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3 DIFICULDADES NO ENSINO-APRENDIZAGEM DE TEMAS DA ASTRONOMIA

3.2 REPRESENTAÇÕES RELACIONADAS À FORMA DA TERRA E AO UNIVERSO.

3.2.2 Representações sobre o Universo

Partindo da problemática do déficit de conteúdos de Astronomia na formação inicial de professores do Ensino Fundamental, Bisch (1998) investiga a natureza e conteúdo do conhecimento astronômico apresentado por professores e estudantes deste nível.

Na descrição e caracterização das representações das crianças e adolescentes relativas ao Universo, Bisch (1998) se baseia no levantamento que realizou através de entrevistas com dezoito crianças da cidade de São Paulo, na faixa etária de 6 a 14 anos, sendo selecionadas duas crianças de cada idade.

Nessas entrevistas eram solicitadas a representação da Terra, da Lua, do Sol e das estrelas com massa de modelar, através de desenhos e com a disponibilização de objetos tridimensionais de isopor, além de ser simulada uma viagem com um foguete para outros lugares do Universo que as crianças desejassem. A partir da análise dessas entrevistas, foram criadas sete categorias de acordo com as temáticas específicas abordadas, dentre as quais iremos focalizar somente aquela referente aos modelos de Universo.

A temática sobre os modelos de Universo, foi caracterizada levando em consideração especificamente a construção de um modelo tridimensional usando objetos de isopor e fios de nylon suspensos no teto da sala em um dos momentos da entrevista. A partir dos dados obtidos, Bisch (1998) elaborou quatro diferentes categorias de modelos de Universo para as crianças e adolescentes, as quais são descritas logo abaixo.

A primeira delas é o Universo “Terra embaixo, céu em cima”, no qual existe uma forte diferenciação entre a posição da Terra e a dos demais astros, localizando- se isolada, na posição mais baixa do modelo e com todos os demais astros situados mais acima da mesma. Nesta categoria também estão inseridas as representações de Terra dupla, como é observado na Figura 06 (a).

Figura 06: Representação da disposição dos objetos para a categoria de Universo “Terra embaixo,

céu em cima”. Em (a): T - o “planeta Terra”, L - Lua, S - Sol, E - estrela e TC - “Terra-chão”. E em (b): T - Terra, L - Lua, S - Sol e E1, E2, E3, E4, E5 - estrelas.

(a) (b) Fonte: BISCH, 1998.

A segunda categoria é denominada como Universo em camadas, no qual o Universo é constituído por várias camadas que se superpõem, sendo cada camada caracterizada por astros de natureza semelhante ou de alguma forma associados, como por exemplo as estrelas geralmente se situam em uma camada superior e a Terra, assim como os demais planetas e a Lua, em uma camada inferior. Esta foi a categoria mais encontrada entre os sujeitos investigados na pesquisa de Bisch (1998). Na Figura 07 são ilustrados alguns exemplos dessa categoria.

Figura 07: Representação da disposição dos objetos para a categoria de Universo em camadas.

Sendo: T - Terra, L - Lua, S - Sol e E1, E2 - estrelas

Na terceira categoria chamada Universo plano, os astros são dispostos todos praticamente na mesma altura, definindo um plano horizontal onde se situa todo o Universo, como é ilustrado na Figura 08. Esta concepção foi pouco encontrada entre os sujeitos em geral.

Figura 08: Representação da disposição dos objetos para a categoria de Universo plano. Sendo: T -

Terra, L - Lua, S - Sol, M - Marte e E - estrela esférica.

Fonte: BISCH, 1998.

E por fim, a quarta categoria denominada de Universo das “Terras-países”, é uma representação peculiar de apenas um sujeito da pesquisa, o qual concebe cada país como sendo uma representação de Terra Oca, estando as pessoas localizadas em seu interior, sobre a calota inferior e o céu de cada um deles formando o hemisfério superior. A Figura 09 é uma ilustração dessa representação.

