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SISTEMAS DE VENTILAÇÃO / AERAÇÃO

No documento renatacorreavargas (páginas 63-67)

3 OS ESPAÇOS ESCOLARES

3.2 A ARQUITETURA DO PRÉDIO ESCOLAR

3.2.2 SISTEMAS DE VENTILAÇÃO / AERAÇÃO

No que se refere aos sistemas de ventilação/aeração dos estabelecimentos educativos, podemos ler no artigo de O Pharol de novembro de 1889 referências ao sistema francês:

O conselho superior de hygiene, de França, deu a sua approvação ao processo que foi submettido ao seu exame, o que tem por fim produzir a ventilação permanente nas enfermarias, escolas e em geral, em todos os sítios em que é costume agglomerar-se um grande numero de pessoas.

28 A melhor escola estava ao ar livre, na natureza, não entre as paredes de um edifício. Mas, aceitada a

necessidade deste último, o campo escolar significava a presença da natureza na instituição educacional. Não só havia de sair a ela, ao exterior, mas também incorporá-la (tradução nossa).

Consiste em substituir os vidros das portas e das janellas por uma tira de lona, que determina uma ventilação constante e insensível.

Repetidas experiências de ventilação, feitas por este systema em alguns estabelecimentos públicos, produzira excellentes resultado. (O PHAROL, 13 de setembro de 1889, p. 2).

De acordo com Costa, a França, sofrendo influência das teses do médico sanitarista Johann Peter Frank, adotou o conceito de “Aerismo: a crença neo-hipocrática de que a doença se transmite principalmente pelo ar corrompido” (COSTA, 2013, p. 53). Corrupção essa que seria combatida através da renovação e circulação do ar que, assim, restauraria sua elasticidade e sua qualidade antisséptica: “mesmo antes de drenar a imundície é necessário assegurar a circulação do ar, evitando a estagnação que facilita a exalação dos miasmas” (COSTA, 2013, p. 53). Por miasmas, entendiam-se todas as emanações nocivas que corrompiam o ar e atacavam o corpo humano. O ar estagnado produziria miasma colocando em risco a saúde pública. Supunha-se, inicialmente, que a “doença estava no ar e que, portanto, era necessário fazê-lo circular” (COSTA, 2013, p. 54).

Valemo-nos dos ensinamentos de Chalhoub (1996) que, detalhadamente, historicizou o pensamento de infeccionistas e de contagionistas que se confrontavam no século XIX. Para os infeccionistas, o ambiente era o responsável pela transmissão das doenças por produzirem “miasmas” que infectavam as pessoas. Esta corrente foi a responsável por produzir um alicerce ideológico que sustentou as reformas urbanas.

Esta corrente foi também a responsável pelo embasamento teórico de diversas defesas sobre a importância do arejamento do espaço realizadas no Brasil. Tomemos o exemplo do Pará que a nós foi transmitido pelos estudos de Viana (2015). A autora, ao analisar periódicos pedagógicos publicados no final dos oitocentos e início do século XX, verificou ocorrência de educador empregando a teoria dos miasmas em seus escritos para defender a salubridade do ar. O educador ainda se utilizava de conhecimentos da fisiologia pulmonar para, segundo a autora, garantir que as recomendações higiênicas tivessem uma base científica comprovada e reconhecida.

Em Juiz de Fora, sistemas de ventilação e aeração eram uma constante nos discursos dos médicos. São palavras do Dr. Eduardo de Menezes com relação à arquitetura de prédios: “máximo de aeração e luminosidade; ausência completa de humidade e de viciação do ar”. (MENEZES, 1911, p. 41).

O ar limpo e puro, além de afastar o perigo do contágio, se fazia importante também no suprimento de oxigênio necessário ao trabalho mental, pois, segundo o Dr. Eduardo de Menezes, os:

(...) alumnos em estudo nos collegios [...] excercem um trabalho phychico que modifica a respiração [...] exigindo maior consumo de oxygenio e sendo nestas condições hygienico fornece-lhes ar mais puro, o que sem prejuíso das medidas adoptadas, se consegue por meio de systhemas de aeração. (MENEZES, 1911, p. 63).

Sobre sistema de aeração suplementar, Dr. Menezes ainda reforça em outro momento de sua obra:

Aeração e ventilação supplementares e forçadas – Os systhemas tendo por fim forçar a renovação do ar e mesmo a passagem de correntesas ou ventilação são de grandes effeitos hygienicos. A aeração forçada suppre nas escolas, hospitaes, theatros, etc. a deficiencia de cubagem, augmentando a capacidade respiratória. (MENEZES, 1911, p. 64).

Esta ideia também era defendia pelo Dr. Paul Degrave. Em seus escritos, que foram publicados em O Pharol, ele declarava que “todo o animal tem necessidade de respirar um ar puro” (O PHAROL, 21 de março de 1908, p. 1) e, ao explicar sobre o processo de absorção de oxigênio e exalação de gás carbônico, concluía que

Segue-se d’ahi que no fim de certo tempo o ar do aposento fechado e habitado, torna-se improprio á respiração. Toma então o CHEIRO DE AR CONFINADO, provoca indisposições, dores de cabeça, náuseas.

