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9. DA INCLUSÃO DO AUXÍLIO-ACIDENTE NO ROL DOS BENEFÍCIOS

9.1. Razões fundantes

Procurei deixar claro já no capítulo anterior minha conclusão no sentido de que são três (e não dois) os benefícios previdenciários previstos para proteção da contingência social da incapacidade laboral decorrente de doença ou invalidez, a saber: i) aposentadoria por invalidez; ii) auxílio-doença; iii) auxílio-acidente.

Tal conclusão é sacada, de forma inexorável, a partir de uma visão pós-positivista do direito à previdência social, entendido este como direito humano fundamental de segunda dimensão, dentro de um enfoque dos direitos humanos fundamentais como fruto de um processo de lutas pelo reconhecimento da pessoa humana como sujeito de direitos, bem como do processo de sacralização da pessoa humana.

Dentro deste enfoque, a chave interpretativa de maior importância a reger tais direitos é voltada à garantia de sua efetividade, em um processo tendente à universalização da proteção jurídico-estatal.

Logo, dentre as diversas classificações possíveis das prestações estatais previstas, há que se adotar aquela que traga maior efetividade, além de corresponder aos anseios do legislador constituinte. Somente assim se adotará a classificação mais útil em termos científicos.

No caso em tela, inegavelmente, a classificação mais útil é aquela que parte das

contingências sociais arroladas pelo constituinte como aptas a gerar o direito a cada

prestação previdenciária.

Em outras palavras, em se tratando do direito humano fundamental à previdência social, a classificação mais importante, mais útil e mais eficaz é aquela que adota como elemento de discrímen as contingências sociais arroladas pelo constituinte como aptas a gerar a proteção social estatal.

Tal deve ser a chave de leitura adotada para efeitos de classificação das prestações previdenciárias previstas em lei, a permitir, inclusive, e conforme já demonstrado, a aglutinação de mais de uma prestação dentro de um mesmo regime jurídico protetivo.

Partindo, assim, da contingência social da incapacidade laboral decorrente de

doença ou invalidez, arrolada pelo constituinte pátrio no artigo 201, I, da Constituição,

chega-se, inegavelmente, aos três benefícios mencionados no primeiro parágrafo: aposentadoria por invalidez, auxílio-doença e auxílio-acidente.

Como consequência, devem os três ser estudados, interpretados e compreendidos de forma integrada, sistemática, o que significa dizer que as disposições legais disciplinadoras de cada qual também devem ser interpretadas, compreendidas e aplicadas de forma sistemática e teleológica, tendo como baliza exatamente o fato de se tratar de benefícios protetivos da incapacidade laboral.

Sucede que a doutrina pátria, em sua esmagadora maioria, ao buscar conceituar o benefício previdenciário do auxílio-acidente, o faz reiteradamente ressaltando seu caráter indenizatório365, o que o coloca em contraposição aos outros dois benefícios

previdenciários por incapacidade previstos em lei366.

Também são reiterados os entendimentos exarados pelos nossos Tribunais pátrios no sentido de considerar o auxílio-acidente como benefício desvinculado daqueles protetivos da contingência social da incapacidade laboral, em razão de seu caráter indenizatório, logo, indeferindo sua concessão mesmo quando preenchidos os seus requisitos mediante prova técnica produzida ao longo da instrução processual, sendo exemplos as seguintes ementas de julgados proferidos em sede do Tribunal Regional Federal da Terceira Região:

PREVIDENCIÁRIO. AGRAVO LEGAL. APOSENTADORIA POR

INVALIDEZ. NÃO PREENCHIDOS OS REQUISITOS LEGAIS. DECISÃO FUNDAMENTADA.

