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Segunda reunião ou diversidade, movimento, acúmulo e rejeição de informações: configura-se um isolamento

6.1 As reuniões: onde a informação se movimenta

6.1.2 Segunda reunião ou diversidade, movimento, acúmulo e rejeição de informações: configura-se um isolamento

Essa reunião foi totalmente dedicada à discussão de um evento cultural que seria realizado dentro de dois dias num grande espaço esportivo da região32 e teve lugar na AR- PMBH, sendo, portanto, a única a acontecer fora do local habitual. Foi realizada a pedido do representante da AR-PMBH (Pcom 01), que também faz parte da Comissão de Monitoramento da Violência em Eventos Esportivos e Culturais (Comovec), criada pela SEDS.

Participaram da reunião cerca de 25 pessoas e, entre todas as reuniões observadas, essa foi a que teve maior número de participantes. Do Consep 17 estavam presentes 11 pessoas. Havia também representantes do departamento de eventos da Prefeitura Municipal de Belo Horizonte (PMBH); BHTrans (Empresa de Transportes e Trânsito de Belo Horizonte); Ademg (Administração de Estádios do Estado Minas Gerais; da empresa promotora do evento; da SEDS e também da Comovec, além de alguns poucos moradores de bairros que não pertencem à 17a CPM. O representante da AR-PMBH no Consep (Pmun 01), também membro da Comovec, atuou como coordenador da reunião.

Logo de início, o representante da BH-Trans prestou uma série de informações sobre o evento33 e sobre as providências tomadas em relação ao trânsito, que alterariam a rotina dos bairros. Em seguida falou o administrador do estádio no qual se daria o evento, explicando que a escolha desse novo local, maior que o anterior34, se deu porque há uma maior possibilidade de controle da situação. Ele esclareceu que o novo local, idealizado para sediar jogos de futebol, tornou-se um espaço multiuso. Observou que o evento é positivo, que agrada aos jovens e que, caso a sociedade não assuma essa realidade, eles vão acabar fazendo o evento em lugares marginais e, aí sim, sem qualquer controle ou proteção.

Dois assuntos dominaram toda a reunião: o barulho causado pelo evento e o aumento da criminalidade nas imediações do estádio. Alguns conselheiros e moradores, bastante

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Estádio Governador Magalhães Pinto (Mineirão), construído para a prática do futebol em 1965 e tem capacidade para cerca de 75.000 pessoas, administrado pela Ademg (Administração de Estádios do Estado Minas Gerais) e está localizado na Pampulha, em Belo Horizonte.

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O evento se chamava “Axé Brasil”, show musical com grande afluxo de jovens, que se realizaria no Mineirão.

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O evento era realizado no Estádio Independência, que também foi construído para a prática do futebol no final da década de 40, com capacidade para cerca de 18.000 pessoas, de propriedade do América Futebol Clube, localizado no Bairro Horto, em Belo Horizonte.

nervosos, temiam que o evento musical, diferentemente dos jogos de futebol, provocasse um barulho mais constante e intenso e, por isso, extremamente perturbador.

O representante da empresa promotora informou que haveria controle do nível de ruído e que não desrespeitaria a legislação relativa ao assunto. Explicou que seria utilizado um equipamento de última geração e que a propagação sonora seria menor do que em equipamentos convencionais. Informou também que já havia recolhido as taxas do serviço de limpeza urbana (SLU) e de segurança pública. Disse também ter contratado a SLU para fazer uma limpeza diária extra do local, logo após os eventos. Dirigindo-se, principalmente, aos conselheiros, perguntou: “Por que não pode haver um evento sem barulho, sem bagunça e sem sujeira? Qual o preconceito?”

O presidente da Associação Comunitária Viver Bandeirantes (que é também assessor parlamentar na Câmara de Vereadores da cidade), tentando acalmar os ânimos, disse que “temos que ir em cima do poder público e não do promotor do evento” (Pcom 14). Para ele o empreendedor está correto, pelo que “temos que cobrar do setor público. O que o poder público pediu, o promotor do evento fez”. A partir de sua experiência na área parlamentar, o Pcom 14 propôs que o esforço fosse dirigido no sentido de modificar a lei, pressionando os legisladores municipais.

O representante da AR-PMBH, lembrando que um evento dessa natureza não é proibido na cidade, aproveitou para dizer que a prefeitura tem que observar a lei. O Pcom 04 propôs, então, uma taxa de preservação que pudesse compensar os estragos e os danos à comunidade afetada e que fosse aplicada em melhorias para a região, no sentido de estruturá- la melhor e reduzir os impactos desses eventos.

Durante a reunião, os ânimos exaltados de alguns moradores, cansados do barulho e dos transtornos causados por esse tipo de evento, dificultaram as trocas informacionais. Praticamente não houve diálogo (interação informacional) e, principalmente, nenhuma proposta para encaminhar o problema foi aprovada.

Apesar da intensa participação dos conselheiros, o presidente do Consep (Pcom01) assumiu a palavra e disse que a reunião estava distorcida e que o Consep estava sendo apenas

um mero espectador. Ele observou que o comandante da companhia e o delegado da polícia civil não falaram e que, no entanto, haviam saído de suas rotinas para virem à reunião.

