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O debate modernidade / pós-modernidade e a crise socioambiental: um estudo sobre teses e dissertações brasileiras em educação ambiental

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Academic year: 2017

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MARIA FERNANDA ZANATTA ZUPELARI

O DEBATE MODERNIDADE/ PÓS-MODERNIDADE E A CRISE

SOCIOAMBIENTAL:

um estudo sobre teses e dissertações

brasileiras em Educação Ambiental

Orientadora: Prof. Dra. Rosa Maria Feiteiro Cavalari

Rio Claro

(2)

MARIA FERNANDA ZANATTA ZUPELARI

O DEBATE MODERNIDADE/ PÓS-MODERNIDADE E A CRISE

SOCIOAMBIENTAL:

um estudo sobre teses e dissertações brasileiras em

Educação Ambiental

Dissertação apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Educação, linha de Pesquisa Educação Ambiental do Instituto de Biociências da UNESP de Rio Claro, como requisito para obtenção do título de mestre.

Orientadora: Prof. Dra. Rosa Maria Feiteiro Cavalari

Comissão Examinadora

__________________________________________________________

Prof. Dra. Rosa Maria Feiteiro Cavalari – Orientadora

Departamento de Educação – Universidade Estadual Paulista/ Rio Claro

____________________________________________________________ Prof. Dr. Luciano Fernandes Silva

Instituto de Física e Química - Universidade Federal de Itajubá

____________________________________________________________ Prof. Dr. Silvio Donizetti de Oliveira Gallo

Faculdade de Educação - Universidade Estadual de Campinas

(3)

D

Dedico este trabalho a quem sempre me mostrou o caminho do amor,

(4)

AGRADECIMENTOS

Obrigada. Quantas mãos, quantos pitacos, quantos abraços, quantos irmãos. E, uma irmã. Dê-me sua mão... Quantas vezes pedi uma mão? E sempre fui atendida por braços sorridentes, pacientes, fraternos. Para quem me estendeu mais do que braços, telhas. Para quem abriu mais do que portas, gavetas, panelas, cobertas divididas. Opiniões divididas (tempo dividido). Muitas discussões. Para quem me deu ombros, quem deu de ombros para as ausências. Ausências. Silêncios. Para quem não soube falar em português, ou em palavras. Para quem sorri com latidos. Miados. Pelos. Infâncias. Carinhos. Disritmia. Para quem “fotografa com a retina desses olhos lindos”. Para quem caminha, caminhadas, exemplos. Exemplos de persistência, trabalho, paciência... Exemplo de flores, Rosa. Quem ri. Quem olha. Para quem fala, e quem ouve. Possibilidades. Relógio. Cafuné. Café. Café “te dá asas”? Voos. Voos de balões. Céu colorido. São Paulo. Sergipe. Pernambuco. São Sebastião. Mato Grosso. Itatiba.

Estrada. Chão de estrelas. Trem. “O sol pega o trem azul, você na cabeça”, Pai. Um país de

relíquias, joias raras. Pérola negra. Pérolas de queijo com cachaça. Minas Gerais. Mar de morros. Mar. Mãe. Mãe da mãe. Mãe de letras. Gol de letra. Gol de tintas. Mães de passos. Mimos. Obrigada por amparar meus passos. E páginas.

“Gradecida”

Agradeço, também, a oportunidade de dedicação aos estudos, às disciplinas e à pesquisa, por meio do financiamento da bolsa CAPES; aos professores do PPGE com os quais pude dividir espaços de aprendizagem e de amizade durante as disciplinas e encontros; ao grupo de

(5)

[...] Cinzentas nuvens de fumaça

Umedecendo meus olhos

De aflição e de cansaço

Imensos blocos de concreto

Ocupando todos os espaços

Daquela que já foi a mais bela cidade

Que o mundo inteiro consagrou

Com suas praias tão lindas

Tão cheias de graça, de sonho e de amor

Flutua no ar o desprezo

Desconsiderando a razão

Que o homem não sabe se vai encontrar

Um jeito de dar um jeito na situação

Uma semente atirada

Num solo fértil não deve morrer

É sempre uma nova esperança

Que a gente alimenta de sobreviver

AMOR À NATUREZA

(6)

RESUMO

Tendo como pressuposto que a pesquisa acadêmica sobre Educação Ambiental frequentemente cita e critica características da Modernidade, e da Ciência Moderna, como fatores impulsionadores e que aprofundam a crise socioambiental: a saber, o reducionismo e a fragmentação da Ciência e do Ensino modernos; o modo de produção capitalista e seu princípio acumulador; a relação dicotômica sempre presente entre natureza e sociedade e entre sujeito e objeto, torna-se relevante identificar e analisar as relações estabelecidas entre o debate Modernidade/ Pós-Modernidade e a crise socioambiental expressas nas teses e dissertações brasileiras sobre Educação Ambiental. As pesquisas sobre os fundamentos da Educação Ambiental são importantes para aclarar, na medida das suas possibilidades, as relações complexas existentes entre sociedade e natureza e sobre a crise socioambiental, bem como contribuir para o aprimoramento epistemológico. Assim sendo, buscamos identificar que aspectos do debate Modernidade/Pós-Modernidade, que autores e que conceitos ou categorias são privilegiados nessas pesquisas. Para tanto, foi realizado um recorte a partir da análise de trabalhos selecionados no Banco de Teses do Projeto “Educação Ambiental no

Brasil: análise da produção acadêmica (teses e dissertações)”. De um total de vinte e quatro documentos selecionados, que constituem o corpus documental, dezoito são dissertações de mestrado e seis, teses de doutorado. Esses trabalhos foram defendidos entre 1992 e 2009, e apresentam pequena concentração no período entre 2006-2009. As teses e dissertações foram defendidas em dezenove instituições diferentes, com destaque para USP (foram quatro trabalhos defendidos). Do total dos trabalhos selecionados, 54,1 % está localizado na região Sudeste (SP - oito; RJ - quatro; ES – um), 33 % na região Sul (RS – seis; PR – um; SC - um), 8% na região Centro-Oeste (GO – um; DF – um), e por fim, 4 % na região Norte (AM - um). Não há, dentre os trabalhos constituintes desse corpus documental, nenhum desenvolvido na região Nordeste do Brasil. Das pesquisas selecionadas, dezenove foram produzidas por instituições públicas, três em instituições confessionais e duas em instituição privada. Nota-se que a temática desta investigação chama a atenção de pesquisadores de instituições confessionais, possivelmente pela relação entre a filosofia judaico-cristã e a constituição da Modernidade. Como procedimentos metodológicos, adotamos a pesquisa do tipo “estado da

arte”, e foi realizada a interpretação analítica dos documentos. Ressalta-se que as pesquisas analisadas relacionam diretamente a crise socioambiental com os elementos constituintes da

Modernidade, e que sugerem como alternativas para o “reencantamento do mundo”: a revisão

epistemológica do campo de pesquisa (com base na Complexidade de Morin, Leff e na

Multirreferencialidade, de Ardoino), a relativização da ciência moderna (buscando

reaproximar-se do conhecimento mítico e sagrado), a valorização de sociedades pré-modernas

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ABSTRACT

Assuming that academic research on environmental education often cites and criticizes some characteristics of Modernity and Modern Science, as the factors that deepen the environmental crisis: namely, reductionism and fragmentation of science and modern education; capitalist mode-of-production and its accumulator principle; the dichotomous relationship between nature and society or between subject and object, it becomes important to identify and analyze the relations between the debate Modernity / Post-Modernity and the environmental crisis expressed in theses and dissertations on Brazilian Environmental Education Research. Research on the fundamentals of environmental education is important to clarify, within its possibilities, the complex relationships between society and nature and the environmental crisis, as well as contribute to the epistemological improvement. Therefore, we seek to identify which aspects of this debate, which authors and which concepts or categories are privileged in these surveys. Thus, a cut was held from selected studies analyzed

of the theses’s Bank Project “analysis of academic production (theses and dissertations)

Environmental Education in Brazil". A total of twenty-four selected documents, which constitute the documentary corpus are eighteen dissertations and six doctoral theses. These works were defended between 1992 and 2009, and there is little concentration in the period 2006-2009. Theses and dissertations were defended in nineteen different institutions, highlighting USP (there were four defended works). 54.1% of the total of selected studies are located in the Southeast, 33% in the South, 8% in the Midwest region, and finally, 4% in the Northern region. There are no works developed in northeastern Brazil among the constituents work this documentary corpus. Nineteen of the selected research were produced by public institutions, three confessional institutions, and two in private institution. About the methodological procedures involved, we adopted the search of the "state of the art" and we realized an interpretative analyze about the documents. It is emphasized that the studies analyzed directly relate to environmental crisis with the constituent elements of modernity, and to suggest as alternatives to "re-enchantment of the world": an epistemological review of this research field (based on Complexity Theory of Morin, Leff or Multireferentiality of Ardoino), relativizing modern science (seeking to return closer to the mythical and sacred knowledge), the recovery of pre-modern societies (but, taking care for not being dropped on

“an innocent holism"), the necessary discussion between theories of anthropocentrism and ecocentrism, and finally, the complex environmental education.

