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ENTREVISTADO 1: Isso aí é raríssimo Ainda mais agora que fechou bem três ou foi quatro hospitais.

5.4.5 Relações do CSF, CAPS e HSMM com outros setores

As relações intersetoriais do CAPS, CSF e HSMM também são bem variadas. A modalidade mais citada foi de encaminhamento. Pudemos perceber que o CAPS recebe encaminhamentos de maior variedade de mais locais do que os outros serviços pesquisados, em relação a demandas de saúde mental. No CAPS, foram citados vários serviços ligados à assistência social, como CRAS, CREAS, Conselho Tutelar e Conselho dos Direitos do Idoso, assim como solicitações advindas das Promotorias de Justiça do Idoso e da Saúde:

São encaminhados por serviços, como é que a gente pode dizer? Institucionais. Que é o que? O CRAS, o CREAS, o NASF, né? [CAPS 01]

Promotoria pública também vem muito, porque muitas vezes chegam denúncias de maus tratos, negligência. Ou então de uma pessoa que [...] o comportamento chama atenção e a vizinhança alerta aos órgãos públicos. [...] E as delegacias às vezes encaminham por questões legais mesmo vinculadas a violência. Conselho Tutelar, em alguns casos que a criança é atendida e se descobre que naquela família tem alguém com transtorno mental também e tão encaminhando eles pra cá. E dos CRAS [...] . Eles vêm de vários pontos da rede tanto da saúde como da assistência. [CAPS 04]

O que eu vejo de fora da área da saúde seriam os órgãos outros referentes à infância, adolescência, aos idosos. [CAPS/HSMM]

[No CAPS] É comum chegar casos encaminhados por promotorias. Promotoria da saúde, promotoria do idoso. [...] Promotoria da infância e adolescência. Mas muitas vezes solicitando não um acompanhamento, mas pedindo um parecer. Uma avaliação né. [CAPS/HSMM]

No Centro de Saúde Fernandes Távora, só foram citados encaminhamentos a partir do Conselho dos Direitos do Idoso:

[...] só se for conselho do idoso, né? Porque lá eles têm meio que muito idoso que tem problema mental e eles procuram, né? Pra resolver, assim... Porque eles vão pra uma coisa e junta e resolve a outra. [...] Porque quando chega lá ele vê que a pessoa tem problema mental, entendeu? Ai já entra nessa outra parte. [CSF 07]

Em relação ao HSMM, os encaminhamentos citados foram apenas em relação a determinações judiciais. Quando estas envolvem menores de idade, o Conselho Tutelar também se faz presente:

No hospital, o que tem acontecido são determinações. Internações compulsórias determinadas judicialmente. Isso tem ocorrido com frequência, e quase em sua totalidade, se não a totalidade, de pessoas menores de idade e dependentes químicos. [CAPS/HSMM]

No caso aqui, a gente sempre tem contato com o conselho tutelar. No caso do atendimento de menores. [HSMM 02]

A gente acaba tendo muita internação compulsória. O juiz faz uma determinação de uma internação. [HSMM 04]

Essas relações com a Justiça apresentam-se unidirecionais, no sentido de que o Ministério Público não é muito utilizado pelo HSMM. Um profissional se queixa dessa unilateralidade, afirmando a necessidade do Ministério Público questionar também o papel das famílias de pacientes:

E eu gostaria de também dizer, que é importante também no Ministério Público acordar que vão tantas comunicação de internação e reinternação da mesma pessoa. E os familia res se sentem imunes, porque nada vai acontecer com eles pela sua maneira não responsável em cumprir a proposta terapêutica e facilitar a reinternação. [HSMM 05]

Em termos de variedade de relações, percebemos que, no que diz respeito ao recebimento de pessoas, o CAPS é procurado por um número maior de lugares. Essa maior variedade é indicativa da capacidade de conectividade do serviço (OLIVEIRA; PASSOS, 2009), mais desenvolvida que nos outros dois serviços pesquisados. Não podemos precisar, apenas a partir dos achados da pesquisa, a razão dessa maior multiplicidade de relações, mas podemos especular que um dos motivos seja um maior espectro de situações relacionadas à saúde mental abrangido por esse serviço, em comparação com o HSMM e o CSF, sendo assim responsável por uma quantidade maior de pessoas. O CSF não tem como função principal a atenção à saúde mental, e o HSMM é responsável por um momento bastante específico dos problemas de saúde mental.

