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Transtorno do Movimento Estereotipado

No documento DSM V português (páginas 121-125)

Critérios Diagnósticos

307.3 (F98.4)

A. Comportamento motor repetitivo, aparentemente direcionado e sem propósito (p. ex., apertar as mãos ou abanar, balançar o corpo, bater a cabeça, morder-se, golpear o próprio corpo).

B. O comportamento motor repetitivo interfere em atividades sociais, acadêmicas ou outras, po- dendo resultar em autolesão.

C. O início se dá precocemente no período do desenvolvimento.

D. O comportamento motor repetitivo não é atribuível aos efeitos fisiológicos de uma substância ou a condição neurológica, não sendo mais bem explicado por outro transtorno do neurodesenvol- vimento ou mental (p. ex., tricotilomania [transtorno de arrancar o cabelo], transtorno obsessivo- -compulsivo).

Especificar se:

Com comportamento autolesivo (ou comportamento que resulte em lesão, quando não usa-

das medidas preventivas)

Sem comportamento autolesivo

Especificar se:

Associado a alguma condição médica ou genética conhecida, transtorno do neurodesen- volvimento ou fator ambiental (p. ex., síndrome de Lesch-Nyhan, deficiência intelectual [trans-

torno do desenvolvimento intelectual], exposição intrauterina ao álcool)

Nota para codificação: Usar código adicional para identificar condição médica ou genética

associada ou transtorno do neurodesenvolvimento. Especificar a gravidade atual:

Leve: Os sintomas são facilmente suprimidos por estímulo sensorial ou distração.

Moderada: Os sintomas exigem medidas protetivas ou modificação comportamental explícita. Grave: Monitoração contínua e medidas de proteção são necessárias para prevenir lesão grave.

Procedimentos para Registro

No caso de transtorno do movimento estereotipado associado a alguma condição médica ou ge- nética conhecida, transtorno do neurodesenvolvimento ou fator ambiental, registrar transtorno do movimento estereotipado associado com (nome da condição, do transtorno ou do fator) (p. ex., transtorno do movimento estereotipado associado a síndrome de Lesch-Nyhan).

Especificadores

A gravidade dos movimentos estereotipados não autolesivos varia desde apresentações leves, facilmente suprimidas por um estímulo sensorial ou uma distração, até movimentos contínuos que, de forma acentuada, interferem em todas as atividades cotidianas. Os comportamentos au- tolesivos variam em gravidade ao longo de muitas dimensões, incluindo frequência, impacto no funcionamento adaptativo e gravidade da lesão corporal (de hematoma leve ou eritema por atingir o corpo com as mãos, passando por lacerações ou amputação de dedos da mão, até desco- lamento da retina por bater a cabeça).

Características Diagnósticas

A característica essencial do transtorno do movimento estereotipado é um comportamento motor repetitivo, aparentemente direcionado e sem propósito claro (Critério A). Esses comportamentos costumam ser movimentos ritmados da cabeça, das mãos ou do corpo, sem função adaptativa óbvia. Os movimentos podem ou não responder a tentativas de pará-los. Entre crianças com de- senvolvimento normal, os movimentos repetitivos podem ser interrompidos quando atenção é dirigida a elas ou quando a criança é distraída da realização dos movimentos. Entre crianças com transtornos do neurodesenvolvimento, os comportamentos costumam responder menos a tais tentativas. Nos demais casos, o indivíduo demonstra comportamentos de autocontenção (p. ex., sentar-se sobre as mãos, enrolar as mãos nas roupas, encontrar dispositivo de proteção).

O repertório de comportamentos é variável; cada indivíduo se apresenta com seu padrão es- pecífico, “assinatura” comportamental. Exemplos de movimentos estereotipados não autolesivos incluem, embora não se limitem a, balançar o corpo, fazer movimentos de abano ou rotação das mãos bilaterais, agitar ou tremular os dedos na frente do rosto, sacudir ou abanar os braços e ace- nar com a cabeça. Comportamentos estereotipados autolesivos incluem, embora não se limitem

a, bater a cabeça repetidas vezes, dar tapas no rosto, cutucar os olhos e morder as mãos, os lábios ou outras partes do corpo. Cutucar os olhos causa preocupação especial; ocorre com maior fre- quência entre crianças com deficiência visual. Múltiplos movimentos podem ser combinados (p. ex., erguer a cabeça, balançar o torso, sacudir uma corda pequena repetidas vezes diante do rosto).