      

365Prova de tal enfoque é dada na seguinte passagem: “O auxílio-acidente é um benefício previdenciário pago mensalmente ao segurado acidentado como forma de indenização, sem caráter substitutivo do salário, pois é recebido cumulativamente com o mesmo, quando, após a consolidação das lesões decorrentes de acidente de qualquer natureza – e não somente de acidentes de trabalho -, resultarem sequelas que impliquem redução da capacidade para o trabalho que habitualmente exercia – Lei n. 8.213/91, art. 86, caput”. CASTRO, Carlos Alberto Pereira de; LAZZARI, João Batista. op. cit., p. 797.

366Outras definições dadas por doutrina pátria abalizada para o benefício previdenciário de auxílio-acidente, a ressaltar seu caráter indenizatório em detrimento da contingência social protegida, são encontradas em: i) IBRAHIM, Fábio Zambitte. op. cit., p. 648; ii) HORVATH JÚNIOR, Miguel. op. cit., p. 335; iii) MARTINEZ, Wladimir Novaes. Auxílio-acidente. São Paulo: LTr, 2006. p. 23-25; iv) DIAS, Eduardo Rocha; MACÊDO, José Leandro Monteiro de. op. cit., p. 227; v) AMADO, Frederico. op. cit., p. 701.

I - Não procede a insurgência da parte agravante porque não preenchidos os requisitos legais para a concessão de aposentadoria por invalidez ou auxílio- doença.

(...)

V - Prejudicado o pleito de concessão de auxílio-acidente, por não constar

da petição inicial, não sendo possível inovar o pedido, em sede de agravo legal.

(...)

IX - Agravo improvido.

(TRF 3ª Região, 8ª TURMA, AC 0005207-68.2008.4.03.6114, Rel. DESEMBARGADORA FEDERAL MARIANINA GALANTE, julgado em 05/12/2011, e-DJF3 Judicial 1 DATA:15/12/2011) (grifado)

PREVIDENCIÁRIO E PROCESSUAL CIVIL - SENTENÇA EXTRA PETITA E ARTIGO 515, § 1º DO CPC - CONCESSÃO DE BENEFÍCIO - DECADÊNCIA - BENEFÍCIOS POR INCAPACIDADE - DATA DE INÍCIO - HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS.

1.O auxílio-acidente difere dos demais benefícios por incapacidade, pois sua finalidade é a compensação (indenização) pela perda da capacidade de trabalho. Por isso configura julgamento "extra petita" a sua concessão, se o segurado

relata incapacidade total e permanente, com pedido de aposentadoria por invalidez, ou, subsidiariamente, o reconhecimento da incapacidade temporária e submissão a processo de reabilitação profissional, com pedido de auxílio-doença, pois nestas duas espécies de benefício o objetivo é a paralisação das atividades profissionais com substituição da renda mensal do obreiro.

(...)

9.Recurso e remessa oficial parcialmente providos.

(TRF 3ª Região, 9ª TURMA, AC 0037781-37.2005.4.03.9999, Rel. DESEMBARGADORA FEDERAL MARISA SANTOS, julgado em 26/6/2006, DJU DATA:14/9/2006) (grifado)

Não obstante os respeitáveis entendimentos, pelas razões já expostas, não posso com eles concordar.

Isso porque o caráter inegavelmente indenizatório do benefício previdenciário de auxílio-acidente decorre do fato de o mesmo não ser substitutivo da remuneração do trabalhador, diversamente da aposentadoria por invalidez e do auxílio-doença.

Porém, tal constatação leva em conta o critério de classificação do caráter

substitutivo (ou não) do valor pago a título de benefício previdenciário, o qual não foi

arrolado pelo legislador constituinte ou ordinário como elemento hábil a classificar as prestações previdenciárias estatais.

De se recordar, uma vez mais, que o legislador constituinte, de forma correta e louvável, adotou como elemento de discrímen o critério das contingências sociais

protegidas, sendo que o legislador ordinário, por sua vez, adotou o critério – já

questionável, diga-se de passagem – dos beneficiários.

