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Elaboração própria Fonte: Gentil (2007, p. 178)

(1) Exclui a Contribuição à Seguridade Social do Servidor Público – CSSS e a contribuição ao custeio de pensões militares.

(2) Inclui apenas 60% da receita com PIS e PASEP. Os 40% restantes são destinados ao BNDES.

(3) Despesa líquida e paga por função, inclusive pessoal e divida. Seguro-desemprego é da função trabalho, mas é um evento da Seguridade Social. Excluídas as despesas com FAT.

(4) Estão excluídos os gastos com inativos do Regime Próprio de Previdência dos Servidores (RPPS) civis e militares.

(5) Receita total deduzida da DRU. OBS: A Contribuição para a Previdência Social não está sujeita a DRU.

Ademais, há que se enfrentar o discurso desconstrutivo dos “rombos” e “déficits” da Previdência, com conceitos e práticas de finanças públicas republicanos, desideologizadas e devidamente referidas, no caso da Previdência Social, aos significados que esta passa a ter a partir da Constituição de 1988: o amalgama de uma previdência contributiva ao estilo “bismarckiano” com uma previdência de Seguridade Social, ao estilo “beviredgeano”. E nesta, o benefício mínimo está sujeito a subvenções financiadas por tributos. Isto precisa assim aparecer nas finanças públicas; mas não como “rombo” ou “déficit” (DELGADO, 2007, p. 307).

Khair (2007b) realiza o mesmo tipo de análise a respeito da Seguridade Social brasileira entre 1995 e 2007, mas se apropriando de uma metodologia um pouco diferente da apresentada em Gentil (2007), levando em conta, por exemplo, as despesas com pessoal e custeio do INSS. Cabe destacar que essa metodologia, do ponto de vista contábil, também acaba desconsiderando o texto da Seguridade Social inscrito na Constituição. O estudo conclui que, considerando a Desvinculação das Receitas da União (DRU), os resultados foram deficitários entre 1995 e 1999. Não considerando a DRU, os resultados foram deficitários apenas em 1996 e 1998. Porém, o mais importante é enfatizar que a partir de 2000 o resultado é superavitário mesmo após as transferências da DRU da Seguridade Social para o Orçamento Fiscal da União. Khair aponta ainda que os resultados da Seguridade Social seriam superavitários pelo menos até 2050, mesmo que suas receitas de contribuições acompanhem o crescimento do PIB per capita, que as despesas do governo federal com a Saúde acompanhem o crescimento do PIB nominal e que as despesas com Assistência Social por habitante cresçam anualmente dois pontos percentuais acima da inflação.

O mesmo tipo de análise sobre a Seguridade Social realizada por Gentil (2007) e Khair (2007b) a partir de dados de uma série histórica mais ampla, pode ser verificado em Vaz e Martins (2007) para as contas da Seguridade Social de 2006. Embora existam diferenças metodológicas entre os autores, responsáveis por variações entre os dados apresentados, a conclusão de ambos para o ano de 2006 é a mesma: a Seguridade Social não foi deficitária. Diante dos valores apurados, os autores mostram que a Seguridade Social apresentou em 2006 um superávit pouco acima de R$ 51 bilhões, valor superior ao resultado do superávit primário promovido pelo Governo Federal naquele ano, que foi de R$ 49,8 bilhões.

O relatório da ANFIP (2009) mostra a análise da Seguridade Social em 2007 e 2008 e chega à mesma conclusão: a Seguridade Social não é deficitária. “Esse orçamento não pode ser analisado exclusivamente pelo seu resultado financeiro, porque, a bem da verdade, nem deveria ser superavitário diante de tantas demandas e carências vinculadas às suas áreas” (ANFIP, 2009, p. 25-26). Em 2008, por exemplo, esse conjunto de despesas totalizou R$ 312,6 bilhões. Caso a CPMF não tivesse sido derrubada pelo congresso, haveria uma arrecadação adicional de aproximadamente R$ 40 bilhões. “Da arrecadação de R$ 364,9 bilhões ainda sobraram R$ 52,3 bilhões.” (ANFIP, 2009, p. 18).

