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Para a processualidade investigativa, recorri à metodologia da História Oral, onde os relatos orais se constituem em referência maior para o desenvolvimento do trabalho investigativo, ou seja, as narrativas, o conteúdo dos relatos, enquanto fonte principal de coleta de informações e/ou dados que, por sua vez, revelam práticas sociais e as experiências de sujeitos através de suas narrativas gravadas, transcritas e analisadas com a finalidade de responder às questões previamente formuladas no estudo e dar origem à produção do enredo.

18 Os procedimentos metodológicos foram elaborados através das seguintes referências:

KOSMINSKY, Ethel. Pesquisas qualitativas – a utilização da técnica de história de vida e de depoimentos pessoais em Sociologia. Revista Serviço Social & Sociedade. São Paulo: Cortez, dez. 1985. n. 19. p. 45-57

LANG, Alice Beatriz da Silva Gordo et al. História oral e pesquisa sociológica: a experiência do CERU. São Paulo: Humanitas, 1998.

WHITAKER, Dulce C. A. Análise de entrevistas em pesquisas com histórias de vida. XXVI ENCONTRO CERU. São Paulo: CERU. (Mimeografado).

Pensas em palavras, para ti a linguagem é um fio inesgotável que teces como se a vida se fizesse ao contá- la. Eu penso em imagens congeladas numa fotografia. No entanto, esta não está impressa numa placa, parece desenhada a pena, é uma recordação, minuciosa e perfeita, de volumes suaves e cores quentes, renascentista, como uma intenção captada sobre um papel granulado ou uma tela. É um momento profético, é toda a nossa existência, tudo o que foi vivido e está por viver, todas as épocas simultâneas, sem princípio nem fim. (ISABEL ALLENDE, 1991)19

O uso da História Oral fez-se em uma perspectiva sociológica20, destacando a

técnica do relato de vida na busca e apreensão do objeto de estudo – conhecer o significado atribuído pelos jovens, com idade entre 16 e 20 anos, que já cumpriram a medida socioeducativa de internação nas Unidades da CASA e, atualmente, cumprem a medida socioeducativa de liberdade assistida, a fim de conhecer a condição de vida destes jovens que optaram e/ou foram conduzidos à vida do crime em virtude de inúmeras determinações.

Destarte, o relato de vida se constitui no relato oral dos jovens sobre sua existência através do tempo, mediado pela memória – as recordações de sua trajetória existencial.

Apesar do uso de um roteiro pré-elaborado sobre determinadas temáticas, a serem contempladas no decorrer da entrevista, foi respeitada a liberdade do sujeito pesquisado, para que ele contasse sobre sua própria vida, ao acaso das lembranças, sem procurar retê-lo ou dirigi-lo, pois segundo Rojas (1993, p. 93)21, é “[...] importante

estabelecer que a narrativa é um momento da coleta de dados, é um momento específico

19 ALLENDE, Isabel. Contos de Eva Luna. Rio de Janeiro, Bertrand, 1991.

20 As pesquisas com orientação sociológica estão voltadas para a práxis, para o conhecimento da sociedade, a fim de fornecer dados e apreender relações que possam fundamentar uma ação. O objetivo da pesquisa sociológica tem na análise e interpretação dos dados um elemento fundamental. Não se trata de coletar o dado, construir um documento e arquivá-lo para preservar a memória de um tempo, mas, sim, por meio da análise e interpretação, oferecer subsídios para uma ação racional e coerente.

Através da História Oral, a Sociologia não se propõe a chegar ao conhecimento pleno e insofismável da realidade, mas conhecer versões referidas a indivíduos sociologicamente qualificados e inseridos em uma dada conjuntura que deve ser considerada. Isto não significa que não deve haver diálogo entre a História e a Sociologia no tocante às questões teóricas e aos temas-objeto com os quais as duas têm trabalhado nos últimos anos e contribuído para a ampliação do conhecimento científico sobre as vivências do homem em sociedade, pois as contribuições das referências teóricas e as diversificadas práticas de pesquisa que têm sido utilizadas em cada área das pesquisas participam da reconstrução histórico-sociológicas (KOSMINSKY, 1985; LANG et al., 1998).

21 ROJAS, Juana E. A. O indizível e o dizível na história oral. In: MARTINELLI, Maria Lúcia. (Org.). Pesquisa qualitativa – um instigante desafio. São Paulo: Veras, 1999.

da pesquisa e não a pesquisa na totalidade”.

O primeiro passo para a coleta do relato de vida consistiu em realizar uma ficha do sujeito pesquisado com seus dados pessoais: idade, sexo, estado civil, cor, nacionalidade, naturalidade, religião, ocupação atual ou já exercida e outras informações que se fizessem necessárias. Outro suporte de fundamental importância foi a leitura atenta e cuidadosa dos prontuários, de modo a colher dados significativos da vida pregressa institucional e delituosa.

Em seguida, os relatos foram colhidos através de entrevistas gravadas com a máxima fidelidade, a fim de conservar as expressões dos jovens e sua maneira de encadear os fatos e propiciar-lhes um ambiente de liberdade para narrarem. A liberdade de expressar-se revela muito mais a realidade, mesmo que sob aparente desordem, do que entrevistas muito dirigidas ou questionários.

As intervenções foram feitas somente quando necessárias, como, por exemplo, para pedir maior precisão sobre um dado ou outro, muito embora apresentem o caráter de não-diretividade. Pelo emprego da técnica de modo livre, o problema e objetivos da pesquisa nortearam os trabalhos, bem como o uso de um roteiro pré-elaborado sobre determinadas temáticas, no entanto, outras surgiram no decorrer da entrevista.

Foi construído, ainda, no processo da coleta, um diário de pesquisa e/ou caderno de campo, com anotações feitas sobre as tarefas empíricas, registro das condições em que foram feitas as entrevistas – onde, quando, quem, o quê – isto porque todo estímulo físico, psicológico e social poderia alterar o encaminhamento proposto para o relato.

A análise das temáticas presentes e dos conteúdos apreendidos através das narrativas acompanhou todo o processo, desde a transcrição até a interpretação final.

Primeiramente, foi realizada a recuperação das entrevistas através da digitação das narrativas gravadas, de forma a retomar o contato com os dados em maior profundidade e realizar a identificação preliminar dos temas. Em seguida, foi realizada a análise das entrevistas de forma individualizada, entrevista por entrevista, para reconfirmação dos temas e encaminhamento da síntese.

Com isso, foram realizados algumas aproximações nos relatos de vida com base, em primeiro lugar, em temas mais amplos e, logo a seguir, em temas específicos, o que permitiu construir um roteiro para as análises temáticas, descobrir pontos em comum e determinantes sociais, pois para uma análise sociológica é necessário caracterizar os

grupos sociais, compará-los, detectar semelhanças e diferenças.