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CAPÍTULO 1: EXPERIÊNCIA SOCIAL, JOVENS E UNIVERSIDADE

1.2. JUVENTUDES, DIÁLOGO E EDUCAÇÃO

1.2.2. Sentidos do termo juventude

No âmbito das definições internacionais, os jovens pertencem à faixa da população com idade entre 15 e 24 anos. No Brasil, eles fazem parte da população de 15 a 29 anos de idade (ONU, 1981; BRASIL, 1990, 2005, 2013). Definições desta natureza, baseadas no critério da idade, servem para elaborar estratégias de atuação em países como o Brasil, por exemplo, cuja legislação prevê a garantia de direitos do cidadão, como o direito à vida, à liberdade, à igualdade, à educação, dentre outros (BRASIL, 1988). Tomada desta maneira, juventude seria o grupo de pessoas participantes do período de vida iniciado na adolescência, com avanço para a idade adulta, prevalecendo o critério da homogeneidade.

Todavia, os jovens participam de classes sociais e situações econômicas de maneira desigual, têm díspares interesses e mudam rapidamente os modos de relacionamento consigo e com os outros. Concebida deste outro modo (sem qualquer juízo de valor a respeito de uma ou outra maneira de explicar), a juventude seria o conjunto social composto por pessoas de situações sociais diferenciadas, embora pertencendo à mesma faixa etária (PAIS, 2003). Assim, torna-se possível falar em juventude, consoante uma perspectiva homogeneizadora, e de juventudes, como o conjunto social compreensível a partir de múltiplos pontos de vista, com indivíduos que experimentam novas situações num processo contínuo de construção de identidades.

A utilização do termo juventude no plural, conforme a Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco), está embasada na ideia de que “a juventude tem significados distintos para pessoas de diferentes estratos socioeconômicos, e é vivida de maneira heterogênea, segundo contextos e circunstâncias” (UNESCO, 2004, p. 25). A literatura relacionada ao assunto está repleta de definições. Constituem-se de diversificadas explicações os caminhos que caracterizam, definem e conceituam o termo juventude com o objetivo de evidenciar seu sentido – aquilo que constitui a orientação própria, intrínseco e vital para a existência de algo.

A polifonia de vozes que tenta caracterizar a juventude envolve opiniões de antigos e de novos pensadores, em épocas pré e pós-angústia cartesiana (BERNSTEIN, 1983; VASCONCELOS; LIMA, 2012), compondo uma textura nos discursos que, a despeito das divergências, possibilita a ideia de haver um sentido para o termo.

Encontrar seu sentido, ou sentidos, exige, do olhar curioso, a tomada de decisões, o fazer recortes, pois a complexidade do termo implica aspectos biológicos, históricos, sociológicos, culturais, dentre outros. Assim, Stevens e colaboradores (2007) reuniram alguns aspectos em cinco perspectivas para explicar a adolescência e as consequências educacionais, constituindo-se em recortes que possibilitam desenvolver outros recortes a respeito do termo juventude.

Estas perspectivas ou tendências seriam:

a) Desenvolvimento: a criança, o adolescente e o jovem são percebidos como deficitários em seu potencial para pensar o complexo, posicionar-se e equilibrar os hormônios, tal como os adultos conseguem fazer; à escola caberia suprir tais deficiências;

b) Patologizantes: os adolescentes são percebidos como desviantes com relação ao tipo ideal (modelo) de comportamento de adultos brancos, da classe média e heterossexuais; à escola caberia ajustá-los a este tipo, podendo diagnosticar e encaminhar a especialistas, bem como introduzi-lo na cultura intelectual ocidental dominante;

c) Críticas: os jovens são percebidos como ingênuos, mas, rebeldes, agentes de resistência e de transformação social; a escola teria o papel de contribuir para a sua emancipação;

d) Pós-modernas: a adolescência é considerada um grupo com relativa homogeneidade, com seus problemas na multiplicidade de situações e riscos, por vezes sem objetivos; a escola teria a função de administrar estes riscos e rebeldia;

e) Subjetividade: o adolescente percebido como capaz de conquistar sua identidade, como sujeito inserido no contexto histórico-social e cultural; à escola caberia elaborar e desenvolver práticas favoráveis a que os jovens aprendam e compreendam a sua participação pessoal por um mundo mais justo (Quadro 4). Essas explicações evidenciam que a subjetividade é construída a partir das experiências dos indivíduos e por intermédio da compreensão que eles tenham a respeito destas experiências (DUBET, 2003; GOMES, 2012). Para tratar da identidade dos jovens, torna-se necessário considerar a diversidade da vida social, a qual envolve questões políticas, históricas, econômicas e culturais. Torna-se necessário considerar que as experiências cotidianas, embora repetitivas, são ressignificadas pelos seres humanos ao longo das situações que lhes exigem

escolhas e posicionamentos relacionados a condutas e valores construídos individual e coletivamente (KEMP, 2000).

