3.2 ATORES DO CENÁRIO EAD
3.2.1 Tutor@ e/ou Professor@
O tutor ou professor com fluência em Libras ajuda a aprendizagem de seus alunos surdos, pois tem consigo um conjunto de estratégias de como ensinar. Sua presença é fundamental porque
[...] ele vai imprimir a marca de sua escolha metodológica, sua concepção de educação ao processo de ensino-aprendizagem, que fica muito mais sob controle do aluno do que do professor, já que ele usa o computador a sua maneira e tem chance de explorar os recursos do jeito que lhe convém. (GOES, 2010, p. 46).
Os processos de ensino-aprendizagem entre professor e aluno podem ser uma relação interessante quando na modalidade a distância, visto que os alunos estão acostumados com o método tradicional de aulas presenciais, e muitos deles têm pouco contato com as modalidades a distância. Por isso, o professor/tutor precisa ter uma série de características que estimulem as estratégias de ensino-aprendizagem por meio da EaD. Destaca-se que o papel do tutor é de extrema importância nesse processo, pois
A presteza nas respostas ao aluno é fundamental, já que não existe o contato presencial, o “olho no olho”. O tutor acompanha e monitora atividades sincrônicas, como os chats, Web TVs e gincanas, e as assincrônicas, como os fóruns de discussão. Tutores devem ter a capacidade de provocar nos alunos a vontade consciente de compartilhamento de reflexões e compreensões e a ação neste sentido e, dessa forma, instigar a construção do conhecimento coletivo. Devem, ainda, provocar no aluno a compreensão de que se ele não faz leitura prévia, se não realiza estudo individual e trabalhos em grupo, perde espaço nos chats. Afinal, a EaD exige autodisciplina, liberdade acompanhada da responsabilidade. É de relevância estar atento a alunos que “desaparecem”. É preciso monitorar, chamá-los, incentivá-los a prosseguir. Demonstrar que se preocupa com ele. (VERGARA, 2007, p. 6, grifo nosso).
Sobre a citação acima, percebe-se que esses profissionais precisam estar constantemente atentos aos AVAs e às movimentações da turma. Ao perceber a diminuição da frequência dos alunos, por exemplo, é preciso entrar em contato com eles, aperfeiçoar questões já vistas e também identificar que tipo de suporte cada aluno precisa. Nesse sentido, a fim de se evitar a insatisfação produzida por esses indivíduos, deve haver uma preparação prévia dos conteúdos, uma boa comunicação entre os envolvidos e postagem adequada dos vídeos e demais materiais pelo e-mail ou no fórum.
O professor precisa estar ciente das particularidades que apresenta um usuário surdo. Este necessita de instrução em sua primeira língua, que é a língua de sinais, para ter acesso aos recursos. Ao adicionar vídeos, por exemplo, deve-se ter atenção à necessária presença da legenda. Também é importante que o professor/tutor saiba língua de sinais para atender os surdos nos ambientes em que for possível comunicação por meio de vídeo. Seguindo essas orientações, evita-se que os alunos diminuam o contato dentro do ambiente virtual.
Outro ponto sobre os AVAs, também mencionado em minha dissertação de Mestrado (GOES, 2010), é que as ferramentas lá disponíveis propiciam uma interação professor-aluno fortemente marcada por trocas e orientações compartilhadas, ao invés de uma pura transmissão unilateral de conhecimentos. Esse fenômeno ocorre com o intuito de “[...] tornar acessível ao aluno o patrimônio cultural já formulado pelos homens e, portanto, desafiar através do ensino os processos de aprendizagem e desenvolvimento [...]” (REGO, 1997, p. 115).
Sobre a organização de um AVA, Santarosa (2006) propõe alguns itens que devem ser levados em consideração para que o ambiente seja bem estruturado e facilite o sucesso do aluno na sua aprendizagem. Algumas dessas características da EaD são:
a) A presença de diálogo/conversação síncrona/assíncrona (aluno-aluno; aluno-professor) no contexto da aprendizagem em colaboração e interação social;
b) Dinâmica de interação da dimensão de troca/cooperação/construção conjunta, na realização das atividades em rede;
c) Apresentação de meios/ferramentas/softwares em rede, que gerem motivação intrínseca;
d) Ênfase no desenvolvimento de processos mentais superiores em oposição à memorização/retenção de informação;
e) Incentivo à exploração/descoberta na construção de conhecimento, na dimensão do construtivismo social no acesso/interação a ambientes virtuais;
f) Ênfase na criação de conflitos cognitivos, do ponto de vista individual, e, principalmente, sóciocognitivos, do ponto de vista do grupo;
g) Atuação do professor como observador/facilitador/animador da inteligência coletiva em oposição ao organizador/transmissor nas atividades em rede;
h) Espaços virtuais de discussão/compartilhamento/colaboração de construções das próprias representações do mundo;
i) A promoção da construção conjunta/distribuída do conhecimento favorecendo a cognição coletiva;
j) O incentivo à interação/cooperação/construção no enfoque “todos-todos”, além do simples acesso à informação disponibilizada em rede;
k) Criação de espaços de inclusão e oposição à segregação;
l) Do ponto de vista pedagógico esses ambientes devem contemplar perspectivas de ambiente de aprendizagem; de construção de conhecimento; de aprendizagem autônoma;
m) Além disso, do ponto de vista tecnológico esses ambientes devem contemplar várias ferramentas, tais como: de gestão do ambiente; de gestão de comunidades; de autoria para professor e, principalmente, para aluno; da área individual; da área da comunidade; de serviços/apoios; de interação síncrona; de interação assíncrona; de avaliação; de cooperação; entre outras, que ampliem seu potencial para o processo de aprendizagem/desenvolvimento. (SANTAROSA, 2006, p. 9).
