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3.2 O Paradigma da Complexidade

3.2.2 Teorias do Pensamento Complexo

O Paradigma da Complexidade ―constitui-se a partir das Teorias do Pensamento Complexo, oriundas de diferentes áreas, como a Biologia, a Filosofia, a Física e a Informática‖ (COSTA, 2020, p. 314). A Teoria da Autopoiesis, apresentada no subcapítulo

anterior, é uma delas. Dentre outras, posso destacar também a Teoria do Caos, a Teoria da Atividade e a Teoria da Complexificação pelo Ruído, sobre as quais passo a discutir.

A Teoria do Caos, ao contrário do que o nome possa sugerir, preocupa-se em compreender como os sistemas aparentemente caóticos são (no fundo) ordenados (LEFFA, 2006b). Com base em Fialho (2011, p. 35), cabe lembrar que a palavra caos, de raiz protoindo-europeia, originalmente possuía o significado de ―aberto‖, ou de ―estar bem aberto‖. Embora o significado de ―caos‖ possa estar, ainda hoje, muito atrelado ao sentido de ―desordem‖, lembra Paiva (2007, p. 167) que, na mitologia grega, a palavra caos significa ―a origem de tudo‖, algo mais adequado ao contexto de uma teoria que trata do emergentismo,

Para Leffa (2009, p. 25), o emergentismo pode ser entendido como a tentativa de explicar de que maneira um sistema complexo se desenvolve. Quer dizer: um SAC, um sistema complexo – que pode ser desde um fenômeno da natureza (como as colmeias ou os oceanos) até as organizações sociais (como uma cidade, um país ou um curso de graduação em Letras na EaD, por exemplo) – é um sistema composto de partes que interagem entre si e que evolui num determinado período (LEFFA, 2009). Essa interação entre as partes de um sistema complexo, que leva à produção e à possível evolução de novos elementos, em ―efeito dominó‖, ou ―efeito cascata‖, é o próprio emergentismo (COSTA et al., 2019).

Apoiado na Teoria do Caos, Leffa (2006b) defende: torna-se evidente ―a ideia de que não existe um elo solto no universo; tudo está de alguma maneira relacionado‖ (LEFFA, 2006b, p. 22). Nesse sentido, a Teoria do Caos contribui para olhares interpretativos sobre fenômenos marcados por pequenas mudanças, que podem gerar (e, portanto, se relacionar a) grandes diferenças. Fenômenos tais quais: a decisão por formar-se educador, a opção por um curso EaD e o encantamento por determinada área de estudo, dentre muitos outros. Tais fenômenos podem ser pensados a partir da Teoria do Caos em função da sensibilidade extrema às condições iniciais e da imprevisibilidade que lhes são pertinentes (LEFFA, 2009; FIALHO, 2011).

Por sua vez, a Teoria da Atividade (TA), proposta por Leontiev, com base em Vygotsky, e desenvolvida atualmente por Engeström, é uma teoria que busca situar a ação humana dentro do contexto em que ela ocorre, determinar elementos que fazem parte desse contexto e identificar as relações que se estabelecem entre eles, segundo Leffa (2005; 2006b). À luz de tal teoria, toda atividade desenvolvida por um sujeito é sempre movida por um objetivo.

A apropriação desse objetivo dá-se sempre através de um instrumento, que pode ser tecnológico, como o livro, ou psicológico, como a linguagem. Como o sujeito não

age isoladamente, mas de modo coletivo, dentro de uma comunidade, existem normas que regem como o indivíduo deve agir dentro dessa comunidade, e normas para a divisão de trabalho que os membros devem adotar para que o objetivo seja atingido. O sujeito, o objetivo da atividade, o instrumento usado, a comunidade, as normas e a divisão de trabalho, tudo está intimamente relacionado, provocando reações entre si e mudando sua natureza em função do objetivo proposto, exatamente como acontece com os ingredientes quando são misturados para fazer o bolo. Se eu mudar um dos ingredientes ou alterar sua quantidade, o bolo sairá diferente (LEFFA, 2006b, p. 38-39).

