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Anteriormente ao capitalismo, por milênios, durante a trajetória da humanidade, indivíduos das mais diferentes nacionalidades, etnias e culturas foram escravizados. Pelo Egito, Babilônia, Grécia, Roma e tantos outros locais, o modo de produção escravista foi a principal forma de construção das economias das antigas civilizações e, para a época, era o modelo econômico predominante (AMIN, 1989).

No entanto, durante o domínio dessas civilizações, o que o modelo não realizava era a distinção entre senhores e escravizados por determinados fatores físicos, ou fenótipos, tal como a cor de pele, mas sim a separação entre aqueles que eram de melhor condição de vida, que poderiam comprar e vender indivíduos escravizados, ou até mesmo pequenos produtores, daqueles que eram prisioneiros de guerra, subordinados, etc., ou seja, basicamente, classe dominada e classe dominante. A primeira sendo composta pelos que trabalhavam em prol da força central, de forma que haviam tido seu povo incorporado por meio da expansão das antigas civilizações ou que acabam por nascer “naturalmente” como indivíduos servis. Enquanto os da segunda seriam os nascidos nas cidades-Estado, que possuíam grandes extensões de terra, que deteriam, por fim, meios de produção.

Porém, como foi explicitado anteriormente, no capitalismo a relação de distanciamento entre o indivíduo e o produto de seu trabalho, com ambos sendo realizados dentro da produção como mercadoria, ocorre de modo que a escravidão nas colônias é oriunda da exploração da força de trabalho majoritariamente não branca ou não europeia.

Possibilitando, em um quadro de autoafirmação europeia com o eurocentrismo, que o determinismo econômico nas colônias e nas metrópoles adquirisse o caráter étnico.

Se, na França, a monarquia fosse branca, os burgueses, mestiços e as massas, negras, a Revolução Francesa teria sido registrada na História como uma guerra de raças. Mas, embora na França fossem todos brancos, lutaram do mesmo modo. A luta de classes termina ou na reconstrução da sociedade ou na ruína comum das classes em luta (JAMES, 2010, p. 128).

No contexto da colonização na Idade Moderna, a distinção entre os europeus e os povos submetidos a eles acontecia pela cor da pele. Com isso, “o negro, num ambiente estranho, destacando-se pela cor e pelos traços, ignorando a língua e os costumes do homem branco, podia jamais vir a ter acesso a um lote de terra. Com as diferenças raciais ficava mais fácil justificar e racionalizar a escravidão” (WILLIAMS, 2012, p. 49). E a mesma ideia se aplica aos povos indígenas na Abya Yala.

Os colonizadores se utilizaram pelo continente americano dos indígenas como primeira opção. Logo que eles povoavam todo o continente e, apesar de vencerem os europeus em questão de número, sua capacidade bélica era limitada, seus corpos foram vítimas de doenças trazidas pelos invasores e, em sua grande maioria, viviam em pequenas comunidades sem um senso de união que pudesse unificar sua luta. Porém, após o extermínio de milhões de indígenas, as populações africanas escravizadas são trazidas ao continente americano pelos navios negreiros de forma a solucionar a escassez de mão de obra explorada.

Com o comércio mercantil dominando grande parte do continente, a inserção do trabalho escravizado em um sistema já desenvolvido de exploração das minas, campos, cidades e florestas foi de fácil assimilação ao capital. E não apenas no seu aspecto econômico, mas convergindo para sua matriz ideológica. Como descreve brevemente Eric Williams (2012) sobre a escravidão no Caribe, e que pode ser generalizada para o resto da América Latina:

A escravidão no Caribe tem sido identificada com o negro de forma demasiada estreita. Com isso deu-se uma feição racial ao que é basicamente um fenômeno econômico. A escravidão não nasceu do racismo: pelo contrário, o racismo foi

consequência da escravidão. O trabalho forçado no Novo Mundo foi vermelho,

branco, preto e amarelo; católico, protestante e pagão. O primeiro caso de tráfico e trabalho escravos que se desenvolveu no Novo Mundo dizia respeito, em termos raciais, não ao negro, mas ao índio. Os indígenas sucumbiram rapidamente ao excesso de trabalho exigido, à alimentação insuficiente, às doenças do homem branco e à incapacidade de se adequar ao novo modo de vida. Acostumados a uma vida de liberdade, a constituição física e o temperamento dos índios não se adaptavam bem aos rigores da escravidão nas fazendas [plantations]. Como escreve Fernando Ortíz: „Submeter o índio às minas, a seu trabalho monótono, insalubre

da vida. [...] Era escravizar não só sua carne, mas também seu espírito coletivo’

(WILLIAMS, 2012, pp. 34-35, grifos nossos).

