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Proteção do sujeito trabalhador migrante no âmbito regional:

4. REGULAÇÃO

4.1. AS NORMAS DE PROTEÇÃO INTERNACIONAL DO SUJEITO

4.1.3. Proteção do sujeito trabalhador migrante no âmbito regional:

Organização dos Estados Americanos e Mercosul

Em 1948, três anos após a criação da ONU (1945), foi fundado, na cidade de Bogotá, Colômbia, pela Carta da Organização dos Estados Americanos287 (entrou em vigor em dezembro de 1951), o mais antigo organismo internacional regional, o qual reúne os 35 Estados independentes das Américas288. Nascido sob a missão histórica de “oferecer ao Homem uma terra de liberdade e um ambiente favorável para o desenvolvimento de sua personalidade e a realização de suas justas aspirações”, demarca a importância de uma ordem social justa, fundada no desenvolvimento econômico, à concretização da plena realização das aspirações da pessoa humana, seu artigo 45 dispõe sobre o trabalho, não somente como direito, mas

285 Idem pp. 6-7

286 Idem pp. 4-5.

287 A Carta da Organização dos Estados Americanos foi promulgada no Brasil pelo Decreto nº 30.544, de 14 de fevereiro de 1952. < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/d2677.htm>

288 <

http://www.oas.org/dil/port/tratados_A-41_Carta_da_Organiza%C3%A7%C3%A3o_dos_Estados_Americanos.htm>

também como dever social, conformador da dignidade do trabalhador, que compreende o direito a um regime de salários justo, essencial à vida, saúde e nível econômico digno, tanto nos anos de atividade, quanto nos de velhice.

A Comissão Interamericana de Direitos Humanos, órgão da Organização dos Estados Americanos, elaborou em 2015 um relatório sobre a mobilidade humana no contexto da sua abrangência regional, em que aponta para a existência de múltiplas fontes normativas de regulação da migração internacional entre os Estados (marcos normativos, foros e instituições)289. Essa multiplicidade de normas e mecanismos estatais, seja bilateral, seja multilateral, acaba por acarretar “uma falta de coerência na governança mundial, regional e nacional da migração internacional, que coloca desafios para os marcos normativos a nível universal e regional de direitos humanos”290. Por sua avaliação, os migrantes internacionais estão expostos a um contexto de discriminação e de vulnerabilidade decorrentes da nítida diferença de poder em relação aos nacionais, cuja dimensão ideológica sustenta situações de jure (desigualdades entre nacionais e estrangeiros perante a lei) e de facto (desigualdades estruturais)291. Diante dessa situação, um dos principais desafios a serem enfrentados na proteção dos direitos humanos dos migrantes consiste na ignorância das pessoas sobre a pletora de políticas, leis e práticas estatais, bem como na persistência de ações e omissões, tanto no âmbito estatal, quanto no privado, de negação do reconhecimento dos migrantes internacionais como sujeitos de direitos:

[...] Es preciso recalcar que inmigrantes y trabajadores migratorios se encuentran en una condición muy vulnerable. Estas personas muchas veces ignoran las leyes y el idioma del país receptor y en varias ocasiones deben enfrentar abierta hostilidad por parte de la población, incluso de las autoridades. La situación es particularmente grave en el caso de los migrantes indocumentados, cuya situación inmigratoria los expone aún más a abusos. De hecho, dada la situación particular de los migrantes se sostiene que estas personas enfrentan una condición de vulnerabilidad estructural. A raíz de ella, los migrantes están expuestos a una serie de atropellos.

Entre ellos se pueden mencionar arrestos arbitrarios y la ausencia

289 Comisión Interamericana de Derechos Humanos. Derechos humanos de migrantes, refugiados, apátridas, víctimas de trata de personas y desplazados internos: normas y estándares del sistema interamericano de derechos humanos. OEA. 2015, pp. 40-41.

