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2. Construindo a Pesquisa: Problema, Métodos e Fontes

2.3 Métodos: de onde viemos e para onde iremos

2.3.1 Selecionando as decisões

As decisões foram extraídas do sítio eletrônico do Tribunal de Justiça de São Paulo através da ferramenta de busca de jurisprudência62. Ainda que a ferramenta de busca não garanta acesso à integralidade dos casos julgados pelo tribunal – há diversos casos fora do repertório eletrônico63 – é o principal mecanismo disponibilizado pelo tribunal para que os cidadãos e operadores do direito acessem suas decisões.

Além disso, a ferramenta de busca do tribunal é utilizada pelos operadores do direito que trabalham com o sistema de justiça – advogados, promotores, defensores, e até mesmo juízes – para identificar o entendimento da corte a respeito de questões jurídicas diversas. É um mecanismo de busca, portanto, que faz parte da criação das próprias decisões que ele acessa. Afinal, advogados e promotores recorrem ao site do TJSP para fundamentar seus

61 Cf. nota 26 supra.

62 É possível acessar a ferramenta de pesquisa online de jurisprudência do TJSP através do link:

https://esaj.tjsp.jus.br/cjsg/consultaCompleta.do?f=1 – Acesso: 08/06/2015.

63

Durante a elaboração da pesquisa realizamos contato telefônico com funcionários de cartórios judiciais das Câmaras Criminais do Tribunal de Justiça de São Paulo que indicaram que os acervos eletrônicos acessíveis pela ferramenta de busca do site não incluem todos os acórdãos proferidos pelo tribunal. Alguns funcionários afirmaram que cada serventia judicial tem uma política própria para a disponibilização dos acórdãos no acervo online.

pleitos, juízes remetem aos fundamentos e julgados trazidos pelas partes e, quando as questões são novamente devolvidas ao tribunal, as decisões outrora encontradas pelo mecanismo de busca do próprio tribunal aparecem na fundamentação dos acórdãos. Conquanto haja limitações para as generalizações sobre o que se descobre ao utilizar a ferramenta de jurisprudência dos sites, é um instrumento importante, legítimo, que tem um impacto importante na operacionalização do direito em si.

O download de todas as decisões que foram lidas no curso da pesquisa foi feito entre os dias 02/02/2015 e 05/02/201564.

Na pesquisa preliminar foram testados diversos critérios de busca para selecionar as decisões65. A combinação dos termos “cultivo” e “maconha” gerou o maior número de resultados: foram 296 acórdãos em 02/02/2015. Por esta razão, escolhemos utilizar estes termos de busca no site.

Partindo dos 296 resultados acusados pela ferramenta de busca do tribunal foi feito um filtro de classe processual anterior ao download dos acórdãos. O mecanismo de busca do TJSP permite que o pesquisador selecione as decisões a partir da classe processual em que foram registradas. O registro de classe dos acórdãos foi assim organizado pela ferramenta de busca online66:

64 Inicialmente estabelecemos que o download de todas as decisões seria feito imediatamente após o recesso

forense de dezembro2014/janeiro2015 (de 20 de dezembro de 2014 a 18 de janeiro de 2015), determinado pelo Provimento nº 1.948/2012 do Conselho Superior da Magistratura de São Paulo , complementado pelo Provimento nº 2.216/2014 do mesmo Conselho . No entanto, entre dezembro de 2014 e janeiro de 2015 o acesso à ferramenta de busca online de decisões do TJSP permaneceu bastante instável, com dias em que o mecanismo simplesmente não estava disponível ou estava com a conexão limitada. Por esta razão optamos por realizar o download das decisões após o fim do recesso forense paulista, quando o acesso à ferramenta de busca de decisões do TJSP já havia sido restabelecido. O provimento nº 1.948/2012 estabelece em definitivo o período do recesso forense paulista compreendido entre os dias 20 de dezembro e 06 de janeiro. O Provimento está publicado no Diário de Justiça Eletrônico de São Paulo de 03/02/2012, caderno 1 (administrativo), página

3. A íntegra do Provimento está disponível em:

http://esaj.tjsp.jus.br/gcnPtl/abrirDetalhesLegislacao.do?cdLegislacaoEdit=101433&flBtVoltar=N. Acesso: 07/06/2015.

Excepcionalmente para o ano de 2015 o Conselho Superior da Magistratura de São Paulo aprovou uma prorrogação do recesso forense entre os dias 07/01/2015 e 18/01/2015, atendendo a pedido apresentado pela Seccional Paulista da Ordem dos Advogados do Brasil. O Provimento está publicado no Diário de Justiça Eletrônico de São Paulo de 14/10/2014, caderno 1 (administrativo), página 1. A íntegra do Provimento está

disponível no link:

https://www.dje.tjsp.jus.br/cdje/consultaSimples.do?cdVolume=9&nuDiario=1754&cdCaderno=10&nuSeqpag ina=1. Acesso: 07/06/2015.

65 Foram testadas, por exemplo, as combinações: “plantio” e “maconha”; “cultivo” e “canábis” ou “cannabis”;

“plantio” e “canábis” ou “cannabis”; “cultiv$” e “maconha”; “cultiv$” e “canábis” ou “cannabis”. Em todos os casos, o número de resultados indicado pelas ferramentas de pesquisa foi menor que o gerado pela combinação escolhida (“cultivo” e “maconha”).