KEY-WORDS: Modernity. Postmodernity.Environmental Education.

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LISTA DE FIGURAS COMENTADAS

Páginas

Figura 1: Cartaz do longa-metragem “Outubro”, de Sergei Eisenstein (1927)...22

O filme experimental Outubro de Sergei Eisenstein representa a dialética da Modernidade, ao passo que narra o sentimento de revolução, referente ao outubro revolucionário de 1917, mas de forma desigual, desequilibrada, apaixonante e arrebatadora1, ilustra a contradição do período moderno. O intuito inicial do filme

era fazer uma adaptação da obra de Marx “O Capital”, uma das principais da

Modernidade, mas este projeto foi barrado pela própria burocracia e totalitarismo moderno. Berman (1988) retoma essa discussão quando se refere à “Modernização

do subdesenvolvimento”, da qual São Petersburgo (e sua histórica contradição

moderno/ pré-moderno, ocidente/oriente) é um exemplo.

Figura 2: Rua Nevsky, São Petersburgo, Rússia...25

Figura 3: Avenida Rio Branco, Rio de Janeiro, Brasil...25

Gravuras que fazem referência à arquitetura moderna. O Projeto Nevsky simboliza,

segundo Berman (1988), a “ocidentalização” moderna da Rússia, a partir dos

modelos arquitetônicos típicos de grandes avenidas e boulevares parisienses. A Avenida Rio Branco é o exemplo brasileiro deste modelo urbanístico.

Figura 4: Demolição do conjunto de prédios Pruit-Iggoe (St. Louis, EUA, 1972)...31

“No tocante à arquitetura, Charles Jencks data o final simbólico do modernismo e a passagem para o pós-moderno de 15h32m de 15 de julho de 1972, quando o projeto de desenvolvimento da habitação Pruitt-Igoe, de St. Louis (uma versão premiada da

‘máquina para a vida moderna’, de Le Corbusier), foi dinamitado como um ambiente inabitável para as pessoas de baixa renda que abrigava” (HARVEY, 2008, p. 25).

Figura 5: Gravura referente ao personagem “Grande Irmão” da obra 1984, de George Orwell

(1949)...35

O personagem Big Brother do livro de George Orwell antecipa o que Lipovetsky

(2004, pg. 55) denomina de hipervigilância: “Para lutar contra o terrorismo e a

criminalidade, nas ruas, nos shopping centers, nos transportes coletivos, nas empresas, já se instalam milhões de câmeras, meios eletrônicos de vigilância e identificação dos cidadãos; substituindo-se à antiga sociedade disciplinar –

totalitária, a sociedade da hipervigilância está a postos.”.

Figura 6: Bailarina representando a angústia diante das modificações ambientais, em

coreografia cênica e audiovisual...43

1

(9)

A coreografia “As três graças de Rafael” foi composta pelas intérpretes, Ana Clara Nery, Clara Nascimento e Maria Zupelari, inspirada na obra “O mal-estar da

pós-modernidade” (1999), de Zygmunt Bauman, e na questão ambiental do Brasil.

Figura 7: Caminho Metodológico para constituição do Corpus Documental a partir do Banco

de Teses e Dissertações do Projeto “EARTE” (1994-2009)...53

Organograma que ilustra os passos dados para a constituição do corpus documental definitivo.

Figura 8: Performance corporal e instalação sobre a construção do conhecimento no contexto da Modernidade Reflexiva...66

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LISTA DE TABELAS, GRÁFICOS E QUADROS

Páginas

Tabela 1: Primeira busca no Banco de Teses do Projeto “Educação Ambiental no Brasil:

análise da produção acadêmica (teses e dissertações)”...48

Tabela 2: Segunda busca no Banco de Teses do Projeto “Educação Ambiental no Brasil: análise da produção acadêmica (teses e dissertações)”...49

Tabela 3: Terceira busca realizada no Banco do Projeto Earte: busca pelo termo “complexidade”...51

Tabela 4: Quadro geral das buscas realizadas no Banco do “Projeto Earte”...52

Quadro 1: Lista dos trabalhos constituintes do corpus documental...54

Gráfico 1: Gráfico de dispersão de teses e dissertações por ano de defesa...57

Gráfico 2: Locais de defesa dos trabalhos analisados por região brasileira...58

(11)

SUMÁRIO

Páginas

1 INTRODUÇÃO ... 13

2 A AVENTURA DA MODERNIDADE ... 23

2.1 O modernismo ... 24

2.2 A Modernidade ... 26

2.3 O Debate Modernidade/ Pós-modernidade ... 29

2.4 A Pós-modernidade ... 29

2.5 A Hipermodernidade ... 34

2.6 Limites do conhecimento moderno ... 36

2.6.1 Sobre as formas de conhecer o mundo ... 38

2.7 A crise socioambiental e a incerteza do futuro nas sociedades de “capitalismo tardio” ... 41

3 PROCEDIMENTOS DE PESQUISA ... 45

3.1 Constituição do corpus documental ... 47

4 ANÁLISE DO DEBATE MODERNIDADE/PÓS-MODERNIDADE NO CORPUS DOCUMENTAL ... 57

4.1. Mapeamento dos trabalhos analisados ... 57

4.2 “O desencantantamento do mundo” no corpus documental ... 59

4.3 A Pós-Modernidade: um reencantamento? ... 74

4.3.1 A contemporaneidade ... 81

4.4 As principais áreas de conhecimento, teorias e correntes epistemológicas que fundamentam os trabalhos analisados ... 82

4.4.1 A Fenomenologia e a Hermenêutica nos trabalhos analisados ... 85

4.4.1.1. A Corporeidade...86

4.4.2 O Materialismo Histórico nos trabalhos analisados ... 87

4.4.3 A Teoria Crítica nos trabalhos analisados ... 88

4.4.3.1 A categoria mito...89

4.5 Teorias emergentes e outras epistemologias ... 92

(12)

4.6 O debate modernidade/pós-modernidade nos trabalhos analisados ... 96

4.6.1 O Sujeito moderno ... 99

4.6.2 Sobre a incerteza e a insegurança como temas problematizados pelos trabalhos (ou “Ai daqueles que contém um deserto” ) ... 100

4.6.3 O temor e a angústia gerada por tornar conscientes os riscos ... 101

4.6.4 Ecofobia: o temor da escassez, guerras, catástrofes naturais, ou do “último dia” ... 103

4.7 O reencantamento: alternativas dadas pelos trabalhos analisados para enfrentar as contradições do paradigma moderno ... 104

4.7.1 Revisão da matriz epistemológica: uma alternativa ... 105

4.7.2 Fim do paradigma moderno? ... 107

4.7.2.1 Paradigma moderno, porém sustentável?...108

4.7.2.2 A categoria Paradigma...109

4.7.3 Entre paradigmas antropocêntricos e ecocêntricos... 111

4.7.4 O nascimento do novo paradigma ... 112

4.7.5 O “holismo inocente” ... 113

4.7.6 A religiosidade e demais elementos espirituais analisados pelos trabalhos ... 118

4.8 O hibridismo como opção metodológica... 119

4.9 O desafio da educação ... 120

5 AS RELAÇÕES ESTABELECIDAS ENTRE AS DIVERSAS COMPREENSÕES DE CRISE E O DEBATE DA MODERNIDADE/ PÓS-MODERNIDADE NO CORPUS DOCUMENTAL ... 123

6 CONSIDERAÇÕES FINAIS ... 133

REFERÊNCIAS ... 140

BIBLIOGRAFIA CONSULTADA ... 144

APÊNDICE A – REFERÊNCIAS DOS TRABALHOS CONSTITUINTES DO CORPUS DOCUMENTAL ... 146

(13)

O mundo está bem melhor Do que há cem anos atrás Morre muito menos gente As pessoas vivem mais Ainda temos muita guerra Mas todo mundo quer paz, dizem Tantos passos adiante E apenas alguns atrás Já chegamos muito longe Mas podemos muito mais, dizem Encontrar novos planetas Pra fazermos filiais Temos inteligência Pra acabar com a violência, dizem Cultivamos a beleza, Arte e Filosofia A

A modernidade agora Vai durar pra sempre, dizem Toda a tecnologia Só pra criar fantasia Deuses e ciência Vão se unir na consciência, dizem Vivermos em harmonia Não será só utopia Quem me dera Não sentir mais medo Quem me dera Não me preocupar Quem me dera Não sentir mais medo algum

(14)

1 INTRODUÇÃO

Pensar o contemporâneo é um desafio e uma necessidade. O presente nos revela a urgência de refletir sobre a situação desconfortante em que nos encontramos perante a crise dos recursos naturais, do modo de produção hegemônico, das relações sociais e do indivíduo. Por fim, pensar sobre o hoje é também debater sobre como podemos intervir nessa crise, de diferentes e complementares escalas, a fim de entender com certa profundidade fatos, discursos, significados e ações, e encarar com seriedade o dilema que nos foi dado: a sociedade em crise com o seu ambiente.