Disponível em: <http://www.oas.org/es/cidh/informes/pdfs/MovilidadHumana.pdf>

290 Idem p. 12.

291 Idem pp 14-15

de debido proceso; deportaciones masivas; discriminación para concesión de la nacionalidad o para acceder a servicios sociales a los que extranjeros tienen derecho por ley; condiciones de detención infrahumanas; apremios ilegítimos por parte de autoridades como policías y funcionarios de inmigración; y completa indefensión cuando son expuestos a condiciones de explotación por parte de empleadores inescrupulosos. Estas situaciones afectan de forma particular a las mujeres y niños migrantes, quienes están además expuestos a excesos como acoso sexual, golpizas y condiciones deficientes de trabajo292.

A partir desse contexto de representação simbólico-cultural dos sujeitos migrantes trabalhadores, outro desafio a ser transposto consiste no fomento a mecanismos de acesso a justiça. Nesse sentido, a Comissão Interamericana de Direitos Humanos identifica no panorama institucional de implementação e de interpretação dos direitos humanos dos migrantes: ampla margem de discricionariedade das autoridades, inobservância de garantias do devido processo legal, bem como insuficiente ou inexistente proteção judicial e, consequentemente, alto nível de impunidade das situações de violação dos direitos humanos. Daí a necessidade de se enfrentar a clivagem existente entre o marco jurídico normativo internacional e as políticas e práticas nacionais293.

Com o objetivo de combater as violações de direitos humanos, além dos “vazios de proteção que enfrentam as pessoas no contexto da mobilidade humana”294, a Comissão Interamericana de Direitos Humanos definiu standards jurídicos sobre os direitos dos migrantes295.

Nesse sentido, a Comissão registrou que os direitos humanos estão fundamentados em base normativa constituída por 11 instrumentos interamericanos, os quais se aplicam aos migrantes, mesmo que não tratem especificamente dessa matéria296: Declaração Americana dos Direitos e Deveres do Homem297 (1948); Convenção Americana sobre Direitos Humanos298 (1969); Convenção Interamericana para Prevenir e Punir a

292 Idem p.

293 Idem p. 15

294 Ídem p. 40-41

295 Idem pp..15-16

296 Idem pp. 40-41

297 https://www.cidh.oas.org/basicos/portugues/b.Declaracao_Americana.htm

298 Promulgada no Brasil pelo Decreto nº 678 de 6 de novembro de 1992.

<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/d0678.htm>

Tortura299 (1985); Protocolo Adicional à Convenção Americana sobre Direitos Humanos em Matéria de Direitos Econômicos, Sociais e Culturais, “Protocolo de São Salvador”300 (1988); Protocolo à Convenção Americana sobre Direitos Humanos Relativos à Abolição da Pena de Morte301 (1990); Convenção Interamericana para Prevenir, Punir e Erradicar a Violência contra a Mulher,

“Convenção de Belém do Pará”302 (1994); Convenção Interamericana para a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra as Pessoas Portadoras de Deficiência303 (1999); Convenção Interamericana contra o Racismo, a Discriminação Racial e Formas Correlatas de Intolerância (2013);

Convenção Interamericana contra toda Forma de Discriminação e Intolerância (2013); Convenção Interamericana sobre a Proteção dos Direitos Humanos dos Idosos (2015).

A Declaração Americana dos Direitos e Deveres do Homem “é o primeiro instrumento internacional de caráter geral”304 e desde o seu preâmbulo estabelece que “os direitos essenciais do homem não derivam do fato de ser ele cidadão de determinado Estado, mas sim do fato dos direitos terem como base atributos de pessoa humana”. Dispõe, ainda, em seu artigo XIV, o direito ao trabalho em condições dignais e o direito a seguir livremente a vocação “na medida em que for permitido pelas oportunidades de emprego existentes”.

Assegura, também, uma remuneração equivalente à capacidade e habilidade de trabalho, que propicie um nível de apropriado à manutenção de si e da família.