A análise conjunta da Seguridade pôde demonstrar como o Orçamento da Seguridade era superavitário e o fluxo financeiro estava invertido, contrariando o discurso da grande mídia e dos conservadores de que não se recebia recursos do Orçamento Fiscal. Por meio de desvinculações e de

alocações estranhas ao texto constitucional era a Seguridade que financiava o Orçamento Fiscal, viabilizando a produção de superávits (ANFIP, 2009, p. 17).

Independentemente das pequenas diferenças metodológicas de análise e dos resultados obtidos por Gentil (2007), Khair (2007b), Vaz e Martins (2007) e ANFIP (2009), todos revelam que a DRU tem prejudicado o superávit das contas da Seguridade Social. Gentil esclarece ainda que parcela significativa dos recursos desviados destina-se ao pagamento de aposentadorias e pensões do Regime de Previdência dos Servidores (RPPS). Mas esse emprego não é legítimo, pois, de acordo com a Constituição, a operacionalização financeira de ativos e inativos do serviço público federal está a cargo do Tesouro Nacional, não da Seguridade Social.

Segundo Gentil (2007), entre 1995 e 2006 houve desvio de recursos do orçamento da Seguridade Social para além dos 20% legalmente autorizados pelo mecanismo da DRU, exceto nos anos de 1995 e 1998.

Os desvios do Orçamento da Seguridade Social cumprem importantes papéis: para a política fiscal, viabiliza superávit; para a saúde, é o principal instrumento de precarização dos serviços; para a previdência social, viabiliza o principal elemento do discurso de falência do sistema e de inevitabilidade das reformas; e, para os interesses dos mais diversos setores econômicos, oportunidade de grandes negócios (VAZ e MARTINS, 2007, p. 194).

O relatório da ANFIP (2009), que também faz a análise do peso da DRU nas contas da Seguridade Social, enfatiza que ela prejudica o crescimento econômico “ao retirar recursos da sociedade a fim de obter o superávit primário e por extensão transferi-los ao mercado especulativo (...) direcionados para os rentistas, credores da União” (ANFIP, 2009, p. 50).

Embora tenha amparo legal, mecanismos como a DRU não contribuem para a adequada utilização do orçamento. Percebe-se que na maioria das vezes é construído um discurso para convencer a opinião pública de que a previdência é inviável, tanto econômica como socialmente, e que a questão pode ser resolvida através da previdência privada. Isso é levado a cabo com o objetivo de justificar reformas e retirar do Estado a responsabilidade de assumir despesas na área social, particularmente, na Seguridade (ANFIP, 2009, p. 51).

Para Vaz e Martins (2007), por conta dessa prática, o OSS acaba assumindo despesas de praticamente todos os órgãos e entidades do Governo Federal, independentemente das suas áreas de atuação, ao invés de atender as necessidades relativas à Saúde, Assistência Social e

Previdência Social. “Há silêncio absoluto sobre a parcela de receitas do Orçamento Fiscal que tem como origem recursos desvinculados do Orçamento da Seguridade Social” (VAZ e MARTINS, 2007, p. 195).

Essas práticas fiscais conferem o estigma de “déficit” a toda despesa previdenciária não financiada por contribuições financeiras dos segurados, ainda que, como é caso, financiados por tributos da Seguridade Social. Uma conceituação explícita e transparente destas contas nos respectivos orçamentos da Previdência e da Seguridade Social é caminho critico para corrigir essas práticas e evitar manipulações ideológicas dessas informações essenciais (DELGADO, 2007, p. 298).

