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A trajetória de vida dos educandos jovens e adultos do ProJovem de Brazlândia.

2 PRESSUPOSTOS METODOLÓGICOS

2.11 A trajetória de vida dos educandos jovens e adultos do ProJovem de Brazlândia.

Para começar a relatar a história de vida de cada aluno participante da pesquisa, gostaria de tomar emprestado um trecho de uma narração feita por um aluno participante do Projeto do Paranoá relatado por Reis (2000).

Estou cansado, sinto-me desanimado. Como é difícil a vida aqui na capital da esperança. Mas, o que fazer? Sentar, olhar, deixar a vida passar. Esta é a minha vontade. Mas deixar como está, para ver como fica, se tenho de trabalhar, para alimentar mulher e filhos, lugar para morar, escola para filho estudar? Vou atrás de trabalho, mas não sei ler e escrever e para trabalhar tem que saber ler e escrever. Outro aperto. Que fazer? Ouvi dizer que tem uma escola por aí. Vou atrás, mas lá me dizem que vou aprender a ler, escrever, calcular e participar de uma luta de moradores, que eu nem sabia que existia, pois pouco falo, converso, troco idéias. A maior parte do tempo converso é comigo mesmo. (p. 226)

Dados empíricos e de pesquisas (REIS, 2000) revelam que é nessa realidade que grande parte dos alunos que chegam à educação de jovens e adultos estão inseridos. Uma realidade, muitas vezes cruel, que não respeita e não acolhe: apenas exclui. Exclui por vários motivos, principalmente por não dominar a tecnologia da leitura, da escrita e do cálculo.

Ao observar a história de vida dos alunos que atuaram como sujeitos dessa pesquisa, vê-se que existem algumas semelhanças e algumas diferenças com a história contada por Reis (2000) na citação acima, mas o sentimento, muitas vezes, de cansaço, de desânimo, de luta e de injustiça é constante entre esses jovens.

Como professora e pesquisadora ao mesmo tempo, sinto a necessidade de conhecer um pouco mais sobre cada aluno e, por acreditar que essa é uma necessidade indispensável para esse trabalho, procurei conhecer e participar da história de vida que mostra o passado, desafia o presente para se refletir no futuro. E eu espero que a minha contribuição seja para um futuro muito melhor. Reis (2000, p.144) destaca que: “Na narrativa de cada sujeito, uma história. Em cada história, um processo de desenvolvimento”. É nisso que eu, enquanto professora e pesquisadora, acredito.

Essa atividade foi desenvolvida no dia 30/05/2007. Primeiramente os alunos foram filmados contando a sua história de vida. Para isso, formulei algumas questões que abrangessem: sua infância, sua adolescência e sua vida adulta. Nessa atividade, optei por um direcionamento maior, em relação às falas dos alunos. Essa decisão deu-se, porque tive medo

de que eles não abordassem pontos importantes para o trabalho, tais como: a questão escolar e o motivo que os levou a deixar a escola fundamental sem conclui-la. Além desses motivos, acredito que esse direcionamento ajuda a desenvolver a fala do aluno e contribui para que ele tenha idéias na hora de produzir o texto escrito, que seria a segunda atividade a ser desenvolvida após a filmagem.

A produção da história de vida individual foi desenvolvida em dois momentos, assim distribuídos: (i) entrevista oral, na qual os alunos tinham que falar um pouco sobre a sua história de vida e (ii) a produção de um texto escrito também sobre o mesmo tema. Aqui serão apresentados resumos das histórias orais, visto que elas abarcam melhor os assuntos que eu gostaria que fossem contemplados. Cada história narrada pode ser lida na íntegra nos anexos desta pesquisa. Os objetivos dessa atividade foram: (a) conhecer a trajetória de vida de cada aluno e (b) retomar a questão dos estudos, buscando conhecer qual foi o caminho percorrido pelo aluno até chegar ao ProJovem.

Inicialmente, os alunos estavam nervosos e com muita vergonha, pois eles estavam sendo filmados individualmente. Porém, observou-se que, no decorrer da atividade, alguns foram se soltando e relatando fatos bem pessoais e decisivos em suas vidas.

2.11.1 A história de vida de cada aluno participante da pesquisa

A seguir será apresentada a história de vida de cada participante desta investigação. Cada história foi dividida, observando as principais fases da vida de cada aluno: a infância, a adolescência, a vida adulta. Foi dado um enfoque especial à questão escolar, já abordada no primeiro questionário aplicado no início da pesquisa.

