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A tevê educativa na contemporaneidade

No documento PUC-SP VILMA SILVA LIMA (páginas 125-135)

Ao iniciar mais um capítulo desta pesquisa, novamente, busca-se amparo conceitual na teoria de campo de Bourdieu. Pode-se afirmar que a tevê educativa, junto com outras de caráter público, configura-se como um subcampo, parte de um

campo maior, o da televisão; este, por sua vez, constitui-se, como determina a Lei, a partir dos três sistemas de radiodifusão: o público, o estatal e o privado.

Segundo Bourdieu (2005), uma empresa55 constitui-se de um subcampo que goza de uma relativa autonomia em relação ao campo que a engloba.

As estratégias das empresas não dependem somente da posição que elas ocupam na estrutura do campo. Elas dependem, também, da estrutura das posições de poder constitutivas do governo interno da firma ou, mais exatamente, das disposições (socialmente constituídas) dos dirigentes agindo sob pressão do campo do poder no seio da firma e do campo da firma em toda sua totalidade (que se pode caracterizar através de índices, tais como a composição hierárquica da mão de obra, o capital escolar e, particularmente, científico do quadro executivo, o grau de diferenciação burocrática, o peso dos sindicatos, etc.) (Bourdieu, 2005:42).

Para entender a constituição e consolidação de um subcampo em determinado

campo, Bourdieu sugere que se analise tanto o subcampo, em relação ao campo, quanto o próprio subcampo, enquanto um campo relativamente autônomo. Notadamente, o campo televisivo está situado em um campo ainda maior que é o da Comunicação Social, porém, em função de sua importância para a sociedade, ganhou autonomia e legitimidade em relação ao campo da Comunicação Social. Pode-se observar isso em várias partes do mundo, no entanto, no Brasil, a tevê tem presença decisiva em diversas áreas. Desde os anos de 1970, a tevê é um importante instrumento econômico, cultural e ideológico. É também objeto de estudos em diversas áreas do conhecimento. Já o subcampo da televisão educativa (TVE), no qual se podem incluir os canais universitários, essa autonomia e presença é quase ínfima.

55 Em função de seus estudos sobre o mercado de casa própria na França, Bourdieu (2005) propõe

uma teoria econômica como ciência histórica. Para ele, o mercado é o produto da construção social da oferta e da construção social da demanda, para as quais o Estado contribui decisivamente, em particular nos aspectos jurídicos (Bourdieu, 2005).

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A história das televisões educativas no mundo e no Brasil está vinculada diretamente à história da televisão como um todo. Tanto no modelo americano quanto no europeu, as tevês educativas foram decorrência imediata do aparecimento deste meio. A televisão, na Europa, nasceu pública, vinculada às ideias da teoria crítica, diferentemente dos Estados Unidos, país no qual o meio surgiu no bojo de teorias que buscaram compreender as funções da tevê para a sociedade e, particularmente, para os proprietários, interessados em desenvolver propósitos comerciais. Se na Europa a tevê deveria cumprir sua função de formar um cidadão crítico de sua sociedade, com informações suficientes para tomar decisões em seu benefício e do coletivo e sem fins lucrativos e comercias, nos EUA, nasceu como auxiliar de um sistema econômico em expansão, em busca da demanda reprimida com o pós-guerra (Gordon, 1967).

As implicações do modo como cada nação enxergou o meio ficam evidentes ao se analisarem as TVEs dentro do contexto da radiodifusão. Nos países em que o modelo de referência é o americano, ou seja, com fim comercial e de incentivo ao lucro, as TVEs erguem-se às margens do processo. Nos EUA56, por exemplo, a tevê educativa ficou limitada às instituições de ensino, e seu uso circunscrito, basicamente, a circuitos fechados, ou seja, ao próprio ambiente acadêmico. A rede americana Public Broadcasting Service (PBS), que congrega as emissoras públicas com fins educativos e culturais, surgiu em 1967 e, até hoje, é limitada em sua abrangência e atuação (Intervozes, 2009). Por outro lado, na maior parte dos países da Europa, nos quais coube ao Estado o gerenciamento da TV em benefício do cidadão, o que implica na utilização do meio sem distinção de classe, sem qualquer fim comercial e voltado para a formação social do indivíduo, a tevê já nasceu educativa.