A questão ambiental tornou-se clara no fim da década de 1960, quando os limites da natureza como sustentáculo do progresso ocidental moderno apontaram para uma nova problemática: a sobrevivência e reprodução da humanidade, em determinado padrão acelerado de consumo, como aponta Bornheim (1985, p.21):

Os processos de manipulação, que tudo pretendem pôr a serviço do homem, encontram a sua situação limite – o que já vem verificando muitos setores – na destruição da natureza. Destruição no caso, quer dizer, por exemplo: a redução da natureza às exigências estipuladas pelo consumo como critério final e tal como o encontramos hoje organizado na sociedade contemporânea.

Diferentes disciplinas científicas, ou ainda diferentes matrizes referenciais para conhecer o mundo, debruçam-se hoje sobre aspectos e fenômenos da questão ambiental, pois esta, cada vez mais, torna-se assunto primordial e urgente a ser debatido em meios sociais, acadêmicos e na mídia. No entanto, coerente com o objeto de estudo de cada disciplina, a crise ambiental é focalizada fragmentadamente pelos diferentes ramos da ciência moderna, o que impossibilita a compreensão do que a crise representa. De forma ideal, espera-se que em conjunto seja possível compreender mais amplamente a crise ambiental, para que haja caminhos possíveis de intervenção e minimização da mesma.

Uma das formas possíveis de conceber a crise é entendê-la como uma manifestação da crise da organização e produção da sociedade contemporânea, ou seja, da forma como a nossa sociedade conhece, compreende, relaciona-se e interage com a natureza. Segundo Rocha (2008, p.226), “é o modo moderno de organização do pensamento, da produção e dos

estilos de vida que está em crise”. É, portanto, o modelo de organização social atual, que se

estabeleceu com o Projeto da Modernidade a partir do século XVII, e que caminha, no período contemporâneo, para a crise socioambiental.

(15)

ecológica”, “crise ambiental”, “crise dos recursos naturais”, entre outros. Entendemos, pois, a

crise atual como complexa, a qual abarca o agravamento da devastação ambiental em conjunto com o acirramento da desigualdade social e da injustiça ambiental. Sendo assim, o

uso do termo “crise socioambiental” nos parece mais justo ao fenômeno descrito. A crise

socioambiental trata-se, portanto, também da degradação das relações sociais, da relação do indivíduo com ele mesmo e com o outro, e não somente da degradação da relação da sociedade com a natureza (LIMA, 2011).

Em meio à condição de crise que permeia a sociedade moderna, parece claro que o modelo de produção associado ao de (des) organização social não atingiram seus principais ideais traçados no Projeto da Modernidade, quais sejam libertar a humanidade do medo dos fenômenos naturais inexplicáveis até então, promover o individualismo, a liberdade e o progresso tecnocientífico, a fim de possibilitar uma vida mais justa e confortável para todos.

Visando amparar a sociedade moderna ideal descrita, a Ciência Moderna e a técnica desta derivada desenvolveram-se a partir da promessa de

consolidar e estender o poder do controle humano sobre a natureza externa e também sobre a natureza interior do homem. [...] uma vez assegurada à posse dos meios e recursos naturais para o bem-estar humano na Terra, essa mesma racionalidade encarregar-se-ia de promover a humanização das relações entre os homens, no plano econômico, social e político de sua existência. (GIACOIA JUNIOR, 2004, p. 389).

Com o passar do tempo, contraditoriamente, a consolidação desse procedimento de construção do conhecimento passou a servir de instrumento de poder dos homens, como meio de conhecer e controlar a natureza e os outros seres humanos. Entretanto, nota-se pela injusta condição à que grande parte da humanidade está submetida que não fora atingido em plenitude o estado de Maioridade ou o Esclarecimento2.

O objetivo moderno de obter e disseminar o Esclarecimento, a partir da Ciência e da Técnica, guarda em si a grande contradição da civilização ocidental, pois “o homem foi condenado pela ciência e tecnologia a uma nova era de precariedade” (BERMAN, 1988, p. 81), visto que “a maldição do progresso irrefreável é a irrefreável regressão” (ADORNO; HORKHEIMER, 2006, p. 41), ou seja, segundo a Teoria Crítica, são a cultura e a barbárie

2 O conceito de Maioridade refere-se ao sujeito emancipado, o qual se libertou dos medos e das angústias da

ignorância e do desconhecido por meio do conhecimento racional. Como pode ser compreendido no excerto:

“Esclarecimento (Aufklärung) significa a saída do homem de sua minoridade, pela qual ele próprio é

responsável. A minoridade é a incapacidade de se servir de seu próprio, entendimento sem a tutela de um outro.”

(16)

elas mesmas, no molde civilizacional moderno, partes indissociáveis do percurso da Humanidade.

Assim, as pessoas, ao tentarem libertar-se do medo de uma natureza desconhecida e das explicações míticas para os fenômenos inexplicáveis, a partir das elucidações científicas,

desenvolveram uma espécie de “crença mítica” na verdade absoluta produzida pelo

conhecimento científico metódico e verificável. Este processo de “desencantamento do

mundo” sobrevalorizou o conhecimento objetivo, livre de subjetividades e sensibilidades, mas

por outro lado, desvalorizou a arte como processo válido para conhecer o mundo (ADORNO; HORKHEIMER, 2006).

Como se vê, a racionalização extrema da tecnociência não é capaz de solucionar as angústias humanas (muitas vezes aprofundando-as), e por este motivo, a Humanidade constitui-se, também, a partir do conhecer artístico, do expressar-se pela arte; “[...] segundo

Schelling a arte entra em ação quando o saber desampara os homens” (Idem, p. 29).

Desamparada pela Ciência e diante de condições bárbaras de vida (e morte) possibilitadas por essa forma de conhecer e relacionar-se com a natureza e com a sociedade, responsável por criar e legitimar armas de destruição em massa3, a sociedade contemporânea busca recuperar aspectos do mítico e do estético como referenciais do conhecimento. Nesse sentido, propõe-se que o ambiente pode ser um ponto de encontro dos saberes científico e estético.

Norteando-se por uma direção mais otimista, Leis (1995) entende que essa contradição intrínseca da Modernidade pode gerar, em seu próprio movimento, forças para uma maior qualidade de vida, orientada pelo ambientalismo, pois

o impasse civilizatório da Modernidade é fator constitutivo do mesmo. Afirmo que o ambientalismo viabiliza uma reforma criativa da sociedade contemporânea

assumindo uma atitude “não-moderna” (tanto pré- como pós-moderna) que impulsiona uma reordenação amorosa da realidade. (p.6)

Diante disso, a conjunção de valores, crenças e princípios que compõem a concepção de mundo da Modernidade pode ser compreendida como uma das causas constituintes da crise socioambiental e, dialeticamente, uma fonte de oportunidades para a minimização ou resolução desta. Contudo, para que se recuperem as possibilidades da Modernidade de intervir positivamente na crise contemporânea, é preciso que se reflita sobre o significado e as influências do projeto moderno, suas falhas e contribuições, no contexto de crise atual.

3Aqui incluímos bombas atômicas, instrumentos de guerra em geral, técnicas poluidoras, mas também teorias de

(17)

Enrique Leff (2001) contextualiza a crise ecológica como uma das esferas da “crise da

civilização ocidental”, cujos fundamentos estão na desordem de como a humanidade passou a

conhecer o meio que a cerca, a partir da consolidação da Ciência Moderna, como segue:

A crise ambiental é a crise de nosso tempo. O risco ecológico questiona o conhecimento do mundo. Esta crise apresenta-se a nós como um limite do real [...] Mas também crise do pensamento ocidental: da determinação metafísica que, ao pensar o ser como ente, abriu caminho para a racionalidade científica e instrumental que produziu a Modernidade como uma ordem coisificada e fragmentada, como formas de domínio e controle sobre o mundo. Por isso, a crise ambiental é, acima de tudo, um problema de conhecimento. (p.191, grifo nosso)

O conhecimento moderno, majoritariamente científico e metódico, apoiado em princípios como a verdade absoluta, a objetividade, a dicotomia sujeito-objeto e a fragmentação da realidade, gradativamente, perde força na sociedade contemporânea, ao passo que alguns pensadores apontam para a insuficiência da ciência moderna para resolver, sozinha, questões complexas como a questão ambiental (GOERGEN, 2010).