Os participantes da pesquisa são jovens pertencentes a famílias brasilienses e moradores da cidade satélite de Brazlândia. A primeira aluna, chama-se Laura (nome fictício), é filha adotiva, é casada há quatorze anos e tem uma filha.

Quando relembra essas fases de sua vida, a aluna afirma que o fato que mais marcou sua infância foi a presença constante de seu pai, e o que mais a fez sofrer foi o falecimento dele ainda quando ela era pequena. Já na adolescência, dois acontecimentos foram muito importantes para a educanda. Primeiro, a construção de sua família ao lado de seu marido e depois, o nascimento de sua filha.

Em relação à vida adulta, Laura afirma que o seu maior desejo é concluir seus estudos e no futuro cursar uma faculdade de estilismo. Segundo a aluna, esse desejo fora adiado devido à sua gravidez que a impediu de concluir os estudos em tempo hábil e por causa de um

problema que aconteceu com ela quando ia para a escola, que fez com que ela ficasse um bom tempo sem sair de casa.

A segunda participante recebeu o nome de Janaína (nome fictício). A participante relatou que mora com uma amiga e que seus pais residem no INCRA 06. Além dela, seus pais têm outros filhos.

Em relação à infância, a aluna afirma que foi muito feliz e que brincou bastante, não tendo, assim, do que reclamar.

Quanto à adolescência, ela destaca um ponto negativo que a marcou bastante, que foi o abandono dos estudos. A esse respeito, a educanda coloca que optou por largar os estudos, porque acreditava que não daria conta de concluí-los. Porém ressalta que se tivesse encontrado professores interessados em ajudá-la, talvez a sua história estudantil tivesse tido outro desfecho.

Hoje em sua vida adulta, o maior objetivo é concluir seus estudos e cursar uma faculdade de Educação Física.

O terceiro participante chama-se Jeferson (nome fictício). Ele reside com sua mãe e seus irmãos em Brazlândia.

Em relação à sua infância, o estudante revela que o que mais gostava de fazer era ir para a escola, o que só foi possível a partir dos 11 anos de idade, devido ao grande número de viagens que sua mãe fazia.

Em nossa conversa sobre a sua adolescência, o aluno continua dando um enfoque maior à questão escolar, principalmente às dificuldades em manter-se na escola, tendo em vista a longa distância existente entre ela (a escola) e a sua casa.

Agora, em sua vida adulta, Jeferson reforça seu desejo de concluir os estudos e acredita que o ProJovem possa lhe dá condições de alcançar esse objetivo.

A quarta participante chama-se Fernanda (nome fictício) e apresenta uma história de vida muito complexa.

Fernanda e sua irmã moraram desde pequenas com sua avó. A aluna relata que a convivência entre ela e sua mãe sempre foi muito difícil, porém o nascimento de sua filha ajudou a amenizar o clima de desconforto existente entre ambas.

Em relação à sua infância, a aluna deixa claro que para ela essa fase praticamente não existiu, pois teve que trabalhar desde cedo para ajudar em casa, o que juntamente com outros fatores dificultou a sua inserção e sua continuidade na escola.

Quanto à vida adulta, a aluna evidencia que só depois de casada é que ela passou de fato a viver, pois passou a ser tratada com mais carinho, principalmente pelo marido. Ela destaca ainda que, nesse momento, seu maior desejo é concluir os estudos e tornar-se uma enfermeira.

A última aluna recebeu o nome de Maria das Graças (nome fictício). Essa aluna é oriunda de uma família maranhense, formada pelos seus pais e mais doze irmãos. Segundo a educanda, ela foi criada por sua avó e só começou a estudar aos 11 anos de idade. Informa também que no Maranhão, cursou até a 4ª série.

Aos 14 anos, Maria das Graças teve que vir para Brasília em busca de emprego, dessa forma, estudar foi ficando cada vez mais difícil, mas mesmo assim, ela conseguiu estudar até a 6ª série, quando realmente teve que se dedicar ao trabalho e mandar dinheiro para os pais. Por esse motivo, a aluna acredita que não teve adolescência, pois não aproveitou desse momento tão importante de sua vida por conta do trabalho e dos filhos que vieram aos 19 anos.

A aluna também destaca que os seus desejos são concluir os estudos, possuir uma casa própria e seguir a carreira de veterinária.

Ao observar as histórias desses alunos, percebe-se que as dificuldades por eles passadas ora se aproximam, ora se afastam, porém o desejo de vencer os obstáculos e terminar os estudos é comum a todos.