A classificação que leva em conta o caráter substitutivo (ou não) da remuneração por parte dos benefícios previdenciários, não obstante seja possível, possui restrita utilidade prática, limitada, em termos de proteção, basicamente à garantia da percepção de um valor mínimo no caso de se tratar de benefício substitutivo da remuneração (art. 201, §2º, da Constituição).

Ou seja, tal critério possui relevância jurídica, porém, muito limitada e restrita, jamais podendo, por isso mesmo, assumir o papel de elemento de classificação das prestações previdenciárias estatais.

Até se entendem as razões históricas da adoção de tal elemento como supostamente identificador da natureza jurídica ontológica do benefício previdenciário de auxílio- acidente como indenizatório, pela constatação de uma redução da capacidade laboral do trabalhador. Afinal de contas, suas raízes históricas puseram ênfase exatamente no caráter indenizatório da redução da capacidade laboral comparativamente com os demais trabalhadores, indenizando o trabalhador que deixou de possuir a mesma capacidade de trabalho comparativamente aos demais trabalhadores367.

Porém, com o advento da Constituição de 1988 e a consolidação da previdência social em um regime jurídico único, qual seja, a seguridade social, não cabe mais tal conceituação, posto que embasada em critério defasado, não adotado pelo constituinte e que não reflete o caráter altamente protetivo e efetivo do regime jurídico atinente aos direitos humanos fundamentais.

Logo, a conceituação do benefício previdenciário de auxílio-acidente não pode mais partir de seu caráter indenizatório, cuja importância atual somente serve para diferenciá-lo dos dois outros benefícios por incapacidade, em termos de proteção e garantia de um valor mínimo a ser pago a título de benefício: garantia de um salário mínimo para os casos de aposentadoria por invalidez e auxílio-doença, o que não é assegurado ao auxílio- acidente.

      

367“O dealbar mais antigo do auxílio-acidente é o art. 18 do Decreto-lei n. 9.036/44 (regulamentado pelo Decreto n. 18.809/45), quando aquela Lei de Acidentes do Trabalho disciplinou a incapacidade parcial e permanente do obreiro, mediante uma prestação inominada, equivalente de três a oitenta centésimos da quantidade correspondente a quatro anos de diárias, a esse tempo com a configuração de indenização de um prejuízo causado à aptidão de trabalho do segurado”. MARTINEZ, Wladimir Novaes. Auxílio-acidente, cit., p. 15.

Para efeitos de conceituação, há que se partir da contingência social protegida (incapacidade laboral decorrente de doença ou invalidez), bem como do regime jurídico unificador dos benefícios por incapacidade.

Assim é que, na atual quadra, o benefício de auxílio-acidente deve ser conceituado como direito humano fundamental previdenciário à percepção de uma prestação estatal

decorrente da constatação de sequelas causadoras de redução da capacidade laboral para a atividade habitual.

Em razão do exposto, concordo plenamente com as seguintes observações doutrinárias:

O auxílio-acidente é benefício previdenciário que protege as sequelas resultantes de acidente de qualquer natureza que reduza a capacidade para o trabalho que o segurado habitualmente exercia. Assim, o que se protege não é o acidente em si, e sim a consequência deste acidente, a redução da capacidade para o trabalho do segurado, pois é esta redução que vai gerar a necessidade social que deve ser protegida pela previdência social por meio do benefício em comento368.

Lembrando uma vez mais: é decorrência inexorável da análise das prestações previdenciárias a partir das contingências sociais protegidas o reconhecimento da existência de três benefícios previdenciários protetores da incapacidade laboral decorrente de doença ou invalidez, cujos requisitos para a concessão variam unicamente em razão do

grau de extensão e tempo de duração de tal incapacidade: i) aposentadoria por invalidez =

incapacidade para toda e qualquer atividade laboral, sem prognóstico favorável de recuperação; ii) auxílio-doença = incapacidade total para a atividade habitual, com prognóstico favorável de recuperação em prazo previsível ou possibilidade de reabilitação para outra atividade profissional; iii) auxílio-acidente = redução da capacidade laboral para a atividade habitual, com tendência de irreversibilidade (após consolidação das lesões).

