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6.1 As reuniões: onde a informação se movimenta

6.1.3 Terceira reunião ou “Eu fico perdidinho aqui”: configura-se o vazio informacional

6.1.3.2 Segundo momento: a (difícil) relação com as escolas

O presidente prosseguiu dizendo também que “falou mal das escolas”. Para ele “são uma cortina de fumaça” que pedem muito e não dão nada e “não apoiam o Proerd”. Iniciou- se então uma longa e relativamente conturbada discussão.

Ele comentou que havia marcado uma reunião com a Secretaria Municipal de Educação e que procurara esse órgão porque, quando entregou as cartilhas sobre segurança preventiva, elaboradas pelo Consep e pela PMMG, às escolas, elas receberam, fizeram o lançamento, mas não repassaram aos demais alunos e seus pais. Entendeu que estava havendo um boicote, sentindo, então, necessidade de buscar medidas que viessem de “cima para baixo”. Disse que há “idéias maravilhosas” que as escolas, de fato, não apóiam, referindo-se, principalmente, à proposta de cada escola criar um movimento esportivo com a ajuda dos jovens universitários das igrejas locais. Durante essas disputas esportivas, ele gostaria que acontecessem, paralelamente, as palestras do Proerd, reunindo os alunos e suas famílias.

Falou, ainda, que a igreja católica possui “uma freqüência imensa” e que lá existem muitos jovens que querem trabalhar na escola e que querem falar sobre a família e sobre a desagregação familiar. Lamentou, entretanto, um episódio no qual um questionário aplicado

por eles aos pais dos alunos, visando levantar o que os pais pensavam acerca da escola, tivesse sido muito mal recebido pelas diretoras das escolas.

Dois conselheiros tentaram relativizar esses acontecimentos e abrir espaço para uma discussão do problema, sugerindo a possibilidade de que alguma falha tivesse ocorrido, perguntando por que o questionário havia surtido um efeito contrário ao desejado, ou seja, não conduzira a uma aproximação dos jovens com as escolas.

O presidente do Consep respondeu: “As escolas estão mendigando segurança!”. Contou que uma diretora o procurara para dizer que havia “uma dupla armada dentro da escola que ameaçava professores”. Observou que eles têm medo de chamar a polícia. O sub- comandante e o Pcom 13 disseram que, no entanto, “isso é um caso de polícia”. Por outro lado, o Pcom 10 interveio perguntando se a polícia não estaria “entrando na escola no lugar do educador?”, mas o presidente do Consep, voltando a usar termos fortes, disse que “o educador está sendo covarde”.

Nesse momento manifesta-se mais agudamente o “vazio informacional”. Perguntas pertinentes e importantes ficam sem resposta. Há um vácuo de novas informações que poderiam advir do diálogo com o outro lado, ou seja, de um contato com a perspectiva dos educadores. Talvez fosse necessário perguntar: Se a escola está mendigando segurança, por que não vem às reuniões do Consep? O educador estaria mesmo sendo covarde? Diante de que estaria se acovardando o educador?

O sub-comandante, que já havia atendido a ocorrências em escolas, explicou que, nesses casos, os policiais advertem o aluno, chamam os pais, num trabalho no qual se sentem mais como educadores do que como policiais. O Pcom 10 disse que “a escola não está fazendo a diferença”, e o Pcom 05 completou dizendo que “a escola tem que ter qualidade”, dando chance às pessoas de melhorarem na vida. O Pcom 06 manifestou uma opinião diferente daquela que vê os professores como covardes e, procurando entender o problema sob uma outra perspectiva, contou que um aluno “mandou o professor embora da escola”, ameaçando-o e, em seguida, ponderou dizendo que os professores “não têm apoio” e, evidentemente, “não vão enfrentar aqueles que os ameaçam”.

