transição (norte de Vimioso) e o Planalto Mirandês (Miranda do Douro e sul de Vi- mioso).
O isolamento é um dos problemas que mais atinge o território, que tem sofrido um acentuado decréscimo populacional.
Património
Gastronómico
Destaca-se a Carne Mirandesa – DOP, proveniente de bovinos da raçã homóni- ma, que se alimentam em pastagens na- turais da região, acima dos 500 m de alti- tude. A carne é excecionalmente tenra e suculenta e possui aromas e sabores que a diferenciam de qualquer outra carne de bovino. Como é referido no livro de Al- fredo Saramago e António Monteiro, Co-
zinha Transmontana, “contrariamente ao
que acontecia nas outras províncias, em Trás-os-Montes comia-se carne de vaca com abundância. E não eram só as comu- nidades mais providas de dinheiro que a consumiam.(...) A posta mirandesa é um exemplo do consumo de carne de vaca pe- las classes populares.”
Pode degustar-se a excelente posta mirandesa nos quatro concelhos da Terra Fria: Vinhais, Bragança, Vimioso e Mi- randa do Douro.
O castanheiro assume o papel de
ex libris da paisagem local, sendo a produ-
ção da castanha uma atividade estratégica para a economia do nordeste transmon- tano. Estudos recentes confirmam que o castanheiro europeu pode ter aparecido em Portugal em época bem remota, há largos milhares de anos, muito antes da chegada dos romanos à Península Ibé- rica. O castanheiro é caracterizado por uma ampla variabilidade genética, com numerosos ecotipos espalhados por Por- tugal, particularmente em Trás-os-Mon- tes, onde existem duas DOP: Castanha
da Terra Fria – DOP e Castanha dos Soutos da Lapa – DOP. Nesta região
localiza-se mais de 85 por cento da área de castanheiro em Portugal. No território
da Terra Fria, é sobretudo no concelho de Vinhais e Bragança que o cultivo da castanha assume maior expressão, sendo a Longal e Judia as variedades regionais características. Produto presente em vá- rias tradições transmontanas e receitas típicas da região, destaca-se a receita de
Javali no Pote com Castanhas, onde se
testemunha a sua associação a pratos de caça grossa, presença natural neste terri- tório montanhoso. A castanha também é utilizada na engorda e acabamento dos suínos da raça Bísara.
Outra especialidade gastronómica da Terra Fria são os Cuscos de Vinhais. Os cuscos, denominação local para o cuscuz, têm origem magrebina e já eram popu- lares no Portugal do século XV, como comprovam alguns textos de cronistas do século XVI. Eram utilizados nas aldeias da zona de Vinhais desde o século XVIII, como substituto do arroz, costume que terá sido herdado dos hábitos alimentares dos judeus que por ali viveram.
Os grânulos podem ter diferentes dimensões. O granulado mais miúdo é usado na preparação de caldos ou sopas, com ou sem leite, e na confeção dos cus- cos doces com passas de uvas, iguaria semelhante ao arroz-doce. O granulado graúdo é utilizado em várias receitas, destacando-se os Cuscos com Chouriça (ou com bucheira). Triturando os cuscos,
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A batata veio substituir o nabo e a cas- tanha nas tradições alimentares de Trás- -os-Montes, pelo que foi chamada “cas- tanha da terra”, tendo então provocado grande transformação na dieta alimentar regional. O cultivo da batata é extensível a todo o território da Terra Fria, no en- tanto, nos últimos anos tem-se vindo a assistir a um decréscimo da respetiva área e da produção.
Na Terra Fria Transmontana salien- ta-se também a existência de várias es- pécies de cogumelos que localmente as- sumem diferentes nomes: “os frades ou roques (os mais conhecidos); os chapéus de sol ou febras; os cardielos, cantarelos, míscaros ou cristas de galo; as pinheiras, telheiras ou sanchas; as manitas de César, manitas laranja ou amarelo de ovo (um dos melhores e mais apreciados); os ce- pes; e as geribóilas (que crescem nas vi- nhas, sobretudo em terras de Miranda)”.