De posse dessas informações a respeito do AVA, passo a analisar como outras teorizações poderiam acrescentar nas discussões aqui empreendidas sobre o ensino a distância. Um conceito importante para a compreensão desse assunto é da Zona de Desenvolvimento Proximal (ZDP), descrito pelo sociólogo Lev Vygotsky. Sua relevância está na discussão sobre a experiência educacional, a qual também se faz presente na educação a distância, visto que, por meio desse conceito, é possível compreender a dinâmica interna do desenvolvimento e do aprendizado como um estado em movimento e propor estratégias que aproveitem a condição de autonomia da EaD e as possibilidades de trocas entre os alunos.
O papel do tutor é novamente ratificado como de extrema importância, pois ele seria o mediador mais direto, o provocador constante, aquele que auxilia nas tarefas cujos alunos sentem que necessitam de apoio. Pode-se considerar que o tutor é um dos agentes presentes na mediação proposta por Vygotsky, como vemos na figura sugerida por Gallimore e Tharp (1996).
Figura 25 – A gênese de uma capacidade de desempenho: avanços para além da ZDP
Fonte: Gallimore e Tharp (1996, p. 180).
Essa intervenção é considerada pelos autores como de fundamental importância para o desempenho do aluno em direção à Zona de Desenvolvimento Real (ZDR). Por ZDR, entende-se que é aquele estágio em que o indivíduo realiza uma ação já esperada a partir de seu controle interno.
Tendo essas noções em mente, proponho uma nova estruturação no trabalho de interação do professor/tutor surdo ou ouvinte no ambiente virtual, assunto também contemplado nesta pesquisa. Para isso, vários aspectos devem ser enfatizados, como exemplificado na figura abaixo:
Figura 26 – O professor/tutor
Fonte: Organizado pela autora.
1. Recursos tecnológicos: ter acesso a computadores, tablets ou outros tipos de recursos que, a partir da conexão de internet, permitam o acesso ao ambiente virtual;
treinadores
2. Domínio digital: saber interagir com os recursos tecnológicos;
3. Conhecer a organização e estrutura do ambiente virtual: saber onde colocar os materiais, imagens e vídeos no ambiente;
4. Relação entre tutor e professor: em caso de dúvidas, é necessário que o tutor ou professor estabeleça uma relação no ambiente para solucionar os problemas que possam surgir;
5. Saber sobre o curso/disciplina: para atuar como tutor é necessário conhecimento prévio sobre o curso/disciplina, possibilitando uma preparação e atuação com confiança;
6. Materiais adequados com vídeo em Libras: os vídeos são materiais importantes no ambiente virtual, e podem ser utilizados para inserção de traduções em Libras. Por exemplo, onde há textos, adiciona-se o vídeo com tradução do texto em Libras. Em caso de arquivo, é necessário também traduzir o texto e postar no ambiente, além de um profissional tradutor e intérprete de Libras que possa traduzir os textos;
7. Fluente em Língua de Sinais: ser fluente na língua de sinais para se comunicar com tutor e colegas surdos;
8. Conhecer os perfis dos alunos: é importante conhecer os alunos, o que fazem, o que gostam, como é o aprendizado deles e se têm dificuldades ou não; 9. Mediar, esclarecer as dúvidas e interagir com os alunos surdos: as mediações
e interações entre tutor e alunos são importantes, principalmente no sentido de desafiar os alunos para que eles possam responder os questionários. Para esclarecer as dúvidas é importante o uso da língua de sinais;
10. Controlar o acesso dos alunos: quando os alunos não estão ativos, o tutor deve procurá-los, identificando os problemas e dificuldades que estão sentindo, podendo dialogar com ele, sempre em língua de sinais.
Além de se utilizar de todos os recursos acima para o aluno, o tutor deve buscar e aplicar estratégias metodológicas que proporcionem a interação e mediação no processo de ensino e de aprendizagem. Para atender os alunos surdos, recomenda-se que o tutor seja fluente em língua de sinais, pois, caso não ocorra essa comunicação de forma efetiva, poderão ocorrer prejuízos aos processos de ensino-aprendizagem necessários nessa interação, fundamentais para a acessibilidade dos sujeitos surdos.