago aos professores em tempo integral (BOK, 2000). O autor vai além, descrevendo o quanto as próprias IES têm sido objeto de patrocínio, trazendo não apenas as marcas de empresas para salas e até banheiros, mas para as “cadeiras” acadêmicas. Há nos Estados Unidos títulos como Professor Yahoo de Ciências da Computação ou K- Mart de Marketing. Outro caso é o da Universidade do Tennessee que vendeu sua cor para uma fábrica de tintas: que oferece, assim, a possibilidade de pintar sua casa de laranja-Tennessee.

Vendas pessoais

A literatura utilizada para a construção deste texto traz diversas lacunas. Tapp, Hicks e Stone (2004), por exemplo, sugerem a venda cruzada. Em setores como cartão de crédito, a taxa de respostas é em

torno de 3-4 % e a área educacional oferece uma ampla gama de oportunidades de novas vendas para os clientes atuais, como cursos de especialização, pós-graduação, um novo curso universitário,

workshops etc. A Universidade do Arizona conclama seus alunos, professores e funcionários a se

empenharem na busca por novos alunos (CLARK, 2000, p. 8).

Internet Martin (2006) mostrou a importância cada vez mais crescente dos sites das universidades como ferramenta de comunicação com seu público-alvo, sobretudo no momento da escolha. Para obter mais detalhes sobre as escolas de interesse, a Internet seria a fonte mais completa e fácil de informações. Desse modo, o tipo de informação colocado no site da universidade deve ser cuidadosamente escolhido e redigido. Para ilustrar de modo curioso a importância dos websites, em 2002, funcionários da Princeton invadiram o site de admissão de Yale para espiar os arquivos de 11 alunos que foram selecionados por ambas (KIRP, 2003). Zaski (2004) conta o caso da Universidade de Nova Iorque, que trouxe para a Internet sua identidade (cores, logos) e integrou o processo de matrícula. No período em que foi implantada a mudança, o número de inscrições via site para os cursos dobrou em relação ao anterior. Williams (2000 apud QUATROCHE, 2004) descreve que os alunos veem a Internet como uma fonte de informação relevante e pertinente, trazendo dados de grande valor para a IES, pois mostra, por exemplo, de onde o aluno está acessando o site, o caminho que percorreu, quanto tempo e por quais páginas navegou, de que site veio. Apresenta ainda um estudo da National Association for College Admission Counseling, segundo o qual os candidatos preferiam os contatos onlines aos feitos por telefone.

Eventos Para Foster, Sauser e Self (1994, p. 125), é comum a participação das universidades em eventos para promover sua marca e cursos. Com estandes caprichados, distribuem sacolas, chaveiros, canetas e, sobretudo, folhetos (ou catálogos), com os dados da instituição. Na área de Administração, é comum ver estandes de diversas universidades que oferecem o curso tanto de graduação como de pós em eventos, como HSManagement, Enanpad (Encontro Nacional dos Cursos de Pós-Graduação em Administração), Enangrad (Encontro Nacional dos Cursos de Graduação em Administração) e feiras de MBA. Algumas promovem eventos, como palestras, workshops, feiras (como da Propaganda), semanas (como da Administração), concursos criativos para atrair público (alunos, seus e da concorrência e futuros alunos) e mídia.

Marketing direto

Wonders e Gyure (1991) apontaram o crescimento do marketing direto (mala-direta e e-mail marketing). Para eles, o marketing direto acaba se tornando o “marketing” de muitas instituições, que ainda se mostram satisfeitas só com isso. As universidades acrescentariam, algumas vezes, o uso de uma brochura ou folhetos sobre os cursos e informações sobre datas e procedimentos.

