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A RANCIDEZ DAS NOVAS ESCOLAS

A EDUCAÇÃO OU O ERRO EM RELAÇÃO À CRIANÇA

12. A RANCIDEZ DAS NOVAS ESCOLAS

É por essa profunda e debilitante razão, é pela cínica e abandonada indiferença que as escolas públicas da Inglaterra dispensaram à verdade que elas não nos dão o ideal de que precisamos. Só nos resta pedir a seus críticos modernos que se lembrem que, bem ou mal, a coisa pode ser feita. A fábrica está funcionando, as rodas estão girando, os gentlemen estão sendo fabricados com seu sabão, seu críquete e sua caridade organizada. Em tudo isso, como já disse anteriormente, a escola pública tem realmente uma vantagem sobre os demais

sistemas educacionais de nossa época. É possível distinguir um ex-aluno de uma escola pública em qualquer dos muitos ambientes em que ele se encontre: do fumadouro de ópio chinês ao jantar de um banqueiro judeu-alemão. Mas duvido que alguém consiga distinguir entre duas pequenas vendedoras de fósforos qual foi educada numa religião não-confessional e qual recebeu uma educação secular. A alta aristocracia inglesa que nos governou desde a Reforma, nesse sentido, é realmente um modelo para os modernos. Tinha um ideal e, portanto, produziu uma realidade.

Torno a dizer que estas páginas só se propõem a mostrar que o progresso deve basear-se em princípios, conquanto nosso progresso moderno baseie-se em precedentes. Guiamo-nos não por aquilo que se pode afirmar em teoria, mas por aquilo que já foi admitido na prática. É por isso que os jacobinos foram os últimos tories da história com os quais uma pessoa briosa poderia simpatizar. Desejavam uma coisa específica, estavam dispostos a ir adiante por ela e, assim, estavam também dispostos a retroceder por ela. Mas os tories modernos só cultivam a obtusidade de defender situações que eles não tiveram o excitante prazer de criar. Os

revolucionários fazem a reforma; os conservadores apenas conservam a reforma. Eles jamais reformam a reforma, o que geralmente é muito mais necessário. Assim como a corrida

armamentista é apenas uma espécie de lânguido plágio, a corrida dos partidos é apenas uma espécie de lânguida herança. Os homens têm votos; então, que as mulheres tenham-nos em breve. As crianças pobres são educadas à força; então, que em breve as alimentem à força. A polícia fecha os pubs à meia-noite; então, que em breve feche-os às onze. As crianças deixam a escola aos catorze anos; então, que em breve deixem-na aos quarenta. Nenhum lampejo de razão, nenhum retorno momentâneo aos primeiros princípios, nenhum questionamento abstrato de qualquer coisa óbvia, nada disso é capaz de interromper esse galope louco e monótono do progresso por precedentes. É uma boa maneira de evitar uma revolução genuína. Segundo essa lógica, os radicais vivem tão rotineiramente quanto os conservadores. Encontramos um velho lunático e grisalho a dizer que seu avô lhe aconselhara a manter-se perto de um umbral.

Encontramos outro velho lunático e grisalho a dizer que seu avô lhe aconselhara apenas a seguir por uma vereda.

Tornei a mencionar aqui a primeira parte do argumento porque chegamos agora ao ponto em que ele se mostra mais forte e surpreendentemente. A prova final de que nossas escolas

elementares não têm um ideal próprio definido está no fato de imitarem tão abertamente os ideais das escolas públicas. Nas escolas elementares temos todos os preconceitos éticos e exagerações do Eton e do Harrow cuidadosamente reproduzidos para pessoas que

absolutamente não se adaptam a eles. Temos a mesma doutrina loucamente desproporcional do efeito da limpeza física sobre o caráter moral. Educadores e políticos da educação declaram, entre calorosas aclamações, que a limpeza é de longe muito mais importante que todas as contendas sobre ensino moral e religioso. Isso dá a entender que, contanto que um rapazinho lave suas mãos, não importa se é para limpar a geléia da mãe ou o sangue do irmão. Temos a mesma pretensão insincera de que o esporte sempre fomenta um sentido de honra, quando sabemos que ele muitas vezes o destrói. Acima de tudo, sustentamos a mesma grande

suposição de classe alta de que as grandes instituições fazem melhor as coisas, uma vez que dispõem de grandes somas de dinheiro e têm poder para controlar todo o mundo; e de que a caridade trivial e impulsiva é, de algum modo, desprezível. Como diz o sr. Blatchford: “O mundo não quer piedade, mas sabão... e socialismo.” A piedade é uma das virtudes populares, enquanto o sabão e o socialismo são dois passatempos da classe média-alta.

Esses ideais “saudáveis” – como são chamados – que nossos políticos e mestres tomaram emprestados das escolas aristocráticas e aplicaram às democráticas não são de forma alguma apropriados a uma democracia empobrecida. Uma vaga admiração pelo governo organizado e uma vaga desconfiança da ajuda individual não podem adaptar-se às vidas de pessoas para quem gentileza significa emprestar uma panela e honra significa manter-se fora das casas de correção. O resultado disso é ou o desencorajamento daquele sistema de generosidade ligeira e fragmentária, que é uma glória diária para os pobres, ou um nebuloso conselho às pessoas que não têm dinheiro para desperdiçar. Tampouco a exagerada glória do atletismo –

razoavelmente defensável no caso de ricos que só saltam e correm porque comem e bebem de maneira prejudicial à saúde – seria conveniente quando aplicada ao povo, cuja maioria já pratica cotidianamente toda forma de exercício, com a pá ou o martelo, com a picareta ou o serrote. Quanto ao terceiro caso, o da limpeza, é óbvio que o mesmo tipo de retórica sobre finura corporal, própria de uma classe ornamental, não pode aplicar-se, tal como está, a um lixeiro. Espera-se de um gentleman que esteja basicamente impecável o tempo todo. Mas não é maior desonra estar um varredor de rua sujo do que estar um mergulhador molhado. Um limpador de chaminés não é mais desonrado por estar coberto de fuligem do que Michelângelo por estar coberto de argila ou Bayard por estar coberto de sangue. Tampouco esses

prolongadores da tradição das escolas públicas fizeram ou sugeriram algum substituto para o esnobe sistema atual em que a limpeza é algo praticamente impossível para os pobres. Refiro- me ao ritual geral da roupa branca e do vestir as roupas descartadas pelos ricos. Um homem entra na roupa de outro homem como entra na casa de outro homem. Nossos educadores não se horrorizam quando um homem pega as calças de segunda mão do aristocrata, pois eles