Movimentos estereotipados podem ocorrer muitas vezes durante o dia, com duração de al- guns segundos a vários minutos, ou mais. A frequência pode variar de diversas ocorrências em um único dia a um intervalo de várias semanas entre os episódios. Os comportamentos variam no contexto, ocorrendo quando a pessoa está envolvida em outras atividades, quando excitada, estressada, cansada ou chateada. O Critério A exige que os movimentos sejam “aparentemente” sem propósito. Todavia, eles podem atender a algumas funções. Por exemplo, podem reduzir a ansiedade em resposta a estressores externos.

O Critério B informa que os movimentos estereotipados interferem em atividades sociais, acadêmicas ou outras e, em certas crianças, podem resultar em autolesão (ou resultariam se medidas de proteção não fossem usadas). Se autolesão estiver presente, ela deve ser codificada usando-se o especificador. O início dos movimentos estereotipados ocorre no início do período de desenvolvimento (Critério C). O Critério D afirma que comportamento repetitivo e estereoti- pado, no transtorno do movimento estereotipado, não é atribuível a efeitos fisiológicos de uma substância ou a condição neurológica e não é mais bem explicado por outro transtorno do neuro- desenvolvimento ou mental. A presença de movimentos estereotipados pode indicar um proble- ma do neurodesenvolvimento não detectado, em especial em crianças entre 1 e 3 anos de idade.

Prevalência

Movimentos estereotipados simples (p. ex., balançar-se) são comuns em crianças pequenas com desenvolvimento típico. Movimentos estereotipados complexos são muito menos comuns (ocor- rem em cerca de 3 a 4%). Entre 4 e 16% dos indivíduos com deficiência intelectual (transtorno do desenvolvimento intelectual) apresentam estereotipias e autolesão. O risco é maior naqueles com deficiência intelectual grave. Entre pessoas com deficiência intelectual institucionalizadas, 10 a 15% podem apresentar transtorno do movimento estereotipado com autolesão.

Desenvolvimento e Curso

Os movimentos estereotipados costumam iniciar-se nos primeiros três anos de vida. Movimen- tos estereotipados simples são comuns na infância e podem estar envolvidos na aquisição do domínio motor. Em crianças que desenvolvem estereotipias motoras complexas, cerca de 80% exibem sintomas antes dos 24 meses de vida, 12%, entre 24 e 35 meses, e 8%, aos 36 meses ou após. Na maioria das crianças com desenvolvimento típico, esses movimentos desaparecem com o tempo ou podem ser suprimidos. O início das estereotipias motoras complexas pode-se dar na infância ou mais tarde no período do desenvolvimento. Entre indivíduos com deficiência intelec- tual, comportamentos estereotipados e autolesivos podem persistir durante anos, mesmo que a topografia ou o padrão da autolesão possa mudar.

Fatores de Risco e Prognóstico

Ambientais. Isolamento social é um fator de risco para autoestimulação, que pode progredir

para movimentos estereotipados, com autolesão repetitiva. Estresse ambiental também pode de- sencadear comportamento estereotipado. O medo é capaz de alterar o estado fisiológico, resul- tando em aumento da frequência de comportamentos estereotipados.

Genéticos e fisiológicos. Funcionamento cognitivo inferior está associado a risco maior para

comportamentos estereotipados e pior resposta a intervenções. Movimentos estereotipados são mais frequentes entre indivíduos com deficiência intelectual de moderada a grave/profunda, que, devido a alguma síndrome particular (p. ex., síndrome de Rett) ou a fator ambiental (p. ex., um ambiente com estimulação relativamente insuficiente), parecem estar sob maior risco para o aparecimento de estereotipias. Comportamento autolesivo repetitivo pode ser um fenótipo

comportamental em síndromes neurogenéticas. Por exemplo, na síndrome de Lesch-Nyhan, há movimentos distônicos estereotipados e automutilação dos dedos, mordida dos lábios e outras formas de autolesão, a menos que o indivíduo seja contido, e, nas síndromes de Rett e de Corne- lia de Lange, a autolesão pode ser consequência de estereotipias mão-boca. Os comportamentos estereotipados podem resultar de alguma condição médica dolorosa (p. ex., infecção no ouvido médio, problemas dentários, refluxo gastroesofágico).

Questões Diagnósticas Relativas à Cultura

O transtorno do movimento estereotipado, com ou sem autolesão, ocorre em todas as raças e culturas. Atitudes culturais voltadas a comportamentos incomuns podem resultar em diagnós- tico atrasado. Tolerância e atitudes culturais em relação a movimentos estereotipados variam e devem ser consideradas.