A Comissão Interamericana de Direitos Humanos, ao tratar da aplicação das normas standards, alerta que, apesar de não possuir a forma jurídica de tratado internacional, a Declaração Americana constitui fonte de obrigações para os Estados-membros, já que estas derivam das obrigações

299 Promulgada no Brasil pelo Decreto nº 98.386, de 9 de dezembro de 1989.

<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/1980-1989/D98386.htm>

300 Promulgado no Brasil pelo Decreto nº 3.321, de 30 de dezembro de 1999.

<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/d3321.htm>

301 Promulgado no Brasil pelo Decreto nº 2.754, de 27 de agosto de 1988.

<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/D2754.htm>

302 Promulgada no Brasil pelo Decreto nº 1.973, de 1º de agosto de 1996.

http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/1996/d1973.htm

303 Promulgada no Brasil pelo Decreto nº 3.956, de 8 de outubro de 2001.

http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/2001/d3956.htm

304 OEA. CIDH. p. 41

previstas na Carta da OEA, pelo que obrigam também os Estados que não assinaram a Convenção Americana305:

[...] la Declaración Americana ha sido el instrumento en el cual se ha basado la Comisión para analizar un gran número de casos y situaciones relativas a violaciones de derechos humanos de personas en el contexto de la migración, quienes para el momento de la

ocurrencia de los hechos se encontraban

bajo la jurisdicción de Estados que no habían ratificado la Convención Americana sobre Derechos Humanos.

Por outro lado, a Convenção Americana de Direitos Humanos, também denominada de Pacto de São José da Costa Rica306, possui status de tratado internacional e reconhece que a concretização do ideal de liberdade do ser humano, sem temor e miséria, depende da materialização tanto dos direitos econômicos, sociais e culturais quanto dos civis e políticos. Com relação aos direitos dos migrantes, dois artigos assumem especial relevância: o art. 1.1, que estabelece o princípio da não-discriminação, e o art. 22, que dispõe sobre os direitos de circulação e de residência:

Outro importante instrumento internacional de proteção no âmbito regional americano consiste no Protocolo Adicional à Convenção Americana sobre Direitos Humanos em Matéria de Direitos Econômicos, Sociais e Culturais – Protocolo de São Salvador. O direito ao trabalho está regulamentado em seu art. 6º, que inclui, nesse conceito, “a oportunidade de obter os meios para levar uma vida digna decorosa através do desempenho de atividade lícita, livremente escolhida ou aceita”. Estabelece, ainda, o compromisso dos Estados-Partes de adotar medidas em direção ao pleno emprego, orientação vocacional e treinamento técnico-profissional.

Especificamente quanto aos migrantes, também prevê, expressamente, o princípio da não discriminação.

Destaca, ainda, a Comissão Interamericana de Direitos Humanos, a responsabilidade de ambos os países, de destino e de origem, pela proteção e

305 Idem p. 42

306 Ratificaram a Convenção Americana os seguintes Estados: Argentina, Barbados, Bolívia, Brasil, Chile, Colômbia, Costa Rica, Dominica, Equador, El Salvador, Grenada, Guatemala, Haiti, Honduras, Jamaica, México, Nicarágua, Panamá, Paraguai, Peru, República Dominicana, Suriname, Trinidad e Togabo, Uruguai e Venezuela.

concretização dos direitos humanos dos migrantes internacionais. Embora o Estado que recebe o migrante seja o responsável principal, também o Estado de origem deve observar obrigações gerais, notadamente o dever de prevenção, ou seja, o de “gerar e assegurar as condições para que seus nacionais não se vejam forçados a migrar, assim como corrigir as causas geradoras dos fluxos migratórios”307.

Nesse contexto, cumpre especial relevância o papel da Corte Interamericana de Direitos Humanos308 no sistema de interpretação e aplicação desses direitos na região das Américas. A propósito da situação dos migrantes internacionais, merece atenção a sua manifestação na Opinião Consultiva 18/03, de 17 de setembro de 2003, solicitada pelo México acerca da condição jurídica e direitos dos migrantes indocumentados.