Dessa forma, por séculos, o escravismo foi o modo de produção mais rentável à acumulação primitiva europeia, contribuindo na formação das burguesias nacionais e com a presença dos monopólios nas colônias. E, como já descrevemos em parte anteriormente, esses fenômenos levaram à uma movimentação social que possibilitaria o surgimento e estabelecimento do liberalismo econômico, filosófico e político como uma das particularidades ideológicas dessa nova mentalidade europeia.

Tendo suas origens nos século XV e XVI, o liberalismo e o Iluminismo foram os representantes máximos da experiência burguesa em uma Europa que vivenciava em primeira mão a mudança da ordem quanto à atuação desses grupos em ascensão devido ao capitalismo mercantilista. Com o crescimento do mercado e sua concepção como ator independente, as burguesias nacionais tiveram que buscar novas formas de justificação e atuação que transbordavam além dos limites impostos pelo feudalismo, apoiando-se em novos ideais sobre a liberdade e igualdade de atuação dos indivíduos, da sociedade e da propriedade privada. O capitalismo adquiriria seu principal expoente com os Estados nacionais.

Dentro desse movimento, que viria a se mostrar predominante por todo o continente europeu, a França e a Inglaterra seriam os principais expoentes dos novos ideais, popularizando-se principalmente os pensamentos de filósofos como Thomas Hobbes, John Locke e Jean-Jacques Rousseau. Destacaremos, brevemente, os ideais de cada um, assim como algumas de sua características particulares, logo que, ainda que bebessem das mesmas fontes do pensamento racionalista grego e se utilizassem do mesmo arcabouço histórico para a construção de seus pensamentos, chegando a conclusões muito parecidas quanto à necessidade de certos direitos fundamentais, as formas como elaboram diferem em grande medida (OLIVEIRA, E., 2020).

Um dos primeiros a estabelecer-se dentro do contexto europeu mercantil absolutista de XVII foi Thomas Hobbes. Ainda tendo grande influência dos regimes monárquicos e observando os conflitos com os liberais sobre a forma como deveria se dar o governo, Hobbes declarava que o Estado, simbolizado aqui pela figura do rei, deveria ser soberano e defensor da paz. Esse papel deveria ser, então, aplicado pela adoção de leis rígidas que fossem capazes de colocar o estado de natureza humana – descrito pelo autor como egoísta e ganancioso – sob o controle de um grande “Leviatã” soberano, logo que, ao se deparar com uma constante guerra de todos contra todos (como a vista entre os monarquistas e liberais), os indivíduos teriam medo e temor de ir contra as vontades desse grande órgão que rege a sociedade. Assim,

o Estado, através das leis, representaria o resultado do pacto entre os indivíduos, possibilitando que, desde que obedecessem ao pacto, eles possuíssem sua liberdade e seus direitos democráticos, tais como o da posse sobre a propriedade, garantidos.

Já para John Locke, conhecido como pai do liberalismo, o Estado não carregaria o mesmo instrumento despótico descrito por Hobbes. Para Locke, os indivíduos possuem primordialmente o direito à liberdade, esta mesma liberdade é o princípio básico para o desenvolvimento de uma sociedade. No entanto, ela seria efetivada por meio de um contrato social, o qual, como em Hobbes, é assegurado pela presença das leis, com os indivíduos decidindo seguir o poder superior de legislação para escapar de seu estado de natureza. Locke estabelece em seu pensamento que os seres humanos possuem intrinsecamente a maldade e o egoísmo em si, instintos que guiam em grande parte as ações humanas, mas que, para garantir sua sobrevivência, o ser humano decide viver em sociedade, estabelecendo um contrato de liberdade condicionada pela política e o direito. Com isso, a liberdade seria descrita como um elemento de autoridade para punir aqueles que não seguem tais medidas, garantindo os impulsos “naturais humanos” e dos interesses privados, como a propriedade (OLIVEIRA, E., 2020).