56 Registros históricos sugerem que as primeiras transmissões do que se pode chamar de tevê

educativa ocorreram em 1932, quando alguns professores e estudantes de uma universidade localizada no centro-oeste dos Estados Unidos comunicaram-se por meio de uma estação experimental criada por alunos de engenharia eletrônica. Essa estação veiculou cerca de 400 programas, incluindo cursos de arte, taquigrafia, engenharia, arte dramática, entre outros, no período de 1932 a 1939. A partir de tal experiência, várias outras universidades americanas se interessaram pela novidade, já que, mesmo havendo dificuldades relativas à qualidade técnica e à aquisição dos aparelhos receptores, a televisão educativa inseriu-se na vida das pessoas, atraindo-as para o consumo das mensagens audiovisuais. (Lima, 2002:43)

112 O rádio e a televisão são veículos da produção cultural de um povo ou de uma nação e, para exercerem essa tarefa, não podem ser contaminados por interferências políticas ou comerciais. Ainda que marcada por uma forte dose de purismo, foi essa a concepção que sustentou durante quase sessenta anos o modelo de rádio e de televisão adotado na Europa ocidental (Leal Filho, 1997:17).

Esta exposição acerca do modelo europeu de televisão revela que, na intenção, as televisões europeias nasceram com foco no cidadão e, consequentemente, mais próximas de um conceito de tevê educativa. Contudo é importante observar que o modelo adotado pelos europeus não resistiu à era dos satélites – a tevê americana atravessou oceanos e aportou na casa dos cidadãos europeus. Com isso, em pouco tempo, as tevês estatais europeias foram obrigadas a se adaptarem. Recentemente, inclusive, abriram espaço para comercialização e processos de privatização.

Algumas peculiaridades do caminho das TVEs, no entanto, são singulares e devem ser lembradas. Trata-se de uma trajetória que carrega em si paradoxos e dilemas, transcendendo as tevês convencionais, no que tange tanto à amplitude de análise quanto à complexidade do seu contexto. Não é uma história autônoma, e o seu desenvolvimento é marcado por inúmeras influências. Pode-se dizer que a televisão comercial, em curto tempo, começou a andar com suas próprias pernas, recursos e conquistas. Já a televisão educativa esteve sujeita a tantos fatores que sua história se organiza a partir de fusões de outras histórias. O movimento das tevês educativas permeia a relação entre comunicação e educação, as oscilações teóricas de ambas as áreas, os períodos histórico-sociais, o desenvolvimento dos modelos americano e europeu de se fazer e pensar televisão, entre outros aspectos relevantes para a história do meio.

Com relação, especificamente, ao conceito de televisão educativa, segundo Gordon (1967), no início das reflexões acerca deste tema, o conceito televisão

educativa não dizia respeito às emissoras voltadas para fins educacionais, mas, sim, a toda forma de veiculação, via televisão, de programas e projetos que visavam ao ensino. ―O uso popular permitiu ao termo televisão educativa compreender quase todo tipo de programa educacional de televisão, apresentado para qualquer finalidade educativa ou que tente ensinar alguma coisa‖ (Gordon, 1967:14).

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Ainda que sem especificar limitações de alcance ou desvendar qualquer pista sobre a programação, o conceito estabelecido pela Federal Communications Commission - FCC57, nos EUA, em 1963, para o Serviço Fixo de Televisão Educativa, constituiu-se como o embrião do que se entende como a finalidade de uma tevê educativa. Segundo esse órgão, a finalidade primordial deste modelo de tevê é transmitir matéria educativa visual e sonora a determinados locais receptores: escolas públicas e particulares, faculdades e universidades e outros centros de instrução para a educação formal dos alunos (Burke, 1974:151).

Nota-se, nessa definição, uma característica bastante peculiar no que diz respeito à tevê educativa norte-americana, em comparação à europeia e à brasileira. A televisão educativa americana está diretamente vinculada a instituições de ensino ou de interesse social. Já, nos países da Europa, as próprias emissoras são as responsáveis pela programação educativa e esta é veiculada a toda sociedade indiscriminadamente. No Brasil, a opção foi pelo total atrelamento ao Estado: os colaboradores são funcionários públicos, suas diretorias são indicadas pelo governo, sua programação é definida nos padrões de controle social e de políticas governamentais. No entanto, sua veiculação abrange todo cidadão que disponha de sinal de tevê.

