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CAPÍTULO 2: TRATADOS

2.1 TRATADOS INTERNACIONAIS

2.1.2 Tratado de Madrid

A área ocupada por Moreira Cabral foi tão importante, enquanto “centro formador de fronteira”, que Alexandre Gusmão, ao negociar o Tratado de Madri, a tomou como principal eixo das balizas naturais e como a chave geopolítica dos acordos.59

De acordo com o que consta, depois de descoberta e realizada a primeira remessa de ouro, a área territorial mato-grossense alargou-se rapidamente e as tarefas de garimpagem tornaram-se intensas. Fundou-se em 1719 o Arraial de Forquilha às margens de um dos rios formadores do rio Paraguai, o Coxipó do Ouro, e logo em seguida (1720), foi aberta a mina de Forquilha.

A grande preocupação, portanto, ligava-se às áreas do extremo-oeste. Estes sertões ocidentais estiveram ligados à história da construção territorial do Brasil. Ultrapassada a linha raiana de Tordesilhas, com a penetração lusitana nos domínios castelhanos, apesar do “front” indígena existente, sobretudo, no paso do Paraguai,

cabia aos portugueses assegurar a posse das terras conquistadas, para que Alexandre de Gusmão pudesse invocar o princípio do uti possidetis, consagrado nas

decisões do Tratado das Cortes em Madri.

Durante as negociações diplomáticas que redundaram no referido Tratado, em 1750, foram criadas, por ordem de D. João V, no vale do Guaporé, algumas jurisdições religiosas com o objetivo disfarçado de reconhecimento da Igreja Católica em favor do domínio português, sobretudo em proteção as minas existentes nas áreas oeste de Tordesilhas.

Para que os portugueses pudessem defender a legitimidade das fronteiras conquistadas, o governo determinou a organização de expedições de reconhecimento com o encargo de explorar os rios e de reconhecer os acidentes naturais estratégicos, além de efetuar registros potamográficos e de produzir mapas e informações sobre a região.

As correspondências oficiais mantidas entre o Secretário de Estado, Marco Antônio de Azevedo Coutinho e o negociador luso Visconde Tomás da Silva Teles, em 1733, possibilitavam que Gusmão, enquanto secretário particular de D. João V,

59 MOURA, Pedro. “Bacia do Alto Paraguai”. Revista Brasileira de Geografia. Rio de Janeiro: CNG, jan/mar, 1943, p. 44.

pudesse receber as informações sobre as condições geográficas do interior brasileiro.

Entre os anos de 1733 e 1737 acentuaram-se as funções e o prestígio de Gusmão junto ao monarca. Como despachante dos negócios do Brasil, sobretudo as questões de capitação, Alexandre de Gusmão já vinha, portanto, se inteirando das geografias dos possíveis traçados do Brasil enviando instruções régias que determinavam os registros minuciosos da geografia colonial.60

O expansionismo português nas Américas já buscava, então, muito antes do Tratado de Madri, a delimitação do território colonial pela noção das “fronteiras naturais”, contrariando os princípios do Tratado de Tordesilhas e determinando os signos da soberania portuguesa.

As análises de Teixeira Soares sobre a política pombalina no Brasil esclarecem que Portugal considerava os rios Amazonas, Paraguai e Prata como “três imponentes fronteiras naturais” indispensáveis para a configuração do território brasileiro.61

Assim sendo, a definição dos rios como raias limítrofes entre as nações confinantes, contou com o trabalho dos agentes administrativos da Coroa na Colônia os quais deviam apresentar variados informes geográficos para a orientação e defesa dos planos de divisas naturais junto à Corte de Madri.

O interesse em reunir uma vasta documentação sobre os rios do extremo oeste colonial lhe daria elementos para as negociações diplomáticas de 1750 em Madri.62

Recorde-se, de acordo com o apresentado no capítulo 1, que os entendimentos diplomáticos foram negociados desde 1746 e se baseava no estabelecimento de fronteiras reconhecidas pelos reinos de Portugal e Espanha na América.

Foram três anos de negociações para que, finalmente, pudesse ocorrer o estabelecimento do corpo diplomático que iria traçar os preceitos do Tratado. Para

60 CORTESÃO, Jaime

. Alexandre de Gusmão e o Tratado de Madrid. Lisboa: Livros Horizontes,

1984, Tomo III, p. 578-9.

61 SOARES, T. Diplomacia do Império no Rio da Prata (até 1865). Rio de Janeiro: Brand, 1955, p. 8.

facilitar o trabalho de Gusmão, a região guaporeana estabeleceu-se como faixa de fronteira no norte da Colônia; e Mato Grosso e Goiás foram desmembradas de São Paulo pelo alvará de 9 de maio de 1748.

