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8. O INSTITUTO JURÍDICO DOS USOS E COSTUMES COMO FONTE DO

8.2 Usos e costumes como fonte de direito comercial no Brasil

8.2.3 Requisitos à sua formação

Das definições expostas, alguns aspectos emergem como requisitos dos usos e costumes que pretendam se legitimar como fonte de direito.

De fato, a fim de que seja reconhecido como fonte de direito aplicável, tais práticas reiteradas devem surgir espontaneamente, consoante uma prática uniforme, constante e por certo tempo.

A discorrer sobre o assunto, Requião afirma:

Os usos comerciais surgem espontaneamente. Um comerciante, em seus hábitos, fixa determinada norma,

196 ESPÍNOLA, Eduardo. Systema do direito civil brasileiro. Vol. I. 2ͣ ed. Rio de Janeiro: Francisco Alves, 1917, p. 108. Ainda sobre isso, discorreu o autor que “Os factos constituem e elemento material, externo, dos costumes; a convicção jurídica popular vem a ser o seu elemento subjetivo, verdadeiramente específico” (op. cit., p. 111).

197 SILVA, DE PLÁCIDO. Vocabulário Jurídico. Rio de Janeiro: Forense, 2001, p. 844 198 Ibid., p. 228

que vai sendo adotada por outros. De individual o uso torna-se geral. A princípio, em determinada praça, que são os usos locais, expandindo-se depois para outras, formando os usos regionais ou nacionais. No comércio exterior, são os usos internacionais.

Surgindo, assim, modestamente no início, após a sua prática constante e o reconhecimento voluntário de alguma comunidade de comerciantes, torna-se regra implícita da relação jurídica, para a qual nasceu. (...) o uso deve ser mantido de modo uniforme por certo tempo, e é observado como se fosse uma regra de direito e, portanto, com a convicção de que não se pode violá-lo impunemente. Assim, a exigência de sua formação consiste em: prática uniforme, constante e por certo tempo.(...)

Não constituem, pois, usos comerciais os atos de mero favor ou tolerância, de liberdade ou condescendência, que não se praticam com a intenção de reconhecer um direito alheio.200

Para Clóvis Beviláqua, “o costume jurídico é a observância constante de norma jurídica, não baseada em lei escrita”. Integram-no dois elementos: um, externo – o uso, a observância constante; e o outro, interno – a opinio necessitatis, a convicção de que funcionam como lei.201

Waldemar Ferreira, por sua vez, assentou que

O primeiro requisito para a validade dos usos comerciais legislativos é a prática continuada, a séria longa de normas, generalizada entre todos os comerciantes de determinado lugar, praça, ou cidade, ou Estado, e são, então, os – usos locais. Quando observados em todo território do país, constituem os – usos gerais. Mas prática e observância uniformes. Se de mais de um modo fossem entendidos e aplicados aos mesmos atos e fatos não poderiam jamais constituir normas ou regras do Direito Consuetudinário. Para isto se dar mister se torna o seu cumprimento e o sentido de sua obrigatoriedade sempre igual. Nessa opinio juris seu necessitatis está o seu elemento imaterial ou subjetivo.(...)

Dois elementos os compõem.

Reside o primeiro na constância e uniformidade de sua observância.

Está o segundo no sentimento íntimo, que se apodera de quantos os observam e cumprem, de valerem como lei

200 REQUIÃO, Rubens Edmundo. Curso de direito comercial, 2014, op. cit., p. 56-57. 201 BEVILÁQUA, Clóvis. Teoria geral do direito civil, 1929, op. cit., p. 27.

reguladora do caso, mercê de sua prática constante e uniforme.202

Para Carvalho de Mendonça, para que os usos comerciais tenham o cunho de legitimidade, tornando-se preceitos jurídicos, devem reunir três elementos materiais ou de fato: serem geralmente praticados entre os comerciantes do lugar; estarem conforme os princípios da boa-fé e das máximas comerciais e não ofenderem disposições de lei ou princípio de ordem social.

Por usos geralmente praticados, quer se referir ao seu emprego uniforme em casos semelhantes ou serem admitidos pelo consenso coletivo, baseado sobre a geral convicção jurídica. Supõe, ainda segundo o autor, unanimidade moral dos comerciantes.203

Quanto ao segundo elemento, pugna-se que a prática reiterada esteja conforme a boa-fé e as máximas comerciais, inspirado que foi no preceito canônico que o uso, além de lícito e honesto, deve ser razoável (consuetudo debet esse rationabilis – Graciano).

E, a propósito do último elemento, ensina o autor que

Não existem usos contra a lei comercial, isto é, contra lei que verse sobre matéria de comércio. Desse modo assegura-se a aplicação de uma legislação certa e progressiva aos atos de comércio. Os usos não alteram a lei comercial, mas a integram, a aperfeiçoam, estabelecendo regras para os casos novos.

Os usos comerciais, não obstante, podem ser contrários às leis civis, desde que estas não sejam por lei comercial expressamente aplicáveis à matéria mercantil. As leis civis não bastam para a tutela dos interesses comerciais; os usos suprem essa deficiência e evitam o conflito entre tais leis e as exigências da vida comercial.204

202 FERREIRA, Waldemar. Tratado de direito comercial, 1960, op. cit., p. 427-431.

203 MENDONÇA, José Xavier Carvalho de. Tratado de direito comercial brasileiro, 2000, op. cit., p. 208.

De maneira semelhante, Waldemar Ferreira sustentava dois requisitos essenciais à formação das práticas comerciais: “a) o de sua conformidade com os são princípios de boa-fé e máximas comerciais, geralmente praticados entre os comerciantes do lugar em que se acharem estabelecidos; b) o de não serem contrárias a dispositivo algum do então Código Comercial ou de lei depois dele publicada” (FERREIRA, Waldemar. Tratado de direito comercial, 1960, op. cit., p. 433).

204 MENDONÇA, José Xavier Carvalho de. Tratado de direito comercial brasileiro, 2000, op. cit., p. 209.

Além desses elementos, Mendonça afirma que outro, de cunho imaterial e psicológico, deve estar presente. Trata-se do sentimento de que sua observância é obrigatória:

(...) A prática de atos uniformes e constantes para tomar a qualidade de uso deve ser acompanhada da convicção de que tal é o direito; por outra, deve ser observada como se obedecesse a dispositivo legal. Esta convicção dá vida jurídica aos usos, imprime-lhes o caráter e a autoridade de fonte do direito.205

Antes, Lopes já afirmava que dois eram os requisitos para a eficácia obrigatória da norma costumeira: um uso prolongado e a opinio necessitatis, referindo-se ao primeiro para sustentar que, segundo a teoria romana, uma norma jurídica deve ser considerada como bem fundada, se exteriorizada através de um diuturno consuetudo de muitos anos, e que esses atos caracterizadores dos costumes devem consistir numa prática reiterada, pacífica, aceita incondicionalmente.

Já, tratando do segundo requisito, referido autor a ele se referia como elemento subjetivo e psicológico, querendo com isso dizer que é na vontade geral de que este comportamento se transforme em regra jurídica que ele de fato se tornará obrigatório, por vezes sendo até incorporada pela própria jurisprudência.206