9.2. Conclusões

Tal enfoque, constitucional, com ênfase na proteção e efetividade do direito à previdência social como direito humano fundamental social, traz consequências jurídicas de enorme relevo em termos de proteção do direito à percepção do auxílio-acidente, inclusive com maior abrangência de seu conteúdo e alcance, a saber:

      

1. Por se tratar de benefício previdenciário também voltado à proteção da

contingência social da incapacidade laboral, seu rol de beneficiários deve ser o mesmo dos benefícios de aposentadoria por invalidez e auxílio-doença, não havendo qualquer elemento constitucional de discrímen que justifique uma menor proteção em termos de beneficiários.

Por decorrência, não há outra solução jurídica possível que não reputar

inconstitucional o prescrito pelo artigo 18, §1º, da Lei n. 8.213/91, a saber: “somente

poderão beneficiar-se do auxílio-acidente os segurados incluídos nos incisos I, VI e VII do artigo 11 desta Lei”.

Por lei, são beneficiários do auxílio-acidente unicamente as seguintes categorias de segurados: empregados (inciso I), trabalhadores avulsos (inciso VI) e segurados especiais (inciso VII). Estão excluídos da proteção, por consequência, os demais trabalhadores: empregados domésticos (inciso II), contribuintes individuais (inciso V) e facultativos (art. 13).

Sucede que, conforme já afirmado, a contingência social protegida pelo auxílio- acidente é idêntica àquela protegida pela aposentadoria por invalidez e auxílio-doença: incapacidade laboral decorrente dos eventos de doença ou invalidez.

Logo, não há justificativa plausível para a menor proteção em termos de beneficiários acobertados pelo auxílio-acidente. Todos os trabalhadores contribuintes do regime geral de previdência social devem ser agraciados com o auxílio-acidente previdenciário, desde que constatada a existência de redução de sua capacidade laboral para a atividade habitual.

Na verdade, a restrição legal dos beneficiários do auxílio-acidente também possui raízes históricas369, já que, até as alterações trazidas pelo advento da Lei n. 9.032/95, havia

a previsão legal unicamente do auxílio-acidente de natureza acidentária, ou seja, decorrente de acidente do trabalho (arts. 19 a 21, da Lei n. 8.213/91)370.

      

369“A limitação deste benefício aos segurados empregados, avulsos e especiais é feita pelo art. 18, §1º, da Lei nº 8.213/91, apesar do art. 86 trazer previsão genérica. A restrição é oriunda da origem do benefício, o antigo auxílio-acidente ou auxílio-suplementar, previsto na Lei nº 6.367/76. À época, era benefício restrito à sequela produzida por acidente do trabalho, e daí a limitação aos segurados que são objeto de tutela do seguro de acidentes do trabalho. Atualmente, o auxílio-acidente não se limita mais a acidentes do trabalho”. IBRAHIM, Fábio Zambitte. op. cit., p. 649.

370O benefício de auxílio-acidente ainda padece de diversas abordagens equivocadas, posto que estanques, no tocante ao seu sentido e alcance, inclusive, no tocante ao termo inicial de advento de sua espécie previdenciária, prevalecendo, não obstante, o advento da lei n. 9.032/95 como marco temporal e legislativo,

Porém, desde o advento da Constituição de 1988 já deveria ter ocorrido a modificação de compreensão acerca do grau de abrangência das prestações previdenciárias por incapacidade laboral, interpretando-se as disposições legais à luz do regime protetivo constitucional único, e não de forma literal.

De qualquer sorte, a Lei n. 9.032/95 adequou a lei ao regime jurídico constitucional, corrigindo grave distorção histórica, em prol dos trabalhadores.