Figura 09: Representação da disposição dos objetos para a categoria de Universo das “Terras-

países”. Sendo: J - Japão, L - Lua, B - Brasil e S - Sol.

Fonte: BISCH, 1998.

Sobre o Universo dos professores, a investigação de suas representações foi realizada durante um curso de extensão denominado “Astronomia do 1º Grau” no IFUSP, cujo objetivo geral era promover uma atualização dos professores em

conteúdo e metodologia sobre tópicos de Astronomia para o Ensino Fundamental. Participaram desse curso, vinte professoras que atuavam nas séries iniciais do Ensino Fundamental e, em sua maioria, possuíam o magistério superior ou eram formadas em pedagogia. Dessas vinte participantes, apenas seis concluíram o curso assiduamente.

A aplicação de um questionário inicial nos primeiros dias de curso, solicitando a realização de desenhos livres e descrições do céu e do Universo, as próprias ações, falas e discussões das professoras durante as atividades e o curso como um todo, bem como as anotações feitas em seus cadernos individuais e os demais questionários respondidos por elas a cada tema trabalhado presencialmente, foram os instrumentos utilizados que forneceram dados para a caracterização das representações dos professores sobre o Universo.

Os resultados da análise dos dados coletados a partir de todos esses instrumentos possibilitaram a Bisch (1998) discutir as concepções iniciais das professoras também em diferentes temáticas, dentre as quais iremos focalizar apenas a temática sobre o Universo.

Os modelos de Universo dos professores investigados por Bisch (1998) foram categorizados quanto a sua concepção mais geral de Universo, envolvendo sua definição e constituição, e quanto a sua estruturação.

Nessa visão mais geral, Bisch (1998) identificou duas concepções, não excludentes. A primeira delas prioriza os objetos que o compõem, caracterizando o Universo como um conjunto formado por todos os astros, poeiras, nebulosas e luzes, sendo definido por uma das professoras como “o conjunto de tudo que existe...”. A segunda concepção enfatiza o espaço que o constitui, caracterizando o Universo como o espaço imenso onde se encontram os astros.

Quanto às estruturas do Universo, Bisch (1998) cria três diferentes categorias:

Universo sem estrutura, Universo heliocêntrico e Universo estruturado em galáxias, sendo as duas primeiras categorias as mais frequentes entre os

professores.

Na concepção de Universo sem estrutura, os astros foram todos dispostos aleatoriamente no espaço sem qualquer indício de organização ou hierarquia entre eles, como é ilustrado na Figura 10. Nas descrições apresentadas pelos professores dessa concepção, Bisch (1998) observou afirmações como: “[...] Se compõe de

estrelas, planetas, satélites, cometas, corpos celestes que se movimentam uns em relação aos outros” (BISCH, 1998, p. 219).

Figura 10: Universo sem estrutura apresentado pelos professores.

Fonte: BISCH, 1998.

Na concepção de Universo heliocêntrico, é dada uma ênfase maior ao Sol, caracterizando-se como um astro dominante e central, semelhante à organização do Sistema Solar. Essa concepção é ilustrada na Figura 11. Uma das descrições características dessa categoria identificada por Bisch (1998), foi: “Imagino como o sol sendo o centro do universo e em seu redor os planetas, galáxias e estrelas; contendo várias formas e tamanhos. Como também um lugar escuro e sombrio, tendo movimentos rotineiros” (BISCH, 1998, 221).

Figura 11: Universo heliocêntrico apresentado pelos professores.

Fonte: BISCH, 1998.

Na concepção de Universo estruturado em galáxias, apresentada por apenas quatro professoras, o Universo é composto por galáxias, dentro das quais há sistemas solares, como é representado na Figura 12. Nas descrições apresentadas pelos professores dessa concepção, Bisch (1998) observou afirmações como: “O Universo é formado por várias Galáxias e cada galáxia formada por um sistema que possui um astro que centraliza o sistema da Galáxia” (BISCH, 1998, p. 219).