No Brasil, essa modalidade de tevê surgiu após duas décadas da chegada da tevê ao país, quando, em 1967, o Conselho Nacional de Telecomunicações (CONTEL) aprovou o Decreto Lei nº 236, de 1967, instituindo a existência da televisão educativa, cujo objetivo era a divulgação de programas educacionais sem caráter comercial ou de publicidade. Segundo Valente (2009), essa modalidade de tevê nasceu da intenção dos militares de constituir um sistema de educação de massa através da televisão, corroborado pela acelerada industrialização e consequente carência de mão de obra qualificada a partir de meados dos anos 60. Nesse sentido, a TVE foi vista como um veículo capaz de massificar a educação, na medida em que ela apoiaria a educação formal e permitiria que parcela da população excluída do sistema oficial de ensino fosse incluída (Beltrán 2002). ―Os meios de radiodifusão e televisão são meios eficientes para realizar programas educativos destinados a grupos de população distribuídos sobre grandes extensões territoriais (MEC 1982:17).

57 Órgão regulador do campo de telecomunicações e radiodifusão dos Estados Unidos. Entre suas

competências registra-se a fiscalização do espectro norte-americano de radiodifusão e a atribuição de canais de rádio, tevê e serviços de telefonia. Equivale, aqui no Brasil, à ANATEL.

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Sobre o mesmo assunto, numa outra direção, Fradkin (2003) acredita que a tevê educativa foi criada sem planejamento e, portanto, sem um norte que a direcionasse.

A televisão educativa foi implantada, no Brasil, sem obedecer a um planejamento que decorresse de uma política setorial de Governo. Algumas emissoras tiveram como raiz de sua criação razões de ordem política, outras deveram sua existência à tenacidade individual de idealistas, e poucas foram as que surgiram com objetivos explicitamente definidos (Fradkin 2003:56).

A radiodifusão educativa, no Brasil, nasceu a partir da consolidação da Rádio MEC (Ministério da Educação e Cultura), nome dado à Rádio Sociedade do Rio de Janeiro, que, em 1936, foi doada ao governo federal, por Edgar Roquete Pinto, que vinculou a transferência à manutenção de seu caráter educativo e à vinculação administrativa da emissora ao Ministério da Educação e Cultura. Até hoje a emissora vem sendo operada pelo executivo federal nesses moldes.

Segundo Valente, o principal estímulo para o surgimento de um conjunto de televisões de caráter educacional, diferentemente do que aconteceu em outros países, não ocorreu em função da necessidade de informação, cultura e entretenimento, visto que as tevês comerciais tinham legitimidade nesse tipo de conteúdo, e, sim, pela ―demanda por educação, visto que o país experimentava, na época, uma industrialização bastante acelerada e para a qual não havia mão de obra qualificada num cenário de crescimento populacional relevante‖ (Valente, 2009:270).

Em 1967, além do Decreto-Lei nº. 236, que legislava acerca das tevês educativas, foi criada a Fundação Centro Brasileiro de TV Educativa (FCBTVE), órgão voltado ao fomento da programação educativa. Nesse mesmo período, iniciou-se a implantação de emissoras de caráter educativo por parte dos governos estaduais, com a criação da primeira tevê educativa do país, a TV Universitária do Recife. Logo depois, em 1969, o governo do Estado de São Paulo adquiriu a TV Cultura, do grupo Diários e Emissoras Associados, e organizou a emissora que se tornaria a mais bem sucedida entre suas congêneres estaduais. Enquanto os governos estaduais construíam suas televisões educativas, o governo federal, por meio da FCBTVE, atuava como um centro de produção de programas educativos. Para referendar essas produções, em 1972, o Ministério da Educação – MEC - implantou o Programa Nacional de

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Teleducação (Prontel), que passou a coordenar e organizar as atividades de teleducação no país.

Em 1973, a FCBTVE produziu João da Silva, a primeira novela pedagógica destinada aos alunos do ensino de 1º Grau, atual ensino fundamental, que, curiosamente, foi veiculada primeiramente por emissoras comerciais - TV Globo e TV Rio. Somente em 1976, após a criação da TVE do Rio de Janeiro, que ocorrera um ano antes, ou seja, em 1975, a obra passou a ser veiculada por uma tevê educativa. Segundo Valente (2009:271), a TVE do Rio de Janeiro constituiu-se como ―janela de veiculação da produção da FCBTVE‖. Esse modo de administrar a programação educativa, por parte do governo federal, porém, começou a mudar ao longo da década de 1970, mais precisamente, a partir de 1975, com a aprovação da Lei nº. 6.301, que institui a Empresa Brasileira de Radiodifusão (Radiobrás), órgão responsável pela exploração dos serviços de rádio e TV do governo e da TVE do Rio de Janeiro. A partir daí, o executivo federal passou a atuar como operador direto de emissoras e não mais apenas como produtor de conteúdo.

