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6 – A DECISÃO JURÍDICA LEGÍTIMA – INTERPRETAÇÃO DO DIREITO

6.1 Representação interpretativa

Na obra clássica de Carlos Maximiliano, Hermenêutica e aplicação do direito, há uma distinção entre hermenêutica e interpretação: “Esta é a aplicação daquela; a primeira como entidades familiares. Doutrina. Alegada inconstitucionalidade do art. 1º da Lei nº 9.278/96. Norma legal derrogada pela superveniência do Art. 1.723 do novo Código Civil (2002), que não foi objeto de impugnação nesta sede de controle abstrato. Inviabilidade, por tal razão, da ação direta. Impossibilidade jurídica, de outro lado, de se proceder à fiscalização normativa abstrata de normas constitucionais originárias (cf, art. 226, § 3º, no caso). Doutrina. Jurisprudência (STF). Necessidade, contudo, de se discutir o tema das uniões estáveis homoafetivas, inclusive para efeito de sua subsunção ao conceito de entidade familiar: matéria a ser veiculada em sede de ADPF.”

199

Para a sociedade o desenvolvimento normal da criança é necessário, sendo que a convivência com ambos os pais é de suma importância para que isso aconteça, pois este desenvolvimento normal somente pode ocorrer com uma correta triangulação entre pai, mãe e criança. Toda criança tem necessidade do pai e da mãe, e, em princípio, não podemos afirmar que a função de um é mais importante que a do outro, mas que ambos têm relevância.

O artigo 227 da Constituição Federal determinou que o melhor interesse da criança prevalecerá sobre qualquer outro envolvido, entendendo-se o mesmo para o adolescente, estabelecendo-se, dessa maneira, uma hierarquia de valores em que o direito da criança e do adolescente aparece sempre em primeiro lugar.

Para nossa integralidade psíquica o acesso ao afeto é essencial, sendo de vital importância para o bom desenvolvimento da criança, com reflexos inclusive físicos, daí todo o desenvolvimento da psicologia e psicanálise. O afeto é intrínseco à dignidade humana. Não se pode exigir afeto de qualquer um, mas apenas daqueles que de certa forma são responsáveis pelo bom desempenho psíquico de cada um. No caso das crianças, os pais.

Dessa forma, a não realização de visitas pelo genitor não guardião, quando há dissolução do casamento ou da união, é uma exteriorização da falta de afeto. A não realização de visitas, a negação ao direito de receber afeto, constitui uma lesão ao direito de personalidade suportado pelo filho e, como tal, ele pode exigir seu respeito e o genitor tem o dever de abster-se de praticar esse dano.

O Projeto de Lei nº 6.960/2002 pretende pacificar o assunto ao acrescentar um § 2º ao artigo 927 do Código Civil, com a seguinte redação: “Os princípios da responsabilidade civil aplicam-se também às relações de família”.

descobre e fixa os princípios que regem a segunda. A Hermenêutica é a teoria científica da arte de interpretar”201.

Inicia-se pela lição do Direito Romano contida em Gaio, que o romanista Sandro Schipani enaltece, uma vez que seu método interpretativo é suficiente para trazer aos juristas noções e argumentos idôneos à melhor conhecer e aplicar o direito202. Seu procedimento consiste em ir ao encontro do evento e relacioná-lo ao momento do da lei promulgada, quase sempre a Lei das XII Tábuas, partindo-se da idéia de completude do que é interpretado, mesmo que constituído em partes. Não que seja necessário uma busca constante do momento histórico da referida lei, mas que esta é um ponto de partida como criação de uma fórmula geral que resolva o caso concreto203. Desse modo Gaio afirma que alguém, mesmo de boa-fé, não poderá adquirir uma coisa por usucapião, visto que a Lei das XII Tábuas proibia a usucapião de coisas furtadas e a Lei Júlia e Pláucia as adquiridas de modo violento, ou seja, as coisas possuídas de má-fé204.

Ora, o Digesto já afirmava que “as leis devem ser interpretadas com mais benignidade para que a vontade delas seja conservada”205, em um paradoxo entre permitir que a lei possa ser atualizada para aplicar-se a um caso contemporâneo, contudo mantendo-a na sua integralidade.