No caso, o México solicitou interpretação sobre os artigos 3.1 e 17 da Carta da Organização dos Estados Americanos; II (Direito de igualdade perante a lei) da Declaração Americana dos Direitos e Deveres do Homem; 1.1 (obrigação de respeitar os direitos), 2 (dever de adotar disposições de direito interno), 24 (igualdade perante alei) da Convenção Americana; 1, 2.1 e 7 da Declaração Universal de Direitos Humanos e 2.1, 2.2, 5.2 e 26 do Pacto Internacional de Direitos Civis e Políticos. Foram quatro as perguntas encaminhadas: 1. Pode um Estado americano estabelecer em sua legislação do trabalho um tratamento prejudicialmente distinto para os trabalhadores migrantes indocumentados em relação aos direitos trabalhistas dos seus cidadãos?; 2. A presença das pessoas no território de um Estado americano é condição necessária para o respeito e garantia dos direitos e liberdades das pessoas sujeitas à sua jurisdição reconhecidos nas disposições internacionais?; 3. Qual a validade da interpretação por um Estado americano no sentido de subordinar ou condicionar a observância dos direitos humanos fundamentais frente as obrigações internacionais derivadas do Pacto Internacional de Direitos Civis e Políticos e outras obrigações de direito

307 Opus cit. p. 77.

308 A Corte Interamericana de Direitos Humanos consiste em uma instituição judicial autônoma que tem por objetivo aplicar e interpretar a Convenção Americana de Direitos Humanos. Exerce uma função contenciosa, de resolução de casos e de supervisão de sentenças, e uma função consultiva.

internacional oponíveis erga omnes? 4. Qual o caráter possui hoje o princípio de não discriminação e o direito à proteção igualitária e efetiva da lei na hierarquia normativa estabelecida pelo direito internacional geral, ou seja, podem ser consideradas jus cogens309?

Sob a presidência do expoente jurista brasileiro Antônio Augusto Cançado Trindade, a opinião emitida pela Corte Interamericana representa expressivo marco jurídico de reconhecimento da condição dos migrantes indocumentados como sujeitos de direitos trabalhistas, independentemente da sua condição migratória:

1. Que os Estados têm a obrigação geral de respeitar e garantir os direitos fundamentais. Com este propósito, devem adotar medidas positivas, evitar tomar iniciativas que limitem ou violem um direito fundamental, e eliminar as medidas e práticas que restrinjam ou violem um direito fundamental. 2. Que o descumprimento pelo Estado, através de qualquer tratamento discriminatório, da obrigação geral de respeitar e garantir os direitos humanos, gera sua responsabilidade internacional. 3. Que o princípio de igualdade e não discriminação possui um caráter fundamental para a proteção dos direitos humanos tanto no Direito Internacional como no interno. 4.

Que o princípio fundamental de igualdade e não discriminação faz parte do Direito Internacional geral, à medida que é aplicável a todos os Estados, independentemente de que seja parte ou não em determinado tratado internacional. Na atual etapa da evolução do Direito Internacional, o princípio fundamental de igualdade e não discriminação ingressou no domínio do jus cogens. 5. Que o princípio fundamental de igualdade e não discriminação, revestido de caráter imperativo, acarreta obrigações erga omnes de proteção que vinculam todos os Estados e geram efeitos com respeito a terceiros, inclusive particulares. 6. Que a obrigação geral de respeitar e garantir os direitos humanos vincula os Estados, independentemente de qualquer circunstância ou consideração, inclusive o status migratório das pessoas. 7. Que o direito ao devido processo legal deve ser reconhecido no contexto das garantias mínimas que se devem oferecer a todo migrante, independentemente de seu status migratório. O amplo alcance da intangibilidade do devido processo compreende todas as matérias e todas as pessoas, sem discriminação alguma. 8. Que a qualidade migratória de uma pessoa não pode constituir uma justificativa para privá-la do desfrute e do exercício de seus direitos humanos, entre eles os de caráter trabalhista. O imigrante, ao assumir uma relação de trabalho, adquire direitos por ser trabalhador, que devem ser reconhecidos e garantidos, independentemente de sua situação regular ou irregular no Estado receptor. Estes direitos são consequência da relação

