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4 ANÁLISE DO DEBATE MODERNIDADE/PÓS-MODERNIDADE NO CORPUS

4.7 O reencantamento: alternativas dadas pelos trabalhos analisados para enfrentar as contradições

4.7.1 Revisão da matriz epistemológica: uma alternativa

Segundo consta no trabalho T2577, de acordo com o levantamento realizado por Novicki (2006), a revisão (ou reinvenção) de tendências epistemológicas críticas à Modernidade (modelos positivista, racionalista e empirista) “deve-se principalmente aos questionamentos de Kuhn à objetividade e racionalidade da ciência, por uma via, e à teoria crítica da Escola de Frankfurt, enfatizando os aspectos ideológicos, por outra.” (T2577, p. 62)

Com o objetivo de colaborar para a discussão sobre o conhecimento, e especificamente sobre a matriz epistemológica hegemônica, no trabalho T83 são levantadas quatro “Teorias Emergentes” que se opõem as dualidades modernas – “a Racionalidade Ambiental de Enrique Leff, o pensamento dialético crítico - teoria da complexidade de Edgar Morin, a orientação Holístico Sistêmica de Fritjof Capra, e a Teoria da Cognição de Humberto Maturana” (T83, p. 18) – cujo detalhamento está a seguir:

Orientação Integradora, Holístico-sistêmica de Fritjof Capra, que propõe uma sorte de unificação entre conhecimento/natureza/sociedade; O Paradigma Verde26 de Edgar Morin que sugere reconhecer a complexidade como elemento inerente aos

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Em T83, explica-se: “Por [paradigma] verde, ele se refere, em primeiro é claro, a uma explicação ecológica da

vida que leva em conta essa variedade simples de relações vitais para além de todas as ramificações disciplinares e burocráticas para compreender ou controlar essa vida. Mas, o verde conota também a imaturidade; também esse adjetivo colore esse modelo explicativo de uma tintura de novidade, de não-acabamento. (PINEAU, G. De

processos naturais e sociais e como esquema epistemológico e metodológico de explicação, compreensão e de intervenção da/na realidade; A Racionalidade ou Epistemologia Ambiental de Enrique Leff que, lançando mão de alguns aportes da Teoria da Complexidade e das Teorias Marxistas Pós-críticas, propõe a construção de um conhecimento ético e politicamente engajado com a construção de novos sentidos sobre o mundo (num processo permanente de disputa de sentidos, relações de poder e negociações) e de ações de intervenção; e, ainda, a Teoria da Cognição de Humberto Maturana e Francisco Varela que oferecem novos aportes à re-visitação do conceito de vida e da relação homem/natureza ao identificarem a cognição (o processo de conhecimento) como o próprio processo de viver que promove a auto- geração (autopoiesis) das redes vivas (sociais e naturais). (T83, p. 251)

Estas contribuições teóricas, para a temática ambiental, são “lentes” que facilitam o enxergar das inerentes circunstâncias que tornam o paradigma moderno e a crise socioambiental indissociáveis. Justifica-se na passagem do mesmo trabalho T83, a qual dununcia os paradoxos modernos que aprofundam a crise, veja-se:

Ora, os paradigmas emergentes propõem uma nova discussão sobre o conhecimento e apresentam, em consequência, novos aportes metodológicos e epistemológicos para a construção de uma racionalidade complexa. Essas emergências se mostram pertinentes à medida que denunciam o vínculo inalienável entre a produção científica e técnica e os problemas socioambientais; entre a ampliação da crise e as lógicas cotidianas (estilos de vida) pautadas nos processos e nos produtos técnico- científicos; entre o caráter fragmentado do conhecimento científico e os entendimentos simplistas acerca dos problemas atuais; entre o engajamento da ciência com o mundo da economia e do mercado e sua impossibilidade de oferecer, por isso mesmo, soluções mais radicais e ofensivas, pois que desse modo põe em risco seu compromisso com a esfera econômica que a tudo subsume (T83, p. 253, grifo nosso).

O conceito de “autopoiese” de Maturana e Varela, uma das “Teorias emergentes” apresentadas pelo trabalho T83, também orientou a alternativa ao “paradigma modernista” proposta no trabalho T2024, o qual versa sobre “a busca existencial e a procura espiritual do movimento daimista em harmonizar [...] na imanência da autopoiese homem – mundo – cosmos mutuamente se implicando na construção de seu próprio ser e identidade” (p. 30). Isto é, segundo o trabalho T2024:

Ao apresentarmos como alternativa ao paradigma modernista o paradigma autopoiético (p. 30) [...] queremos propor novos modelos de interpretação da realidade que levem em conta a autocriação e a auto -organização dos organismos, dos indivíduos, das sociedades, das culturas e do meio em mútuo e complementar dinamismo, ou seja, autopoieticamente (p. 57)

No ideal de reorientar o conhecer humano sobre a natureza e sobre todas as coisas, Habermas, no T4142, propõe uma ética diferente na relação sociedade – natureza, pois este pensador “preocupado com a sobrevivência das pessoas no futuro [...] declara ser necessária uma nova ética ‘fundamentada no cuidado pelo futuro e no temor e respeito diante da natureza” (T4142, p. 20). Nesta direção, em concordância com Leis (1992), como descrito em T6172, estaríamos em um “processo em gestação de uma ética ecológica” (p. 127)

Existe um consenso entre estes trabalhos analisados que algumas das características modernas terão que ser superadas por outras para que se possa de fato construir relações menos opressoras entre as pessoas, e entre sociedade e natureza, e assim diminuir as desigualdades e a exploração desenfreada. São elas: as dualidades corpo e espírito; natureza e ser humano; a fragmentação da realidade; a superespecialização do conhecimento, a “mercadorização da natureza”.

Especificamente no que concerne a fragmentação da realidade, ou do conhecimento, ou ainda da aprendizagem, os trabalhos T83 e T928 propõem que a interdisciplinaridade seja uma prática e uma orientação, uma possibilidade de afrontar as “lacunas” abertas pela fragmentação. Esta interdisciplinaridade visa à articulação entre as disciplinas, mas além delas, entre os diferentes tipos de produção de saber. A discussão sobre “diálogo de saberes” baseia-se em Leff, e este por sua vez, fundamenta-se na discussão sobre a disciplina realizada por Foucault, citados por T928 (p.20-21):

Na consideração de LEFF (1997), a interdisciplinaridade não se relaciona somente com os interesses e articulação das ciências existentes, mas sim com as ideologias e teorias que produzem sentidos e mobilizam ações sociais para a construção de outra racionalidade social. “No sólo es producción de conocimiento, sino diálogo de

saberes que producem nuevas formas de social y apropiación subjetiva de la realidad a través de las estrategias de poder en el saber y por el conocimiento” (LEFF, 1997).”

Deste modo, a interdisciplinaridade é uma proposta que extrapola aos fundamentos modernos, e apesar de nascer de uma “mentalidade de formação moderna”, busca rever este paradigma diante de problema contextualizado em uma “dinâmica sistêmica, global e caótica” (T6808, p. 48).

A revisão epistemológica do paradigma moderno traz o questionamento se estaria esse paradigma em condições de se reinventar, ou se inevitavelmente teria chegado o momento do fim deste paradigma.