Quadro 4 – Perspectivas da adolescência e suas implicações escolares.

Perspectivas da adolescência e suas implicações escolares Desenvolvi- mento Patologizantes Críticas Pós- Modernas Subjetividade Def iniçõ es Etapa preparatória e transicional da vida humana. Abordagem do déficit. Etapa preparatória e transicional da vida humana, suscetível a patologias e desvios. Escola é instituição dominadora, que transmite ideologia, domestica novas gerações. Adolescente é oprimido, rebelde, agente de resistência. Grupo relativamente homogêneo, rebelde e em risco de não alcançar certos objetivos. Formação de sujeitos histórico- sociais e culturais. Co n se q u ênci as edu ca cion ais Suprir os déficits, superar os impulsos negativos, controle e vigilância. Formar a pessoa normal, diagnosticar e curar as patologias. Desvelar a reprodução social, emancipar os alunos por meio de uma pedagogia dialógica. Administrar riscos em face da rebeldia. Processo de subjetividade. Contextualizar as experiências vividas dos sujeitos. Mod elo d e p es soa Masculino, ocidental, branco, cristão. Comportamen- tos adultos, brancos, ocidentais, de classe média, heterossexuais. Pessoa conscientizada, politizada, transformadora. Rejeita significados positivistas de conhecimento e verdade. Construção de um futuro com justiça social e integridade política. Cu rr ícu los Cultura intelectual ocidental dominante. Cultura ocidental dominante. Privilegiam culturas populares e midiáticas, desde que não ideológicas. Contribuem para viver a vida da melhor maneira. Práticas pedagógicas para os jovens aprenderem e compreenderem sua participação na vida social. P ro fes sore s Vigilância e ordem. Regramento dos tempos, espaços e movimentos. Cientistas maduros e racionais, capazes de diagnosticar e encaminhar alunos com patologias. Dissipam a ingenuidade e revelam as estruturas de poder. Guiam o aluno na investigação crítica. Versões de amigos e terapeutas identificam estudantes em risco e lhes provém apoio. Orientadores das experiências no contexto. Alu n o s Passivos (objetos de modelagem para serem adultos). Passivos (objetos de ajustamento). Sujeitos de

conscientização. Sujeitos. Sujeitos, protagonistas.

Desse modo, optou-se aqui por abordar a formação histórico-social e cultural dos jovens, tendo as explicações e as pesquisas de Pais (2003, 2005, 2008) e Savage (2009) como principais referências, acompanhadas por comentários com base em outros autores, e apresentar, ao final desta tentativa de apreender alguns sentidos do termo juventude, o perfil do jovem brasileiro de acordo com resultados alcançados por duas pesquisas.

Ao tomar como base as diferenças biológicas elementares (gênero e idade), Ortega y Gasset (1987) entende o ser jovem ou o ser velho como módulos elementares e divergentes da vitalidade resultantes dos plásticos poderes da história. Por isto mesmo, Gomes (2012) sublinha que biologia e ambientes interagem de tal maneira que as idades são conceituadas e reconceituadas nas dimensões dos tempos. Assim, para Ortega y Gasset (1987), no limite, a estrutura social se reduz a dividir os indivíduos em homens e mulheres e dentro de cada uma destas divisões as categorias meninos, jovens e velhos. Cabe acrescentar que, por esta razão, diferenças biológicas como o gênero e a idade aparecem na literatura sociológica como construções sociais.

Aparentando estilos diferentes de estar presente em idêntica época histórica, cada uma dessas categorias procura os sentidos da sua própria existência. De todo modo, ao fazer a retrospectiva dos deslocamentos de poder entre essas categorias, Ortega e Gasset (1987) contribui para a compreensão, em quadros amplos, dos diversos sentidos do termo juventude desde os gregos antigos até o início do século passado.

Com Ortega y Gasset (1987), compreende-se que na Grécia clássica a luta entre as mencionadas categorias poderia ser representada pela dupla composta por Sócrates e Alcebíades (PLATÃO, 1972). Enquanto o primeiro era o homem maduro a educar e a dirigir, o segundo era o jovem que triunfara sobre a sociedade – apesar de ser o caso de entender, conforme o autor, que graça e vigor juvenil estavam a serviço da norma, da incitação e do freio situados acima da dupla. Já entre os antigos romanos os jovens patrícios e os jovens proletários representavam, respectivamente, os filhos de pais cidadãos e os filhos de alguém desconhecido. O senador, o pai de família, era o modelo cardinal da sociedade.