A discussão acerca da insuficiência do modelo de conhecimento moderno sobre o mundo gerou o debate a respeito de novos paradigmas que poderiam abarcar realidades e crises que a sociedade contemporânea passou a enfrentar, como por exemplo, a crise socioambiental. Entretanto, a organização e produção social típicos da Modernidade continuam a impor sua forte presença nas sociedades de “capitalismo tardio” (JAMESON, 2002), nas quais os paradigmas que surgem não são exatamente alternativos à Modernidade, pois se referem a esta, aprofundando-a ou contradizendo-a, de alguma forma. Reconhecemos este movimento nas formulações teóricas pós-modernas e hipermodernas.

A dificuldade em traçar um contexto que delimite a possível finitude da Modernidade,

e o início da “Pós-Modernidade” (LYOTARD, 1979), ou ainda da “Hipermodernidade”

(LIPOVETSKY, 2004), é que não existe um consenso sobre esta temática. Assim, o debate da Modernidade/ Pós-Modernidade sugere que exista uma dificuldade para delimitar se há um paradigma orientador definido na sociedade contemporânea, globalizada, e se existe a necessidade de delimitá-lo.

É válido lembrar que o questionamento do paradigma moderno e a proposição da pós-modernidade surgiram no contexto artístico, mais especificamente na Arquitetura e na

Literatura, e somente após ser “emprestado” por Jean- François Lyotard,na obra A condição

pós-moderna(1979), é que esse debate começa a frequentar as discussões das Ciências

(18)

Especificamente para esta pesquisa, interessa discutir sobre o debate Modernidade/ Pós-Modernidade no âmbito da Educação Ambiental brasileira, pois o país encontra-se hoje, segundo critérios avaliativos do Índice de Desenvolvimento Humano – IDH, em um contexto de transição de país subdesenvolvido para desenvolvido, o que podemos compreender como uma amálgama de características arcaicas e tradicionais (pré-moderna), modernas típicas e, em algumas localidades brasileiras, pós-industriais. Gilles Lipovetsky (2012) ao retratar o Brasil contemporâneo em entrevista à revista Isto é4, aponta que em algumas de suas regiões o

país caracteriza-se por traços latentes da Hipermodernidade: hiperconsumo acelerado, ode ao luxo, hipervigilância, sentimento de medo constante. Assim, ao contextualizar a Educação Ambiental no Brasil dentro do debate da Modernidade/ Pós-Modernidade, é importante que tenhamos em vista a pluralidade de realidades brasileiras que variam entre aspectos pré-modernos até hiperpré-modernos a fim de aproximar a pesquisa desse campo às organizações sociais diversas, e dessa maneira, colaborar para que a Educação Ambiental possa dialogar com tal pluralidade.

Ao focar o problema da questão ambiental, e respeitando seu caráter complexo, fica claro que a minimização ou retenção necessária da crise socioambiental não poderá acontecer apenas com soluções dadas aos impactos ambientais negativos ou inflexão da degradação dos recursos naturais. Pois, ao concebermos a crise ambiental como crise do conhecimento, seu enfrentamento deverá acontecer por meio de reformulações da consciência do homem, ocidental e moderno, sobre a constituição de si, e do entendimento que ele tem sobre o meio ambiente, o conhecimento e a verdade. Nesse sentido, concordamos com Leff (2001), quando afirma “A crise ambiental, entendida como crise da civilização, não poderia encontrar uma solução por meio da racionalidade teórica e instrumental que constrói e destrói o mundo” (p. 191).

A crise socioambiental então se apresenta como um desafio para a sociedade contemporânea, e no sentido de minimizá-la ou superá-la, evidencia-se o papel do processo educativo, que mesmo com limitações e cercado de ambiguidades, carrega em si possibilidades para alterar as relações degradantes entre sociedade e natureza na atualidade, como afirma Carvalho (2006, p. 3):

é interessante observarmos hoje, nos diferentes setores sociais, uma forte tendência em reconhecer o processo educativo como uma possibilidade de provocar mudanças e alterar o atual quadro de degradação do ambiente com o qual deparamos. Independente do modelo adotado para explicar o atual estado de agressão à natureza,

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o processo educativo é sempre apresentado como uma possibilidade de alteração desse quadro, isto é como um agente eficaz de transformação.

Carvalho (2006) alerta para a necessidade de uma permanente avaliação do alcance e objetivos da educação, pois com a intenção de encorajar processos de mudanças, existe certo

“otimismo pedagógico” que permeia o movimento ambientalista e os educadores em geral.

Como explicita o autor, “Muitas vezes a contribuição do processo educativo para as mudanças almejadas é de tal forma supervalorizada que leva facilmente à idealização ou à mistificação” (p. 3). Assim, a educação ambiental se trabalhada em conjunto com outras propostas, como políticas públicas, legislações de caráter de prevenção e reparação dos altos índices de impactos ambientais negativos, pode colaborar para a mudança gradual das formas de produzir conhecimento, dos padrões de consumo, dos valores, a fim de explicitar e provocar a reflexão sobre a forma como conhecemos e atuamos na realidade.

A pesquisa em educação ambiental surge, desse modo, como uma das contribuições para orientar as ações educativas dentro do debate ambiental. De acordo com Gamboa (2007, p.29):

A pesquisa em EA é movida pelo desafio da produção de conhecimentos que ofereçam respostas novas para os problemas gritantes e prementes da atual condição do homem e de suas relações com a natureza, conhecimentos esses que gerem e motivem uma práxis transformadora das atuais condições de degradação biológica e cultural, das estruturas e práticas sociais que reproduzem e aprofundam as desigualdades sociais, a miséria humana, a destruição do patrimônio e dos recursos dos povos sob a racionalidade econômica dominante.

Freitas e Oliveira (2006), Daniel e Marin (2007), Carvalho, Tomazello e Oliveira (2009), Kawasaki e Carvalho (2009), Pato, Sá e Catalão (2009), em revistas acadêmicas especializadas, eventos de porte regionais ou nacionais, traçam um panorama da pesquisa em Educação Ambiental no Brasil e apontam para o processo de consolidação da área como campo do conhecimento, em específico no que tange aos aspectos teórico-metodológicos das investigações .

(20)

intervencionistas possa resolver problemas imediatos e práticos sem, no entanto, debruçar-se sobre os fundamentos da crise socioambiental.

Sabe-se que o campo da Educação Ambiental, especificamente no caso brasileiro, encontra-se em fase de consolidação e sendo assim, permanece buscando alicerces tanto para suas práticas quanto para seus fundamentos. Porém, o aporte teórico-metodológico não apresenta definição ou baliza rígidas. Nesse sentido, Novicki (2003), a partir da observação sobre as tendências destes trabalhos do Rio de Janeiro, afirma que 30% dos trabalhos, por ele analisados, podem ser encaixados no que denominou de “miscelânea teórica”, ou seja, misturam diferentes correntes epistemológicas a fim de construir sua argumentação, o que pode afetar a qualidade analítica destes trabalhos acadêmicos.

No âmbito do aprimoramento epistemológico, as investigações sobre os fundamentos do campo de conhecimento são importantes para aclarar, na medida das suas possibilidades, as relações complexas existentes entre sociedade e natureza, mesmo que se possa notar com frequência alguns problemas resultantes de confusões teóricas ou metodológicas, como a justaposição de teorias contraditórias, sem fazer necessárias distinções, ou a criação de falsos consensos por conta da incompreensão de teorias e/ou obras de autores importantes, como é o caso de René Descartes.

Supõe-se, a partir de leituras de artigos nacionais e internacionais, de teses e dissertações, e da observação de palestras e apresentações de trabalhos nesse campo do conhecimento, que a pesquisa acadêmica sobre Educação Ambiental frequentemente cita e critica características da Modernidade, e da Ciência Moderna, como fatores impulsionadores e que aprofundam a crise socioambiental: a saber, o reducionismo e a fragmentação da Ciência e do Ensino modernos; o modo de produção capitalista e seu princípio acumulador; a relação dicotômica sempre presente entre natureza e sociedade e entre sujeito e objeto.

