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R EFLEXÕES DE UM PROFESSOR APRENDIZ ( A PESQUISA DE CAMPO )

6.2. R EFLEXÕES SOBRE AS REFLEXÕES DE UM PROFESSOR APRENDIZ : ANÁLISE DO QUE VI , VIVI E SENTI NO DIA A DIA ESCOLA

6.4.12. Como superar os obstáculos

Após questionar os docentes sobre os maiores obstáculos às práticas interdisciplinares na escola, foi pedido que apontassem sugestões para superar esses entraves. As respostas contemplaram alguns tipos de problemas (ver Gráfico 14).

Fonte: Entrevistas.

Obstáculos epistemológicos e institucionais

A maioria das sugestões foi voltada para a transformação das discussões e críticas estéreis relacionadas à interdisciplinaridade (tão frequentes nos debates e reuniões da escola) em ações práticas. Ou seja: passar da discussão à ação, formulando e executando projetos na escola, como ilustram as respostas de Rosa e Hortência:

É porque [a interdisciplinaridade] é um tema que já vem há tanto tempo sendo debatido na escola, sendo discutido, e a interdisciplinaridade é vista às vezes como a solução, pra tudo. Mas eu acho que muito mais que formular projetos, muito mais que discutir ideias, discutir teorias, eu acho que é a ação mesmo, a atitude. Se a gente não partir pra pôr em prática... E também eu acho que uma pessoa sozinha, ela não faz muita coisa não. (Rosa).

Por exemplo, ali no colégio, se tivesse um espaço, a gente fazia uma horta, um “Projeto Horta”: teria de ter integração... teria de ter ali todos os professores, que participassem, de todas as disciplinas. Cada um dando a sua colaboração. (Hortência).

Foi sugerida a formação de um grupo de trabalho, em que todos pudessem participar, para elaborar e executar projetos interdisciplinares visando à melhoria da escola:

Eu acho que pra isso a gente poderia, por exemplo, montar mesmo (por que não?) os professores tanto do ensino fundamental como do Médio também... Eu acho que a gente poderia pensar... é... em montar mesmo um grupo de trabalho, em que todos... em que todos pudessem dar suas opiniões, tentar criar projetos para a melhoria da escola (né?), e que não ficasse só no papel. Que a gente realizasse mesmo. Com data fixa, com a participação de cada um, com o interesse... (Acácia).

Isso também resolveria o problema dos projetos impostos, “de cima pra baixo”, sem a participação do professores:

(...) ter reuniões , mesmo, com os professores, pra que os projetos possam ser realizados. Porque eu acho também que os professores, eles precisam... é... de uma explicação pra aqueles que não conhecem sobre o tema... e... a partir daí, (né?), criar. (Acácia).

A elaboração de um projeto político-pedagógico bem definido, que contemple a escola como um todo, envolvendo todos os integrantes da comunidade escolar, minimizaria a questão da fragmentação e da falta de integração entre as disciplinas e entre as pessoas:

Eu acho que nosso aluno é assim, porque precisa... Não... eu acho que escola, pra poder ir pra frente, teria que fazer um projeto. Um projeto que atingisse não só da 5ª à 8ª como também o Ensino Médio, né? Seria importante assim, não só nas 5ª séries, nas 6ª e nas 7ª não; viesse desde a 5ª série, nera? A escola dar mais ênfase a isso. Porque eu acho que só daria certo, só funcionaria, se fosse em todos os níveis, fosse trabalhado. Não só na 5ª, nem na 6ª, na 7ª e na 8ª. Enfim, fosse trabalhado na escola como um todo. Pra poder dar certo, né? Pra poder... É como dizer assim: pra poder valer a pena, né? Ter um objetivo. Conseguir, né?

Pra poder surgir efeito na escola, precisaria ser trabalhado da 5ª série do ensino fundamental até o médio. (Hortência).

Uma boa atuação, em todos os níveis: grupo gestor, professor. Porque a gente trabalha ali em prol do aluno. A partir do momento em que houver uma mudança... de ter aquele espaço, aluno, pro aluno, pro grupo gestor, pro professor, pra desenvolver uma atividade, tudo muda na escola. Mas tem que ter uma mudança, no geral: em termos materiais, em termo de grupo gestor, dentro das suas competências. Qual é a minha competência, de coordenador de gestão? Qual é a minha competência dentro da escola? Tem que pegar as minhas “diretrizezinhas” e ver o que eu to fazendo pra trazer o aluno pra se tornar importante dentro sala de aula, dentro do contexto geral ali da educação, da escola. O que não está acontecendo na nossa escola, e você sabe disso. (Magnólia).