Levados mais longe, estes accidentes acarretam a ASPHYXIA. Eis ahi porque as agglomerações de indivíduos ou de animaes são insalubres, e os campos – mais saudáveis do que as cidades. (O PHAROL, 21 de março de 1908, p. 1, grifo do autor).

Tendo, entretanto, de conviver nesses locais, ele sugeria a ventilação como forma de renovação do ar.

Remedeia-se a falta de espaço habitual pela ventilação ou o renovamento do ar. A ventilação se faz naturalmente pela abertura frequente das portas e janellas, por seus interstícios, por orifícios especiaes furados nos tectos, pelas chaminés. Mais quente e menos denso, o ar respirado tende a se elevar, e sua ascensão chama o ar mais frio do exterior é a TIRAGEM.(O PHAROL, 21 de março de 1908, p. 1, grifo do autor).

O Pharol publicava um entendimento acerca da higiene do ar que já se fazia presente em solo europeu. Cavadas, ao investigar o higienismo nas escolas primárias portuguesas do início no século XX, analisou um manual escolar que, segundo ele, era comumente utilizado e

observou que tal aparato educativo indicava, como forma de prevenção de doenças respiratórias que atacavam os portugueses, o ar puro e recomendava o de ensino medidas de higiene do ar às crianças: “aconselha que se arejem bem todas as divisões das casas para renovar o ar que se viciou devido às substâncias resultantes da respiração e das combustões” (CAVADAS, 2010, p. 48). O manual dedicou um capítulo para explicar as regras de uma ventilação adequada nas salas de aula “através das janelas, paredes, chaminé e teto” (CAVADAS, 2010, p. 51).

Faz-se novamente necessário registrar que a preocupação quanto a esta regra de higiene não necessariamente se concretiza com uma mudança de prática. Em pesquisa anterior, Vargas (2008) nos aponta duas passagens que ilustram esta ideia: uma corroborando com as ideias veiculadas e outra se afastando de tais recomendações.

No primeiro exemplo, leem-se elogios ao aspecto higiênico dos primeiros Grupos Escolares da cidade – Grupo Jose Rangel e Grupo Delfim Moreira – referindo-se ao arejamento dos mesmos: “a lotação, o arejamento, a luz, tudo obedece aos preceitos da boa pedagogia”29. (SALLES, 1907, apud VARGAS, 2008, p. 98).

No segundo exemplo, verificamos uma crítica quanto a não observância destas regras no prédio do Grupo Escolar Mariano Procópio:

Visitei o grupo escolar de Mariano Procopio, bairro desta cidade. São enormes os inconvenientes do predio, onde ora funcciona o grupo. Ali não ha salas, mas quartos pequenos e abafadissimos, sem illuminação conveniente30. (TAVARES, 1913, apud VARGAS, 2008, p. 100).

Em O Pharol, encontramos algumas menções a instituições privadas da cidade nas quais o tema ventilação/aeração se fez presente, muitas delas foram nas próprias propagandas das escolas no jornal, o que nos faz também indagar sobre a fidedignidade dessas informações com a prática. Foram os casos da Academia de Comércio que assim anunciava: “vastos commodos para aulas, dormitórios, refeitórios, bem montados gabinetes de Physica e Chimica: tudo bem arejado e segundo as regras de hygiene moderna” (O PHAROL, 11 de setembro de 1909, p. 9) e do Ginásio de Minas – antes Colégio Malta – que foi mencionado em um artigo sobre a inauguração de seu novo prédio: “O novo prédio do gymnasio está

29 Reportagem publicada por Antonio Salles no Correio da Manhã no dia 3 de junho de 1907 e

republicada no Jornal do Commercio em 5 de junho de 1907 – p. 1 e 2 – nº3321.

30 Relatórios da 15ª a 16ª Circunscrição Literária feita por Raimundo Tavares, inspetor regional do

ensino, em 17 de fevereiro de 1913 para o Dr. Delfim Moreira da Costa Ribeiro, Secretário do Interior. OBS.: Tais informações referem-se a um prédio provisório, alugado, em que funcionava o Grupo devido a uma reforma do prédio próprio que foi concluída no início de março de 1913.

situado á rua Direita nº 141, possuindo grandes salas, muito bem arejadas e altas, e contando com um mobiliário moderno e hygienico.” (O PHAROL, 19 de julho de 1910, p. 1).

Cabe-nos assim registrar que, nos discursos disseminados na sociedade juiz-forana através de seu principal veículo de informação, a educação tinha um comprometimento com o desenvolvimento e modernização da cidade mediante o ensino e a prática de valores proferidos pela ordem médica que acreditava na manutenção/produção de um corpo saudável – e, portanto, produtivo – através da adoção de medidas de prevenção de doenças e de atitudes imorais.

No documento renatacorreavargas (páginas 63-67)