No entanto, ainda não sabemos se existe consenso, ou falso consenso, sobre a influência que a Modernidade exerce sobre o processo de degradação ambiental, sobre a contribuição do debate Modernidade/ Pós-Modernidade para a fundamentação teórica da pesquisa em Educação Ambiental, se existe uma opção comum por novos paradigmas em tais investigações, ou ainda, se as possibilidades teóricas pós-modernas ou hipermodernas interessam ao campo.

Nessa conjuntura, no intuito de analisar de que forma a crise socioambiental na

contemporaneidade, ou “crise da civilização” (LEFF, 2001), é retratada nas pesquisas em

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Educação Ambiental no país (teses e dissertações). Para tanto, será feito um recorte a partir da análise de trabalhos selecionados no Banco de Teses do Projeto “Educação Ambiental no Brasil: análise da produção acadêmica (teses e dissertações)”5.

Na intenção de identificar a relação estabelecida, propomos os seguintes objetivos de pesquisa: identificar se o debate Modernidade/Pós-Modernidade tem sido contemplado na produção acadêmica sobre Educação Ambiental, quais autores, conceitos ou categorias são privilegiados; identificar e analisar as articulações estabelecidas entre o debate Modernidade/ Pós-Modernidade e a crise socioambiental expressas nas teses e dissertações brasileiras sobre Educação Ambiental.

Os resultados dessa investigação são apresentados nesta dissertação da seguinte maneira: Além desta introdução, na seção 2 são apresentadas algumas reflexões acerca do debate Modernidade/ Pós-Modernidade, do Projeto da Modernidade, da Pós-Modernidade e da Hipermodernidade; esta parte discorre sobre limites e possibilidades das visões de mundo, e para tal fim, abre-se a discussão sobre o limite do conhecimento científico moderno, paradigmas que se justificam como alternativos ao moderno, e algumas consequências desse modo de vida na subjetividade humana, diante da crise socioambiental.

Como pesquisadora do tema abordado, encontrei na contemplação e na expressão artística uma possível ampliação da sensibilidade para conhecer o contraditório, o efêmero da Modernidade, e busquei inserir no texto narrativo algumas imagens, de forma a complementar o texto, traduzindo para o leitor o que pode vir a ser uma sensação do que é estar diante do processo de conhecer um pouco do debate Modernidade e da Pós-Modernidade.

Essas imagens têm a intenção de retratar o meu processo de aprendizagem, deste modo foram produzidas a partir de cartazes gráficos de filmes que representam a expressão artística da Modernidade e de trechos de obras literárias, “colados” livremente. Outras fontes primárias para a confecção das imagens são fotografias das performances corporais realizadas, em conjunto com mais três bailarinos e um artista plástico6.

5O projeto “Educação Ambiental no Brasil: análise da produção acadêmica (teses e dissertações)”, de caráter interinstitucional (UNESP/RC, UNICAMP, USP/RP), tem como finalidade principal organizar um catálogo de todas as teses e dissertações sobre Educação Ambiental que foram defendidas no Brasil até a data de 2009, quando foram coletadas do Banco de Teses da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior – Capes). O Banco de Teses e Dissertações de Educação Ambiental produzido pelo Projeto é composto pelos trabalhos que atenderam aos critérios definidos previamente pelos pesquisadores para selecionar os trabalhos que constituem o campo da Educação Ambiental e está em processo de publicação – priorizadas aquela para o segundo semestre de 2014. Quando se fizer referência a este banco de trabalhos irá se usar a expressão “Banco de Teses do Projeto Earte”, como tem sido chamado pelos membros que o estão desenvolvendo.

6

Duas das performances corporais puderam ser apresentadas no contexto da Universidade: “Ariadne” na ocasião

(22)

Considero importante destacar que a iniciativa em partilhar meu processo de aprendizagem com o leitor, diante das dimensões que não pude alcançar em palavras formalizadas em um texto do gênero dissertativo, vai ao encontro à resposta dada por Oliveira Jr (2012, p. 1) para o seguinte questionamento: “O que podem imagens que não visam explicar ou ilustrar?”.

Estas perguntas são como gritos no campo da Educação, pois as imagens estão ali sempre visando explicar, ilustrar, informar e comunicar. São gritos porque desarrumam o lugar onde as imagens ali se localizam, fazendo com que se abram possibilidades para pensar as imagens e a Educação em composições outras (p. 1).

Assim, pretendo com tais imagens abrir “espaços” não direcionados, a fim de que cada um que tiver contato com o texto possa fazer suas próprias interpretações, e contribuir para outros processos de aprendizagens, mesmo que seja incentivando os leitores a refazerem o processo imagético e entrarem em contato com as obras aludidas. As imagens, nesse caso,

não querem comunicar nada, nem explicar ou ilustrar, apenas expressam-se canto, pedra e passagem diante de nós. Justamente por isto eles nos afetam aleatoriamente, forçando-nos conexões inusitadas, aberturas múltiplas, impedindo que encontremos alguma maneira de representar estes lugares, estes espaços. (Idem, p. 3)

Esse interesse em abarcar a dimensão estética no processo de conhecimento encontra respaldo na seguinte afirmação:

As possibilidades de explorar a natureza do conhecimento científico e a instigante relação entre produção científica e produção artística são aspectos que merecem a atenção de nossos projetos em educação ambiental. Esta me parece ser condição necessária para que possamos dimensionar possibilidades e limites do conhecimento científico. Talvez esta possibilidade seja um dos caminhos para evitarmos uma das críticas contundentes apresentada pelo movimento ambientalista, qual seja a da mistificação do conhecimento científico. (CARVALHO, 2006, p. 15)

Na seção 3, apresentamos os procedimentos realizados na pesquisa, os quais incluem o motivo da escolha de se trabalhar com as teses e dissertações integrantes do Banco de teses referido, a descrição da constituição e definição do corpus documental e da análise dos documentos selecionados.

Nas seções 4 e 5, são apresentadas as análises realizadas dos documentos selecionados. Finalmente, na seção 6, são apresentadas as considerações finais.

(23)

Figura 1: Cartaz do longa-metragem Outubro, de Sergei

Eisenstein (1927)

Fonte: Acesso em http://www.jonathanrosenbaum.net

A AVENTURA DA MODERNIDADE

“Ser moderno é encontrar-se num

ambiente que promete aventura, poder,

alegria, crescimento, transformação de

si, e do mundo, e ao mesmo tempo, que

ameaça a destruir tudo o que temos

tudo que sabemos, tudo o que somos. Os

ambientes e experiências modernos

cruzam todas as fronteiras da

geografia e da etnicidade, da classe e

da nacionalidade, da religião e da

ideologia; nesse sentido, pode-se

dizer que a modernidade une toda a

humanidade. Mas trata-se de uma

unidade paradoxal, uma unidade da

desunidade, ela nos arroja num

redemoinho de perpétua desintegração e

renovação, de luta e contradição, de

ambiguidade e angústia. Ser moderno é

ser parte de um universo em que, como

disse Marx, ‘tudo que é sólido se

(24)

2 A AVENTURA DA MODERNIDADE

A modernidade é uma categoria qualitativa, não cronológica.

T. Adorno7

Foi Calvino (2007) quem fez o convite a conhecer os clássicos. Porque é melhor

lê-los, do que não lê-los. Porque é uma forma de entender o ser humano, os fatos, as coisas, os

discursos, as leituras, a arte, o mundo. Mas, do que faz um livro um clássico? Mais

especificamente, do que faz uma obra um clássico individual? Seria uma possível resposta o

sorriso constante que se tem ao lê-lo? Ou, seria aquela impressão de que suas frases não o

deixaram mais em solidão, desde a última vez que o pegou em mãos? Ler, reler, esquecer,

lembrar, ler de novo, assustar-se com aquela ideia que não tinha percebido antes. Uma

imagem nunca vista. Um poema, com ou sem letras. Um clássico individual é um livro que

pode guiar um pensamento por dentre muitos outros. E, até mesmo convidar a desbravar uma

aventura: neste caso, A aventura da Modernidade.

Berman (1988) causou tal inquietação quando propôs o uso da frase “Tudo que é

sólido se desmancha no ar” como símbolo do fenômeno da Modernidade. Insustentavelmente

potente esta metáfora de Marx e Engels deu origem a um interessante debate sobre como

contextualizar e interpretar o tempo presente. Este debate, nos dias atuais, pode ser sintetizado

como o debate da Modernidade/ Pós-Modernidade. Embora atualmente também sejam usados

outros conceitos que o complementam como supermodernidade e hipermodernidade.