Além disso, acreditamos que o fato das solicitações provirem de muitos pontos indica também o espaço conquistado pelo CAPS junto às outras instituições, no sentido de se constituir a principal referência de serviço em saúde mental. Isso vai de acordo à proposta substitutiva do serviço em relação aos hospitais psiquiátricos, assim como ao seu papel de articulador da rede de cuidados em saúde mental (BRASIL. MINISTÉRIO DA SAÚDE, 2004).

Também é digno de nota a recorrência de encaminhamentos, solicitações e determinações, nos três dispositivos pesquisados, provenientes de órgãos voltados para a garantia de direitos: Defensoria Pública, Ministério Público, conselho tutelar e conselhos de direitos. As relações com esses órgãos revelam não apenas intervenções de tratamento compulsório, mas, fundamentalmente, ações voltadas para a reconquista de direitos civis, parte essencial da reabilitação psicossocial (BRASIL. MINISTÉRIO DA SAÚDE, 2004; KINOSHITA, 1996).

Ainda que em alguns momentos essa relação se estabeleça com a pessoa com transtorno mental/sofrimento psíquico sendo alvo de intervenções coercitivas (determinações de internação

A respeito de encaminhamentos provenientes do CAPS, CSF e HSMM, direcionados a outros serviços, percebemos que tanto o CAPS como o CSF não referiram realizar muitos encaminhamentos intersetoriais. No caso do HSMM, foram mencionados com frequência os encaminhamentos para abrigos:

Contato com abrigos. Quer dizer, eles não são da saúde, mas acolhem. A gente recebe também muito morador de rua. Que a gente tenta colocar esses pacientes em abrigos. [HSMM 02] Alguns vão para o abrigo e vão para o CAPS, o abrigo mesmo se encarrega disso. Tem uns abrigos que acolhem pacientes com transtornos. [...] Quando o paciente recebe um benefício, ele paga um abrigo com esse benefício. [HSMM 02]

Assim, tem sempre contato, não sei se é exatamente o que você tá perguntando, com alguns abrigos. Porque sempre tem alguns pacientes indigentes, ás vezes que não tem mais contato com a família e tal. Para não ficar institucionalizado, virar morador do hospital. [HSMM 06] A gente tenta uma unidade de abrigo para aqueles pacientes que vêm se internar trazido pelo SAMU e que a gente não consegue encontrar uma família. Então, no hospital a gente tem a assistente social que faz praticamente milagre para poder colocar esse paciente em casa de novo, que é a grande preocupação. [HSMM 08]

Tendo em vista a preocupação do hospital de não institucionalizar os pacientes, o contato com abrigos frequentemente faz-se necessário para que indigentes ou pessoas sem vínculos familiares não sejam abandonados após a situação de alta. O abrigo surge como uma alternativa mais digna e mais saudável, em comparação com uma situação de

moradia no próprio hospital, sendo um espaço mais propício ao desenvolvimento de um grau mínimo de contratualidade (KINOSHITA, 1996). Também foram mencionados encaminhamentos do hospital para obtenção de próteses e cadeiras de rodas, relação reforçada também pelo contato telefônico, assim como para a perícia dos serviços de transporte público, para obtenção da gratuidade:

Lá na secretaria de ação social também, para a gente solicitar algum recurso, alguma prótese, alguma coisa desse tipo. Cadeira de rodas. [...] Através de um encaminhamento e de contato telefônico. Com o serviço social de lá. [HSMM 01]

Tem a gratuidade, a gente tem alguns pacientes aqui que tem gratuidade. Mas nem todo paciente doente mental que leva o relatório recebe gratuidade. Tem os pacientes que a gente jura que vai receber e é negado, ninguém sabe como que é feito essa avaliação, quem é que faz essa avaliação no SINDIONIBUS e na ETUFOR, se o paciente tem direito ou se o paciente não tem. [HSMM 03]

No CSF foram citados poucos encaminhamentos, sendo mencionados outros tipos de relação. Foram relatadas solicitações para o Conselho de Direitos da Criança e do Adolescente auxiliar no acompanhamento de alguns casos:

Tenho uma criança aqui, [...] que a menina não saía de dentro da rede, com 12 anos de idade. Desde 12 anos em uma rede, a urinar, não comia, não... [...] Ai a [ACS Fulana] disse: “eu estou achando que ela foi violentada pelo pai, ou ela foi violentada pela mãe dela. Aconteceu alguma coisa." Aí eu disse: "Já que ela não se levanta, vamos ligar para o... o... [conselho] dos direitos da criança e do adolescente, né?" Quando a gente ligou, as moças foram de lá, procuraram a [ACS Fulana], que levou elas até a casa da menina". [CSF 07]