Uma atuação pedagógica mais dinâmica do Núcleo Gestor, que extrapole a simples atividade administrativa, passando a propor e coordenar o grupo de estudo e trabalho dos professores, foi apontada como fundamental para o sucesso dos projetos interdisciplinares na escola:

(...) é preciso que haja alguém, dentro de uma coordenação pedagógica ou então... alguém que... que possa controlar o assunto da interdisciplinaridade... , e ter reuniões, mesmo, com os professores, pra que os projetos possam ser realizados. Porque eu acho também que os professores, eles precisam... é... de uma explicação pra aqueles que não conhecem sobre o tema... e... a partir daí, (né?), criar. (Acácia). Eu acho que quem tem que propor essas atividades é o Gestor da escola, com os professores em conjunto. Então, eu acho que a escola, ela tem que ser um conjunto, né? Os alunos, eles tem que participar? Sim. Mas os alunos, eles vão ser “convidados” a participar. Eles têm que ser “convencidos”, de certa forma, a se envolver, né? Porque o aluno, ele não vai chegar na escola e dizer: “Olha, eu acho que é uma boa ideia a gente trabalhar...” E os alunos já fazem isso de certa forma. A gente vê os alunos fazendo. Mas muitas vezes eles não fazem porque eles sabem que

as ideias (né) podem cair ao... Como é que se diz?Por terra, não ser aceita, né? Então, é uma conquista, eu acho que isso é uma conquista. Então, eu acho que o Núcleo Gestor, ele tem que ter uma postura definida, o Núcleo Gestor ele tem que ter sua proposta. Ele ta ali não só pra fiscalizar e pra cobrar, né? (Rosa).

Obstáculos materiais

A escola pode facilitar o trabalho interdisciplinar disponibilizando os recursos didáticos variados e necessários para a realização das atividades:

Materiais e de sala: uma boa lousa, um bom pincel, um livro, um material pra se trabalhar. Uma bola, uma cartolina, um lápis de cor, uma tinta guache...Tudo isso, é preciso que a escola tenha. Uma xerox, um som, uma fita de forró, uma fita de pagode, uma fita de MPB, uma fita de acordo com o que você vai trabalhar. Isso aí é a questão material, a escola tem que ter. (Magnólia).

Os entrevistados reconhecem, porém, que, para que isso aconteça (bem como a conquista de melhores condições salariais, para evitar a sobrecarga de trabalho que reduz seu tempo para planejamento e gera desânimo), é necessário um processo de organização política dos professores. Não depende só do trabalho na escola, mas de uma mobilização e sensibilização dos dirigentes políticos para uma priorização da educação nas políticas públicas:

(...) trabalhando, principalmente trabalhar a mentalidade dos nossos políticos, pra investir na educação, que professor não pode fazer mágica, não é? Se os nossos políticos, se eles não priorizarem a educação, nós não vamos conseguir chegar, também, a nenhum resultado positivo nesse aspecto. (Violeta).

A sua [do professor] vida particular, ela é quebrada, então isso provoca um desgaste muito grande. Então essa saída não depende só da escola. Depende do professor sim, mas se o professor se organizar, sua classe ser organizada. Cobrar seus direitos, mas cumprir deveres. A gente só tem direito quando cumpre o dever, né? Então muitas vezes, nas nossas lutas... Nós nos organizamos para um movimento e o movimento não caminha, né? Porque falta o compromisso de um colega com o outro. (Margarida).

A “falta de base” dos alunos, que também dificulta as atividades interdisciplinares é um problema a ser resolvido em longo prazo, através da formação de uma base sólida de conhecimentos desde a educação infantil:

Não, eu acho que pra todo problema existe solução. Só que precisa ser trabalhado por muitos anos ainda para se ter um bom resultado. Principalmente... “começando lá de baixo”, como diz, da educação infantil. (Violeta).

Obstáculos psicossociológicos e culturais

A superação da acomodação dos professores, obstáculo psicossociológico e cultural citado com maior frequência, depende em primeiro lugar da atitude, da vontade de cada professor, de sua disposição para inovar e ampliar seu trabalho para além das “quatro paredes” da escola:

Tem coisa melhor do que se sentir útil? Não tem! Nós vamos projetar aqui “A paz na Escola Jardim do Éden”. O que é que a gente faz? Todo mundo fez aquela caminhada da paz, não foi assim? Muita gente se engajou, o aluno foi... mas, dentro da sala de aula, dentro da escola, como é que vamos fazer? Primeiro de que tudo, nós temos que ter vontade. De acertar ou de melhorar, pra que agente possa sair da sala de aula e dizer: “Hoje foi um show de bola! A nossa escola ta tranqüila, a nossa escola ta boa!” Não é não? Você acha que a nossa escola está boa? (Gardênia). Nós precisamos ter um campo de trabalho mais aberto, sair das quatro paredes. Nós não temos ainda como fazer de outra forma. Nós não temos recurso para um transporte, nós não temos recurso pra levar esse aluno “fora” da escola. Então só em quatro paredes também não se trabalha. (Margarida).