Indispensável quando se discute o tema da Modernidade é perceber sua dupla, ou até

tripla compreensão, pois este termo pode significar um movimento artístico (a partir do

Século XIX), ou uma corrente filosófica (do Século XVI em diante), ou referir-se a um

processo de mudanças na infraestrutura de produção. No campo das Artes e da Cultura, o

termo Modernismo é mais frequente para delimitar uma expressão específica de obra artística,

Modernidade é mais usual no campo da Filosofia e das Ciências Humanas para demarcar uma linha de pensamento, um conjunto da criação humana material e imaterial. Menos comum, o

termo modernização é utilizado em específicas áreas do conhecimento, por exemplo, a agronomia, para referir-se a complexos de estruturas e processos materiais relativos ao

progresso econômico e técnico-científico. No entanto, muitos autores podem utilizá-los como

sinônimos.

7

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2.1 O modernismo

[...] escreveu Baudelaire em 1851, "é impossível não ficar emocionado com o espetáculo desta população doentia, que engole a poeira das fábricas, que inala partículas de algodão, que deixa penetrar seus tecidos pelo alvaiade, pelo mercúrio e por todos os venenos necessários à realização das obras-primas [...] Esta população espera os milagres a que o mundo lhe parece dar direito; sente correr sangue purpúreo nas veias e lança um longo olhar carregado de tristeza à luz do sol e às sombras dos grandes parques". Esta população é o pano de fundo, no qual se destaca a silhueta do herói. Para este quadro, Baudelaire escreveu uma legenda a seu modo:

a expressão ‘la modernité’. (BENJAMIM, 2000, p. 10)

O movimento artístico do Modernismo volta-se à industrialização, e o modo de vida

por ela estruturado, criticando ou elogiando-o. Os temas e materiais cotidianos ganham

importância neste contexto, no qual a arte passa a fazer parte do dia-a-dia da população, e a

população da arte. Das diversas manifestações da arte moderna, pode-se destacar a

Arquitetura, pois esta expressão artística se concretizou em formas que visaram possibilitar e

reger o modo de vida das sociedades industriais.

Berman (1988, p. 143) explicita a relação entre a arte modernista e a condição humana

moderna, materialmente produzida pela modernização do espaço e das formas de produção:

“Baudelaire pôde ver como a modernização das cidades simultaneamente inspira e força a

modernização da alma dos cidadãos.” A referência do autor é a experiência do poeta que

viveu na capital francesa e pôde observar e transmitir, em seus versos, a transformação urbana

de Paris – da era do Barão Haussmann à Le Corbusier, cujo padrão moderno deveria ser

seguido por outras cidades no mundo. Símbolos da Arquitetura Moderna, o Palácio de Cristal

de Londres (Joseph Paxton, 1851), a Ponte do Brooklyn nos Estados Unidos da América

(John Augustus Roebling, 1881), a Rua Nevski em São Petersburgo (autoria coletiva, fim da

década de 1820), a Avenida Central – atual Avenida Rio Branco- no Rio de Janeiro (Paulo de

Frontim, 1904) entre outros, reproduziram o estilo e a funcionalidade da arquitetura moderna

de Paris, desde os projetos fáusticos8, a ode ao saneamento e embelezamento, a “desconstrução criativa” 9 permanente e a segregação socioespacial.

8 Referência ao personagem Fausto, de Goethe, da obra homônima publicada em alemão, em 1832. Fausto

representa a gana pelo progresso, e tem o objetivo de buscar o ideal da liberdade humana. De tal forma que Karl Marx chegou a relacionar o personagem à era da Modernidade, pois ambos são incapazes de gerir os resultados

de suas ações: para o bem, ou para o mal. “Fausto vislumbra, e luta para criar, um mundo onde crescimento

pessoal e progresso social passam ser atingidos com um mínimo de sacrifícios humanos. Ironicamente, sua

tragédia decorre exatamente de seu desejo de eliminar a tragédia da vida” (BERMAN, 1988, p. 66).

99“Desconstrução criativa” foi uma bandeira da arquitetura moderna do Barão de Haussmann para justificar as

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Figura 1: Rua Nevsky, São Petersburgo, Rússia.

Fonte: Acesso em http://nskrip1.blogspot.com.br/2012/11/the-history-of-nevsky-prospect-in-st.html

Figura 3: Avenida Rio Branco, Rio de Janeiro, Brasil.

(27)

As modernizações da infraestrutura e da estética urbana tiveram como objetivo permitir a fluidez de pessoas, meios de transportes, mercadorias e informações, e impedir, simultaneamente, revoltas populares. Em um primeiro momento, as ruas eram espaços a serem ocupados e que deveriam oferecer o consumo de mercadorias e de espaços, primordialmente em bulevares. Em um próximo momento, o planejamento urbano inspirado para evitar revoluções, e acelerar a produção e as trocas comerciais e industriais, priorizou as grandes rodovias, as quais deveriam ligar todos os espaços de produção das cidades e entre cidades. A arquitetura moderna trouxe pela primeira vez a pobreza humana e as desigualdades para os olhos dos burgueses e poderosos10, por meio da convivência, nem sempre pacífica, das classes sociais nas ruas e grandes avenidas das cidades modernas. A cidade é uma exigência do modernismo, da modernização e da Modernidade.

2.2 A Modernidade

Berman (1988) resume as mudanças estruturais que permitiram a consolidação da Modernidade como pensamento orientador da sociedade ocidental: mercado capitalista mundial, grandes avanços da ciência, industrialização da produção, aceleração dos ritmos de vida, fortalecimento do poder corporativo e da luta de classes, explosão demográfica e crescimento urbano.

Tais mudanças iniciaram-se na Europa do Século XVI no contexto histórico do Renascimento Cultural, cujos fundamentos (o humanismo, o antropocentrismo, o desenvolvimento da Ciência e da Arte) são manifestações da força contestadora contra o pensamento único da verdade divina, o qual fora defendido por forte repressão da Santa Inquisição, durante a Idade Média. Assim, o ato de conhecer a verdade, de “pensar com a

própria cabeça” surge, em meio a conflitos, como um caminho para o homem que se

empenhava, gradativamente, em tornar o mundo desencantado de forças desconhecidas e

onipotentes, e, reduzir a ‘perigosa’ natureza às fórmulas racionalmente explicáveis.

O espírito desta época foi retratado pelo personagem Fausto quando este se dirige a

Mefisto: “Não é já o momento de o homem afirmar-se contra a arrogante tirania da natureza,

de enfrentar as forças naturais em nome do ‘livre espírito que protege todos os direitos”?

(BERMAN, 1988, p.61)

10

(28)

No entanto, era preciso desenvolver um caminho confiável para produzir o conhecimento que iria desencantar a natureza e tornar a Humanidade mais segura, eis a importância da construção do método. O método indutivo e empírico, postulado por Francis Bacon, fundamenta-se na observação e comprovação de hipóteses, por meio da experiência e rigor científico, que conjuntamente com o método dedutivo e racional cartesiano estabeleceram as bases da produção científica moderna (BACON, 1997; DESCARTES, 2000). Através destes procedimentos metodológicos e abordagens, o avanço da Ciência permitiu que o conhecimento se tornasse prático-intervencionista. Superando o caráter especulativo antigo e medieval, a Ciência Moderna prometeu descobrir as regras da natureza, para controlá-la, e proporcionar a Humanidade mais segurança, conforto e qualidade de vida.

A ideia de Modernidade, portanto, equivale à consolidação do esclarecimento11, ou o

“desencantamento do mundo” pelo qual a Humanidade foi capaz de libertar-se de uma

natureza desconhecida e amedrontadora, mesmo que esta libertação tenha significado a submissão da natureza e de outros povos aos Homens modernos ocidentais que a ciência e a técnica havia apoderado. Explicitam tal relação os autores frankfurtianos: “A essência do esclarecimento é a alternativa que torna inevitável a dominação. Os homens sempre tiveram que escolher entre submeter-se à natureza ou submeter a natureza à si” (ADORNO; HORKHEIMER, 2006, p. 38).

Uma natureza sem encantos, sem mística, sem mitos, fora submetida ao domínio,

exploração e repressão pela “sociedade administrada” 12

. A sociedade burguesa ocidental por meio do processo de instrumentalização da razão e distanciamento da natureza tornou-se desamparada diante dos ciclos naturais e perdeu-se no caminho obstruído para a construção de verdades esclarecidas.