Essa realidade orçamentária seria alterada se o dispositivo constitucional, presente no parágrafo 5º do artigo 165 da Constituição Federal, fosse cumprido. Ele estabelece que o Poder Executivo deve elaborar e executar três orçamentos separadamente – o orçamento fiscal, o orçamento de investimento das empresas da União e o orçamento da Seguridade Social. No entanto, o governo federal apresenta dados consolidados de apenas dois demonstrativos de execução orçamentária: o Orçamento de Investimento das Empresas Estatais e o Orçamento Fiscal e da Seguridade Social. Neste último orçamento, as receitas e gastos fiscais e da Seguridade são agregados numa única peça orçamentária. Assim, as receitas e as despesas que seriam da Seguridade Social aparecem unificadas às outras receitas de impostos. Para Gentil (2007), a consequência desse artifício metodológico contribuiu para a geração dos elevados superávits primários ao longo dos últimos anos, mas penalizando recursos que deveriam ser destinados aos programas da Seguridade.

De acordo com Delgado (2007), o descumprimento dessa regra fiscal fez surgir, a partir de 1996, um “déficit” de caixa no RGPS que a contabilidade pública registra equivocadamente como “déficit previdenciário” e que a mídia registra o tempo todo como “rombo” da previdência.

Se (...) o orçamento da seguridade social fosse elaborado isoladamente, ver- se-ia claramente: 1) que o desequilíbrio orçamentário está no orçamento fiscal, não no orçamento da seguridade social ou no orçamento da previdência social; 2) que a seguridade social não recebe recursos do orçamento fiscal; ao contrário, parte substancialmente elevada de seus recursos financia o orçamento fiscal; e 3) que não é a previdência que impede a realização de investimentos públicos, gastos com educação ou em qualquer outra área considerada mais nobre para o crescimento econômico; ao contrário, é a política econômica que atinge a previdência, a saúde pública e a assistência social, retirando-lhes recursos e precarizando serviços essenciais à sobrevivência da classe trabalhadora (GENTIL, 2007, p. 180).

Para Vaz e Martins (2007), essa confusão de números e conceitos, com dados díspares, tumultua os debates sobre a Seguridade Social.

É fato que o Governo tem autorização constitucional para retirar parcela dos recursos da seguridade por meio da DRU. Mas não é correto esconder esses efeitos do debate público. Não é nada transparente subtrair (...) bilhões de receitas que foram arrecadadas para atender a ações e programas da Seguridade Social e, ainda assim, disseminar aos quatro ventos que há déficits na seguridade como justificativa para impor mais perdas de direitos aos trabalhadores. (VAZ e MARTINS, 2007, p. 196).

Para esses autores, a sociedade deve optar por ampliar a Seguridade Social, em volume suficiente para transformar permanentemente a miséria e a pobreza em dignidade e financiar programas de inclusão previdenciária.

Transformar superávits dessa monta em gigantescos déficits não é obra de um erro desproposital. Há interesses que se sustentam exatamente nesse processo. É preciso um grande esforço da sociedade organizada para desmistificar esses números. A transparência é fundamental para que a sociedade possa fazer suas escolhas (VAZ e MARTINS, 2007, p. 204).

A confusão que se estabelece em relação ao suposto déficit da Previdência Social é agravada pela constante associação entre o Regime Geral de Previdência Social (RGPS), que atende os trabalhadores do setor privado, e o Regime Próprio de Previdência Social (RPPS), que beneficia os trabalhadores do setor público federal.

Gentil (2007, p. 177) aponta que o RGPS e o RPPS são regimes inteiramente distintos. “Apenas o RGPS é público, universal e integra o orçamento da Seguridade Social”. Já o RPPS dos servidores federais é um sistema patrocinado por contribuições específicas de seus beneficiários e pela contribuição patronal da União. “É muito frequente, entretanto, esses regimes distintos (...) se misturarem nas estatísticas e, como consequência, o total dos gastos com a Previdência Social ficam inflados com itens que lhe são estranhos” (GENTIL, 2007, p.178).