O individualismo, que cria dificuldades para o diálogo e impede a unidade, pode ser superado pelo aprendizado e prática do diálogo, de trocas com outros colegas de outras disciplinas e construção de parcerias que envolvam a participação e integração de todos.

Poderia superar através do quê? A gente conversar com os próprios colegas, né? Ter uma conversa assim com os colegas pra poder se integrar mais, chegar mais junto, né Wagner? (Hortência).

A interdisciplinaridade? A gente tem que ver o quê? Dar as mãos. Buscar o outro. Dar ideias. Eu posso... Você pode dar ideia pra mim: Gardênia, você pode trabalhar em História, a Matemática assim e assim... Eu também já posso cobrar de você a outra parte, gráficos, essas coisas...

Se eu fosse trabalhar, por exemplo, com a poupança. Com a poupança hoje, dentro da História. Eu ia pedir ajuda a você. A primeira coisa que ia saber é assim: que a poupança, a ideia de juntar dinheiro, ela vem da Grécia. O homem que tentou poupar. Então se você quisesse trabalhar com Matemática, você ia procurar pra mim, então a gente podia já fazer um projeto, né? Como ocorreu, como se desenvolveu, as consequências, tudo isso. (Gardênia).

É porque [a interdisciplinaridade] é um tema que já vem há tanto tempo sendo debatido na escola, sendo discutido, e a interdisciplinaridade é vista às vezes como a solução, pra tudo. Mas eu acho que muito mais que formular projetos, muito mais que discutir ideias, discutir teorias, eu acho que é a ação mesmo, a atitude. Se a gente não partir pra pôr em prática... E também eu acho que uma pessoa sozinha, ela não faz muita coisa não. (Rosa).

Então, isso aí, a única saída é essa: nós resolvermos nos unir e cada um fica na sua turma: turma de Português, essa aqui; turma de Matemática, essa aqui; turma de Ciências, essa aqui, e aí vai separando por turmas. (Jacinto).

Em relação ao conservadorismo do aluno, que foi educado segundo um paradigma disciplinar, fragmentado, é necessário um trabalho de conscientização, no dia-a-dia, sobre a interdependência das disciplinas do currículo:

[Falando a um aluno que questionou o fato dela começar as aulas de História com leitura e compreensão de texto]: Meu filho, mas se você não entender, você não sabe, você não vai aprender esse conteúdo. Porque a História, antes de tudo, tem que haver com que: com Português. Porque se você não souber ler você não sabe o que é que eu estou dando, não é verdade? (Dália).

Obstáculos de formação

Para o problema da carência de conhecimento teórico e prático sobre a interdisciplinaridade foram apontadas duas sugestões: uma interna e outra externa.

Existe a possibilidade de estudo em grupo, na escola, liderado pela coordenação pedagógica e/ou pelos professores, para aprofundamento e planejamento de atividades:

É preciso que haja alguém, dentro de uma coordenação pedagógica ou então... alguém que... que possa controlar o assunto da interdisciplinaridade, e ter reuniões , mesmo, com os professores, pra que os projetos possam ser realizados. Porque eu acho também que os professores, eles precisam... é... de uma explicação pra aqueles que não conhecem sobre o tema... e... a partir daí, (né?), criar. (Acácia).

A Secretaria da Educação poderia promover a realização de encontros pedagógicos para estudo, com participação de estudiosos da interdisciplinaridade:

Precisamos, nós todos os educadores, precisamos de encontros pedagógicos para estudo, com pessoas que nos facilitem essa compreensão. Porque geralmente os treinamentos que nós temos recebido (balança a cabeça): nós somos expectadores de nós mesmos! Nós precisamos de embasamento teórico. Nós precisamos estudar várias correntes. (Margarida),

Como superar os obstáculos metodológicos

Encontros e palestras com convidados, sobre como trabalhar a ID dentro de cada disciplina do currículo, também foram sugeridos para esclarecer as dúvidas metodológicas dos professores:

Seria bom que a gente tivesse oportunidade de conversar, de uma pessoa... dar uma palestra, dar opinião como a gente trabalhar nesse ano de 2006 (tem que aproveitar a Semana pedagógica; você mesmo pode fazer isso com a gente). Como trabalhar a História dentro da sua matéria? Matemática? (Gardênia).

Quem disse que as rosas não falam? Falam sim, e com os alicerces da sua vivência: na escola, na sala de aula, nos movimentos reivindicatórios. Nada mais justo, então,

do que abrir o máximo de espaço nessa Dissertação para que elas expressem/falem/exalem seus saberes, esperanças, temores, opiniões, críticas e sugestões.

CAPÍTULO7