A sociedade burguesa é cínica porque, sob as máscaras do Esclarecimento e da liberdade, institucionalizou-se e concretizou-se como razão perversa, instrumental, e não somente dominando a natureza e os homens, mas ameaçando-os em sua própria sobrevivência. Segundo Sloterdijk, foram justamente Adorno e Horkheimer os primeiros a denunciar a ilusão otimista da Aufklarung13, desmascarando-a como um novo mito da Modernidade. (FREITAG, 1986, p. 117)

A originalidade destes autores da Teoria Crítica consistiu em detectar o mecanismo intrinsecamente contraditório do Esclarecimento e da organização social moderna. Como

11 In: Adorno,T.; Horkheimer, M. (2006)

12 Idem.

13

(29)

sintetizaram na convincente asserção: “A maldição do progresso irrefreável é a sua irrefreável

regressão” (ADORNO, HORKHEIMER, 2006, p. 41). Deste modo, as contradições e

conflitos inerentes à Modernidade nega qualquer tentativa de realizar-se em plenitude, visto sua condição sine qua non de construir-se destrutivamente: “a vida moderna possui uma

beleza peculiar e autêntica, no entanto, é inseparável da sua miséria e ansiedade.” (BERMAN,

1988, p. 138)

Na oração “[...] tudo que é sólido se desmancha no ar” 14

presente em Manifesto do

partido Comunista, publicado originalmente em 1848, Marx e Engels intencionaram

problematizar a Modernidade, apontando para a possibilidade de que a metáfora do sólido (visão de modernização institucional consolidada através do Estado racional, da consolidação do mercado mundial, da mass media, da fé na evolução histórica e na verdade) estaria em constante transformação devido às próprias contradições, paradoxos e metamorfoses

modernas, e assim ela “[...] se desmancha no ar” (a visão diluidora da Modernidade).

(BERMAN, 1988)

David Harvey na obra A condição pós-moderna: Uma pesquisa sobre as origens da

mudança cultural (2008) analisa as características da sociedade ocidental no fim do Século

XX - a acumulação flexível de capital, a cultura, e a compressão espaço-tempo e concorda com os autores do Materialismo Histórico do século XIX, ao reafirmar que as mudanças estruturais são intrínsecas ao sistema produtivo da sociedade moderna, indicando que as relações pessoais, sociais e econômicas, nos séculos XX e XXI, tornam-se gradativamente mais pulverizadas quanto maior for o avanço técnico-científico de uma dada sociedade.

Em meio a efemeridade da condição moderna, não há consenso sobre o que foi, é, ou o que nunca teria sido a Modernidade, posto que não se pode afirmar que as sociedades contemporâneas atingiram o Projeto de Modernidade pleno, ou seja, que apresentam, concomitantemente, racionalidade, progresso tecnológico e científico, e o esclarecimento de sua população. Deste modo, é cabível perguntar como pode ser a Modernidade superada se

ela ainda não foi realizada em sua totalidade? “Se a única coisa certa sobre a Modernidade é a

incerteza, devemos sem dúvida dar considerável atenção às forças sociais que produzem tal

condição.” (HARVEY, 2008, p. 113).

14“Tudo que é sólido se des

mancha no ar, tudo que é sagrado é profanado, os homens são finalmente forçados a

enfrentar com sentidos mais sóbrios suas reais condições de vida e suas relações com os outros homens” (In:

(30)

2.3 O Debate Modernidade/ Pós-modernidade

O debate da Modernidade/ Pós-Modernidade sugere que existam incertezas enquanto delimitação de um paradigma filosófico orientador da sociedade contemporânea, diante de uma possível limitação da era moderna na presença das mudanças, rupturas e/ou aprofundamentos, de seu modelo de organização e produção. Afinal, como definir o tempo em que vivemos? Com que tipo de sociedade o modelo contemporâneo ocidental identifica-se? Que relações este modelo social estabelece entre indivíduo e a sociedade, e entre esta e o meio ambiente?

Este questionar do paradigma moderno gerou debates a respeito de novos paradigmas que poderiam abarcar realidades e crises que a sociedade contemporânea passou a enfrentar, como a crise socioambiental. A dificuldade em traçar um fio histórico que delimite temporalmente uma possível finitude da Modernidade é a inexistência de um consenso sobre

esta temática, como foi observado por Latour (1994, p.15): “A Modernidade possui tantos

sentidos quantos forem os pensadores ou jornalistas. Ainda assim, todas as definições

apontam para a passagem de tempo”. Em comum, estas concepções de mundo voltam-se para

a Modernidade, no intuito de romper, ou exaltar, suas características principais. No entanto, as possíveis leituras de mundo -“pré-moderna”, “moderna reflexiva”, “moderna tardia”, “pós

-moderna”, e “hipermoderna”- são diversas, e até sob alguns aspectos conflitantes.

Para debater e ampliar a metáfora da Modernidade sólida e seu processo de sublimação15 Bauman (1998) apresenta a Modernidade como líquida, pois esta escorre, espalha-se rapidamente através das ações e relações dos homens e mulheres pós-modernos. A metáfora do líquido irá percorrer a obra deste sociólogo preocupado com a leitura de mundo das sociedades pós-industriais, as quais ele denomina de pós-modernas.

2.4 A Pós-modernidade

Será o pós-modernismo um estilo ou devemos vê-lo estritamente como ou conceito periodizador ?Terá ele um potencial revolucionário em virtude de sua oposição a todas as formas de metanarrativas e da sua extensão a outras vozes que há muito estavam silenciadas? Ou, não passa de comercialização e domestificação do modernismo e de uma redução das aspirações já prejudicadas deste a um ecletismo de mercado vale tudo? Portanto, ele solapa a política neoconservadora ou se integra a ela? (HARVEY, 2008, p.47).

15

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A Pós-Modernidade propõe uma mutação à Modernidade: ruptura, nova orientação ou extremismo. O prefixo pós sugere, em seu uso habitual, uma marca temporal de superação de um dado fenômeno, após de, depois de. Simples seria se houvesse consenso com o uso do prefixo pós neste contexto. “Quanto ao sentido do termo (pós-moderno) talvez só haja concordância em afirmar que o pós-modernismo representa alguma espécie de reação ao modernismo, ou de afastamento dele. (HARVEY, 2008, p.19).”

Fredric Jameson (2002) fez um estudo detalhado desta visão de sociedade e colabora explicando os termos pós-modernismo e sociedade pós-industrial. Pós-Modernismo é

definido por este autor como “a lógica cultural articulada pelas determinações concretas do

que se convencionou chamar eufemisticamente de nova ordem mundial” (Idem, p. 5). A

citação visa complementar a definição exposta:

[...] parte das formulações de Ernest Mendel que, em O capitalismo tardio, expõe os rumos do atual terceiro estágio desse sistema [o Capitalismo], agora oficialmente batizado de globalização. Sucedendo os estágios de capitalismo de mercado, e do monopolista, ou imperialista, o capitalismo multinacional colonizando áreas tributárias de tal forma que não se pode falar de algum lugar “fora do sistema”, como a Natureza (dada a destruição de formas antigas de produção) ou o Inconsciente, constantemente bombardeado pela mídia e pela propaganda. Nesta nova versão expandida e atualizada o velho mundo do capital, não mais se trata de ver a cultura como expressão relativamente autônoma da organização social, mas [...] demonstrar que o pós-modernismo é a lógica cultural deste novo estágio. (Idem, p. 5, grifo nosso)

É importante frisar o destaque dado por Jameson ao contextualizar o pós-modernismo como uma teoria que não é independente, nova, original, pois

[...] replica, já no próprio título, uma mimésis do modo como são parasitárias de outro sistema (do próprio modernismo), cujos traços residuais, assim como valores e atitudes inconscientemente reproduzidos, tornam-se, então, indicações preciosas da impossibilidade de emergência de uma cultura totalmente nova [...] É apenas reflexo e aspecto concomitante de mais uma modificação sistêmica do próprio capitalismo (Idem, p. 16)

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Mas, este uso do termo pós-moderno significando então outra Modernidade também não é consenso, pois quem faça uso do termo para caracterizar uma nova e diferente sociedade, assim como o fez Lyotard (1979).

O termo pós-moderno nasce nas Artes, especificamente na Arquitetura e na Literatura, movimento contrário do termo modernismo. No campo artístico, o termo pós-moderno debutou na América Hispânica, dos séculos XIX e XX na literatura de Federico de Onís, cujo emprego se deu como um refluxo conservador do modernismo (ANDERSON, 1999). Na Arquitetura, o pós-moderno dá sentido ao urbano como algo necessariamente fragmentado,

eclético, efêmero, uma “colagem” de muitos outros movimentos artísticos de épocas distintas,

que pretende ser uma crítica concreta aos projetos modernos de Le Corbusier, Mies van der Rohe, Haussmann, cujo foco estava na padronização, na retilinização, e funcionalidade dos espaços urbanos. Charles Jencks16 acredita que o fim simbólico da era Moderna aconteceu a exatos 15/07/1972 na implosão do prédio de habitação popular Pruitt- Igoe, na França, o qual representava a incapacidade de projetos arquitetônicos modernos de solucionar questões da era contemporânea (HARVEY, 2008).