De 1968 em diante, com a inauguração das primeiras televisões educativas, e com a disponibilidade de canais exclusivos58 para emissoras dessa natureza, muitas Secretarias de Estado da Educação interessaram-se pela implantação de sua televisão. Segundo Fradkin (2003), entre os anos de 1967 e 1974, surgiram nove emissoras educativas, cuja razão social e vinculação eram as mais diversas, como pode ser verificado no quadro abaixo, citado por Fradkin, (2003:56):

58 ―[...] em 1965 o Ministério da Educação solicitou ao Conselho Nacional de Telecomunicação

(Contel) a reserva de 100 (cem) canais de televisão para fins educativos – 50 VHF e 50 UHF)‖ (Nunes, 1987).

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Quadro: 15 – Emissoras Educativas - vinculação

Emissora Razão Social Vinculação

TVE do Amazonas Fundação Pub. Estadual Sec. Comunicação

TVE do Ceará Fundação Pub. Estadual Sec. Educação

TVE do Espírito Santo Fundação Pub. Estadual Sec. Educação TVE do Maranhão Fundação Pub. Estadual Sec. Educação

TVU de Pernambuco Universidade Federal Ministério da Educação TVE do Rio de Janeiro Fundação Pub. Federal Ministério da Educação TVU do Rio G. do Norte Universidade Federal Ministério da Educação TVE do Rio G. do Sul Admin. Direta Estadual Sec. de Educação TV Cultura de São Paulo Fundação Priv. Estadual Sec. de Cultura

No entanto, mesmo considerando o crescimento - mais de uma ao ano - em tão pouco tempo de existência, e, portanto, o interesse que o empreendimento provocou nos estados, não se pode desconsiderar as críticas em relação ao seu desenvolvimento. Segundo Carmona (2006), as televisões educativas criadas na década de 1970 foram usadas como tábua de salvação para a educação e como instrumento político.

No Brasil, há mais de quatro décadas no ar, essa modalidade de tevê continua merecendo debates acalorados e, muitas vezes, apaixonados acerca de sua missão e qualidade. Miola (2009:45), citando a Comissão Carnegie, que analisa a tevê educativa dos EUA, faz constar que, ―[...] na soma do que apresenta, [a televisão] é profundamente educativa, como o é a própria vida, e tanto mais porque não há um sumário formal que possamos consultar para apurar o que aprendemos‖. Tal afirmação deixa evidente a necessidade de analisarmos a televisão educativa brasileira, que apresenta deficiências relativas a diferentes aspectos, como sustentação financeira, descontinuidade de gestão, falta de legitimidade e de reconhecimento do seu papel social. Esse diagnóstico fica evidente na avaliação de Jambeiro:

117 A despeito de tanto suporte legal, a TV educativa atravessou a segunda metade do século XX desacreditada e fortemente criticada por ineficiência; chegou-se a dizer que ela gastava muito dinheiro para fazer nada. Sua programação carece de coerência. [...] No que se refere a sua missão educativa, alguns críticos argumentam que com os recursos que ela gastou durante sua existência teria sido mais barato e provavelmente mais eficiente pagar um professor particular para cada um de seus alunos, ou mandá-los estudar nas melhores escolas privadas (Jambeiro, 2001:124).

A programação nessa modalidade de tevê teve, como base de formato, a reprodução do modelo convencional da sala de aula, ou seja, a lousa e o giz. Pouco se criou. Ocorreu, na verdade, uma transposição simples do que se fazia em sala de aula para a mídia televisiva. As aulas eram veiculadas, basicamente, pela manhã, com conteúdos da educação formal, o que causava desinteresse para o restante da audiência. Este modelo, segundo observa Fernández (2002:161), demonstrou- se incompatível com a realidade educacional e as especificidades da mídia televisiva: ―a cobertura maciça da mídia é incongruente com a audiência segmentada dos telealunos‖. No ambiente escolar, por sua vez, esses programas igualmente não cumpriam seus objetivos educacionais pela carência de equipamentos de recepção nas salas de aula, de videotecas e de formação dos professores.