Por fim, mencionaremos o pensamento do filósofo Rousseau. Vinculando-se aos ideais de democracia e tendo como panorama teórico um distanciamento de quase cem anos de Hobbes e Locke, Rousseau trabalha em seus estudos conceitos de desigualdade e pacto social como uma construção social. Para Jean-Jacques, diferentemente de Locke, o ser humano é naturalmente um ser bom, sendo a sociedade que o corrompe e o torna egoísta.

Assim, na defesa desse princípio, a desigualdade e a propriedade privada seriam um contrato social que ocorrera de forma orgânica dentro do sistema de congregação humana. Além disso, o pacto de existência entre os seres humanos viria de maneira democrática, sendo seu ápice as leis reguladoras da sociedade – exemplificadas aqui pelo papel do Estado –, de forma que as normas de relação de contato entre os indivíduos obedeceria à seguinte ordem “quando obedeço as leis, estou obedecendo a mim mesmo, o que torna o indivíduo livre” (OLIVEIRA, E., 2020, p. 216).

Cada indivíduo, com efeito, pode, como homem, ter uma vontade particular, contrária ou diversa da vontade geral que tem como cidadão. Seu interesse particular pode ser muito diferente do interesse comum. Sua existência, absoluta e naturalmente independente, pode levá-lo a considerar o que deve à causa comum como uma contribuição gratuita, cuja perda prejudicará menos aos outros, do que será oneroso o cumprimento a si próprio. Considerando a pessoa moral que constitui o Estado como um ente de razão, porquanto não é um homem, ele desfrutará dos

direitos do cidadão sem querer desempenhar os deveres de súdito - injustiça cujo progresso determinaria a ruína do corpo político.

A fim de que o pacto social não represente, pois, um formulário vão, compreende ele tacitamente este compromisso, o único que poderá dar força aos outros: aquele que recusar obedecer à vontade geral a tanto será constrangido por todo um corpo, o que não significa senão que o forçarão a ser livre, pois é essa a condição que, entregando cada cidadão à pátria, o garante contra qualquer dependência pessoal. Essa condição constitui o artifício e o jogo de toda a máquina política, e é a única a legitimar os compromissos civis, os quais, sem isso, se tornariam absurdos, tirânicos e sujeitos a maiores abusos. (ROUSSEAU, 1999, p. 75)

Tais ideais, que bebiam novamente no determinismo da natureza humana e que exaltavam a atuação de indivíduos particulares em contraposição ao papel do Estado, levou ao estopim do processo histórico vivenciado pelas burguesias em uma sequência de eventos ao redor do mundo durante os séculos XVIII e XIX. Iniciando no hemisfério norte, três desses eventos iriam moldar este capítulo do capitalismo e da ideologia eurocêntrica: a Revolução Estadunidense19, a Revolução Industrial na Inglaterra e a Revolução Francesa.

Todos esses episódios foram frutos de sua época e seu momento histórico, porém seus impactos e ramificações não ficaram contidos dentro das próprias fronteiras nacionais, ou até mesmo continentais. E foi através da popularização dos ideais e de sua disseminação por meio das burguesias comerciais que se formavam por todo o mundo que tais eventos se apresentariam como uma necessidade de romper com os valores antigos em virtude daqueles que emergiam na sociedade capitalista-mercantil, não só no Velho Continente, mas no “Novo Mundo”: “enquanto a burguesia francesa liderava o ataque contra a monarquia absolutista em casa, os fazendeiros seguiam o exemplo nas colônias” (JAMES, 2010, p. 68).

Inicia-se então, ao final do século XVIII, os primeiros movimentos de independência nas colônias, sendo o Haiti o primeiro a realizar um movimento desse nível que obtivesse sucesso. E a Revolução Haitiana, também conhecida como “Revolução de São Domingo”, que teve mais de dez anos de duração e resultou na independência do seu território, aqui ganha destaque, não só por ser a primeira desta magnitude dentro da América Latina, mas por ter como sua principal força motriz os africanos, pretos e mulatos do país, indivíduos escravizados e livres que, em sua grande maioria, tiveram participação política praticamente nula durante séculos. Baseando-se nos ideais vindos de outros países ocidentais, começam na ilha caribenha uma série de sanguinolentas batalhas que levariam à emancipação política do Haiti em relação à metrópole francesa, bem como ao fim da escravidão na região.