É nesse contexto que o Pcom 05 perguntou ao presidente do Consep se “esse tipo de ameaça ao professor é muito comum?” E ele respondeu: “Na nossa região não. Eles estão vindo aqui perguntar o que fazer, porque aqui as coisas estão dando certo. Isso é na área da 8a CPM.” Ele exemplificou citando o trabalho que vem sendo feito junto às escolas da região através do escotismo e do Proerd. Depois de discutir a questão do escotismo com o presidente do Consep, o Pcom 10 dispôs-se a ajudar e a conseguir mais pessoas que queiram adotar escoteiros, aproveitando para dizer que muita coisa começa pela televisão, que “mostra tudo aquilo que a criança não pode fazer”.

O presidente do Consep, acalmando-se um pouco, advertiu, como se falasse consigo mesmo, que não seria possível querer “sair daqui, hoje, com o problema solucionado”, pois isso se dá a longo prazo. O Pcom 15, que trabalha com um grupo popular de dança folclórica, fez uma outra observação tranqüilizadora, sugerindo uma atitude diferente: “É com o trabalho que vem o resultado, com boa vontade”. O Pcom 10 lembrou que “o Rotary e o Lyons têm um trabalho social muito bom” nesse sentido.

O presidente, talvez já um pouco cansado, observou: “Eu tenho é que ter proposta. A PM e a civil já deram apoio. Nós temos é que conseguir entrar na escola”, mas não deixou de reafirmar que “os piores parceiros para trabalhar com a comunidade são as escolas”. O Pcom 13, apoiando essa versão, contou que ele queria ensinar os alunos a fazerem evoluções para o desfile de 7 de setembro e “a professora não deixou”.

Algumas dessas últimas colocações tendem a romper com a situação de “vazio informacional”. São perguntas, dúvidas que tentam abordar a situação da perspectiva também dos educadores. O presidente reflete sobre o próprio Consep, produzindo informações sobre seu desempenho, concluindo, talvez um tanto ou quanto apressadamente, que precisa ser mais propositivo, Quando, na realidade, talvez devesse abrir-se às proposições e aos problemas da escola.

Em determinado momento da seqüência da reunião o delegado levantou a mão para uma “questão de ordem” e disse:

É necessário ter muito tato com os diretores de escola, pois são eleitos pela comunidade e têm medo de desagradar. Eles tiveram medo do questionário, porque tiveram medo dos fatos virem a público. Houve um caso de uma menina que chegou com a professora e a mãe no carro e havia sido espancada. Elas não queriam polícia, conselho tutelar ou juizado de menores. A PM é do portão para fora. Eles não querem tornar isso público. Eles já foram chamados para as reuniões (Pciv 01).

Há uma grande dificuldade entre alguns membros do Consep e as escolas da região prejudicando a comunicação e a troca de informações, interferindo na construção de sentidos e do “terceiro conhecimento”, justamente aquilo que poderia sustentar algumas ações conjuntas e concretas de caráter preventivo contra a violência, já que a escola é uma instituição importante nesse processo.

Há alguns indicativos de que possa tratar-se de conflitos de natureza político-partidária, ligados, sobretudo, à prefeitura, como poder-se-á observar mais à frente.

Deve-se notar, também, a presença da idéia de que a eleição democrática dos diretores das escolas pelos pais e pela comunidade conduziria os primeiros a uma atitude meramente politiqueira. Novamente aparece na reunião a referência pejorativa à política e, agora mais precisamente, ao processo eleitoral. Talvez esse discurso deva ser interpretado como expressão de uma crença, evidentemente ilusória, na possibilidade de uma ação humana ser politicamente neutra e/ou objetiva.

Mais do que isso, talvez possa ser interpretada no contexto de um processo, atualmente em marcha no País, que pretende desqualificar a política, tentando enfraquecer as instituições democráticas, porque não são perfeitas e, assim, prescindir da participação do saber popular em detrimento da tecnocracia e da hierarquia. Uma das conseqüências mais imediatas desse discurso é reforçar a descrença nas autoridades políticas democraticamente constituídas, o grave sentimento de impotência quanto à possibilidade de desenvolver ações para a transformação da realidade, ou seja, a desmobilização política da comunidade.

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