Fonte: baseado em: BOHLEY, Katherine Anne Marketing higher educational institutions in Argentina, Belize,

Bolivia, Mexico, Paraguay, Peru, Uruguay and Venezuela. 1998. [D.B.A. dissertation]. United States --

California: United States International University. Disponível em: ProQuest Digital Dissertations; FOSTER, Ralph S.; SAUSER, William I.; SELF, Donald R. Marketing university outreach programs. Binghamton: Haworth Press, 1994; KIRP, David L. et al. Shakespeare, Einstein, and the bottom line: the marketing of higher education. Cambridge: Harvard University Press, 2003; MARTIN, Tait Jeffrey. Information processing and

college choice: An examination of recruitment information on higher education Web sites using the heuristic-

sistematic model. Ph.D., The Florida State University, 2006, 155 p.; QUATROCHE, Thomas J., Jr. A study of

promotional marketing methods of contact and college-choice preferences among freshman community college students.2004. [Ph.D. dissertation]. United States -- New York: State University of New York at Buffalo.

Disponível em: ProQuest Digital Dissertations; TAPP, Alan; HICKS, Keith; STONE, Merlin. International

Journal of Nonprofit and Voluntary Sector Marketing. London: Nov 2004.Vol.9, Iss. 4, p. 335; WONDERS,

Thomas J.; GYURE, James F. Opportunistic marketing in higher education. Journal of Marketing for Higher

Education, v3 n2, p1-16, 1991.

Apesar disso, alguns autores recomendam não atribuir à propaganda grande influência na escolha da instituição de ensino superior. Os respondentes buscam informação sobre as escolas que já conhecem, que a família e amigos recomendaram, com atenção seletiva voltada para instituições, que em sua opinião atendam ao que têm em mente — posicionamento e objetivos pessoais a serem atingidos. Desse modo, propagandas de escolas desconhecidas ou que não estão no espectro desejado tendem a ter resultado mais baixo. De forma similar, estudo com 951 respondentes no Harry S. Truman College (HASTINGS, 2000 apud

QUATROCHE, 2004) para entender a efetividade dos esforços de marketing, mostrou que 74% dos alunos souberam da escola por meio do boca-a-boca (indicações de pais e amigos). Apenas 7% citam a propaganda pela televisão e míseros 2% pelo jornal.

Além de a influência da propaganda na escolha dos alunos e posicionamento de marketing das instituições não ser considerada tão profunda, as próprias IES não fazem pleno e eficiente uso desse instrumento. Lynch (2004, p. 68-9) arrola algumas pesquisas sobre a deficiência das instituições no que tange à propaganda, escassez ou falha no planejamento até sua execução e mensuração, apesar de esta ser a ferramenta mais usada. Muitas tendem a dar mais crédito à publicidade por gerar menos ceticismo. Cita a pesquisa de Hassler (1974), para a qual essa desconfiança é histórica: numa amostra de 500 alunos, 45% desacreditavam a propaganda das universidades, não a julgando boa e confiável forma de saber o valor de uma instituição.

O fato de o anúncio ter essa característica de curto prazo (focando o preenchimento das vagas), falta de profundidade (a maioria das mídias não oferece espaço para tal) e ser quase sempre na mesma época (alguns meses ou semanas antes do vestibular) é reflexo do público consumidor, ou seja, dos futuros alunos. A falta de pesquisa e conhecimento dos candidatos é, às vezes, assustadora. Muitos acabam tomando uma decisão tão importante, com grande impacto em sua vida profissional, com poucas informações e sem a devida dedicação de tempo e análise. Até na pós-graduação, que lida com alunos mais maduros e mensalidades mais vultosas. Pesquisa conduzida pela Association of MBA (AMBA) focou o fato de uma parte dos alunos só se preocupar com a faculdade menos de um ano antes de sua entrada no ensino superior. Assim, algumas universidades podem achar interessante endereçar a propaganda para outros públicos que não o próprio aluno, como familiares e contratantes (mercado de trabalho). Todavia, falar com os pais – tido como os que mais influenciam a decisão por uma dada universidade –, deve ter uma linguagem diferente da voltada para os filhos (DENNIS, 1998 apud LYNCH, 2004).