No CSF também foram citados encaminhamentos para recursos da comunidade, assim como parcerias para o uso de espaços da comunidade para a realização de atividades do posto de saúde:

Mas eu acho que você tem que ver, que tem atividades que não são aqui. Se o posto desse estrutura, todas as atividades a gente faria aqui. Não dá, a gente tem que buscar na escola, a gente tem que buscar alguma coisa, na igreja... Para fazer essas atividades. Até o grupo de saúde mental era lá na maçonaria. A gente fazia lá de tarde. [CSF 02]

Não é um trabalho psicoterápico, mas um trabalho de acompanhamento. Tentar encaixar esses pacientes em algumas atividades da comunidade. Aí você tem que descobrir se na comunidade tem as terapias comunitárias, se tem os grupos de convivências, por exemplo, dos bombeiros... Há as questões religiosas, se a pessoa pode participar de algum grupo religioso. [CSF 02]

Tais relações revelam que o CSF dispõe de conhecimentos sobre seu território, ainda que prevaleçam relações de encaminhamento e de uso do espaço, não sendo relatadas ações conjuntas interinstitucionais ou junta a com sujeitos da comunidade. O estabelecimento formal de parcerias foi mais bem percebido no CAPS, onde além dos

encaminhamentos, foram apresentados projetos, produzidos pelo serviço, que envolviam usuários do serviço e outras instituições da comunidade:

Assim como, também, eu consegui fazer uma parceria na guarda municipal e hoje, né? Já faz o que? Dois anos e meio que eles estão na comunidade fazendo hidroginástica com os demais. Não foi fácil. Então eu levei um projetinho, e consegui. [CAPS 01]

Da Fundação Silvestre Gomes, que dá cursos de informática. [CAPS 01]

O mais significativo foi o projeto que eu fiz com uma ONG, do grupo E.N.T.R.E. [...] Há muito tempo, desde que eu tinha entrado no CAPS da UFC, eu tive um sonho de fazer essa inclusão produtiva com esses pacientes. Então assim, eu fui procurando dentro do território algo que eu pudesse, é... ingressá-los. Então, quando eu vinha passando eu vi: uma ONG de empreendedorismo de transformação de reciclado. Como eu gosto muito de trabalhar com reciclado, principalmente garrafas pet, eu entrei, e fui conversar com a coordenação. A coordenação me pediu um projeto para poder fazer essa parceria com o CAPS. Então eu fiz um projeto. [CAPS 01]

Nós, até por força da circunstância e mesmo pela ousadia da equipe, construímos e fomentamos muito trabalho de comunidade, né? Um trabalho de rede, articulando terapias complementares. [...] Essas terapias podem estar tanto incorporadas às unidades de saúde, como em outros equipamentos também na comunidade que a gente pode dispor. Por exemplo, aqui na SER III a gente tem terapia comunitária no Centro de Referência de Assistência Social; a gente tem terapia comunitária no equipamento da igreja aqui próximo; a gente tem dentro da Guarda Municipal. Então a gente vai identificando na comunidade onde é que tem esses espaços. Assim como tem dois, no máximo três em unidades básicas de saúde. [CAPS 03]

Tanto no CAPS como no CSF foram citadas as terapias comunitárias (BARRETO, 2005), e ainda que em ambos os serviços essa conexão se estabeleça por meio de encaminhamento, no CAPS a relação é mais sistematizada, com esse serviço possuindo um formulário próprio de encaminhamento. Esse formulário foi desenvolvido após o mapeamento de várias terapias complementares existentes no território, além da terapia comunitária: grupos de biodança, aplicação de reiki, reflexologia e massoterapia. Percebemos novamente um grande potencial de conectividade no CAPS, ao desenvolver não apenas encaminhamentos e utilização de espaços da comunidade, mas a criação de atividades conjuntas, interinstitucionais e com o 3º setor. As relações de parceria mostram-se mais densas do que o encaminhamento, pois este implica apenas no trânsito do usuário, que fica então sob responsabilidade do outro serviço. No caso das parcerias, percebe-se a presença do serviço de origem na instituição parceira, no sentido de combinar o modo de acesso, o público e a responsabilidade do local que receberá as pessoas encaminhadas. Quando ocorre apenas o encaminhamento, os profissionais pressupõem o consenso sobre esses aspectos, situação nem sempre verídica, conforme

os frequentes relatos de encaminhamentos “errados” para o CAPS e HSMM, descritos

A relação de parceria também é mais complexa que o mero uso do espaço físico de outras instituições, pois neste caso a responsabilidade continua sendo apenas do serviço de origem, que realiza por conta própria toda a atividade. É digno de nota, contudo, a variedade de recursos intersetoriais e comunitários acessados pelo CSF, fato importante tendo em vista que o cuidado em saúde mental na APS não pode se restringir a atividade internas aos centros de saúde, sendo fundamental o acesso a outros potenciais de saúde do território (CAÇAPAVA; COLVERO, 2008).