Sobre os pagamentos dos Encargos Previdenciários da União, referentes ao RPPS, é preciso explicitar que não envolve despesas previdenciárias da Seguridade Social. O RPPS atende a um público específico, que possui requisitos, critérios, contribuições e exigências distintas. “É importante a análise dessas despesas, como, aliás, de todas elas. Mas confundir essas despesas com as do RGPS não ajuda a entender os problemas” (VAZ e MARTINS, 2007, p. 200). As receitas do regime previdenciário dos servidores são as contribuições de

ativos, de inativos e pensionistas, bem como a contribuição patronal, que correspondente ao dobro da contribuição do servidor, conforme estabelecido na Lei n° 9.717/1998.

Segundo Gentil (2007), mesmo que as despesas do RPPS fossem lançadas nas contas do OSS, ainda assim não seria possível falar em “déficit” da Previdência Social, como frequentemente proclamado, muito menos da Seguridade Social; e isso independentemente das contribuições da União como empregador do setor público. Ou seja, as contribuições sociais de trabalhadores e empregadores do setor privado e contribuições de servidores públicos superam os gastos com Previdência Social (dos servidores públicos e do setor privado), Saúde e Assistência Social da esfera federal, produzindo excedente de recursos. Mas por causa da DRU, esse “superávit foi empregado em gastos do orçamento fiscal da União” (GENTIL, 2007, p. 181). As despesas do RPPS corresponderam a mais de R$ 59 bilhões em 2008. Mesmo assim, o saldo da Seguridade Social, incluído o RGPS e o RPPS, alcançou um superávit de R$ 15 bilhões. (ANFIP, 2009, p. 61).

No entanto, Vaz e Martins (2007, p. 200) apontam que a utilização pela União de recursos das contribuições sociais para pagamentos dos Encargos Previdenciários da União referentes ao RPPS não deveria ser feita em detrimento das prioridades da própria Seguridade, devido à manutenção de diversas carências sociais.

Sem distinguir o RGPS do RPPS, o reformismo previdenciário, em diálogo com o discurso neoliberal de ajuste fiscal, propõem reformas que podem provocar mais dificuldades sociais. Segundo Matijascic, Ribeiro e Kay (2007a, p. 155), esse “é tipicamente o caso das propostas de reforma em debate atualmente, onde a não distinção entre as modalidades de benefícios gera confusão e estimula a formulação de políticas que, claramente, não podem atingir os fins pretendidos”.

(...) a agenda proposta pela ortodoxia está focada exclusivamente no corte das despesas correntes. Para justificar essa necessidade, argumentam que o gasto com aposentadorias no Brasil é elevado e tenderá a se agravar no futuro. Argumentam, por exemplo, que o “Brasil gasta como país rico” (12% do PIB). Alertando que comparações internacionais exigem cautela – para não se comparar banana com abacaxi – nesse caso, aos gastos com o INSS (urbano e rural) são adicionados gastos com a Previdência do setor público (...). Ora, esse procedimento não é correto, pois adicionam despesas de naturezas muito diversas (FAGNANI, 2007b, p. 59).

Caso as fontes previstas para a Seguridade Social fossem respeitas conforme o estabelecido constitucionalmente, a Seguridade Social teria os recursos necessários para seus programas. Dessa forma, como por “milagre”, o “déficit” da Previdência se tornaria superávit.

O Brasil não é um dos campeões em gastos sociais

O discurso neoliberal considera um contrassenso o Brasil ser um dos países “campeões” em gastos sociais no mundo. No entanto, esse tipo de consideração não condiz com a realidade, pois o Brasil está longe de possuir os gastos públicos mais elevados57 (tabela 3).