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Temos conhecimento de que os Estados Unidos foram se desenvolvendo como país e como potência no capitalismo, ele adquire características próprias que o levam ao surgimento de uma ideologia estadunidense, o americanismo. No entanto, para não fugir do estudo realizado sobre esta fase do capitalismo, além de o período histórico proposto possuir certas limitações quanto a esta abordagem, não iremos nos adentrar quanto a isso. Porém, não deixaremos de pontuar aspectos da construção dessa ideologia e sua influência quando necessário.

Inerentemente, quando se fala da Revolução de São Domingo, é necessário citar as figuras principais que compõem sua liderança: Toussaint L‟Ouverture, Alexandre Pétion, Jean-Jacques Dessalines e Henri Christophe, indivíduos que “tiveram a capacidade de lucrar com o benefício da cultura do sistema que combatiam” (JAMES, 2010, p. 33), ou seja, faziam parte de uma pequena parte dessa população inferiorizada, mas que acabaram por adquirir, dentro de seus círculos sociais, posições privilegiadas e/ou conhecimentos de ideais e técnicas advindas da Europa neste momento de transformação. Foram personagens essenciais para o início de um movimento que espalharia pelo continente. Todavia, fariam parte de um sintoma que não seria visto somente nos líderes da Revolução Haitiana, mas por toda a América Latina: a identificação com elementos europeus, econômicos e ideológicos, que acabaria por gerar a dependência econômica de nações independentes politicamente.

Por meio de viagens ao Velho Continente, estudando “clássicos” da filosofia e atualizando-se sobre as novidades advindas da Europa, pensadores, governantes, senhores de terra, militares e tantos outros apareceram pela América Latina inteira com a intenção de libertar os povos americanos das mesquinharias e opressões seculares em prol da formação de economias e Estados livres. O próprio Libertador, Simón Bolívar, figura-chave na independência de grande parte da América hispanohablante, integrava a elite criolla20 e era um ferrenho liberal. Bolívar obteve grande parte de sua formação educacional na Europa e nos Estados Unidos e, ao retornar à América Latina, transbordou em suas ações e pensamentos a fervura revolucionária que havia visto com os próprios olhos. Assim, ao se deparar com a realidade de sua terra natal, de miséria e dependência, além de ter tido contato pessoalmente com a Revolução Haitiana, Simón assimilaria seu plano militar e político de libertação do continente (RAMOS, 2014). Em um movimento onde pode se perceber que Bolívar representava, ao mesmo tempo:

[...] um paralelo do sistema espanhol e a certeza histórica de sua unidade política: por outro, a consciência da aristocracia nativa, indecisa entre a monarquia, o liberalismo conservador e o medo das massas a que Bolívar denomina, “multidões desenfreadas” (ARREGUI, 1971, p. 59).

O projeto teve apoio de muitos de seus contemporâneos, mas também das elites britânicas, estadunidenses e das burguesias locais interessadas nas vantagens econômicas que

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Os criollos caracterizam-se na América Hispânica como indivíduos geralmente de classe alta e descendentes de indígenas e brancos.

uma independência em relação a outras nações europeias ofereceria21. Além do mais, o fim da escravidão e a “igualdade” de todos os indivíduos ante o mercado possibilitaria não só um aumento no mercado consumidor interno destes novos países, mas também a disponibilidade de uma mão de obra crescente.