Guastini, muito embora em posição positivista, afirma que interpretar é atribuir sentido à norma206, mas essa tarefa impõe uma atividade intelectual desenvolvida pelo intérprete seguindo algum caminho lógico e racional, sob pena de não encontrar fundamento válido ao conteúdo da interpretação, porque a norma escrita, como qualquer expressão literária,

200

Método de interpretación y fuentes en derecho privado positivo, Madrid : Hijos de Reus, 1902, p. 481.

201

Hermenêutica e aplicação do direito, 19ª ed., Rio de Janeiro: Forense, 2001, p. 1.

202

La codificazione del diritto romano comune, Turim: Giappichelli Editore, 1999 p.102.

203

Idem, p. 103: Per compieri questa interpretazione, Gaio ritiene che necessariamente si debba ‘cercare di

nuovo’, ‘risalire da’ un momento od evento (repetere a/ab). Per quete leggi antiche egli ritiene che sia necessario rifarsi ‘dagli inizi dell’Urbe’. Gaio non sta dicendo che per tutte le interpretazioni sia necessario risalire da tali inizi; ma il canone metodogico che sta applicando, e che successivamente enuncia in una formulazione generale (interpretationem promittentibus-tractare), consente di inferire fondatamente che di volta in volta si tratterà di individuare specificamente tale “da quando” o “da cosa”; cioè, tali “inizi”, tale “origine”, restando generalmente necessario non ometerli, ma cercare di possederli di nuovo intellettualmente.

204

Inst.,2,45: “Algumas vezes uma pessoa, de pura boa-fé, possui coisa alheia, mas não lhe aproveita, entretanto, o usucapião, como no caso em que possuía coisa furtada ou obtida mediante violência, porque a Lei das XII Tábuas proíbe o usucapião de coisas furtadas e a Lei Júlia e Pláucia, o de coisas possuídas violentamente.”

205

D.1.3.18: Benignius leges interpraetandae sunt, quo voluntas earum conservetur. Tradução de Hélcio Madeira.

206

adquire vida própria ao ser expressa em palavras, que não mais se confunde com seu autor, recebendo conteúdos interpretativos diversos, que poderá variar conforme o tempo, o lugar e, porque não dizer, o intérprete.

Imagine-se o maestro na condução da orquestra, que tem o poder de reconstruir a composição do autor, com a possibilidade de modificar suas qualidades, apenas com os movimentos de seu corpo, sobretudo das mãos, imprimindo na expressão da música sua própria personalidade, destacando-se, portanto, da obra original. Do mesmo modo com a interpretação do ordenamento jurídico. Com toda razão, Caio Mário da Silva Pereira afirma que toda lei merece interpretação e não somente a obscura, ambígua ou de conteúdo confuso, haja vista que é a interpretação que dá vida à norma207, ou poder-se-ia dizer que a interpretação moderniza o conteúdo normativo, no sentido de trazê-lo ao momento presente segundo as necessidades no instante reclamadas.

Mas uma interpretação nunca será inocente. O intérprete, como um ser humano dotado de vontade, fundamentará sua escolha de acordo com o que acredita como justo, contudo, para conferir legitimidade e validade ao conteúdo interpretativo, deverá seguir um caminho previamente exigido pela sociedade como necessário para conferir o sentido adequado ao resultado escolhido, em outras palavras, deve revelar o direito de modo a ser mais imparcial possível, com os elementos que lhe estão a disposição para tal tarefa.

Há uma metodologia para alcançar esse trabalho mental de revelar o conteúdo normativo, que na síntese de Caio Mário: o intérprete se vale do elemento literal, observando a linguagem adotada pela norma; o elemento lógico, ou sistemático, extraído do fator histórico e mediante o entendimento da norma seu objetivo, concluindo que, “quando o intérprete não atenta exatamente para essa circunstância, e busca a intenção daquilo que alguém disse (subjetiva) e não do que está dito (objetiva) na lei, corre o risco de desvirtuar a obra hermenêutica”208.

Essa metodologia pode resvalar na compreensão do Direito como uma ciência exata, como os que estão sempre a lhe emprestar uma condição racionalmente pura, situação que pode ser percebida inclusive em autores modernos como Robert Alexy, em sua teoria da argumentação jurídica, que empresta à atividade interpretativa, ante a sua possível imprecisão, um discurso racional.