Diagnóstico Diferencial

Desenvolvimento normal. Movimentos estereotipados simples são comuns na primeira in-

fância. Balançar-se pode ocorrer na transição do sono para a vigília, um comportamento que costuma desaparecer com a idade. Estereotipias complexas são menos comuns em crianças com desenvolvimento típico e podem geralmente ser suprimidas por distração ou estimulação sen- sorial. A rotina diária do indivíduo raramente é afetada, e os movimentos, em geral, não causam sofrimento à criança. O diagnóstico não seria apropriado nessas circunstâncias.

Transtorno do espectro autista. Movimentos estereotipados podem ser um sintoma de apresen-

tação de transtorno do espectro autista e devem ser considerados quando movimentos e comporta- mentos repetitivos estão sendo avaliados. Déficits na comunicação social e na reciprocidade, que se manifestam no transtorno do espectro autista, costumam estar ausentes no transtorno do movimento estereotipado; assim, interações sociais, comunicação social e comportamentos e interesses repetiti- vos e rígidos constituem aspectos distintivos. Quando o transtorno do espectro autista está presente, o transtorno do movimento estereotipado somente é diagnosticado quando há autolesão, ou quando os comportamentos estereotipados são suficientemente graves para tornarem-se foco de tratamento.

Transtornos de tique. Tipicamente, as estereotipias têm início em uma idade mais precoce

(antes dos 3 anos de idade) na comparação com tiques, que têm idade de início média entre 5 e 7 anos. São consistentes e fixas em seu padrão ou topografia na comparação com os tiques, que são variáveis em sua apresentação. As estereotipias podem envolver braços, mãos ou todo o corpo, ao passo que os tiques costumam envolver os olhos, o rosto, a cabeça e os ombros. As estereoti- pias são mais fixas, rítmicas e prolongadas em duração do que os tiques, que geralmente são bre- ves, rápidos, aleatórios e flutuantes. Ambos, tiques e movimentos estereotipados, são reduzidos por meio de distração.

Transtorno obsessivo-compulsivo e transtornos relacionados. Transtorno do movimento

estereotipado é diferente de transtorno obsessivo-compulsivo (TOC) pela ausência de obsessões, bem como pela natureza dos comportamentos repetitivos. No TOC, o indivíduo sente-se impul- sionado a realizar comportamentos repetitivos em resposta a uma obsessão ou em conformidade com regras que precisam ser aplicadas com rigidez, enquanto no transtorno do movimento es- tereotipado os comportamentos são, aparentemente, dirigidos, mas sem propósito. Tricotiloma- nia (transtorno de arrancar o cabelo) e transtorno de escoriação (skin-picking) caracterizam-se por comportamentos repetitivos com foco no corpo (i.e., arrancar cabelos e beliscar a pele), que podem aparentemente ser dirigidos, mas que não parecem sem propósito e que podem não ter padrão ou ritmo. Além disso, o início da tricotilomania e do transtorno de escoriação não costuma ocorrer precocemente no período do desenvolvimento, e sim por volta da puberdade ou mais tarde.

Outras condições neurológicas e médicas. O diagnóstico de movimentos estereotipados exige

a exclusão de hábitos, maneirismos, discinesias paroxísticas e coreia hereditária benigna. São neces- sários história e exame neurológico para avaliar as características sugestivas de outros problemas, tais como mioclonia, distonia, tiques e coreia. Movimentos involuntários associados a uma condição

neurológica podem ser diferenciados por seus sinais e sintomas. Por exemplo, movimentos estereo- tipados e repetitivos na discinesia tardia podem ser distinguidos por uma história de uso crônico de neurolépticos e por discinesia facial ou oral característica ou movimentos irregulares de tronco ou membros. Esses tipos de movimentos não resultam em autolesão. Um diagnóstico de transtorno do movimento estereotipado não é apropriado para o ato de beliscar ou coçar a pele repetidas vezes associado a intoxicação ou abuso de anfetaminas (p. ex., pacientes são diagnosticados com transtor- no obsessivo-compulsivo e transtornos relacionados induzido por substância/medicamento) e para movimentos coreoatetoides repetitivos associados a outras condições neurológicas.

Comorbidade

O transtorno do movimento estereotipado pode ocorrer como um diagnóstico primário ou secun- dário a outras condições. Exemplificando, as estereotipias são uma manifestação comum de uma gama de doenças neurogenéticas, como síndrome de Lesch-Nyhan, síndrome de Rett, síndrome do X-frágil, síndrome de Cornelia de Lange e síndrome de Smith-Magenis. Quando o transtorno do movimento estereotipado é comórbido com outra condição médica, ambos devem ser codificados.

No documento DSM V português (páginas 121-125)