trabalhista. 9. Que o Estado tem a obrigação de respeitar e garantir os direitos humanos trabalhistas de todos os trabalhadores, independentemente de sua condição de nacionais ou estrangeiros, e não tolerar situações de discriminação em detrimento destes nas relações de trabalho que se estabeleçam entre particulares (empregador-trabalhador). O Estado não deve permitir que os empregadores privados violem os direitos dos trabalhadores, nem que a relação contratual viole os padrões mínimos internacionais. 10.

Que os trabalhadores, ao serem titulares dos direitos trabalhistas, devem contar com todos os meios adequados para exercê-los. Os trabalhadores migrantes indocumentados possuem os mesmos direitos trabalhistas que correspondem aos demais trabalhadores do Estado receptor, e este último deve tomar todas as medidas necessárias para que assim se reconheça e se cumpra na prática. 11.

Que os Estados não podem subordinar ou condicionar a observância do princípio da igualdade perante a lei e de não discriminação à consecução dos objetivos de suas políticas públicas, quaisquer que sejam estas, incluídas as de caráter migratório310.

O sistema internacional regional de proteção dos direitos dos sujeitos migrantes é complementado pelas normas pactuadas no âmbito do Mercado Comum do Sul – Mercosul, fundado a partir do Tratado de Assunção de 1991311. Atualmente é composto por quatro membros plenos: Argentina, Brasil, Paraguai e Uruguai. Posteriormente, a Venezuela passou a fazer parte do Mercosul, no ano de 2012, mas teve sua autorização suspensa em dezembro de 2016. Por outro lado, a Bolívia requereu a sua adesão como membro pleno e ainda aguarda a aprovação do protocolo de inclusão pelos demais membros312.

Nos termos do Tratado de Assunção, a constituição do Mercado Comum tem por objetivo “a livre circulação de bens, serviços e fatores produtivos”, o que inclui a livre circulação de trabalhadores313. No que se refere aos trabalhadores, entretanto, as normas internacionais regionais se limitam à regulamentação da migração. Mesmo que voltada à facilitação da entrada e

313 GRAVATÁ, Pedro Nicola. A condição jurídica do trabalhador imigrante no direito brasileiro.

São Paulo: LTr, 2011, p. 109

propósito da livre circulação314. No âmbito do Mercosul, o sistema de proteção dos direitos dos migrantes está construído sob a seguinte marco regulatório315: Declaração Sociolaboral do Mercosul de 1998 – Carta Social do Mercosul, (revista no ano de 2015 pela I Reunião Negociadora realizada em Brasília);

Acordo Multilateral de Seguridade Social do Mercosul (1997); Declaração de Santiago sobre Princípios Migratórios (2004); Acordos 11/02, 12/02, 13/02 e 14/02 do Conselho do Mercado Comum do Mercosul; Declaração de Assunção sobre o Tráfico de Pessoas e Tráfico Ilícito de Migrantes (2001); Declaração de Assunção (2006); Declaração de Caracas (2007); Declaração de Lima (2006) e Compromisso de Montevidéu sobre Migrações e Desenvolvimento dos chefes de Estado e do Governo da comunidade Ibero-Americana (2006); Acordo sobre Residência para Nacionais dos Estados Partes do Mercosul (2009).

Por um lado, em seu preâmbulo, a Declaração Sociolaboral do Mercosul reconhece a importância da integração regional, não apenas no que se refere ao âmbito comercial e econômico, mas também quanto à “adequação dos marcos regulatórios trabalhistas às novas realidades configuradas por essa mesma integração e pelo processo de globalização da economia”, cujo objetivo deve ser o “reconhecimento de um patamar mínimo de direitos dos trabalhadores no âmbito do Mercosul, correspondente às convenções fundamentais das OIT”. Por outro, a Declaração de Santiago sobre Princípios Migratórios também admite que o fortalecimento do processo de integração se vincula à temática migratória, principalmente ante a valiosa contribuição dos trabalhadores migrantes como “capital social que dinamiza e potência os diversos setores econômicos e sociais dos países de acolhida migratória.”.