A recém criada Capitania de Mato Grosso ficou sob a jurisdição direta da Coroa Portuguesa até a chegada de seu 1º Capitão General D. Antônio Rolim de Moura, em 1751.

Cabe enfatizar que, até 1750, os espanhóis, representados por D. José de Carvajal e apoiados pelos ingleses, desejavam, por razões estratégicas e econômicas, manter os lusos distantes da região do Prata.

Os portugueses, por sua vez, defendidos por Alexandre de Gusmão, pretendiam, baseado no princípio do uti possidetis, a preservação das terras

ocupadas. Nesse quadro, com base nas conquistas geográficas portuguesas, Alexandre de Gusmão marcou sua notável participação na efetivação do pacto diplomático pautando-se pela defesa da fronteira colonial, cujos agentes diplomáticos deveriam neutralizar o Tratado de Tordesilhas, acolhendo incondicionalmente o princípio do uti possidetis e das “balizas naturais”.

Ao defender essa política, o articulador luso sustentou incontáveis controvérsias, apresentando ilações capazes de equacionar as mais diversas transgressões.

Quanto à Espanha, sua intenção, no acordo, era conter a expansão portuguesa e reservar para a Espanha a soberania política sobre o estuário da Prata, e as vias terrestres e fluviais, sobretudo as províncias platinas que se comunicavam com o Peru.

Os bandeirantes foram reconhecidos pela metrópole portuguesa e estampados no Tratado de 1750, que afinal permitiu a homologação da conquista sertaneja rumo ao extremo-oeste do continente. Mas cabe enfatizar que a construção do conhecimento histórico sobre as bandeiras, teve início no século XVIII com o objetivo pragmático de apresentar suporte para a administração portuguesa que sempre quis ter o controle das regiões onde os colonos haviam descoberto metais preciosos.

A partir de 1750, os governos ibéricos colocaram em prática os termos do tratado que iriam definir as terras coloniais. O reconhecimento da soberania

portuguesa sobre os territórios conquistados pelo avanço bandeirante, pelos religiosos a serviço de Portugal e pelos contingentes militares que ocuparam as áreas do interior, sobretudo ao sul e ao norte da colônia, qual passou a ser o objeto central do Tratado de Madri.

Com relação à área platina, o Tratado determinava a troca da Colônia do Sacramento pela área dos Sete Povos das Missões, no sul da América. As populações indígenas seriam transferidas para outra localidade do território colonial espanhol.

Com a morte de Dom João V, em 1750, o novo rei de Portugal, D. José I, juntamente com seu primeiro-ministro, Marquês de Pombal, traçou um projeto para incentivar o povoamento e a defesa das áreas meridionais do Brasil. O período de 1750 a 1777, conhecido como fase da política pombalina, foi marcado pela reorganização administrativa envolvendo uma série de medidas para ampliar a eficiência na exploração colonial.63

O programa de Pombal foi também responsável pela ampliação da jurisdição do Maranhão com a anexação do Pará, com sede do governo em Belém. Nesse período foi criada também, em 1755, a Capitania de São José do Javari, mais tarde Rio Negro; hoje o Estado do Amazonas.

Durante o período pombalino as operações de limites enfrentaram poderosas resistências. Os jesuítas espanhóis não aceitavam a transferência das missões para o lugar definido pelo Tratado de Madri. Para neutralizar os efeitos do Tratado os jesuítas incitavam os guaranis a resistir às ordens do Rei da Espanha, agredindo as comissões de limites.

Diante desse quadro foi necessário encetar uma guerra para efetivar a posse do território conhecido como as Missões Orientais do Uruguai (1754-1756).

Graças a essa guerra, conhecida como “guerra guaranítica”, D. José I, sob a orientação de Pombal, determinou a expulsão dos missionários de Loiola da Colônia em 1759.

63 SOARES, T. Diplomacia do Império no Rio da Prata (até 1865). Rio de Janeiro: Brand, 1955, p. 46.

Vários acordos diplomáticos foram tentados entre Portugal e Espanha, mas não houve entendimento entre os comissários ibéricos para demarcar as fronteiras determinando a anulação do Tratado em 12 de fevereiro de 1761.64

Apesar da dúvida em relação à existência do rio Igurei ou Iguerey e a oposição das missões jesuíticas foi realizada a demarcação no sul desde Castilhos- Grandes até o Jauru, afluente do Paraguai. No Norte os embaraços de ordem natural e a resistência dos jesuítas espanhóis às ordens do Rei da Espanha não permitiram que a demarcação se realizasse.