É importante, também, destacar que a própria legislação referenda o modelo educativo como reprodutor de ―aulas, conferências e debates‖ (decreto 236, de 28 de fevereiro de 1967). Acerca deste modelo, previsto em lei, Muylaert afirma que:

A TV Cultura optou por ser uma televisão de cunho educativo, mas não strictu sensu, que são programas educativos por sua própria natureza. Mas o que é importante é que nós temos a preocupação de que a televisão seja educativa em toda a sua programação [...] eu falo de programas que deem uma contribuição para a sociedade e, para isso, nós procuramos sempre pesquisar, fazer painéis, pesquisas qualitativas, onde a gente busca saber como essa programação esta sendo recebida e quais são os anseios da sociedade em nosso estado [...] O conceito da TV educativa é um conceito que está se modificando no mundo inteiro [...] Quando a gente faz um documentário sobre o Marechal Rondon, sobre energia elétrica, que leva meses para fazer e ninguém faz, esse programa é educativo [...] aqui se repassa todo o conceito de TV educativa, sem ser o velho conceito que afugenta o telespectador (Muylaert, 1995:83).

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Somente a partir da década de 1970 compreendeu-se que a linguagem televisiva é mais eficiente quando usada a partir da ficção e da identificação emocional, cabendo, portanto, a conceituação e a rememoração à linguagem escrita.

A TV opera com uma linguagem lúdico-afetiva e dramática, que tem características associativas, polissêmicas, sugestivas e glamurosas, e que envolve mais a fantasia e o desejo, do que a razão analítica; ou seja, a linguagem televisiva tem uma eficácia própria, que pode ser complementar e enriquecedora, mas não é sinônimo da linguagem verbal e escrita da escolaridade, nem a substitui (Fernández, 2002:163).

Leal Filho (1997), em relação a esse assunto, diz que o surgimento do sistema educativo de televisão, no Brasil, foi de interesse das emissoras privadas, pois, com a tevê educativa, elas se viram desobrigadas das tarefas culturais e educacionais exigidas por lei. A legislação brasileira, referendada pela constituição de 1988, ratificou o caráter público das tevês quando, em seu Artigo 221, fez constar que a televisão – aqui se referindo a todas as modalidades de tevê, independentemente de ser educativa ou não – deve:

1. Dar preferência a finalidades educativas, artísticas culturais e informativas;

2. Promover a cultura nacional e regional e estimular a produção independente que objetive sua divulgação;

3. Regionalizar a produção cultural, artística e jornalística, conforme percentuais estabelecidos em lei;

4. Respeitar valores éticos e sociais da pessoa e da família.

Na teoria todas as tevês - públicas, estatais ou privadas - têm fins educativos, porém, não é isso que ocorre; o que se vê é um grande distanciamento do que diz a lei, uma vez que as emissoras privadas têm sua programação orientada pela audiência, o que leva à busca incessante por mais telespectadores e valorização dos espaços publicitários em detrimento de uma programação que tenha autonomia em relação aos índices de audiência. Para Bourdieu (1997), o índice de audiência exerce um efeito absolutamente particular sobre a televisão. As tevês estatais, por outro lado, na maioria das vezes, configuram-se como uma espécie de vitrine eletrônica, pela qual as ações governamentais são apresentadas à sociedade.

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Seguindo o modelo dos EUA, a televisão brasileira jamais foi entendida como um bem público. A tevê, de acordo com a legislação, mesmo em se tratando de um serviço de utilidade pública, baseado em concessões, sempre esteve na esfera da exploração privada, permanecendo o Estado como regulador das atividades. Com isso, estimulou-se uma produção de massa vinculada ao entretenimento, compatível com os parâmetros ditados pelo mercado de consumo. Para Lopes (2000), a televisão brasileira atingiu um padrão de excelência, no que tange à qualidade técnica e estética, que a coloca entre as mais bem conceituadas do mundo. No entanto essa mesma eficiência não é vista quando se trata dos aspectos jurídicos relativos à sua regulamentação. Sobre a legislação brasileira afirma:

[...] comparada à legislação de outros países, a brasileira é de um laconismo que reflete com perfeição a falta de consciência da relevância do meio televisivo no mundo contemporâneo e, consequentemente, a responsabilidade social subjacente ao exercício

No documento PUC-SP VILMA SILVA LIMA (páginas 125-135)