Nos doces, a Bola Mirandesa cons- titui uma referência na região, sendo es- pecialmente consumida na Páscoa. Ao contrário da maioria dos folares, trata-se de um doce húmido. A massa é igual à do pão, mas mais fina e intercala-se com ca- madas de açúcar e canela. No final a bola deve ser bem fechada.
é possível criar uma pequena massa, que é posteriormente cozida, formando os Carolos, que se comem polvilhados com açúcar ou mel e canela.
Do fumeiro da Terra Fria salienta-se a alheira, chouriça, salpicão, butelo e ou- tros enchidos que são produtos típicos em todo este território. Sendo que em Vinhais vários são IGP: o Salpicão de Vi- nhais, a Chouriça de Carne de Vinhais a Alheira de Vinhais o Butelo de Vinhais, o Chouriço Azedo de Vinhais, a Chouriça Doce de Vinhais e o Presunto de Vinhais. O salpicão é o enchido de carne do lombo e lombinho do porco bísaro, com a qual se faz uma adoba de vinho, água, alho, sal, loureiro e colorau, introduzida em tripa grossa de porco. Só se encontra na mesa das casas mais ricas e só em ocasiões espe- ciais. Bem curado, cortado em rodelas fi- nas, acompanha com pão de trigo caseiro e vinho tinto e pode ser intervalado com azeitonas curadas.
Noutros tempos, quando os meios de conservação eram escassos, as pessoas colocavam o salpicão num pote de barro, mergulhado em azeite, no fundo da tulha
e coberto por vários alqueires de cereal. Este método permitia conservá-lo durante muito mais tempo, mantendo o sabor e to- das as características organoléticas.
O Butelo de Vinhais – IGP é o es- tômago (bulho) do porco onde se intro- duzem os ossos tenros da costela e do espinhaço, ainda bem cobertos de carne, depois de temperados em “adoba” (com sal, alho, vinho, louro e colorau) durante três ou quatro dias. No fumeiro de Vinhais salienta-se o tempero com vinho; em Mi- randa do Douro e Vimioso substituem o vinho por água; em algumas zonas do concelho de Bragança e Vinhais utilizam água e vinho. Com o butelo, prepara-se um prato muito típico em toda a região da Terra Fria: o Butelo com Cascas.
Os Pastéis do Entrudo de Vinhais são habitualmente confecionados no sábado de Entrudo e consumidos até à terça-feira de Carnaval. Na preparação da finíssima massa utiliza-se farinha de trigo, azeite e sal. O recheio é preparado com carne de vitela, presunto, chouriça de carne, ovos cozidos e salsa. Têm a forma de meia-lua e assemelham-se aos pastéis de massa tenra.
sabia que...
Logo que a batata desembar‑ cou em Trás‑os‑Montes (fim do século XVIII, principio do século XIX), rapidamente destituiu a castanha e, inclusive, muitas hortaliças, como os nabos e as abóboras (favas e lentilhas) na maioria do receituário da região, principalmente no das “Terras Frias Transmontanas”.
Glossário
Adoba – termo regional também usado para designar a marinada com que se temperam os enchidos.
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sopas
Caldo de Cascas
INGREDIENTES
1 kg cascas 1 salpicão 1 linguiça 1 chouriça 200 g presunto Unto q.b. 250 g macarrão Sal Azeite BatatasPREPARAÇÃO
Leva-se uma panela ao lume com as cascas, a linguiça, o salpicão, o presunto, um pouco de unto; tempera-se com sal e azeite e deixa-se cozer.
Depois de cozer um pouco, muda-se a água e deixa-se cozer de novo, aproxima- damente 1 hora.
Quando cozidas, retiram-se as carnes da panela, desfiam-se e juntam-se algu- mas batatas às cascas, deixando cozer.
Quando cozidas, esmagam-se as batatas com um garfo e juntam-se as carnes devi- damente desfiadas e o macarrão.