Pelo exposto, reitero aqui minha noção de ―instrumento‖. Na TA, o instrumento é tudo aquilo que, acoplado ao sistema, pode afetar os demais elementos e, por conseguinte, a atividade como um todo. Fialho (2011, p. 61), sobre esse tópico, afirma: ―ao trocarmos um dos elementos da atividade por outro, estaremos redimensionando todo o esquema da atividade em contexto‖, como no caso de diálogo, ao substituir a carta por um e-mail, ambos vistos como ferramenta de ensino. A imagem a seguir (Imagem 4) é uma ilustração dos elementos constitutivos de uma atividade.

Imagem 4 – Esquema da Teoria da Atividade

Fonte: Leffa (2005, p. 24).

Cumpre elucidar que, evidentemente, nenhum elemento da atividade é estático, nem a própria atividade em si. A atividade como um todo é dinâmica, e a ilustração anterior seria, no melhor dos casos, uma breve fração dela, congelada para fins de observação de seus elementos constitutivos em interação.

Leffa (2005, p. 23), ao discorrer sobre a TA, explica que a interação entre um indivíduo e outro não se dá diretamente, ―mas através de um processo de mediação, com o uso obrigatório de um determinado instrumento, que pode ser a própria língua ou algum artefato

social como o livro ou o computador‖. Portanto, a TA é potente em ver a ferramenta (ou instrumento) como ―um processo de mediação entre o sujeito e o objeto do conhecimento‖ (LEFFA, 2005, p. 22).

Finalmente, vale mencionar a Teoria da Complexificação pelo Ruído, de Henri Atlan (1992). Com desdobramentos da proposta de von Foerster de ―order from noise‖, ou ―ordem pelo ruído‖ (GUSTSACK; PELLANDA; BOETTCHER, 2017, p. 19), Atlan criou a Teoria da Complexificação pelo Ruído valendo-se dos estudos da cibernética complexa.

De acordo com von Foerster (2003), a ordem potencializa a organização do indivíduo, enquanto que, para Atlan, os ruídos permitem a complexificação do indivíduo, possibilitando a atribuição de sentidos a sua realidade através de processos de complexificação. Destarte, com foco na educação e na aprendizagem por ruído, Atlan (1992) optou por trabalhar usando o princípio da auto-organização como suporte fundamental da sua teoria,

e daí chega à complexidade abordando o papel do observador. Para ele, o mundo físico mostra-se num movimento sem ordem, aleatório, que não faz nenhum sentido para um observador externo. Mas, uma vez incluído esse observador, emerge o sentido a partir da ação efetiva na ordem viva posicionando-se como alguém que inventa o mundo e não o contempla de fora simplesmente. A partir daí, ele vai formular o ―princípio da complexificação pelo ruído‖ usando para isso o pressuposto da dimensão significativa dos seres vivos (PELLANDA et al., 2017, p. 132). Tratando de aprendizagem não dirigida e com base em pressupostos cibernéticos, Atlan (1992) nos permite definir a aprendizagem como um conjunto de interações de um sistema vivo que se mantém vivo porque consegue se auto-organizar face aos ruídos perturbadores do meio, transformando essas perturbações em padrões criativos que aumentam a diferenciação do sistema, tornando-o mais capaz de enfrentar novos ruídos (GUSTSACK; PELLANDA; BOETTCHER, 2017). Então, ―Com esse trabalho do sistema emergem processos de complexificações sempre crescentes‖ e sempre em devir (GUSTSACK; PELLANDA; BOETTCHER, 2017, p. 23).

Essas e outras teorias – como a Teoria dos Sistemas Complexos e a Teoria da

Autopoiesis, esta última já introduzida – compõem o Paradigma da Complexidade. São teorias

que, em comum, apresentam a oposição à lógica simplificadora-determinista-linear e servem ao propósito de interpretação dos sistemas complexos.