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Um Modelo de Consultoria: a de Processo

2 Revisão Bibliográfica

1.1 Consultoria Organizacional

2.1.8 Um Modelo de Consultoria: a de Processo

Esta seção tem por objetivo apresentar o entendimento escolhido neste estudo sobre a profissão de “consultor” e o processo que os mesmos lideram nas organizações, “consultoria organizacional” a partir dos estudos de Edgar Schein (2008; 1987; 1975).

A consultoria, para Schein (2008; 1987), é um processo de ajuda a pessoas, pois “todos os problemas organizacionais são fundamentalmente problemas envolvendo interações e processos humanos” (SCHEIN, 2008, p. 42). A esse processo ele nomeou de Consultoria de Processo (CP). Para construir este conceito, apresentarei, a seguir, a comparação realizada pelo autor de três modelos de consultoria e os pressupostos tácitos nos quais os consultores se baseiam em relação ao cliente, “à natureza da ajuda, ao papel do consultor e à realidade em

que o cliente e o consultor se encontram” (SCHEIN, 2008, p. 25).

Os modelos a serem apresentados nos próximos parágrafos são excludentes, mas, segundo Schein (2008), devem compor o repertório do consultor. Certas situações demandam modelos de atuação diferentes e o bom consultor deve saber os terrenos que pode trilhar numa dada situação; contudo, o uso extensivo dos dois primeiros modelos fez com que seu funcionamento fosse entendido como “o” (e não um) modelo de consultoria. Como esses modelos carregarem muitos pressupostos perigosos e difíceis de serem cumpridos, são alvo das principais críticas à atuação dos consultores na atualidade.

O primeiro modelo é aquele em que o consultor assume o papel de especialista cujo objetivo é vender informações e recomendações. Um exemplo é o consultor contratado por uma área específica da organização para responder qual nível de satisfação dos seus empregados com a política de remuneração variável, o grau de sucesso no lançamento de um produto ou a posição da organização frente a seus concorrentes.

Os principais pressuposto tácitos desse modelo são: a) o problema para qual a informação ou recomendação responde foi corretamente diagnosticado pelos gestores da organização; b) a comunicação de expectativas do cliente foi clara; c) o consultor tem capacidade de responder a pergunta; d) as conseqüências das respostas ou as implicações da aplicação da recomendação foram avaliadas; e) há informações prontas ou recomendações acabadas numa realidade externa que pode ser trazida pelo o consultor e aplicada pelo cliente.

Schein (2008) aponta os perigos de se utilizar esse modelo. 1) Baixa taxa de implantação das recomendações – é difícil apontar situações reais onde todos os pressupostos acima citados se confirmam; 2) Transferência pela responsabilidade do sucesso ao consultor – já que ele trás as recomendações e as informações; 3) Dependência do cliente ao consultor – pois este entende e recomenda o melhor frente à sua experiência; 4) Consultores acabam vendendo pacotes gerenciais – como a experiência do consultor é o produto em jogo, ele acaba por vender soluções prontas em sua coleção de idéias; 5) Considerar a realidade externa aos processos – o que desconecta o processo de aprendizagem via significação situada.

O segundo modelo é o médico paciente, o mais popular dentre os modelos e geralmente entendido pelos consultores como a essência do seu trabalho (SCHEIN, 2008). Neste modelo, o consultor é trazido para a organização a fim de avaliar as áreas organizacionais apontadas que não estão funcionando bem. Os sintomas apontados pelos gestores podem ser claros (baixa motivação, queda da produtividade), contudo nem sempre as causas são conhecidas. O papel do consultor, nestes casos, é examinar a organização, diagnosticar e prescrever medidas para “curar” a situação. Muitas vezes, entretanto, os

gestores conhecem remédios prescritos em outras organizações para o mesmo problema e autorizam o consultor e implantar o programa.

Os principais pressuposto tácitos desse modelo são: a) os gestores identificaram bem qual área ou grupo de pessoas está de fato com problemas e precisa de “tratamento”; b) o “paciente” está motivado a revelar sua “doença” e c) acreditam no diagnóstico realizado pelo consultor; d) as conseqüências do diagnóstico são conhecidas e aceitas; e e) o cliente quer e é capaz de implantar as prescrições.

Dentre as fraquezas do modelo, as principais são: 1) o consultor tem ainda mais poder que no modelo anterior, pois não apenas prescreve, mas também diagnostica e implanta a solução; 2) maior dependência do consultor, já que dele depende-se, inclusive, para o diagnóstico; 3) os custos do projeto são altos, já que estão nas mãos do consultor todas as fases do projeto; 4) relatórios e apresentação de descobertas são especialmente importantes para controlar as atividades do consultor; 5) a existência de conflitos na fase de diagnóstico.