Figura 4: Demolição do conjunto de prédios Pruit-Iggoe (St. Louis, EUA, 1972)

Fonte: Fotografia original utilizada no cartaz do longa-metragem “Pruitt-Igoe Myth”. Acesso em http://www.pruitt-igoe.com/press-materials/

16

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Jean François Lyotard (1979) tomou “emprestado” do campo artístico para os campos

da Filosofia e das Ciências Humanas e empregou o termo pós-moderno como qualidade da cultura das sociedades pós-industriais, para este autor aquelas regidas sob o capitalismo avançado) para determinar um momento em que as metanarrativas17 não explicariam mais o mundo18.

Identifica-se na tradução da obra de Lyotard, A condição pós-moderna (de 1979), que a sua primeira tradução para o português, O Pós-Moderno (1986), gerou uma confusão de sentidos, pois para este autor o termo é um adjetivo que qualifica a cultura de uma dada sociedade, ou seja, não pretendeu cunhar um conceito (o substantivo pós-moderno), mas qualificar a condição contemporânea (a locução adjetiva pós-moderna). (GALLO, 2008)

Penso não ser por acaso que os autores optaram pelo adjetivo; nas traduções, ao se optar pelo substantivo, subverte-se o sentido original dos textos [...] Mas o que dizem efetivamente expressões como pós-modernidade? Elas designam, simplesmente, uma temporalidade: viveríamos hoje em um tempo posterior à Modernidade. Mas o que seria este tempo? Isso tais expressões não são capazes de dizer por si mesmas, e por isso afirmo que elas não têm potência de conceito, sendo filosoficamente vazias. (GALLO, 2008, p. 37)

Por ser um conjunto de ideias que não se sustentam por si, permeado por ambiguidades e contradições, a Pós-Modernidade abriu espaço para que críticas fundamentadas em distintos juízos de valor se direcionassem a ela. Lipovetsky (2004, p. 52), nesta direção, complementa:

O neologismo pós-moderno tinha um mérito: salientar uma mudança de direção, uma reorganização em profundidade do modo de funcionamento social e cultural das sociedades democráticas avançadas. Rápida expansão do consumo e da comunicação de massa; enfraquecimento das normas autoritárias e disciplinares; surto de individualização; consagração do hedonismo e do psicologismo; perda da fé no futuro revolucionário; descontentamento com as paixões políticas e as militâncias

– era mesmo preciso dar um nome à enorme tranformação que se desenrolava no palco das sociedades abastadas, livres do peso das grandes utopias futuristas da primeira modernidade. Ao mesmo tempo, porém, a expressão pós-moderno era ambígua, desajeitada, para não dizer vaga. Isso porque era evidentemente uma modernidade de novo gênero a que tomava corpo, e não uma simples superação daquela anterior.

17“Para

Lyotard, o pós-moderno está marcado por uma incredulidade perante o metadiscurso filosófico metafísico, que possui pretensões atemporais e universalizantes.” (KARAZEK, 2010)

18 Interessa observar que a assimilação do fim das grandes narrativas ou até do fim da História com a

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Contudo, o Pós-Modernismo não deve ser considerado somente um erro de interpretação sobre rompimentos ou evoluções paradigmáticas, sendo assim, Terry Eagleton reconhece seus méritos:

O Pós-Modernismo não é, por certo, apenas uma espécie de equívoco teórico. Ele é, entre outras coisas, a Ideologia de uma época histórica específica no Ocidente, em que alguns grupos vituperados e humilhados estão começando a recuperar um pouco de sua história e individualidade. Isso, como argumentei, se constitui sua conquista mais preciosa. (EAGLETON, 1988, p. 118)

Harvey (2008) explicita a possibilidade de atuação crítica do pensamento pós-moderno, em relação ao pensamento estritamente pós-moderno, e demonstra interesse na capacidade nata dos pós-modernos de partir da pluralidade e da heterogeneidade de sujeitos, fatos e valores.

Geralmente percebido como positivista, tecnocêntrico, racionalista, o modernismo universal tem sido identificado na crença no progresso linear, nas verdades absolutas, no planejamento racional, de ordens sociais ideias, e com a padronização do conhecimento e da produção. O pós moderno em contraste , privilegia a heterogeneidade e a diferença como forças libertadoras na redefinição reveladoras do discurso cultural. A fragmentação, a indeterminação, e a intensa desconfiança de todos os discursos universais ou totalizantes são o marco do pensamento pós-moderno. (HARVEY, 2008, p.19, grifo nosso).

Ou ainda:

O Pós-Modernismo tem especial valor por reconhecer as múltiplas formas de alteridade que emergem das diferenças de subjetividade, de gênero, e de sexualidade, de raça, de classe, de (configurações de sensibilidade) temporal e de localizações e deslocamentos geográficos temporais e espaciais. (HARVEY, 2008, p. 109)

Ainda que o Pós-Modernismo tenha méritos ao apontar para possibilidades de reinvenção da sociedade, Trein (2008) alerta que esta teoria pode ser pouco crítica, e pode vir a desconsiderar importantes explanações sobre o mundo moderno que não poderia estar superado, visto que o projeto moderno não o teria sido. Em concordância, no que tange à irrealização da Modernidade, Latour (1994), autor que polemizou ao afirmar enfaticamente que jamais fomos modernos, ao evidenciar que o pós-moderno perde-se em vaguidão e indefinições, e desta forma, convive entre a dúvida e a crença, na medida em que é incapaz de acreditar em utopias, mas também tem cautela para duvidar delas.

(35)

2.5 A Hipermodernidade

Gilles Lipovetsky (2004) compreende que a condição moderna não foi superada pela sociedade ocidental, mas sua revisão foi levada ao extremo, fenômeno por ele denominado de

“Hipermodernidade”: a Modernidade elevada à potência hiperlativa, pois experienciamos um tempo de “hipercapitalismo”, “hiperconsumo”, “hiperindividualismo”, “hiperpotências” e “hiperterrorismo”. Para este autor, o conceito de “Hipermodernidade”, então, não substitui o

de Modernidade e de Pós-Modernidade, seria um terceiro momento da própria Modernidade, sendo que em todos os três momentos as categorias mercado, técnica e individualismo permanecem atuantes, mas com intensidades gradativamente crescentes.

A “Hipermodernidade” concebe-se, a partir destas três categorias, e, nesta visão

predispõe a consumação quase completa do projeto de Modernidade, e desta forma, só poderia ser possível em sociedades de capitalismo avançado, ou desenvolvidas: o mercado dispõe da acumulação flexível do capital, por meio do inchaço nas atividades financeiras e nova exploração de territórios visíveis e invisíveis pelo capital (como os são os sonhos, os discursos e a linguagem); a eficiência técnica atinge seu máximo com a Revolução tecnocientífica e informacional, ao passo que se sobrepõe aos ciclos os naturais e subjuga ao extremo a natureza; o homem alcançou o ápice de seu processo de individualização no momento em que deixou de crer em um futuro comum e coletivo, o que por sua vez, gerou a

falsa necessidade do “hiperconsumo”, o desconforto da “hipervigilância” (LIPOVETSKY,

2004).

A “Hipermodernidade” predispõe uma sociedade organizada para usufruto máximo do

prazer individual convertido no consumo. É uma sociedade orientada pelo desejo da ode ao luxo, da imagem, da conquista da felicidade atrelada ao “ter”. Neste tipo de sociedade organizada pós-industrialmente em que a mídia televisiva, o cinema e a internet se converteram nos principais meios informativos e educacionais, os territórios invisíveis dos sonhos agora passam a ser explorados em favor do consumo.

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modernos e que forma uma família tradicionalmente moderna vá conseguir se espelhar na felicidade de consumir em si um personagem dos meios de comunicação.

Assim, ao ganhar uma importância desmedida as propriedades e bens passam a ser muito desejáveis e dentro de uma sociedade capitalista e desigual, cada vez mais inacessíveis a todos, o que gera a condição de insegurança perene, e consigo a “hipervigilância”.

Figura 5: Gravura referente ao personagem “Grande Irmão” da obra 1984, de George Orwell

Fonte: Acesso em http://endthelie.com/2012/09/28/big-brother-is-already-here/

Contudo, percebemos que nenhuma sociedade contemporânea deve ser absolutamente enquadrada em uma ou outra definição social. Isto porque, em tempos de globalização mercantil e cultural, as características locais mesclam-se com condições globais, e muitas vezes, características descritas como não-modernas, modernas, pós-modernas e hipermodernas convivem em um território nacional.

Em resumo, segundo Latour (1994):

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