Outro aspecto observado no CAPS, ainda acerca das parcerias desenvolvidas, diz respeito ao desenvolvimento da autonomia dos usuários em algumas atividades. Ainda que o acesso inicial à atividade tenha sido mediado pelo serviço, a continuidade da participação não está condicionada à condição de “usuário do CAPS”. Essa qualidade foi percebida no “grupo ENTRE” e na cooperativa do CAPS, ambos voltados a atividades produtivas:

Outros a gente tem realmente uma parceria mais avançada. Por exemplo, a gente já tem aqui trabalhos, é... é... junto à COOPCAPS, que é uma cooperativa nascida aqui e que hoje já conquistou autonomia, mas que consegue dar conta de agir, isso claro, sob acompanhamento dos profissionais obviamente, mas de uma outra perspectiva de atividade terapêutica. [...] Alguns já não são mais nossos usuários, mas outros são. Ainda. [CAPS 03]

Já estão inclusive inseridas dentro de uma perspectiva de inserção produtiva, né? A exemplo do [grupo] ENTRE também, que foi o projeto que foi feito em parceria conosco, que é as reciclagens de material reciclado, que também é dentro dessa perspectiva de reinserção produtiva. Que muitos usuários também vão complementando nossas atividades aqui. [...] Na perspectiva de cuidado tem, continua vindo ao médico, continua fazendo o uso dessa medicação, mas em alguns aspectos ele já está na comunidade. Já está além do CAPS. [CAPS 03]

Se considerarmos como parte do objetivo desses grupos o desenvolvimento da autonomia, é necessário superar a relação de tutela que existe nos serviços de saúde, exigindo relações mais horizontais entre grupos e serviço (SAMPAIO et al., 2011). Além disso, a própria noção de autonomia, segundo Kinoshita (1996), está relacionada a depender de maior variedade de recursos, diferenciando “autonomia” de

“independência”. Dessa forma, diminuir a dependência dos usuários ao CAPS como

mediador de atividades, ainda que isso gere dependência de outros espaços, é um indicativo de desenvolvimento da autonomia.

Para finalizar essa seção, apresentamos uma sistematização gráfica que identifica as principais modalidades de inter-relações observadas no CSF, CAPS e HSMM:

Figura 5 - Relações entre CSF, CAPS e HSMM

Fonte: autor

Figura 6 - Outras relações com setor saúde e intersetoriais: CSF Fernandes Távora

Fonte: autor

CSF - CAPS

• Encaminhamentos CSF CAPS • Encaminhamentos CAPS CSF • Contrarreferência p/ o CSF • Apoio matricial Consultas conjuntas Discussão de caso Contato telefônico

CAPS - HSMM

• Encaminhamentos CAPS HSMM • Encaminhamentos HSMM CAPS • Contrarreferência p/ o CAPS • Contrarreferência p/ o HSMM • Busca ativa • Equipe de desinstitucionalização do CAPS • Reunião de gestores

CSF - HSMM

• Encaminhamentos CSF HSMM • Contato telefônico HSMM CSF

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SF

SETOR SAÚDE ENCAMINHAMENTOS REALIZADOS

Ambulatórios psiquiatria (HUWC, HSMM) SAMU NAMI INTERSETORIAL ENCAMINHAMENTOS RECEBIDOS Conselho Direitos do Idoso SOLICITAÇÕES REALIZADAS

Conselho Direitos da Criança e Adolescente ENCAMINHAMENTO PARA RECURSOS DA COMUNIDADE grupos religiosos terapia comunitária bombeiros grupo de convivência USO DE ESPAÇOS DA COMUNIDADE escola igreja maçonaria

Figura 7 - Outras relações com setor saúde e intersetoriais: CAPS Prof. Frota Pinho

Fonte: autor

Figura 8 - Outras relações com setor saúde e intersetoriais: Hospital de Saúde Mental de Messejana Fonte: autor

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Ambulatórios psiquiatria (HUWC, HSMM, CEMJA) Leito psiquiátrico em hospital geral (HUWC) ENCAMINHAMENTOS