Figura 12: Universo estruturado em galáxias apresentado pelos professores.

Outras pesquisas sobre essa temática também podem ser destacadas, como por exemplo, a investigação de Rodriguez e Sahelices (2005) acerca dos modelos cosmológicos de 34 pessoas, dentre elas: professores, licenciandos e pessoas com diferentes níveis de ensino (engenheiros, comerciante, química farmacêutica, entre outros), e apontaram a existência de quatro categorias de representações. Foram elas: Universo contextual, Universo geocêntrico, Universo heliocêntrico e

Universo acêntrico.

A representação contextual do Universo (Figura 13) caracteriza-se por considerar o Universo como o entorno do homem, sua vida, seus relacionamentos, seu ambiente imediato, considerando a Terra aos seus pés, a Lua e o Sol no espaço ao seu redor como parte deste Universo, destacando-se, conforme os autores, uma conotação de que o Universo “é tudo que nos rodeia”. Na categoria de Universo

geocêntrico (Figura 14), destaca-se um pressuposto semelhante ao do modelo

histórico de Ptolomeu, em que a Terra é tida como o seu centro, e tudo o mais gira em torno dela. Nesta categoria, os tamanhos dos desenhos feitos pelos alunos são considerados para a evidenciação de alguma hierarquia entre os astros representados. Já na representação de Universo heliocêntrico (Figura 15), define- se o Sol como o centro do Universo, sendo a Terra e os ostros planetas semelhantes, e parte de um único Universo. E o Universo acêntrico (Figura 16) corresponde a teorias cosmológicas modernas a partir das quais o Universo não tem um centro determinado, e assim, a Terra não possui um estatuto privilegiado no mesmo.

Figura 13: Representação de Universo Contextual identificada por Rodriguez e Sahelides (2005)

Fonte: RODRIGUEZ e SAHELICES, 2005.

Figura 14: Representação de Universo Geocêntrico identificada por Rodriguez e Sahelides (2005).

Fonte: RODRIGUEZ e SAHELICES, 2005.

Figura 15: Representação de Universo Heliocêntrico com destaque para o tamanho do Sol

identificada por Rodriguez e Sahelides (2005)

Fonte: RODRIGUEZ e SAHELICES, 2005.

Figura 16: Representação de Universo acêntrico identificada por Rodriguez e Sahelides (2005)

Outros autores também apontam essas categorias de Rodriguez e Sahelices (2005) para representações do Universo, como López et al (1995) e Grande, Charrier Melillán e Vilanova (2009), distinguindo-se apenas no que se refere à adoção ou não da categoria Universo Contextual. López et al (1995) investigando um total de 169 estudantes do ensino secundário e de Geologia, substituem essa categoria pelo que denominaram de “Universo saco”, na qual foram inseridos desenhos diversos, que não especificavam claramente uma estrutura para os elementos que eram incluídos neles. Tratou-se de um percentual muito pequeno de respostas, no estudo deles.

Já em Grande, Charrier Melillán e Vilanova (2009), pesquisa que utiliza de uma amostra de 66 alunos do primeiro ano de uma escola secundária, a categoria

Universo Contextual é substituída por outra semelhante à proposta no estudo de

López, e denominada por eles de Universo miscelânea. Como no caso da categoria

Universo saco, os autores incluem aí respostas que consideraram de catalogação

duvidosa: os alunos ou não colocaram legendas ou fizeram os desenhos dos planetas e estrelas sem uma organização ou sem estabelecer uma relação clara entre eles. Contudo, as representações mais frequentes em ambos os trabalhos foram as correspondentes ao Universo heliocêntrico, sendo cerca de 60,94% do total dos estudantes em López et al (1995) e de 68% do total da amostra investigada por Grande, Charrier Melillán e Vilanova (2009).

4 REPRESENTAÇÕES SOBRE FORMA DA TERRA E ESTRUTURAS DO