Quando se trata de comparar a previdência brasileira às suas congêneres no escopo internacional, (...) é possível destacar que o cenário brasileiro, ao contrário do que vem sendo divulgado pela maior parte da mídia, é coerente com o tipo de mercado de trabalho que foi construído pela trajetória social do país. Além disso, os gastos brasileiros não podem ser comparados aos países da OCDE sem ponderar uma série de especificidades que alteram a substância dos argumentos apresentados pela mesma mídia (MATIJASCIC, RIBEIRO e KAY, 2007a, P. 153).

Tabela 3: Gastos sociais em porcentuais do PIB – 2006

Fonte: OECD e MPOG/ Brasil apud Matijascic, Ribeiro e Kay (2007a)

57 Partindo da metodologia da OCDE, os gastos totais reúnem no núcleo previdenciário as despesas com idade avançada, morte prematura do segurado titular, invalidez ou doença. Além do chamado núcleo previdenciário, segundo as definições em vigor no Brasil, se associam os gastos com saúde, transferências para famílias (como o salário família, o bolsa família e as despesas decorrentes da LOAS - Lei Orgânica de Assistência Social, de 1996), seguro-desemprego (benefícios tipicamente previdenciários, mas que recebem outro tratamento no debate local), habitação e programas de ativação do emprego. (MATIJASCIC, RIBEIRO e KAY, 2007a, P. 155).

Além dessa visão equivocada de que os gastos sociais públicos são elevadíssimos, outra ideia muito difundida é de que as despesas com benefícios cresceram a taxas elevadas e que a continuidade desse ritmo colocará em risco as contas públicas.

O Brasil gasta muito em aposentadorias? A proporção gasto/PIB (7%) indica que não transgredimos os padrões internacionais. Nem sequer se pode afirmar que o gasto social brasileiro seja elevado. Estudos da Cepal (2006) indicam que o gasto social por habitante na Argentina é o dobro. Também ficamos atrás de Panamá, Chile, Costa Rica, Cuba e Uruguai. (FAGNANI, 2007a, p. 20).

Ao se considerar os gastos do INSS e dos regimes de previdência de servidores, seguindo a mesma metodologia de todos os países indicados para separar os gastos públicos e privados em suas modalidades compulsórias e voluntárias, percebesse que os gastos brasileiros com aposentadoria em relação ao PIB não se encaixam entre os maiores do mundo (tabela 4) (MATIJASCIC, RIBEIRO e KAY, 2007a, p. 156). Os gastos não estão em descompasso com a experiência internacional. “O fato de ele ultrapassar o que existe em países como México e Coréia significa que esses países possuem um nível de proteção considerado limitado que, no primeiro caso, sobretudo, coloca em risco a qualidade de vida do aposentado” (MATIJASCIC, RIBEIRO e KAY, 2007a, p. 156).

Tabela 4: Idade avançada – Gastos em porcentuais do PIB – 2006

Os gastos totais da Previdência Social (tabela 5) também não permitem afirmar uma situação fora de controle ou que não respeitem os parâmetros internacionais, pois “os níveis observados superam apenas aqueles de países com políticas sociais limitadas e que apresentam problemas sob o prisma do atendimento às populações com inserção mais frágil no mundo do trabalho” (MATIJASCIC, RIBEIRO e KAY, 2007a, p. 158).

Tabela 5: Previdência total – Gastos em porcentuais do PIB – 2006

Fonte: OECD e MPOG/ Brasil apud Matijascic, Ribeiro e Kay (2007a)

Assim, a percepção que os gastos sociais brasileiros são elevados requer qualificação. O gasto público precisa ser hegemônico, pois os rendimentos são baixos para a maioria da população e a iniciativa privada não consegue suprir esse tipo de necessidade que requer transferências via imposto (MATIJASCIC, RIBEIRO e KAY, 2007a, p. 161).

De acordo com Silva (2004a), a ênfase no desequilíbrio orçamentário da Seguridade e do próprio Estado criam relações econômicas que oneram o trabalho e desoneram o capital ou que impedem a ampliação dos recursos do sistema de Seguridade Social pela taxação do capital.