A partir daí, não cabe mais a interpretação literal e isolada do prescrito pelo artigo 18, §1º, da Lei n. 8.213/91, devendo ser estendido o rol de beneficiários do auxílio- acidente para todos os segurados arrolados no artigo 11, da Lei n. 8.213/91, além do segurado facultativo (art. 13).

Não há que se falar em ofensa à exigência constitucional da prévia fonte de custeio (art. 195, §5º, da Constituição), pois não se está falando em criação de novo benefício previdenciário, mas, em evolução na interpretação do regime constitucional de proteção

previdenciária, que desde o seu início assegura a todos os beneficiários do regime geral de previdência social a percepção do auxílio-acidente, desde que constatada a presença da

contingência social protegida371.

2. A expressão legal “acidente de qualquer natureza” contida no artigo 86, da Lei n.

8.213/91, deve ser compreendida levando-se em conta a contingência social protegida pela prestação estatal: a redução da capacidade laboral.

Disso resulta a irrelevância jurídica dos eventos deflagradores da redução da capacidade laboral para efeitos da concessão do auxílio-acidente, pois, conforme já demonstrado no capítulo 8, a doutrina pátria é praticamente uníssona ao interpretar os eventos da “doença” e “invalidez” previstos na constituição (art. 201, I, da Constituição) como correspondentes aos eventos da “doença” (internos ao corpo humano, protraídos no tempo) e do “acidente” (externos, de efeitos imediatos), logo, a abarcar ambos os fenômenos, e não apenas um deles.

      

a saber: i) ROCHA, Daniel Machado da; BALTAZAR JÚNIOR, José Paulo. op. cit., p. 321; ii) CASTRO, Carlos Alberto Pereira de; LAZZARI, João Batista. op. cit., p. 797; iii) FARIAS, Luciana Moraes de. op. cit., p. 56-58. Em sentido contrário, fixando o termo inicial do auxílio-acidente previdenciário apenas em 31.12.2008, quando do advento do Decreto n. 6.722/2008, confira-se: HORVATH JÚNIOR, Miguel. op. cit., p. 335-336.

371De acordo, assim, com a crítica feita a tal restrição, nos seguintes termos: “Considerando o fato de o benefício, na redação original, apenas ser devido nos casos em que caracterizado o acidente do trabalho, a restrição no âmbito subjetivo até poderia ser compreendida. Entretanto, a partir da extensão promovida para os acidentes de qualquer natureza, a limitação subjetiva torna-se difícil de ser justificada”. ROCHA, Daniel Machado da; BALTAZAR JÚNIOR, José Paulo. op. cit., p. 317-318.

Assim é que a concessão da aposentadoria por invalidez depende da constatação da incapacidade laboral para toda e qualquer atividade profissional decorrente de doença ou acidente, do mesmo modo que a concessão do auxílio-doença depende da constatação da incapacidade laboral para a atividade profissional habitual, também decorrente de qualquer dos eventos (doença ou acidente).

São afirmações pacíficas, sobre as quais não pairam divergências doutrinárias ou jurisprudenciais atualmente, válidas mesmo para o auxílio-doença, não obstante sua nomenclatura apenas faça menção a uma das duas espécies de eventos fenomênicos deflagradores da incapacidade laboral (doença).

Não há razões e justificativas plausíveis, pois, para limitar o espectro de alcance do auxílio-acidente para englobar unicamente os casos de redução da capacidade laboral deflagrados por acidentes, deixando de fora aqueles decorrentes de doenças.

Da mesma forma que na conclusão anterior, por se tratar de benefício protetivo da contingência social da incapacidade laboral, o auxílio-acidente deve seguir o mesmo regime jurídico dos dois outros benefícios por incapacidade previstos (aposentadoria por invalidez e auxílio-doença), não podendo ter seu alcance reduzido, sob pena de incidir em inconstitucionalidade.