Como narra C.L.R James (2010, p. 64), sobre o fenômeno visto na Revolução Haitiana quanto à movimentação social, intelectual e das elites:

A França estava então agitada pelos ataques pré-revolucionários a todos os abusos evidentes; e um ano após ter sido formada na Grã-Bretanha a Sociedade Abolicionista, um grupo de liberais na França, Brissot, Mirabeau, Pétion, Condorcet, o padre Gregório e todos os grandes nomes dos primeiros anos da Revolução seguiram o exemplo britânico e formaram uma sociedade: os Amigos dos Negros. O espírito condutor era Brissot, um jornalista que tinha visto a escravidão nos Estados Unidos. A sociedade visava à abolição da escravidão, publicava um jornal e agitava. Isso servia aos britânicos como uma luva. Clarkson foi a Paris para estimular “as energias adormecidas”, deu-lhes dinheiro e supriu a França com propaganda antiescravagista. Apesar dos nomes que viriam a se tornar tão famosos e de uma ampla filiação, devemos tomar cuidado em pensar que os Amigos dos Negros representavam uma força. Os habitantes da colônia levavam-nos a sério; a burguesia marítima, não. Foi a Revolução Francesa que, com uma rapidez inesperada, arrastou esses franceses eloquentes para fora da sua estimulante empolgação de propaganda filantrópica e os colocou face a face com a realidade econômica.

Desloca-se o eixo da dominação e influência econômica e administrativa da Península Ibérica em boa parte da América Latina. Após séculos de parasitismo, ocorreu o mesmo efeito com as classes dominantes de Portugal e da Espanha que nas das antigas civilizações, as quais caíram do seu auge após séculos de ascensão e expansão: definharam, “perderam todas as qualidades de caráter, moralidade e inteligência” (BOMFIM, 2005, p. 334), deixando para trás somente um velho corpo administrativo – o “dente do carrapato” (BOMFIM, 2005, p. 236) – que logo se viu seguindo de forma loquaz seus interesses privados, além daqueles das elites britânicas e estadunidenses.

Por fim, até o final do século XIX, o modo de produção capitalista e suas ideologias cobririam a totalidade do mundo em um denso manto ideológico por meio do modo de

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Ressaltamos novamente que isso não se dá por uma mudança de mentalidade espontânea, em que, através do racionalismo iluminista, toda a classe dominante sofre uma mudança de opinião. Tal como no caso das independências, a escravidão se mostra o exemplo mais claro das intenções reais destes governantes e comerciantes, observado, por exemplo, no fato de que “o governo britânico, antes de 1783, era unânime em incentivar o comércio de escravos” (WILLIAMS, 2012. p. 75). Somente quando o sistema não se mostrava mais rentável – por ser um empreendimento arriscado, no qual motins, suicídios, mortes devido às más condições, torturas vividas nos navios negreiros ou acidentes no caminho poderiam causar perda total dos “investimentos” realizados, levando-os para as profundezas do mar – que “os comerciantes atacadistas de Londres evitaram toda e qualquer relação com os comerciantes e escravos de Liverpool, na convicção de que o tráfico negreiro estava operando em prejuízo.” (WILLIAMS, 2012, p. 73). O fim da escravidão do negro e do indígena não se deu por causas humanitárias, ascensão do pensamento da época ou qualquer outra explicação, mas sim porque não era um mercado tão rentável quanto antes, pelo trabalho assalariado ter se tornado melhor opção para a inclusão de grande parte da população na posição de consumidores, além de outros motivos.

produção implementado. Tal como um fino fio de azeite que começa a ser despejado no globo a partir da Europa e que, aos poucos, envolve todos os continentes sob um viscoso óleo que impregna cada propriedade, campo, floresta e centro urbano contemporâneo.

Porém esse processo não se dá de forma homogênea. O globo se apresentou com declives e aclives, barreiras e texturas em cada uma das regiões incorporadas, com o resultado final da nova ordem não sendo de formato homogêneo, mas sim inerentemente heterogêneo a estrutura social e econômica particular de cada um desses locais: “La occidentalización del mundo impondría a todos la adopción de las recetas que determinam la superioridad europea: la liberdad de empresa y el mercado, el laicismo y la democracia electoral pluralista”22 (SAMIR, 1989, p. 103).

O capitalismo se apresenta como um modelo universalista, de leis imutáveis e que, ao se deparar com desafios, justifica-se por diversas ordens sociais e econômicas que explicam por si os fenômenos contraditórios que ele mesmo cria, de forma que permite sua reprodução ideológica e produção material.

Portanto, o capitalismo em expansão é sua própria fonte de polarização e de seu desenvolvimento desigual. Não é pela falta de atuação do capitalismo e de suas ideologias que o desenvolvimento não se realiza nas colônias, tendo, como resultado: “[...] un proceso