66 Durante a etapa de realização das pesquisas preliminares realizamos contato telefônico com um funcionário

do Tribunal de Justiça de São Paulo que nos indicou que o registro de classe é feito por um serventuário da Justiça imediatamente após a prolação do acórdão. O sistema utilizado pelo TJSP possui um amplo espectro de

Apelação Criminal 121

Apelação 78

Habeas Corpus 62

Apelação Criminal com Revisão 12

Apelação – Reclusão 05

Recurso em Sentido Estrito 04

Agravo de Instrumento 02

Revisão Criminal 04

Apelação Com Revisão 02

Feito não Especificado 01

Embargos de Declaração 01

Apelação Criminal sem Revisão 01

Apelação 02

Embargos de Declaração 01

A partir do registro de classe processual selecionamos apenas os acórdãos que haviam sido proferidos em sede de recurso de Apelação, totalizando 221 decisões. A escolha se justifica porque na Apelação toda a matéria discutida em primeira instância que é impugnada no recurso é devolvida ao conhecimento do Tribunal. Considerando que o problema desta pesquisa requer a análise minuciosa dos argumentos proferidos na fundamentação das decisões, os acórdãos proferidos em recursos de Apelação têm potencialmente mais chances de oferecer as informações que aqui se pretende produzir.

Mais uma ressalva é necessária: o Projeto de Pesquisa que deu origem a este trabalho indicava que acórdãos proferidos em sede de Apelação, Revisão Criminal e Habeas Corpus impetrado depois da sentença de primeiro grau seriam incluídos no corpus empírico da pesquisa. Isto porque, em tese, na Revisão Criminal e nos habeas corpus posteriores à sentença os argumentos relativos à tipificação do cultivo poderiam ser discutidos mais profundamente67.

nomes para as classes processuais e ainda é possível inserir classes não cadastradas. A forma pela qual o registro é feito depende da Câmara, desembargador relator e do funcionário que realiza o registro. Por essa razão há mais de um registro de classe possível para cada tipo de processo julgado.

67 Conquanto a pesquisa preliminar não tenha revelado nenhuma decisão sobre plantio de canábis proferida em HC impetrado após sentença, era possível existir algum caso formatado juridicamente desta forma, sobretudo

nos primeiros anos após a entrada em vigor da Lei nº 11.343/06. Isto porque a lei tipificou o plantio para consumo próprio e equiparou seu tratamento jurídico-penal ao do usuário de drogas, não sujeito a pena de prisão, criando uma situação potencialmente favorável aos pequenos cultivadores que haviam sido condenados por tráfico de drogas. A antiga lei de drogas – Lei nº 6.368/76 – tipificava apenas o cultivo para fins de tráfico enquanto modalidade específica do crime de tráfico de drogas. Por esta razão, supus ser possível haver HCs impetrados na tentativa de revisão urgente de sentenças que versavam sobre pequenos cultivos, sem quaisquer indícios de traficância. É uma possibilidade que não poderia ser excluída de antemão e que, se existente, provavelmente abarcaria uma discussão substantiva sobre a finalidade do plantio – que é o que se pretende estudar nesta pesquisa. Esta questão será retomada no capítulo 7 da dissertação.

Contudo, à luz dos parâmetros de busca escolhidos a inclusão dos acórdãos proferidos em Revisão Criminal ou Habeas Corpus não se mostrou pertinente. Os quatro acórdãos encontrados proferidos em sede de Revisão Criminal possuem fundamentação tão sucinta que sequer é possível identificar quais elementos são considerados na tipificação. Todos os habeas corpus encontrados, por sua vez, foram impetrados antes da prolação de sentença em primeira instância.

Além disso, todos os acórdãos indicaram que as decisões eram proferidas em cognição sumária, com a ressalva de que a questão relativa à tipificação só poderia ser decidida em definitivo após a prolação de sentença, à luz da totalidade das provas produzidas no curso do processo. Por esta razão, considerando que esta pesquisa se debruça sobre as especificidades da fundamentação da tipificação penal, optamos por fazer o download apenas das decisões proferidas em sede de apelação.

Ainda que esta escolha possa implicar a exclusão do universo de análise de decisões relevantes sobre cultivo de canábis, a opção se justifica pelo foco da pesquisa em aspectos qualitativos que são discutidos mais detalhadamente nas decisões proferidas após a prolação de sentença, com a produção de todas as provas que formarão a convicção dos magistrados.

O download dos acórdãos foi feito sem recorte temporal: a partir dos critérios de busca “cultivo” e “maconha” selecionamos todas as decisões que foram apresentadas pela ferramenta online de busca. Há diversas questões importantes que dizem respeito à forma como as novidades trazidas pela Lei nº 11.343/06 têm sido aplicadas que justificam a inclusão de decisões anteriores à vigência da lei na população definitiva de acórdãos da pesquisa.

Muito embora o objetivo principal desta pesquisa não seja a compreensão das mudanças trazidas pela Lei nº 11.343/06, é importante compreender como as principais categorias da tipificação do cultivo de canábis eram vistas à luz da Lei nº 6.368/76. Para entender onde estamos é importante compreender de onde viemos.

A partir destes termos de busca, portanto, foi feito o download dos 221 acórdãos encontrados. Com acesso à integralidade das decisões disponibilizadas a população provisória (Pires, 2008: 163) de acórdãos da pesquisa foi organizada em dois bancos de dados distintos: um composto de decisões anteriores à vigência da Lei nº 11.343/06 e um composto de decisões posteriores. Considerando que a lei foi promulgada em 23 de agosto de 2006, tendo sido estabelecido em seu art. 74 o período de quarenta e cinco dias de vacatio

legis, ela entrou em vigor no dia 08 de outubro de 2006. Esta data – 08/10/2006 -, portanto, representa o marco que dividiu a organização inicial dos acórdãos nos dois bancos de dados referidos.