O elemento relevante juridicamente para sua interpretação é a contingência da incapacidade laboral, e não a ocorrência de acidente ou doença.

Em assim sendo, não obstante o entendimento atual do Superior Tribunal de Justiça esteja correto em abarcar a doença profissional como fato hábil a gerar a proteção previdenciária pela via do auxílio-acidente, equivoca-se, data maxima venia, ao exigir nexo causal entre o evento incapacitante e o labor, conforme se verifica em ementa de julgado proferido em sede de recursos repetitivos:

RECURSO ESPECIAL REPETITIVO. ART. 105, III, ALÍNEA A DA CF. DIREITO PREVIDENCIÁRIO. AUXÍLIO-ACIDENTE. REQUISITOS:

COMPROVAÇÃO DO NEXO DE CAUSALIDADE E DA REDUÇÃO PARCIAL DA CAPACIDADE DO SEGURADO PARA O TRABALHO.

DESNECESSIDADE DE QUE A MOLÉSTIA INCAPACITANTE SEJA IRREVERSÍVEL. NÃO INCIDÊNCIA DA SÚMULA 7/STJ. PARECER MINISTERIAL PELO PROVIMENTO DO RECURSO ESPECIAL. RECURSO ESPECIAL PROVIDO.

1. Nos termos do art. 86 da Lei 8.213/91, para que seja concedido o auxílio- acidente, necessário que o segurado empregado, exceto o doméstico, o trabalhador avulso e o segurado especial (art. 18, § 1o. da Lei 8.213/91), tenha redução permanente da sua capacidade laborativa em decorrência de acidente de qualquer natureza.

2. Por sua vez, o art. 20, I da Lei 8.213/91 considera como acidente do trabalho a doença profissional, proveniente do exercício do trabalho peculiar à determinada atividade, enquadrando-se, nesse caso, as lesões decorrentes de esforços repetitivos.

3. Da leitura dos citados dispositivos legais que regem o benefício acidentário, constata-se que não há nenhuma ressalva quanto à necessidade de que a moléstia incapacitante seja irreversível para que o segurado faça jus ao auxílio-acidente. 4. Dessa forma, será devido o auxílio-acidente quando demonstrado o nexo

de causalidade entre a redução de natureza permanente da capacidade laborativa e a atividade profissional desenvolvida, sendo irrelevante a

possibilidade de reversibilidade da doença. Precedentes do STJ.

5. Estando devidamente comprovado na presente hipótese o nexo de causalidade entre a redução parcial da capacidade para o trabalho e o exercício de suas funções laborais habituais, não é cabível afastar a concessão do auxílio-acidente somente pela possibilidade de desaparecimento dos sintomas da patologia que acomete o segurado, em virtude de tratamento ambulatorial ou cirúrgico.

6. Essa constatação não traduz, de forma alguma, reexame do material fático, mas sim valoração do conjunto probatório produzido nos autos, o que afasta a incidência do enunciado da Súmula 7 desta Corte.

7. Recurso Especial provido.

(REsp 1.112.886/SP, Rel. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, 3ª SEÇÃO, julgado em 25/11/2009, DJe 12/2/2010)

Tal entendimento, com todo o respeito, tolhe direito humano fundamental dos segurados, pois exige, sem supedâneo constitucional ou mesmo legal, a existência de nexo causal entre o evento redutor da incapacidade e o labor, elemento que não faz parte da contingência social protegida (a incapacidade laboral)372.

Defendo, assim, uma interpretação ampliativa da expressão legal “acidente de qualquer natureza”, que deve ser lida de forma sistemática e teleológica como “redução,

decorrente de qualquer evento, da capacidade laboral para a atividade habitual”.

Não obstante, é de se reconhecer que o entendimento doutrinário atualmente prevalente conclui em sentido oposto, qual seja, no sentido de que somente a redução da capacidade laboral levada a cabo por acidentes é que seriam hábeis a gerar a proteção previdenciária por