207

Alexy, expoente do modo de pensar racionalista europeu, procura a legitimidade das regras do discurso jurídico, haja vista que as decisões judiciais que põe fim a um conflito nem sempre decorrem de uma aplicação lógica das normas pressupostas, tampouco de enunciados fundamentados de um sistema, em virtude de quatro motivos, em seu entender: imprecisão da linguagem jurídica; possibilidade de antinomia ou conflitos entre as normas; situações que exijam uma regulamentação jurídica, ou seja, uma lacuna; e casos especiais que impliquem em uma decisão justa fora da literalidade da norma209. De fato, este tem sido a maior preocupação dos juristas, ou seja, fundamentar a legitimidade das decisões dos conflitos de direito, todavia há de considerar-se que se trata de uma ciência que versa sobre as relações sociais e, portanto, não podem ser vistas sob um ângulo cartesiano, sem levar em conta a idiossincrasia do ser humano.

Nesse proceder, Alexy tenta concluir por um modo de valorar adequadamente as decisões judiciais, indicando que o discurso jurídico pode ser apreciado de três perspectivas distintas: empírica, analítica ou normativa210. Empírica é a perspectiva em que se descrevem ou se explicam com a freqüência em que aparecem determinados argumentos. A analítica diz respeito à estrutura lógica dos argumentos apresentados ou que sejam possíveis. Por fim, a normativa é relativa à racionalidade do discurso jurídico, sendo que as três perspectivas se mesclam na metodológica jurídica tradicional211.

Ao longo do desenvolvimento de sua teoria, Alexy apresenta uma série de fórmulas e faz uma apologia à razão ao concluir que os procedimentos de direito devem realizar “na maior medida possível o ideal de racionalidade discursiva”212, o que não significa uma segurança do resultado213, o que não lhe retiraria o caráter racional, que é garantido por

208

Idem, v. I, p. 141. 209

Teoria da argumentação jurídica, trad. Zilda Hutchinson Schild Silva, 2ª ed., São Paulo: Landy, 2005, p. 33.

210

Idem, p. 45.

211

Idem, ibidem: “Na metodologia tradicional, mesclam-se essas três perspectivas. Isso não é um defeito, já que existem entre elas realmente muitas relações. Assim. A perspectiva empírica pressupõe ao menos uma classificação grosso modo dos diferentes argumentos. A normativa exige que seja considerada a estrutura lógica dos possíveis argumentos. Mas é problemática a relação entre a perspectiva normativa e a empírica. É, por exemplo, um critério de validade para a racionalidade de um argumento a concepção dominante em um grupo? Aqui só se podem levantar questões desse tipo, que serão discutidas no transcurso da investigação.”

212

Idem, p. 311.

213

Idem, p. 279: “Para quem só está disposto a aceitar como teoria da argumentação jurídica racional um

procedimento que garanta a segurança do resultado, a teoria aqui proposta mostra-se rejeitável.

Porém não existe nenhum motivo para tal equiparação. Tampouco nas ciências naturais, que foram com freqüência contrapostas à Ciência do Direito como paradigma de verdadeiras ciências, pode-se falar da formação de uma segurança definitiva. O simples fato de não se poder alcançar segurança dificilmente pode

uma série de condições e regras e não pelo resultado214. Sua teoria culmina com uma Tabela das Regras e Formas Elaboradas.

Por mais seguidores que possa ter, deve-se discordar do discurso cartesiano do autor alemão, pois o comportamento humano não cabe em fórmulas pré-determinadas, como se fossem uma equação matemática. O fenômeno do comportamento humano é muito mais do que isso.

Com outro modo de apreciar o fenômeno interpretativo, em sua obra Metodologia da

ciência do direito, Karl Larenz apresenta uma interpretação do direito pelo método

“compreensivo” e orientado a valores, que em seu entender é passível de uma crítica racional215 e define a interpretação como “uma atividade de mediação, pela qual o intérprete traz à compreensão o sentido de um texto que se lhe torna problemático”216, com a missão de evitar a contradição entre as normas, além de responder sobre concurso de normas e de regulações217 e tal somente pode ocorrer com a consciência da impossibilidade de se atingir uma interpretação absolutamente correta, isto é, que seja definitiva para todas as épocas218, até porque a mutação da consciência valorativa geral será encontrada nas leis mais recentes ou, ainda, que se assente em amplo consenso219. Dessa forma, correção é relacionada à ordem jurídica do momento e a interpretação somente pode ser entendida como ciência “se nos libertarmos da estreiteza do conceito cientificista de ciência”220.