Adiante no tempo, o século XVIII mostrou-se ser o século velho, antiquado, odiento quanto às qualidades juvenis – tempo da peruca empoada, usada para

esconder a testa primaveril. Também no século XIX a juventude teria vivido a serviço da madureza, quando então as gerações aspiravam a amadurecer o mais rapidamente possível em meio ao clima de vergonha da própria juventude – até chegar o último quartel do século XIX, período em que teriam iniciado as diversas e conflitantes tentativas para conceber e definir o status do indivíduo jovem (SAVAGE, 2009).

Ao realizar uma retrospectiva das tentativas americanas e europeias para definir adolescência, compreendendo esta retrospectiva o período entre 1875 e 1945, Savage (2009) identificou aspectos da formação histórico-social dos jovens da América, Grã-Bretanha, França, Alemanha, Itália e Rússia, contribuindo para compreender o sentido do termo juventude.

O período que vai do final do século XIX até o primeiro lustro do século XX preocupa-se em formular um conceito de jovem, tendo-se já concebido ser inadequado pensar a idade adulta como fase imediata à infantil. Aquele tempo viveu as controvérsias de lançar os jovens no serviço militar; conviver com as gangues de crianças e adolescentes abandonados à própria sorte nas metrópoles; assistir à imigração maciça do campo para as cidades europeias, à prostituição e à delinquência juvenil. Eventos estes incomparáveis aos vividos por crianças americanas ao embarque nos sonhos de O Mágico de Oz, no Natal de 1900, obra literária que, para alguns, ajudaria na educação da criança moderna.

Era o tempo em que para os americanos valiam a energia e a instantaneidade, e não a linha temporal passado-presente vivida pelos contemporâneos europeus. Por isto, “se o bom condicionamento físico e saúde eram desejáveis para a sociedade americana, então a juventude, que naturalmente personifica estas qualidades, passou a ser o ideal sedutor para todas as idades” (SAVAGE, 2009, p. 71).

Naquela virada de século emergia a ideia de que a juventude poderia alçar voo como fase distinta de vida. Foram escritas obras voltadas para as possibilidades de concretização das promessas de juventude, transitórias ou eternas (SAVAGE, 2009). Em tal momento histórico-social, G. S. Hall (1904) cunhou o termo

adolescência para definir o longo hiato entre a infância e a vida adulta.

A propósito, na primeira metade do século XX, Ortega y Gasset (1987) escreveu que os jovens pareciam donos da situação e, sem se preocupar

minimamente com as outras idades, habitavam sua juventude de tal maneira resoluta e com denodo, despreocupados e seguros, que até parecia terem mergulhado suas existências neles próprios. Admitindo dúvida noutro trecho da obra referenciada, o autor revela não saber se este triunfo da juventude seria fenômeno transitório ou atitude assumida pela vida humana com perspectiva de qualificar uma época ainda por vir – para o autor, seria necessário decorrer algum tempo para ter respostas para este prognóstico.

Para os ingleses da primeira década daquele século, “o futuro do Império Britânico estava na sua juventude” (SAVAGE, 2009, p. 101), mas havia a ideia de que os jovens estavam abaixo dos padrões físicos e, assim, seria por culpa da vida urbana e seus males (os vícios) ou da cultura (levaria ao homossexualismo). Fortalecia-se o escotismo dos anos 1920 em diante. Na América em afirmação como potência financeira e industrial procurava-se domar os jovens para o mundo dos negócios. Desse modo, contrapunham aos jovens do norte da Europa, programados para lutar na guerra, os jovens americanos educados inclusive nas escolas para o ideal dos negócios – processo auxiliado pela Psicologia comercial, concomitantemente ao movimento contra o trabalho infantil.

Em paralelo, a sociedade americana se preocupava com a delinquência e a rebeldia juvenil. Buscava soluções. Tratou de dividir os processos educacionais em educação orientada para os clássicos e educação voltada para a instrução vocacional, sob a resistência de pais e professores, no contexto da evasão escolar ocasionada prioritariamente pelo preenchimento de vagas de trabalhos temporários e com baixos salários. Enquanto isto, na Alemanha, o Wandervogel (pássaro errante) ajudava os jovens a fugirem dos limites da escola e da cidade rumo ao

mundo aberto.