Segundo Fagnani (2007a), verifica-se, desde a promulgação da Constituição de 1988, uma disputa entre dois paradigmas antagônicos: o Estado de bem-estar social e as suas concepções de seguridade social, universalização, prestação estatal de serviços e direitos

trabalhistas de um lado; e do outro, o Estado mínimo com suas visões de seguro social, focalização, privatização, desregulamentação e flexibilização do trabalho.

O discurso neoliberal sobre Estado mínimo aponta que o gasto social aplicado em políticas universais gera instabilidade da moeda e é mal distribuído, pois destina recursos aos mais “ricos”. Por essa lógica, a solução para “erradicar” a pobreza seria reduzir as conquistas trabalhistas constitucionais total ou parcialmente universais e transferir recursos para os programas focalizados em famílias que estão “abaixo da linha de pobreza”.

Nesse sentido, segundo Fagnani (2007a), o discurso neoliberal e seus agentes de propagação defendem um modelo macroeconômico excludente embasado na ideia de ajuste fiscal por meio da redução de gastos sociais universais. Por trás da defesa na focalização dos recursos sociais aos supostamente mais pobres, mediante políticas de transferência de renda, está uma visão meramente contábil, pois esta focalização reduz drasticamente os gastos sociais em relação às políticas universais que asseguram padrões mínimos e dignos de cidadania a todos.

Esta é a verdadeira razão que move a suposta opção preferencial pelos mais pobres, que há mais de duas décadas tem sido defendida com tenacidade pelo Banco Mundial, FMI, demais instituições que pregam a cartilha neoliberal seguida à risca pela ortodoxia econômica brasileira. Dirigem-se ao senso comum e sua maior competência é passar para a opinião pública e para a mídia os seus propósitos visando à “justiça social” (FAGNANI, 2007a, p.5).

Mas essa maneira equivocada de se enxergar a Previdência Social distorce a realidade, legitimando a realização de qualquer tipo de reforma, podendo desestruturar as bases conceituais e financeiras da Seguridade Social, desmontando a sua concepção de universalidade.

(...) não temos a intenção de negar (...) que a previdência não deve ser revista. Ela deve ser reformada, sobretudo para corrigir desigualdades de tratamento entre trabalhadores e para assegurar direitos iguais aos cidadãos brasileiros, e não reduzir direitos duramente conquistados pelos trabalhadores. (BOSCHETTI, 2003).

Na verdade, “a previdência social é um dos campos férteis no qual se manifesta um traço tradicional e reacionário das elites brasileiras: a capacidade de manter, a qualquer preço, o status quo social que comandam secularmente” (FAGNANI, 2007a, p. 1).

O envelhecimento da população não é o problema da Previdência Social brasileira

O discurso neoliberal costuma apontar a questão da Previdência Social como uma “bomba-relógio que irá explodir as contas públicas” (FAGNANI, 2007a, p. 21). Nessa perspectiva, afirma que o problema tende a se agravar à medida que nada é feito e apela para a suposta necessidade de um pacto entre gerações para assegurar aos jovens de hoje os recursos para suas aposentadorias no futuro. Entre as justificativas utilizadas para reforçar a ideia de uma suposta necessidade de mudanças na Previdência Social, destaca-se o envelhecimento crescente da população do país decorrente de uma maior longevidade e da redução da natalidade. Dessa forma, no futuro, os trabalhadores na ativa não conseguiriam arcar com as despesas crescentes da Previdência Social. Assim sendo, “as mudanças demográficas vão para o centro das argumentações, na maioria das vezes em tons catastróficos, do diagnóstico da crise estrutural do sistema previdenciário brasileiro” (ANDRADE, 2007, p.128).

Entretanto, como os reformadores a qualquer custo da Previdência Social “só olham uma face da questão, preveem o desastre fiscal” (FAGNANI, 2007a, p. 21). Sem analisar a questão de forma total, não consideram a redução relativa das despesas do setor público com a

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