Considerando que as leis são feitas por homens para homens e dirigida para a criação de uma ordem jurídica que seja o mais justa possível e de acordo com as necessidades da

ser visto como razão suficiente para se negar à Ciência do Direito o caráter de uma ciência ou uma atividade racional".

214

Idem, ibidem.

215

Metodologia da ciência do direito, trad. José Lamego, 4ª. ed., Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 2005, p. 3: “Nesta medida são as valorações suscetíveis de confirmação e passíveis de uma crítica racional. Há no entanto que afastar a idéia de que os resultados obtidos por essa vida poderiam alcançar o mesmo grau de segurança e precisão de uma dedução matemática ou de uma mediação empreendida de modo rigorosamente exato.” 216 Idem, p. 439. 217 Idem, p. 441. 218

Idem, p. 443: “Se bem que toda e qualquer interpretação, devida a um tribunal ou à ciência do Direito, encerre necessariamente a pretensão de uma interpretação ‘correta’, no sentido de conhecimento adequado, apoiado em razões compreensíveis, não existe, no entanto, uma interpretação ‘absolutamente correta’, no sentido de que seja tanto definitiva, com válida para todas as épocas. Nunca é definitiva, porque a variedade inabarcável e a permanente mutação das relações da vida colocam aquele que aplica a norma constantemente perante novas questões”.

219

Idem, p. 443.

220

sociedade221, que o conceito de justiça e as necessidades estão em constante mutação, é possível atribuir vida própria às normas escritas, visto que como já se destacou com o decorrer do tempo se afasta do desejo primário de seus autores222, como todo o ato humano de criação, portanto o intérprete buscará as respostas de suas questões em seu tempo, contudo, no entender de Larenz, sem deixar de avaliar o legislador histórico, isto é:

O escopo da interpretação só pode ser, nestes termos, o sentido normativo do que é agora juridicamente determinante, quer dizer, o sentido normativo da lei. Mas o sentido da lei há de ser considerado juridicamente determinante tem de ser estabelecido atendendo à intenções de regulação e às idéias normativas concretas do legislador histórico, e, de modo nenhum, independentemente delas223.

Em outras palavras, não é possível deixar a interpretação ao arbítrio de quem a pratica, mas seguindo critérios seguros de atribuir significado às normas, que indicam pontos de vista diretivos, tais como, em primeiro lugar, a busca do sentido literal da linguagem; o contexto significativo da lei (uma interpretação sistemática); a intenção reguladora do legislador histórico; o encontro de critérios teleológico-objetivos; a interpretação conforme a constituição; e, por fim, a inter-relação de todos esses critérios.

A escolha do sentido literal é o primeiro a ser utilizado, haja vista que a linguagem contida nos textos jurídicos é, ao contrário de outros ramos da ciência, a de uso comum, porque a todos se destina, todavia, por mais geral que seja, faz-se necessário entendê-la com exatidão, pois há termos que possuem significado específico para o direito224.

A interpretação sistemática, ou pelo contexto significativo da lei, é aquela em que deve ser necessário investigar o sentido da lei interpretada em face de todo o conjunto legislativo em que está inserida225, havendo uma concordância material de preceitos.

Falhando os dois métodos agora expostos, entende Larenz que se deve ir procurar a intenção, fins e idéias normativas do legislador histórico, e tal deve ser investigado, com a ressalva de que a opinião do legislador não vincula o intérprete226, mas que será retirada da 221 Idem, p. 446. 222 Idem, ibidem. 223 Idem, p. 448. 224

Idem, p. 451: “A linguagem jurídica é um caso especial de linguagem geral, não é uma linguagem simbolizada, completamente desligada dela. Isto tem como conseqüência, como já repetidamente sublinhamos, que não é capaz de alcançar a exatidão de uma linguagem simbolizada, de maneira que os seus termos continuam a necessitar de interpretação”.

225

Idem, p. 457. 226

própria gênese da lei227, assim como dos projetos, atas das comissões, exposição de motivos, onde se pode encontrar a intenção reguladora e os fins do legislador228.