Logo antes da Primeira Guerra Mundial quaisquer jovens parisienses poderiam representar bem a rejeição ao sistema liberal e tecnológico adotado por seus pais, caracterizando um choque de gerações em que, de um lado, estavam filhos conservadores; do outro, pais progressistas. Os jovens europeus (os americanos em menor quantidade), situados no campo de batalha ideológico, vivenciaram os horrores daquela Guerra e saíram diferentes dela, não sendo mais obedientes aos mais velhos de uma maneira automática como antes ocorria. Ao buscar fugir das neuroses do pós-Guerra (muitos sem escola, com pais envolvidos

na guerra, ficaram à deriva), concentraram-se no presente. Meninas foram recrutadas para a prostituição associada às drogas.

Na Rússia de 1918 explodiam greves, motins e rebeliões. A vontade de construir novo ciclo, por parte da sociedade, devia-se em parte à Guerra gerada por ela, tendo se brutalizado “a nova sociedade de massa da juventude” (SAVAGE, 2009, p. 186). Com isso, “o Velho Mundo fora destruído e o Novo Mundo entrou correndo” (p. 196), enquanto o adolescente era lançado no limbo de um mundo incerto.

Ao transpassar o chamado drama do pós-Guerra, vários jovens cresceram sem pais e estudos, compensados apenas por um sentimento de liberdade que não viveram. Chegava ao mundo uma adolescência social e politicamente poderosa, pronta para ajustar contas com a geração mais velha, pois se sentia traída por ela.

Medrava o mercado jovem americano, seguindo-se os problemas da cultura de massa. O consumismo americano invadia a Europa e em meio à busca de prazer, jovens trabalhadores e jovens burgueses dividiam-se nos grandes salões de baile. Pouco mais tarde na Alemanha, já no contexto de instalação da Segunda Guerra Mundial e atrocidades do Holocausto (dirigido não só aos judeus), evocava- se uma abstração da juventude como símbolo de mudança por meio do conflito, da ação e do espírito de pertencimento – naquele país, os jovens passaram a ter poder político como não houvera ocorrido, mas, ressalte-se, sem direito de negar culto ao ditador Hitler (SAVAGE, 2009).

Jovens atingidos pela crise iniciada com a Depressão de 1929 sofriam suas consequências: “Na América, os jovens desempregados iam para a estrada (...). Na Alemanha, [eles] eram a matéria bruta para a arregimentação fascista disfarçada de autogoverno. No Reino Unido, se tivessem ânimo, iam fazer caminhadas” (SAVAGE, 2009, p. 321). Apesar da Depressão, ser cidadão americano bem sucedido significava ter poder aquisitivo (com as devidas consequências para a Europa). E isto incluía divertir-se, para o que o swing se mostrou fundamental – não apenas como estilo musical, mas como representante da liberdade em todos os sentidos (igualmente, com seus desdobramentos na Europa). Isto ocorria paralelamente à obrigatoriedade que os jovens americanos tinham de frequentar a escola secundária – em 1940 por volta de 75,0% dos jovens com idade entre 14 e 17 anos estavam na escola.

No entanto, a obrigatoriedade passou a ser outra após o envolvimento da América na Segunda Guerra Mundial: era preciso trabalhar. Além disso, da noite para o dia, meninos e meninas obrigaram-se a virar adultos – eles viveram racionamentos como os da gasolina, dos chicletes e do açúcar. Em 1942, jovens abandonavam a escola e iam trabalhar. Por outro lado, o ataque a Pearl Harbor, caro a milhares de japoneses de origem americana (deportados e postos em campos especiais), passou a gerar postos de trabalho na indústria bélica (SAVAGE, 2009).

Na Alemanha daquele ano aprovou-se a solução final e diversos jovens foram separados de suas famílias, tendo levado a indagadora e inquieta Anne Frank a escrever em seu diário: “muitos amigos judeus e conhecidos estão sendo levados em bando (...) mulheres e crianças têm a cabeça raspada” (SAVAGE, 2009, p. 454). Diferentemente dos jovens alemães, os jovens americanos viviam o gosto pela novidade, excitação e autoidentificação – um jeito diferente, um conjunto de padrões comportamentais denominados por Parsons (1942) como cultura juvenil. Em 1944, os adolescentes foram designados como teenagers, a partir de sua definição como

ideal e como mercado.