O delegado disse, então, que era necessário buscar nos órgãos competentes meios para dar mais segurança ao evento. Esclareceu que iria haver um delegado de plantão. O comandante da companhia disse que estava há apenas dois meses no cargo, que veio para uma reunião do Consep e que não iria emitir juízos de valor, pois recebera ordem para zelar pela segurança do evento. Observou, no entanto, que iria trabalhar “no limite” de sua capacidade e que todos os esforços possíveis seriam feitos, mas que não havia como negar que os índices de criminalidade nesses eventos são altos e que “os efeitos são avassaladores”, pois, ao reforçar o policiamento no local do evento, outros bairros vizinhos ficam, de fato, desguarnecidos. O Pcom 13 disse que, apesar de não morar muito próximo ao local do evento, sofre suas conseqüências e que os moradores sentem-se prejudicados por causa do vandalismo: “Há muito roubo de carros e de toca-fitas”.

Nesse ponto, a representante da SEDS e também coordenadora da Comovec, certamente baseado em IEG, disse que, de fato, foram identificados focos de vandalismo, mas que, depois da criação da Comovec, eles já diminuíram consideravelmente, pois as regiões próximas passaram a ser alvo de atenção também. O Pcom 12, incomodado com o desencontro de informações, interveio e disse: “o comandante falou uma coisa e a senhora falou outra”. O comandante respondeu que não falava por teoria, mas por prática, e reafirmou que “quando há o evento o atendimento na periferia dele cai”. A representante da SEDS-Comovec esclareceu que homens vão ser deslocados de outras regiões da cidade para atuarem na região do evento. O comandante, no entanto, insistiu que “vão ligar para o 190 e os problemas da companhia não poderão ser atendidos, a viatura não poderá vir”.

Sem entrar no mérito da questão entre o comandante da CPM e o coordenador da Comovec acerca dos impactos do evento nos bairros vizinhos ao estádio, pode-se dizer que, para o primeiro, “a teoria”, no caso as IEG, não refletem muito bem a prática. Ele utiliza-se de um argumento muito semelhante ao do Comandante Geral da PMMG durante a abertura do 2o Encontro de Presidentes de Consep da 7a RPM. Na sua entrevista individual, como já foi dito, mencionou ter poucos conhecimentos de geoprocessamento e dificuldades de encontrar um assessor para auxiliá-lo no trabalho com as IEG. A desvalorização da teoria pode,

portanto, ser expressão dessa dificuldade e, também, de uma irritação com o geoprocessamento como um instrumento gerencial, sobre o qual ele se manifestou não só em sua entrevista individual mas também em outras reuniões35, como um instrumento de pressão utilizado pelo CPC para obtenção de resultados.

De qualquer maneira, os desencontros nas abordagens do coordenador da Comovec e do comandante da 17a CPM refletem conflitos e profundas dificuldades para a realização de um trabalho articulado entre as agências do sistema de segurança pública.

O coordenador encerrou a reunião nesse ponto, agradecendo ao Consep, dizendo que, na realidade, a reunião fora transformada numa reunião da Comovec com a comunidade. Ele lembrou que a PMBH estava propondo uma avaliação pós-evento entre os promotores e moradores. O presidente do Consep, no entanto, rejeitando os conteúdos informacionais dessa reunião, disse que, numa próxima reunião seriam tratados assuntos do Consep.

Até a data em que se encerraram essas observações, ou seja, até o final do mês de agosto do mesmo ano, não mais se falou sobre esses assuntos durante as reuniões do Consep e não mais se buscou dialogar com a Comovec.

Na realidade, essa reunião parece ter sido esquecida, pois o presidente do Consep, assim como o delegado e o comandante da CPM, não a consideraram como uma reunião do Consep. Entretanto, os conteúdos informacionais rejeitados são relevantes e podem ser considerados pertinentes na perspectiva do modelo de policiamento comunitário.

Uma aproximação com a SEDS/Comovec poderia ser uma oportunidade de cooperação e aprendizagem mútua, o que muito poderia contribuir para a promoção da segurança pública na 17ª CPM.

Evidencia-se uma desarticulação interna, dentro do próprio Consep, pois, embora alguns conselheiros tenham participado e feito sugestões, a direção do conselho tomou uma direção contrária e recusou-se a contribuir com os debates.

Ao convocar o Consep para uma reunião com outros órgãos ligados à gestão municipal e estadual (Comovec, BHTrans e Ademg) o representante da AR-PMBH abriu uma importante

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Ver quinta reunião, especialmente, quando na p. 205, antes de mostrar as IEG o ele diz: “eu vou mostrar o que

nós sofremos”. Na p. 211, menciona dificuldades enfrentadas junto ao comandante do CPC que “tende a olhar as estatísticas de modo absoluto”.

possibilidade para a realização de trocas informacionais que, no entanto, não foi valorizada. Além disso, a reunião abriu espaço para que o Consep 17 pudesse posicionar-se em questões de interesse da cidade como um todo e, muito particularmente, dos bairros da 17ª CPM, vizinhos que são do estádio, mas quase nada foi trazido como proposta para a resolução dos conflitos ou levado para posteriores discussões.

Considerando-se os dados das entrevistas individuais com os conselheiros, pode-se dizer que, nessa reunião, começaram a surgir situações que, na verdade, são a expressão de duas das dificuldades básicas do Consep 17, que influenciam na seleção e construção de informações. Primeiro, não identificar como relevantes informações sobre os contextos da criminalidade. Segundo, não atentar para cuidados com o ambiente urbano e, por isso, distanciar-se, principalmente, da prefeitura e da guarda municipal (GM), mas também de outros órgãos e instituições públicas e privadas.

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