Para Wonders e Gyure (1991, p. 2), o marketing (que, em geral, é a propaganda para recrutamento) resulta, em alguns casos, de uma crença superficial, oportunista e generalizada de que a propaganda pode ser a salvação, quando se está perdendo alunos rapidamente. As propagandas não se diferenciam muito das de outros produtos de consumo. Há mais exemplos das proposições únicas de venda (unique selling proposition) nas figuras a seguir com os apelos escolhidos. Independentemente do conceito que cada instituição de ensino quer vender,

Del-Vechio e Caetano (2004) questionam que a maioria foca em sua comunicação a vida profissional — carreira, o futuro do público-alvo —, numa visão prática (que ele chama de utilitarista) da universidade, deixando de lado aspectos “não aplicados”, como o contato com o conhecimento, o ambiente intelectual, o descobrimento de novos horizontes. Analisam exemplos de propagandas de instituições do Vale do Itajaí, ressaltando os slogans e a abordagem usada:

Furb (Universidade Regional de Blumenau): “Una seu talento a nossa experiência”. Foco seria transmitir a credibilidade de seus formados por meio de testemunhais — jovens que se destacaram na região — e “tradição de mais de 40 anos”;

Univali (Universidade do Vale do Itajaí): “Pra quem é cabeça”. Usa modelos de várias “tribos” — cortes de cabelo, penteados e acessórios —. Destaca o fato de a instituição ser a maior universidade do Estado;

Unerj (Centro Universitário de Jaraguá do Sul): “A vida chama por você”. Conta com o apresentador de programa jovem local (Mister Pi) para ressaltar nova fase da vida;

Unidavi (Universidade para o Desenvolvimento do Alto Vale do Itajaí): “Esse é o

caminho”. Tem desenhos de mapas e bússolas, para sinalizar que o caminho passa pela universidade.

A Ilustração 17 é um exemplo que vai numa outra linha, por ressaltar a questão da pesquisa.

Ilustração 17 – Propaganda sobre escolhas na vida e argumento pouco comum: a pesquisa

Braga (2002) analisou as propagandas das instituições de ensino superior e encontrou diversas palavras frequentes. Ele criou uma “fórmula mágica”, que pode ser adaptada pelas instituições, formando um verdadeiro jogo de palavras:

teoria e prática construindo carreiras para o mercado;

teoria e prática formando a empregabilidade no futuro;

excelência/qualidade aprimorando o sucesso há____anos;

tecnologia/modernidade agregando a sua ascensão para a vida;

comprometimento evoluindo as pessoas/você na economia globalizada;

estrutura melhorando profissionais universitários com sucesso;

reconhecimento direcionando suas conquistas na era do conhecimento e

pioneirismo otimizando talentos amanhã.

A venda do serviço educacional não se concentra mais apenas na carreira, trazendo em suas propagandas “diferenciais” como:

preço ou desconto: o apelo da instituição é o preço baixo; a propaganda, em geral voltada para as classes inferiores, foca a mensalidade acessível, que cabe no bolso do aluno. O anúncio da Ilustração 18, da Radial, busca influenciar a escolha por meio do oferecimento de 50% de desconto:

Ilustração 18 – Propaganda que enfatiza a questão da escolha, sem deixar de lado o desconto/preço

Fonte: Jornal Metro. 23 out. 2007. Disponível em: <http://metropoint.metro.lu/20071023_MetroSaoPaulo.pdf>. Acesso em: <24 out. 2007>.

Localização: enfatiza-se a praticidade – como o bairro central, perto de metrô, de centro comercial (ver Ilustração 19).

Ilustração 19 – Senac: propaganda que traz mais uma vez apelo do mercado, mas que destaca localização

Fonte: METRO. Disponível em: <http://www.publimetro.com.br>. Acesso em: 12 abr. 2008.

Del-Vechio (2005) acrescenta ainda os seguintes aspectos: uso de metáforas para indicar valores, cores quentes (como amarelo, vermelho e laranja), vestimenta específica (indicando sucesso ou modernidade, “tribos urbanas”), linguagem jovem (gírias, turma, identificação com a MTV, expressões da moda, alegria das festas universitárias), analogias com o filme Matrix e uso de garoto-propaganda (João Gordo para indicar atitude), elementos da moda e de estilos jovens, como as chamadas Tribos Urbanas.