Quando, em 1º de agosto daquele ano, Anne Frank escreveu em seu diário “tenho medo que as pessoas que me conhecem descubram que tenho outro lado, um lado melhor e mais bonito, tenho medo que zombem de mim” (FRANK, 2001), suas palavras ressoavam como o oposto do ideal de jovem americano representado pelas palavras da revista Vogue em julho de 1945, ao se referir à revolução dos

teenagers: “ela [a revolução] desenvolveu para si mesma um estilo quase tão perfeito quanto possível neste mundo imperfeito [fazendo] da sua juventude uma bandeira” (SAVAGE, 2009, p. 495).

Cabe acrescentar que naquele período histórico, do outro lado do mundo, a China sofria as consequências da invasão japonesa, incluindo o chamado massacre de Nanquim. Os chineses avaliam que cerca de 300 mil pessoas foram mortas na onda de assassinatos, estupros e destruições perpetrada por militares japoneses entre dezembro de 1937 e fevereiro de 1938. Para a China, teria aquele massacre assumido dimensão trágica análoga à da explosão das bombas americanas lançadas em agosto de 1945 sobre Hiroshima e Nagasaki (THOMAS; WITTS, 1977; CHANG, 1997; CHINA COMEMORA..., 2012).

Durante os próximos cinquenta anos após a Segunda Guerra Mundial, desenvolveu-se a ideia do teenager, tendo representado a combinação psíquica de uma época – o viver o presente, a busca de prazer, a fome por produtos –, o que personificou a nova sociedade global (SAVAGE, 2009).

Conforme descreve Dick (2003), nos anos de 1950, com mais autonomia, os jovens viveram os chamados anos dourados. Na década de 60 falou-se com frequência da juventude em tempos de revolta e dos movimentos hippies. Já nos anos de 1970, a juventude estava insatisfeita com a apatia da sociedade. Nos anos de 1980, sem ideologias, presenciava o consumo exacerbado. Nos idos de 1990, com o surgimento da geração zapping, caracterizada pelo saltitar desordenado entre o fazer isso, fazer aquilo, ela vivenciou a ênfase dada à articulação e ao raciocínio, bem como o culto ao corpo e ao prazer.

Dessa maneira, o século XXI recebeu um jovem que possivelmente pela primeira vez na história não estava conseguindo visualizar seu futuro com clareza. Se antes ele conseguia perceber seu papel na sociedade com alguma nitidez, ainda sem concluir sua formação, agora isto se tornou praticamente inviável. Hoje, ele vê o futuro um tanto nebuloso.

Neste sentido, oportuno é estabelecer comparações entre as histórias de duas jovens, uma que viveu e morreu no século XX e outra que vive no século XXI. Uma era alemã e se chamava Anne; a outra é paquistanesa e se chama Malala. De diferente, citem-se suas necessidades imediatas, os modos de viver, as culturas de seu povo. A primeira morreu assassinada pelas forças nazistas quando tinha 15 anos de idade por ser judia. A segunda, com igual idade, sofreu atentado das forças talibãs porque, sendo mulçumana, não poderia frequentar escolas, conforme aquelas. De semelhante, vários aspectos, mas em essencial o sonho de presenciar um mundo em paz. As palavras de uma e de outra, por si, indicam a esperança de um mundo melhor.

Em seu diário, Anne escreveu:

Para mim é totalmente impossível construir a vida sobre um alicerce de caos, sofrimento e morte. Vejo o mundo ser lentamente transformado numa selva, ouço o trovão que se aproxima e que, um dia, irá nos destruir também, sinto o sofrimento de milhões. E mesmo assim, quando olho para o céu, sinto de algum modo que tudo mudará para melhor, que a crueldade também terminará, que a paz e a tranquilidade voltarão (FRANK, 2001, p. 306).

Por sua vez, Malala, em discurso realizado para cerca de 500 jovens provenientes de todas as partes do mundo e para autoridades mundiais, declarou:

Sou apenas uma jovem entre muitas outras. Eu falo não por mim mesma, mas por todos os que não têm voz. (...) Vamos pegar nos nossos livros e nas nossas canetas. Eles são as nossas mais poderosas armas. Uma criança, um professor, um livro e uma caneta podem mudar o mundo. A educação é a única solução. A educação em primeiro lugar (informação verbal)26 (MALALA ESTEVE..., 2013, tradução nossa).

E, mais tarde, ao comentar este seu discurso, realizado na sede da ONU, revelou:

Queria atingir as pessoas que vivem na miséria, as crianças forçadas a trabalhar e aquelas que sofrem com o terrorismo e a falta de educação. No fundo do meu coração eu esperava alcançar toda criança que pudesse