A pesquisa teleológica-objetiva, assim denominada por Larenz em razão de não depender da consciência do legislador na sua importância para a regulação por ele realizada229, ou seja, qual o fim que o legislador pretende realizar com a lei que criou, uma regulação “materialmente adequada”230, o que só terá lugar quando os demais critérios não forem suficientes para elucidar toda a dúvida acerca do alcance legislativo. Assim sendo, se uma norma pretende regular todo um setor específico, como a estrutura de um instituto jurídico, ela somente será adequada se estiver de acordo com sua estrutura material, ou, como queiram alguns, a natureza das coisas231, já que a regulação legal deixou um espaço sem compreensão.

A interpretação conforme a Constituição, diz respeito aos princípios ético-jurídicos elevados a nível constitucional, que lhe acarretam importância tal que as decisões devam por eles ser valorizadas232. Por fim, todos os critérios acima podem ser inter-relacionar, cabendo ao intérprete justificar, fundamentando adequadamente, as razões porque considera um sobre o outro e somente “quando tiver o intérprete esgotado todas as possibilidades de alcançar um resultado metodologicamente assegurado, pode o juiz encontrar uma decisão de sua exclusiva responsabilidade”233.

Com propriedade, e em uma posição francamente favorável ao Direito natural, Limongi França234 conclui pela necessidade de se humanizar a lei na tarefa de interpretá-la e aplicá- la ao caso concreto, atividade realizada pelo magistrado, pois, “a finalidade intrínseca da norma jurídica não é ser dura, mas justa; não é alcançar rija e contundentemente a disciplina férrea, senão o bem e a eqüidade: Ius, dizia o jurisconsulto CELSO, aplaudido por ULPIANO, est ars beni et aequi”.

227 Idem, p. 465. 228 Idem, p. 466. 229 Idem, p. 470. 230

Idem, p. 469: “Só quando se supuser esta intenção da parte do legislador se chegará, por via de interpretação, a resultados que possibilitam uma solução ‘adequada’ também no caso concreto”.

231

Idem, p. 471: “De entre os critérios de interpretação teleológico-objetivos, que decorrem dos fins objetivos do Direito, mais rigorosamente: da idéia de justiça de justiça, cabe uma importância decisiva ao princípio de igualdade de tratamento do que é (segundo as valorações gerais do ordenamento jurídico) igual (ou de sentido idêntico)”.

232

Idem, p. 479. Para Larenz, prevalece o princípio de proteção à dignidade da pessoa humana.

233

Idem, p. 489.

234

Como toda ciência, a maneira de se interpretar o Direito sofreu evolução, mas entre nós há a regra contida no artigo 5º do Dec.-Lei 4.457/42 (LICC), que determina ao intérprete, muito embora pareça uma norma destinada apenas ao magistrado, o dever de atender aos fins sociais que a norma se dirige e às exigências do bem comum ao analisá-la. Na realidade, não se trata aqui de uma regra de hermenêutica propriamente dita, mas um direcionamento ao conteúdo interpretativo.

Assim, encontra-se o método para revelar o direito de modo que a vontade e ideologia do intérprete não ultrapassem os limites impostos pela sociedade na solução dos conflitos235 até porque superada a Escola Exegética de interpretação, limitada apenas em revelar a vontade do legislador, sem expandir a letra da lei; a hermenêutica incorporou regras em que a interpretação leva em conta o sistema jurídico, com a subsunção do fato à norma sob a ótica de uma argumentação lógica, sem que se deixe de observar o mandamento contido no art. 5º, LICC, uma vez que, no dizer de Chaïm Perelman236, “a busca das soluções concretas obrigará muitas vezes a reinterpretar os princípios, a opor o espírito à letra da lei, o ponto de vista pragmático, que leva em consideração as conseqüências resultantes da aplicação de uma regra, ao ponto de vista formalista, o da aplicação literal do texto”237.

Então, para se atribuir legitimidade às decisões jurídicas é imperioso que o intérprete compreenda não o método de valorar as normas, visto que isso apresenta enorme

235

Tome-se como exemplo o juiz espanhol Fernando Ferrín Calamita, que professa a religião católica e admira a obra do fundador do “Opus Dei”, José Maria Escrivá, portanto de notório conteúdo conservador e de rigidez moral, dessa forma, em suas decisões judiciais deixa claro ser contrário à formação de famílias homoafetivas, tanto que proferiu dois julgamentos polêmicos, um em que retirou a guarda de uma criança