Como conseqüência dessas fraquezas, muitos projetos não tem sucesso na implantação desse modelo (SCHEIN, 2008). O principal motivo é a predisposição do cliente a acreditar no diagnóstico realizado e aceitar, com ele, suas recomendações; e geralmente há uma perspectiva não considerada no diagnóstico. Consultores, por outro lado, culpam o insucesso do projeto ao cliente que não percebeu a realidade como ela é, além de ser resistente à mudanças. Na sombra dessa batalha que se trava está o processo de diagnóstico que não é entendido como intervenção, com conseqüências desconhecidas.

O terceiro modelo, da Consultoria de Processo, tenta responder às fraquezas dos modelos anteriores e se trata da essência da resposta que Schein (1987; 2008) oferece ao que seja uma consultoria efetiva.

A Consultoria ganha a qualificação “de processo” para dar ênfase em como as relações interpessoais acontecem e não apenas ao que acontece. Esta foi a forma que o autor encontrou para chamar atenção ao processo interpessoal (entre pessoas ou grupos) mais do que às atividades que as mesmas realizam.

Dentro da realidade organizacional, os principais pressuposto tácitos desse modelo são: a) os gestores desconfiam, mas não sabem exatamente o que está errado e precisam de ajuda para revelar os reais problemas que estão acontecendo num dado setor; b) os gestores / clientes não sabem com exatidão que tipo de ajuda podem receber dos consultores; c) os gestores / clientes sabem que as coisas podem ocorrer de forma melhor, mas precisam de ajuda para perceber o que deve melhorar e como; d) caso os gestores possam aprender a diagnosticar os problemas que estão ocorrendo, a organização se torna mais efetiva; e) apenas

os clientes são capazes de perceber o que pode dar certo na organização, pois é improvável que um consultor externo conheça os padrões culturais da organização de forma tão profunda que possa realizar sugestões apropriadas ao seu contexto; f) o consultor pode sugerir alternativas de mudanças, mas apenas os clientes são responsáveis pela sua execução – já que o cliente, e não o consultor, é dono do problema; g) a incumbência da consultoria é criar habilidades de diagnosticar e intervir de modo que o cliente tenha autonomia sobre os processos de mudança que deseje liderar no futuro.

A seguir, um quadro listando as principais fraquezas dos modelos de especialista e médico-paciente e a resposta que a Consultoria de Processo oferece dentro dos padrões sugeridos de intervenção.

[MODELO] FRAQUEZAS RESPOSTA CONSULTORIA DE PROCESSO

[Especialista] Baixa taxa de implantação das recomendações

O consultor pode criar alternativas conjuntamente com o cliente, mas cabe a este sua implantação. [Especialista / Médico-Paciente]

Transferência pela responsabilidade do sucesso da intervenção ao consultor

“[...] os problemas vão permanecer resolvidos por mais tempo e serão solucionados mais efetivamente se a organização aprender a resolvê-los por si só.” (SCHEIN, 2008, p. 30)

[Especialista / Médico-Paciente] Dependência do cliente ao consultor

Um dos papeis do consultor é criar capacidades no cliente para que ele possa liderar seus processos de intervenção no futuro.

[Especialista] Consultores acabam vendendo pacotes gerenciais

O consultor deve ser humilde e ignorante (SCHEIN, 1987). “(…) um processo custoso de circular todas as nossas idéias preconcebidas e superar algumas de nossas percepções defensivas” (SCHEIN, 2008, p. 31)

[Especialista] Considerar a realidade externa aos processos

A CP considera o processo de relacionamento a realidade, pois é a partir da conexão entre as pessoas que a realidade se molda.

[Médico-Paciente] Relatórios e apresentação de descobertas são especialmente importantes

As atividades do consultor não precisam ser controlada rigidamente, uma vez que grande parte do seu tempo ele está a compartilhar com o cliente. [Médico-Paciente] Conflitos na fase de

diagnóstico

A Consultoria de Processo sabe que o diagnóstico faz parte da intervenção e, portanto, ela deve ser realizada conjuntamente com o cliente.

Quadro 2 – Resposta da Consultoria de Processo às Fraquezas dos Modelos de Especialista e Médico - Paciente

Fonte: própria, baseada em Schein, 2008; 1987.

Em resumo, “a Consultoria de Processos é a criação de uma relação com o cliente que permita a ele perceber, entender e agir sobre acontecimentos progressivos que ocorrem no seu ambiente interno e externo de modo a melhorar a situação tal como definida por esse cliente.” (SCHEIN, 2008, p. 41).

Diante esse contexto, a seguir estarei apresentando o entendimento de Donadone (2001) de como mercado de consultoria se formou até alcançar o nível de desenvolvimento e complexidade que possui.