Nessa perspectiva, o Acordo sobre Residência para Nacionais dos Estados Partes do Mercosul316 consiste em um significativo instrumento de proteção da condição dos trabalhadores migrantes, representando avanço quanto à implementação de uma política de livre circulação de pessoas e trabalho, bem como de não discriminação. Assim, busca “estabelecer regras comuns para a tramitação da autorização de residências aos nacionais dos

314 Idem p. 113

315 Idem pp. 113-114.

316 Promulgado pelo Decreto nº 6.975, de 7 de outubro de 2009.

Estados Parte Associados do Mercosul” na direção do aprofundamento do processo de integração. Com relação ao trabalhador, o art. 8º, ao estabelecer regras gerais sobre entrada e permanência, garante às pessoas que tenham obtido residência temporária ou permanente, o direito a exercer qualquer atividade “nas mesmas condições dos nacionais do país de recepção, de acordo com as normas legais de cada país”. Destaca-se, ademais, a relevância do art. 9º, que dispõe sobre o direito dos migrantes e dos membros das suas famílias, garantindo a igualdade de direitos e liberdades civis, sociais, culturais e econômicas em relação aos nacionais do país de recepção, “em particular o direito a trabalhar e exercer toda atividade lícita, nas condições que dispõem as leis”; a igualdade de tratamento com os nacionais quanto à legislação trabalhista (remuneração, condições de trabalho e seguro social); compromisso em matéria previdenciária (acordos de reciprocidade); direitos de transferir recursos e direitos dos filhos dos imigrantes.

Em recente estudo, Ludmila Andrzejewski Culpi317, fundamentada em entrevistas realizadas com representantes do Mercosul, gestores da política migratória do Brasil e da Argentina, além de especialistas e atores da sociedade civil de ambos os países, demonstra que o Mercosul constituiu importante espaço de intermediação para o desenho da Nova Lei de Migração brasileira (Lei nº 13.445/2017), que se inspirou na Lei de Migrações nº 25.871 de 2003 da Argentina, que, por sua vez, contribuiu também para a construção dos Acordos de Residência no Mercosul. A autora assevera que, como “o maior receptor de imigrantes mercosulinos na região”318 a Argentina assumiu a liderança do bloco quanto às discussão acerca da expansão da livre circulação de pessoas319. Acrescenta que “um elemento central da lei argentina de 2004 é que ela cita pela primeira vez o processo de integração regional e confere aos cidadãos nacionais dos países membros, um tratamento diferenciado prioritário”.

317 http://www.humanas.ufpr.br/portal/nepri/files/2012/04/Nova-lei-de-

migra%C3%A7%C3%B5es-brasileira_Inspira%C3%A7%C3%A3o-no-modelo-da-lei-argentina.pdf

318 Idem p. 12

319 Idem p. 12

Ambos os países coordenaram os seus interesses quanto à questão migratória, por meio do Fórum de Estudos Migratórios – FEM, contando com a cooperação e participação ativa de Organizações Não Governamentais, como a CONECTAS e o Centro de Estudios Legales y Sociales – CELS, que definiu três áreas prioritárias a serem enfrentadas pelo novo marco legal brasileiro: “i)

Ambos os países coordenaram os seus interesses quanto à questão migratória, por meio do Fórum de Estudos Migratórios – FEM, contando com a cooperação e participação ativa de Organizações Não Governamentais, como a CONECTAS e o Centro de Estudios Legales y Sociales – CELS, que definiu três áreas prioritárias a serem enfrentadas pelo novo marco legal brasileiro: “i)